Acontece que entretanto, Olinda teve de se ausentar para o estrangeiro por algum tempo, deixando o sótão bem tratado, habitável e com bom arejamento. Passados alguns tempos e depois de uma boa temporada ausente, o velho sótão voltou ao estado anteriormente encontrado: cheio de pó, de teias de aranha e com ar sombrio. Era esta a situação dum espaço que só Olinda sabia ocupar e com ele se entendia, pese embora, lá de vez em quando, não compreendesse muito bem porque tão facilmente se desarrumasse.
O sol que entrava pelas frinchas do telhado, vinha esmaecido, sem força e sem vida, acentuando-lhe aquele ar pesado que causava aspecto de abandono, tal como antes acontecia. Os caixotes bem arrumadinhos e limpos, começavam a ser corroídos pelo bicho da madeira que entretanto ali tivera penetrado, até as famigeradas vespas encontraram espaço e ambiente para se instalarem à sua maneira sem qualquer dificuldade, tal era o estado de degradação a que tinha chegado o pobre sótão. Era uma lástima
Adivinhava-se que, quando Olinda voltasse, iria ter um ataque de nervos com a surpresa da presença de novos habitantes naquele sótão, pois em vez deles, melhor seria que por ali circulasse ar fresco vindo do Oriente fazendo germinar ideias novas, motivações fortes que dessem inspiração a um projecto de grande envergadura, ou quem sabe o desenvolvimento dum facto amoroso que entretanto ali se acolhesse no desfrute dum belo prazer, com alguma privacidade, claro.
O regresso de Olinda não se fez esperar e cedo se apercebeu que não seria fácil o enriquecimento daquele espaço, porque o velho sótão era um lugar de tamanho irregular, onde qualquer indício de renovação, ou inovação, podia colidir com as suas fronteiras naturais e obstruir o florescimento de novas ideias, o que obrigou Olinda a recorrer a outra parte de casa onde um novo projecto pudesse crescer e o seu espírito conseguisse um pouco de paz.
HARMONIA DOS CONTRÁRIOS
Como nos vemos e nos aceitamos
Como nos distinguimos
e nos amamos
Numa mistura de fel e mel
Sabor agridoce da pele
Amor perdido na idade
Sumo vivo da humanidade
Como nos amamos corremos
e saltamos
Como fugimos e nos encontramos
dentro do nosso descontentamento
Como somos levados no vento
E no vendaval nos encontramos
Como somos e nos propomos
ao deslize
Como nos encontramos depois
no afastamento
Como somos, nos erguemos
e padecemos
Num abraço de entendimento
Como somos e nos inquietamos
Mas só depois… nos aceitamos
Paxiano
SÓTÃO DESARRUMADO
(ALEGORIA)
O sótão esconso junto às águas-furtadas havia anos que estava fechado sem qualquer visita que lhe pudesse dar de alguma utilidade. Estava fechado. Tão fechado que as teias de aranha faziam o rendilhado dos cantos, cujo adorno mais se parecia com a casa dos fantasmas a condizer com aquele desarrumo de caixotes que por ali se quedavam. Era estranho e não deixava de ser inquietante.
Olinda que entretanto chegara de longa viagem, decidiu entrar naquele espaço com a ideia de lhe dar alguma arrumação. À entrada ia perdendo a coragem com tal desalinho. Era o caos. Desarrumo que não tinha ponta por onde se pegasse. Mas como gostava de desafios e nunca entendera por que razão, ou ideia, tinha ficado tanto tempo abandonado, decidiu pôr mãos à obra e, com todo o carinho, deu-lhe alguma ordem de modo a que a luz das clarabóias iluminassem os cantos mais escuros. Ficou mais airoso e acolhedor
Aos poucos e poucos, Olinda passou a frequentar aquele sótão que, entretanto, ficara mais habitável com os caixotes alinhadinhos, em corredores bem definidos, onde o ar e as ideias podiam fluir com a clareza que se pode adivinhar. Ela própria passou a ser visita assídua daquele espaço.
VENS DO OUTRO LADO
Vens desse espaço etéreo
Sem corpo nem tamanho
Como forma duma ideia
Sublimada no desenho
Da semente que se semeia
Mas vens sempre reluzente
Nas manhãs de densa neblina
Mas airosa e brilhante
Tão radiosa e cintilante
Tão segura quanto perdida
braço depois o teu espaço
como quem envolve o universo
Como quem olha o infinito
Erguendo o mundo num só grito
Na rima infinda dum só verso
Vens sempre de sorriso aberto
E vacilas na rima dum só verso
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