Já aqui trouxemos Rosalia mais de uma vez, e voltaremos a trazê-la, que é leitura que merece. A sua importância para a literatura galega contemporânea também já foi por muitos explicada.
O Dia das Letras Galegas, celebrado a 17 de Maio, coincide, aliás, com a data da primeira edição dos Cantares Galegos de Rosalia de Castro, obra fundamental no ressurgimento da literatura em língua galega. Teve início em 1963, ano do centenário daquela primeira edição, e foi dedicado a Rosalia de Castro, como não podia deixar de ser. Cada ano é dedicado a um escritor em língua galega, já falecido.
Iniciando aqui a apresentação de textos dos vários escritores já distinguidos no Dia das Letras Galegas, só podíamos começar por Rosalia.
Pobre Galiza, não deves
chamar-te nunca espanhola
...
A GAITA GALEGA
Resposta ao eminente poeta D. Ventura Ruiz de Aguilera
2 l de água 1 osso de presunto 1 osso de novilho ou vaca 100 g feijão branco 1 molho de grelos 1 kg de batatas 1 chouriço Sal
preparação
Deitar os ossos e o feijão - demolhado do dia anterior, numa panela com água e sal. Cozer durante uma hora. Descascar as batatas e cortar em pequenos cubos. Tirar os ossos da panela e deitar as batatas junto com o chouriço. Deixar cozer. Lavar bem os grelos. Numa outra panela cozer os grelos com sal. Quando começarem a ferver retirar do lume de imediato.
Deitar os grelos na panela onde estão as batatas, deixar cozer tudo durante 15 minutos. Servir bem quente
E um outro caldo galego (irmão), música do grupo Trifulka:
Nas palavras de Carcalho Calero, Rosalia “assinala o primeiro marco inamovível na história da literatura galega contemporânea”.
Os Cantares Galegos, de Rosalia de Castro, publicados em 1863, são um marco na literatura galego-portuguesa e podem agora ser lidos na versão linguística de Higino Martins, editada por Edições da Galiza, sem os implantes da ortografia castelhana.
Escreveu Rosalia na sua introdução aos Cantares:
Cantos, báguas, queixas, suspiros, serãos, romarias, paisagens, devesas, pinhais, solidões, ribeiras, costumes, tudo aquilo, enfim, que pela sua forma e colorido é digno de ser cantado, tudo o que teve um eco,uma voz, um rugido por leve que fosse, que chegasse a comover-me, tudo isso me atrevi a cantar neste humilde livro para dizer uma vez sequer, mal que seja sem jeito, aos que sem razão nem conhecimento algum nos desprezam, que a nossa terra é digna de louvores, e que a nossa língua não é aquela que bastardeiam e champurram lerdamente nas mais ilustradíssimas províncias com um riso de mofa, que para dizer verdade (por mais que esta seja dura) demonstra a ignorância mais crassa e a mais imperdoável injustiça que pode fazer uma província a outra província irmã, por pobre que esta seja. Mas eis que o mais triste nesta questão é a falsidade com que fora daqui pintam assim os filhos da Galiza como a Galiza mesma, a que geralmente julgam o mais desprezível e feio de Espanha, quando acaso seja o mais formoso e digno de louvor.
(...)
Foi este o móbil principal que me impeliu a publicar este livro, que, mais que ninguém, conheço que necessita da indulgência de todos. Sem gramática nem regras de nenhuma classe, o leitor topará muitas vezes faltas de ortografia, expressões que dissoarão aos ouvidos de um purista; mas ao menos, e para desculpar em algo estes defeitos, pus o maior cuidado em reproduzir o verdadeiro espírito do nosso povo, e penso que o consegui em algo… se bem duma maneira débil e fraca. Queira o céu que outro mais afortunado do que eu possa descrever com as suas cores verdadeiras os quadros encantadores que por aqui se topam ainda no recanto mais escondido e olvidado, para que assim, ao menos em fama, já que não em proveito, ganhe e se veja com o respeito e admiração merecida esta infortunada Galiza!
Tanta Rosalia, tantos poemas, por ler, e cantar, uma e outra vez.
Cantar-te-ei, Galiza,
teus doces cantares,
que assim mo pediram
na beira do mare.
Cantar-te-ei, Galiza,
na língua galega
consolo dos males,
alívio das penas.
Mimosa, suave,
sentida, queixosa,
encanta se ri,
comove se chora.
Qual ela nenhuma
tão doce que cante
soidades amargas,
suspiros amantes,
mistérios da tarde,
murmúrios da noite;
cantar-te-ei, Galiza,
na beira das fontes.
Que assim mo pediram,
que assim mo mandaram,
que cante e que cante
na língua que eu falo.
Que assim mo mandaram,
que assim mo disseram…
Já canto, meninhas.
Cuidai, que começo.
Com doce alegria,
com brando compass,
ao pé das ondinhas
que vêm e vão.
Deus santo permita
que aquestes cantares
de alívio vos sirvam
nos vossos pesares;
de amável consolo,
de suave contento,
qual fartam de ditas
cumpridos desejos.
De noite, de dia,
na aurora,na sera
cantando ouvireis-me
por montes e veigas.
Quem quer que me chame,
quem quer que me obriga:
cantar, cantarei-lhe
de noite e de dia
por dar-lhe contento,
por dar-lhe consolo,
trocando em sorrisos
queixinhas e choros.
Buscai-me, rapazes,
velhinas, mocinhos,
buscai-me entre os robles,
buscai-me entreb os milhos,
nas portas dos ricos,
nas portas dos pobres,
que aquestres cantares
a todos respondem.
A todos, que à Virgem
ajuda pedi,
porque vos console
no vosso afligir;
nos vossos tormentos,
nos vossos pesares.
Cuidai que começo…
Maninhas, Deus diante!
O poema Cantar de emigração foi de tal modo sentido em Portugal como traduzindo a situação das vagas que saíam do país em busca de melhor vida que, musicado por José Niza e interpretado primeiro por Adriano Correia de Oliveira em Gente de aqui e de agora, se tornou uma das trovas de denúncia e protesto nos anos 70.
Em 1880, como uma espécie de continuação de “Cantares Galegos”, Rosalia de Castro publica um novo livro de poemas em galego, “Follas Novas” (Folhas Novas).
Dele faz parte o poema “Negra Sombra”, que pela sua força e beleza é lido, declamado e cantado por muitos. Foi primeiro musicado pelo compositor e músico galego Xoán Montés Capónque o associou ao alalá, canto popular galego arrítmico considerado por muitos como a forma mais antiga e característica da música tradicional galega.
Negra Sombra
Cando penso que te fuches, Negra sombra que m’asombras, Ó pé d’os meus cabezales Tornas facéndome mofa.
Cando maxino que’ês ida N’o mesmo sol te m’amostras, Y eres a estrela que brila, Y eres o vento que zóa.
Si cantan, ês tí que cantas, Si choran, ês tí que choras, Y-ês o marmurio d’o río Y-ês a noite y ês a aurora.
En todo estás e ti ês todo, Pra min y en min mesma moras, Nin m’abandonarás nunca, Sombra que sempre m’asombras.
in Follas Novas (1880)
Negra Sombra
Quando penso que te fuches,
Negra sombra que me assombras, Ò pé dos meus cabeçales Tornas fazendo-me mofa.
Quando magino que és ida, No mesmo sol te me amostras, I eres a estrela que brila, I eres o vento que zoa.
Si cantam, és ti que cantas; Si choram, és ti que choras; I és o marmúrio do rio I és a noite i és a aurora.
Em todo estás e ti és todo, Pra min i em mim mesma moras, Nin me abandonarás nunca, Sombra que sempre me assombras.
in Folhas Novas, edição da AGAL - Associaçom Galega da Língua
Negra Sombra
Aqui ficam duas interpretações de Negra Sombra, para ouvir e voltar a ouvir vezes sem conta:
A da asturiana Luz Casal sente-se na pele e faz chorar de emoção:
Igualmente tocante é a do músico galego Bibiano:
Folhas Novas pode ser encomendado (10€ mais envio) através da Imperdível, aloja electrónica da Associaçom Galega da Língua, em http://www.imperdivel.net/.
«Ediçom e notas de Elvira Souto, prólogo de F. Salinas Portugal. Estamos ante uma poética que afunda nos sentimentos, na saudade e que tem frequentemente, por horizonte, a fronteira do próprio ser.
O achegamento a umha obra como Folhas Novas, está sempre cheo de riscos; o primeiro deles advém a escrever um discurso sobre os múltiplos discursos que sobre Rosalia se fixérom, o outro existe se pretendemos conferir-lhe ao nosso discurso um valor universalizante do que nós queremos ficar à marge.
É a nossa umha leitura "individual", o fruto de um diálogo enormemente gratificante com a própria obra rosaliana
Num começo o poemário concebeu-se como uma continuação de Cantares Gallegos: 40% dos poemas de Follas Novas têm afinidade com o texto publicado em 1863, enquanto o restante das composições apresentam um diferente espírito poético motivado pelo afastamento da terra, as desgraças familiares e as doenças físicas e morais.»
A cantora galega Ugia Pedreira apresentou esta semana em Portugal, no Porto e em Braga, o seu livro-disco-poemário Noente Paradise.
Hoje, dia 29, às 22 horas, dá um concerto na Casa da Música, no Porto.
Noente Paradise é «umha viagem polos mares do norte desde a entranha. Noente está nas praias do interior, segundo se passa por Cuba e se volta, sempre, a Galiza, à repetiçom da quotidiania delirante». «O paraíso está no vaivém contínuo da palavra ao som e do som ao texto».
O livro-disco pode ser encomendado através da Imperdível, a loja electrónica da AGAL – Associaçom Galega da Língua.
Dia 27 deste mês teve lugar em Santiago de Compostela o lançamento da obra magna de Daniel Castelão, Sempre em Galiza, com intervenções de Miguel Penas (editor), Fernando Corredoira (responsável pela adaptação) e os autores de dois dos prólogos, Francisco Rodríguez e Camilo Nogueira.
A edição é da ATRAVÉS|EDITORA, com adaptação para a norma internacional portuguesa de Fernando Corredoira, o qual contou com a colaboração de Ernesto Vásquez Souza para as notas.
Segundo Miguel Penas, vice-presidente da AGALe director da ATRAVÉS|EDITORA, Sempre em Galiza é a obra que compila e mostra a amplitude do pensamento político de Castelão e «um dos alicerces ideológicos em que se apoiou o nacionalismo galego para se reconstruir após a barbárie fascista que começou no ano 1936, e da qual ainda hoje padecemos conseqüências bem diretas na Galiza».
O livro é acompanhado duma separata, Sempre Castelao – Sete achegas a Castelao e ao Sempre em Galiza, com textos demonstrativos da herança política que Castelão deixou ao povo galego.
O livro pode ser encomendado através da Imperdível, a loja electrónica da AGAL – Associaçom Galega da Língua.
NO ESTROLABIO, AMANHÃ É DIA DE CARVALHO CALERO!
"O galego ou é galego-português ou é galego-castelhano não há outra alternativa."
“Umha língua tam ameaçada como o galego nom pode sobreviver senom apoiando-se nas demais formas do sistema, quer dizer, reintegrando-se no complexo luso-galaico do qual geneticamente forma parte [...] O galego ou é galego-português ou é galego-castelam nom há outra alternativa. [...] Umha concórdia ortográfica, quando menos, e umha inteligência na opçom das formas lingüísticas que integrariam, sem prejuízo das peculiaridades do galego, o veículo geral de comunicaçom, seriam indispensáveis./ Deste jeito, seríamos o que somos, voltaríamos a ser o que fomos: o romance mais ocidental, nom esnaquizado em dous anacos isolados, senom reintegrado numha unidade sistemática que nom exclui a autonomia normativa” [...] “Alguns demagogos querem manter este estado de alienaçom, e rejeitam como artificiosas as formas restauradas. Comovedora homenagem de ignorância ou fanatismo ao mito do galego popular, se nom se trata de uma maquiavélica manobra encaminhada a fazer impossível a supervivência do galego.”
(“Sobre a nossa língua”, em Problemas da Língua Galega, Sá da Costa Editora, 1981, pp. 19-21, conferência no Clube Linguístico da Crunha, 7 fevereiro 1979)
Rosalia de Castro (Santiago de Compostela, 1837 — Padrón, 1885), escritora e poeta galega, apesar de ter também escrito algumas obras em castelhano, é considerada como a fundadora da literatura galega moderna, em galego.
Nas palavras de Carvalho Calero, “Rosalia assinala o primeiro marco inamovível da literatura galega contemporânea”.
No princípio era a Rosalia…
Um dos nomes grandes da literatura galega deveria igualmente ser acarinhada como parte,que é, da literatura de língua portuguesa, ou galego-portuguesa, e como tal lida e estudada também em Portugal.
O dia 17 de Maio, data de edição da sua primeira obra em língua galega, “Cantares Gallegos”, ficou o Dia das Letras Galegas.
Com “Cantares Gallegos”, publicado em 1863, em Vigo, iniciou-se o ressurgimento da poesia e literatura escrita em galego. Os seus poemas glosam cantigas populares, vivências pessoais, as injustiças sofridas, os sentimentos dos galegos e o seu amor à terra galega.
No prólogo a Cantares Galegos, escreveu Rosalia que “ninguém tem menos do que eu tenho as grandes qualidades que são precisas para levar a cabo obra tão difícil, ainda que ninguém também se pôde achar animado dum mais bom desejo para cantar as belezas da nossa terra naquele dialecto suave e mimoso que querem fazer bárbaro os que não sabem que avantaja as demais línguas em doçura e harmonia. Por isto, ainda achando-me débil em forças e não havendo aprendido em mais escola que a dos nossos pobres aldeãos, guiada só por aqueles cantares, aquelas palavras carinhosas e aquelas expressões nunca olvidadas que tão docemente ressoaram nos meus ouvidos desde o berço e que foram recolhidos pelo meu coração como herança própria, atrevi-me a escrever estes cantares esforçando-me em dar a conhecer como alguns dos nossos poéticos costumes ainda conservam certa frescura patriarcal e primitiva, e como o nosso dialecto doce e sonoro é tão a propósito como o primeiro para toda a classe de versificação.”
A colonização cultural e linguística castelhana e a ausência dum padrão de uso literário fez, então, com que escritores galegos misturassem na sua escrita, galega, também ortografia e morfologia castelhanas.
Mas que português não se reconhece nos ais, inhas e inhos neste poema de Rosalia. Adios, rios; adios, fontes
Adios, ríos; adios, fontes; adios, regatos pequenos; adios, vista dos meus ollos: non sei cando nos veremos.
Miña terra, miña terra, terra donde me eu criei, hortiña que quero tanto, figueiriñas que prantei,
prados, ríos, arboredas, pinares que move o vento, paxariños piadores, casiña do meu contento,
muíño dos castañares, noites craras de luar, campaniñas trimbadoras da igrexiña do lugar,
amoriñas das silveiras que eu lle daba ó meu amor, camiñiños antre o millo, ¡adios, para sempre adios!
¡Adios gloria! ¡Adios contento! ¡Deixo a casa onde nacín, deixo a aldea que conozo por un mundo que non vin!
Deixo amigos por estraños, deixo a veiga polo mar, deixo, enfin, canto ben quero... ¡Quen pudera non deixar!...
Mais son probe e, ¡mal pecado!, a miña terra n'é miña, que hastra lle dan de prestado a beira por que camiña ó que naceu desdichado.
Téñovos, pois, que deixar, hortiña que tanto amei, fogueiriña do meu lar, arboriños que prantei, fontiña do cabañar.
Adios, adios, que me vou, herbiñas do camposanto, donde meu pai se enterrou, herbiñas que biquei tanto, terriña que nos criou.
Adios Virxe da Asunción, branca como un serafín; lévovos no corazón: Pedídelle a Dios por min, miña Virxe da Asunción.
Xa se oien lonxe, moi lonxe, as campanas do Pomar; para min, ¡ai!, coitadiño, nunca máis han de tocar.
Xa se oien lonxe, máis lonxe Cada balada é un dolor; voume soio, sin arrimo... Miña terra, ¡adios!, ¡adios!
¡Adios tamén, queridiña!... ¡Adios por sempre quizais!... Dígoche este adios chorando desde a beiriña do mar.
Non me olvides, queridiña, si morro de soidás... tantas légoas mar adentro... ¡Miña casiña!,¡meu lar!
in Cantares Gallegos (1863)
Adeus, rios; adeus, fontes
Adeus, rios; adeus, fontes; adeus, regatos pequenos; adeus, vista dos meus olhos; não sei quando nos veremos.
Minha terra, minha terra, terra onde me eu criei, hortinha que quero tanto, figueirinhas que plantei,
prados, rios, arvoredos, pinhares que move o vento, passarinhos piadores, casinha do meu contento,
moinho dos castanhais, noites claras de luar, campainhas timbradoras da igrejinha do lugar,
amorinhas das silveiras que eu lhe dava ao meu amor, caminhinhos entre o milho, adeus para sempre a vós!
Adeus, glória! Adeus, contento! Deixo a casa onde nasci, Deixo a aldeia que conheço Por um mundo que não vi!
Deixo amigos por estranhos, deixo a veiga pelo mar, deixo, enfim, quanto bem quero… Quem pudera o não deixar!...
Mas sou pobre e, malpecado! a minha terra n’é minha, que até lhe dão prestado a beira por que caminha ao que nasceu desditado.
Tenho-vos, pois, que deixar, hortinha que tanto amei, fogueirinha do meu lar, arvorinhas que plantei, fontinha do cabanal.
Adeus, adeus, que me vou, ervinhas do campo-santo, onde meu pai se enterrou, ervinhas que biquei tanto, terrinha que nos criou.
Adeus, Virgem da Assunção, branca como um serafim; levo-vos no coração; vós pedi-lhe a Deus por mim, minha Virgem da Assunção.
Já se ouvem longe, mui longe, as campanas do Pomar; para mim, ai!, coitadinho, nunca mais hão de tocar.
Já se ouvem longe, mais longe… Cada bad’lada uma dor; vou-me só e sem arrimo… Minha terra, adeus me vou!
Adeus também, queridinha… Adeus por sempre quiçá!... Digo-che este adeus chorando desde a beirinha do mar.
Não me olvides, queridinha, Se morro de solidão… Tantas léguas mar adentro… Minha casinha!, meu lar!
in Cantares Galegos, edição de Higino Martins Esteves
Amancio Prada canta Adios, rios; adios, fontes
Cantares Galegos pode ser encomendado (12€ mais envio), em edição promovida pela Academia Galega da Língua Portuguesa e reelaborada pelo filólogo Higinno Martins Esteves, através da Imperdível, a loja electrónica da Associaçom Galega da Língua, em http://www.imperdivel.net/.
"Se alguma vez um livro foi capaz de mudar a trajetória da escrita, da língua e por tanto da imagem que uma nação tem de ela própria e oferece ao mundo é esta obra-prima da nossa enorme Rosalia de Castro.
Edições da Galiza e a Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP) publicam a nova versão dos "Cantares Galegos" de Rosalia de Castro segundo o último Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Esta versão foi realizada e dirigida polo membro da Academia e Prof. Dr. Higino Martins Esteves, constando de 248 páginas entre preliminares, texto e notas finais.
Se alguma vez um livro foi capaz de mudar a trajetória da escrita, da língua e por tanto da imagem que uma nação tem de ela própria e oferece ao mundo é este. Foi alvorada que abalou em saudades o duro coração dos galegos e rompeu para sempre a tradição de seqüestro noutra língua. Exemplo de tão alegre e melâncolico ritmo demonstrou possível uma literatura galega, radical e moderna, na língua que empregava a gente para cantar e viver, na única em que podiam ser exprimidas todas as subtilezas do ser, toda a complexa, longa e assanhadamente apagada História nacional. Os Cantares Galegos, nas asas românticas dos lieder, na polêmica céltica dos BarzazBreiz, em diálogo com as Espanhas de AntonioTrueba, são testemunho e reivindicação da essência poética e musical galega, síntese intensa de leituras, melodias, ares, ditos, ambiente e conversas sobre folclore e nação.
Escritos quando agoniza a I Restauração bourbónica espanhola (1863), num momento em que a Galiza liberal luta pola modernidade, celebrados como bandeira antes da chegada da II Restauração canovista nas Espanhas, são, coincidindo com os sonhos vitais da autora, desafio e desabafo, presente e jogo poético de amor; símbolo e mensagem de uma entusiasta moça dotada de raro talento artístico e tremenda potência intelectual.
Se há um programa é este: o da reivindicação dessa língua familiar e cultura herdada em farrapos, aprendida sem mais escola que a das aldeias e sem gramática de nenhuma classe, que aspira por próprio esforço e constância, em construção permanente desde aquela, a levar o nome de Galiza ao lugar onde lhe corresponde entre as nações da Terra.
Cuidai, que começa...”
NO ESTROLABIO TAMBÉM, 30 DE OUTUBRO É DIA DE CARVALHO CALERO...