Todos temos horas, mais ou menos certas para despejar o nosso lixo – a televisão também – chama-lhe prime-time ou horário nobre – vai desde as seis da tarde até às dez horas. Hoje, mais uma vez, vou falar do telelixo que a televisão generalista (e não só) nos despeja diariamente em casa. Para nós, a importação e a produção de lixo televisivo, de uma forma consciente e industrializada, começou há cerca de dez anos. Até então, já tínhamos lixo no pequeno ecrã, mas eram detritos domésticos, artesanais, ingénuos, se comparamos com o que hoje recebemos. Aliás, o conceito de telelixo aprofundou-se ao longo desta última década – há tratados, há filósofos (como Gustavo Bueno) que se especializaram na abordagem do tema. Na rede, circula alguma matéria interessante sobre o assunto.
Precisamente com este título - «O telelixo é uma droga pesada» - encontrei um magnífico texto de Ramiro Marques, do qual já havia lido algumas peças relacionadas com a questão dos professores. Começa por nos lembrar que a Holanda é o maior entreposto europeu de fabrico e distribuição de drogas sintéticas, para depois afirmar que o mesmo país é a sede do maior grupo europeu de produção de concursos, reality shows, novelas da vida real – ou seja o telelixo com que os canais generalistas preenchem os seus horários nobres. Refere-se à nossa bem conhecida Endemol.
Ramiro Marques enuncia depois a composição do telelixo - conteúdos que imbecilizam as pessoas, as tornam insensíveis à dor, à violência e à crueldade, lhes cria falsas necessidades, lhes transmite versões distorcidas da realidade e lhes inculca contravalores. Os próprios noticiários, começam a ser moldados por esta visão perversa do negócio televisivo, abrindo com notícias de crimes, explorando exaustivamente os delitos de natureza sexual, bem como assaltos à mão armada e homicídios. Informando? – Talvez. Deformando? - Sem dúvida.
Recorda que as crianças portuguesas vêem, em média, três horas diárias de televisão, cinco nos fins-de-semana, ficando expostas, com a vulnerabilidade própria da sua inexperiência, a toxicidade do telelixo. A esta exposição, acrescente-se o tempo que crianças e adolescentes dedicam à navegação em websites e salas de chat (também distribuidores de lixo ou de veneno para a mente). Como diz, os efeitos devastadores da absorção e dependência do telelixo, não são menores que os do consumo de drogas pesadas, atingindo um universo muito maior. E, continua, do mesmo modo que os pais lutam por afastar os filhos do ice ou do ecstasy, da cocaína ou da heroína, o mesmo devem fazer contra o viciante consumo do telelixo.
E, conclui dizendo que, infelizmente, ao contrário do que acontece com os narcotraficantes e com os passadores, os proprietários, editores e directores de programas dos canais de televisão que promovem a subida das audiências à custa do telelixo, não são nem punidos, nem sequer alvo da censura social, transformando-se em celebridades e empresários de sucesso. Contudo, os efeitos do telelixo na mente, no carácter e na vida dos jovens podem ser devastadores, tal como o consumo de drogas pesadas – o telelixo, veneno da mente, é uma droga pesada.
Belo texto, que deve, o mais possível, ser divulgado. Em Espanha corre um manifesto ou abaixo-assinado contra o telelixo - tvbasura@arrakis.es – definindo primeiro o que é telelixo e pontualizando depois os seus efeitos nefastos, comparando-o a um vírus informático ou a um cancro, cujas metástases têm tendência para tudo invadir e destruir. Exigem os signatários que os Poderes Públicos responsabilizem os canais de televisão, os anunciantes, os programadores e os profissionais, sem descartar a responsabilidade dos cidadãos que se deixam enganar pela falácia do «espectador soberano» que, segundo os «dealers» televisivos, é quem exige cada vez mais lixo. O que até é verdade, pois os tóxico-dependentes, induzidos ao vício, ficam totalmente dependentes do consumo das drogas que os destroem.
Também eles exigem a sua dose diária, facto que não inocenta os traficantes. Penso que deveríamos pensar num amplo movimento de opinião semelhante ao dos nossos vizinhos. O silêncio é cúmplice do crime. Por isso, seria útil desencadearmos uma iniciativa semelhante.
Sei que estou a abusar da vossa paciência com esta obsessão (causada pelo imprinting?) de vasculhar no lixo televisivo. Vou só falar do que se passa no estado espanhol e não volto a falar tão cedo deste tema. Prometo.
No que à televisão diz respeito, em Espanha, pelos vistos, as coisas não vão melhor. Há meses, circulou um manifesto exigindo a aplicação de medidas contra a emissão de telelixo: «Plataforma para uma televisão de qualidade», apoiada pela Associação de Utentes da Comunicação, União Geral de Trabalhadores, «Comisiones Obreras», Confederação Espanhola de Mães e Pais de Alunos, União dos Consumidores de Espanha e Confederação das Associações de Moradores de Espanha. Não sei se deu algum resultado.
Muito do que aqui digo a seguir foi inspirado naquele manifesto e não seria mau que fôssemos pensando numa iniciativa semelhante, concitando o apoio de associações de pais, organizações de defesa dos consumidores e dos ecologistas, porque o telelixo é extremamente poluente. Teria de ser um amplo movimento de opinião dirigido aos cidadãos em geral, porque, antes de mais, o telelixo e sua proliferação coloca um sério problema de cidadania, minando e pondo em perigo os próprios alicerces da Democracia.
O objectivo dos promotores do telelixo é encontrar um mínimo denominador comum que permita atrair um grande número de espectadores. Para tal, utilizam qualquer tema de interesse humano, seja um acontecimento político ou social, como mero pretexto para desencadear aquilo que consideram ser os elementos básicos para a atracção da audiência – sexo, violência, sentimentalismo, humor grosseiro, superstição, muitas vezes de forma sucessiva e recorrente dentro do mesmo programa.
Sob uma hipócrita aparência de denúncia, os programas de telelixo deleitam-se com o sofrimento, com as demonstrações mais sórdidas da condição humana, com a exibição gratuita de sentimentos e de comportamentos íntimos. Contam também, com uma série de ingredientes básicos que os transformam em factor de aculturação e de desinformação, bem como um obstáculo ao desenvolvimento de uma opinião pública livre e devidamente fundamentada. Segue-se uma lista desses ingredientes.
O reducionismo, com explicações simplistas de assuntos complexos, facilmente compreensíveis, mas parciais ou contendo orientações determinadas. Uma variante deste reducionismo consiste no gosto das teorias da conspiração de não se sabe bem que poderes ocultos, que muitas vezes servem de álibis a determinadas personalidades e grupos de pressão no seu trabalho de intoxicação.
A demagogia, que consiste em apresentar todas as opiniões como equivalentes, independentemente dos conhecimentos ou dos fundamentos éticos sobre os quais se apoiam. Para tal, contribuem a realização de supostos debates, entrevistas e inquéritos, que mais não são do que simulacros, e que longe de lançarem luz sobre os problemas apenas contribuem para consolidar a ideia do «vale tudo». A demagogia tem uma variante: o desenvolvimento de mensagens esotéricas, milagreiras e paranormais, apresentadas de forma acrítica e num mesmo plano de realidade que os argumentos científicos. O desprezo pelos direitos fundamentais, tais como a honra, a intimidade, o respeito, a veracidade ou a presunção de inocência, cuja infracção não pode em nenhum caso ser defendida sob a capa da «liberdade de expressão». Este desprezo desemboca na realização de «juízos paralelos», no abuso do sensacionalismo e do escândalo; na apresentação de testemunhos supostamente verdadeiros, mas que provêm de «convidados profissionais».
E na apoteose de uma televisão de trivialidade, baseada no protagonismo das personagens do mundo cor-de-rosa, as suas insignificâncias e conflitos sentimentais, tratados descaradamente de forma sensacionalista. O problema é ainda mais agudo quando estes conteúdos são difundidos pelo canal de serviço público, cuja obrigação moral e legal é o de fornecer produtos, ética e culturalmente, solventes.
O telelixo nada inventou: a lisonja ao espectador e o sensacionalismo, vêm muito de trás, mas actualmente, a enorme influência social dos meios de comunicação de massas aumenta de forma exponencial os efeitos negativos deste tipo de mensagens. O telelixo está num momento ascendente do seu ciclo vital, como um cancro cujas metástases invadem todo o tecido social, impedindo que grelhas de outros modelos de informação mais respeitadores da verdade e do interesse colectivo surjam e se expandam.
Tudo o que no referido manifesto se alega para mobilizar esforços que combatam este tipo de negócio e todos os seus agentes é válido no nosso País. Não sei se devemos pensar num manifesto, mas é preciso fazer alguma coisa para que a televisão, factor tão importante de informação, cultura, entertenimento, mude em Portugal.
Sei que estou a abusar da vossa paciência com esta obsessão (causada pelo imprinting?) de vasculhar no lixo televisivo. Vou só falar do que se passa no estado espanhol e não volto a falar tão cedo deste tema. Prometo.
No que à televisão diz respeito, em Espanha, pelos vistos, as coisas não vão melhor. Há meses, circulou um manifesto exigindo a aplicação de medidas contra a emissão de telelixo: «Plataforma para uma televisão de qualidade», apoiada pela Associação de Utentes da Comunicação, União Geral de Trabalhadores, «Comisiones Obreras», Confederação Espanhola de Mães e Pais de Alunos, União dos Consumidores de Espanha e Confederação das Associações de Moradores de Espanha. Não sei se deu algum resultado.
Muito do que aqui digo a seguir foi inspirado naquele manifesto e não seria mau que fôssemos pensando numa iniciativa semelhante, concitando o apoio de associações de pais, organizações de defesa dos consumidores e dos ecologistas, porque o telelixo é extremamente poluente. Teria de ser um amplo movimento de opinião dirigido aos cidadãos em geral, porque, antes de mais, o telelixo e sua proliferação coloca um sério problema de cidadania, minando e pondo em perigo os próprios alicerces da Democracia.
O objectivo dos promotores do telelixo é encontrar um mínimo denominador comum que permita atrair um grande número de espectadores. Para tal, utilizam qualquer tema de interesse humano, seja um acontecimento político ou social, como mero pretexto para desencadear aquilo que consideram ser os elementos básicos para a atracção da audiência – sexo, violência, sentimentalismo, humor grosseiro, superstição, muitas vezes de forma sucessiva e recorrente dentro do mesmo programa.
Sob uma hipócrita aparência de denúncia, os programas de telelixo deleitam-se com o sofrimento, com as demonstrações mais sórdidas da condição humana, com a exibição gratuita de sentimentos e de comportamentos íntimos. Contam também, com uma série de ingredientes básicos que os transformam em factor de aculturação e de desinformação, bem como um obstáculo ao desenvolvimento de uma opinião pública livre e devidamente fundamentada. Segue-se uma lista desses ingredientes.
O reducionismo, com explicações simplistas de assuntos complexos, facilmente compreensíveis, mas parciais ou contendo orientações determinadas. Uma variante deste reducionismo consiste no gosto das teorias da conspiração de não se sabe bem que poderes ocultos, que muitas vezes servem de álibis a determinadas personalidades e grupos de pressão no seu trabalho de intoxicação.
A demagogia, que consiste em apresentar todas as opiniões como equivalentes, independentemente dos conhecimentos ou dos fundamentos éticos sobre os quais se apoiam. Para tal, contribuem a realização de supostos debates, entrevistas e inquéritos, que mais não são do que simulacros, e que longe de lançarem luz sobre os problemas apenas contribuem para consolidar a ideia do «vale tudo». A demagogia tem uma variante: o desenvolvimento de mensagens esotéricas, milagreiras e paranormais, apresentadas de forma acrítica e num mesmo plano de realidade que os argumentos científicos. O desprezo pelos direitos fundamentais, tais como a honra, a intimidade, o respeito, a veracidade ou a presunção de inocência, cuja infracção não pode em nenhum caso ser defendida sob a capa da «liberdade de expressão». Este desprezo desemboca na realização de «juízos paralelos», no abuso do sensacionalismo e do escândalo; na apresentação de testemunhos supostamente verdadeiros, mas que provêm de «convidados profissionais».
E na apoteose de uma televisão de trivialidade, baseada no protagonismo das personagens do mundo cor-de-rosa, as suas insignificâncias e conflitos sentimentais, tratados descaradamente de forma sensacionalista. O problema é ainda mais agudo quando estes conteúdos são difundidos pelo canal de serviço público, cuja obrigação moral e legal é o de fornecer produtos, ética e culturalmente, solventes.
O telelixo nada inventou: a lisonja ao espectador e o sensacionalismo, vêm muito de trás, mas actualmente, a enorme influência social dos meios de comunicação de massas aumenta de forma exponencial os efeitos negativos deste tipo de mensagens. O telelixo está num momento ascendente do seu ciclo vital, como um cancro cujas metástases invadem todo o tecido social, impedindo que grelhas de outros modelos de informação mais respeitadores da verdade e do interesse colectivo surjam e se expandam.
Tudo o que no referido manifesto se alega para mobilizar esforços que combatam este tipo de negócio e todos os seus agentes é válido no nosso País. Não sei se devemos pensar num manifesto, mas é preciso fazer alguma coisa para que a televisão, factor tão importante de informação, cultura, entertenimento, mude em Portugal.
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