Quinta-feira, 7 de Abril de 2011

Só quem tem emprego é que pode fazer greve - por Luis Moreira

Vamos partir de um princípio inquestionável. Os trabalhadores têm direito a fazer greve. Mas por definição têm um direito que os desempregados não têm.

 

A partir daqui temos à nossa frente imensas dúvidas sem respostas fáceis, muitas incongruências, muitos paradoxos. Desde logo porque os trabalhadores das empresas privadas, na prática, não têm direito à greve. A não ser como último argumento não há greves. Medo de perder o trabalho, enfrentar o descontentamento dos colegas que não fazem greve, prejudicar a laboração, em última análise medo de não haver vencimento ao fim do mês.

 

Ficamos reduzidos às empresas que têm grande impacto junto da vida social e laboral dos cidadãos. O caso dos transportes é exemplar. Param os transportes e temos logo as primeiras vítimas que são os utentes, os cidadãos que trabalham. A estes ninguém acode, e são os mais pobres de todos, os que sofrem, porque os outros que ganham melhor vão de transporte próprio.

 

Depois temos a questão, incompreensível, de haver centenas de milhares de cidadãos que não arranjam emprego, enquanto outros que já usufruem dessa benesse( nos tempos que correm ter um emprego com vencimento certo ao fim do mês é uma benesse) fazem greve para exigir mais dinheiro e melhores condições. E, na maior parte das vezes fazem greve com razão.

 

Há, pois, nesta equação algo que a torna irresolúvel.Quem já tem pede mais para si próprio e não para quem tem menos e, estes, por falta de meios não podem fazer ouvir a sua voz. E o que está no outro membro da equação é igualmente algo que não controlamos. A profunda injustiça de uma sociedade que cava cada vez mais um fosso entre as pessoas.

 

Se o que ganham os do topo não é conforme à situação da empresa (nos transportes o que temos são empresas falidas, como sabemos) e se permitem atribuirem-se a si próprios milionários vencimentos, quem é que tem coragem de apontar o dedo a quem, tendo vencimento, ganha, em comparação, uma miséria?

 

Estamos, pois, perante um poblema de ética, de justiça social e de moral. Se lá de cima vêm os exemplos que vêm, o que se pode esperar a quem falta vencimento e sobra mês? Estamos na selva, quem tem poder, dinheiro, voz, vai sempre ganhar mais, quem não tem nada disso, vai sempre viver pior.

 

Este sistema a continuar, como os textos do Professor Julio Marque Mota já abordaram, vai acabar em tumultos violentos senão mesmo em guerras, tal como resultaram as guerras mundiais de igual húmus social e politico. Ninguém está disposto a ganhar menos em troca, por exemplo, de trabalhar menos abrindo caminho a uma oportunidade para outros sem igual sorte.

 

Ora se  quem tem meios exige mais os que não têm meios vão ter cada vez menos, a não ser que o bom senso volte.

 

Alguém acredita nisso? Voltar o bom senso por livre vontade?

 

E, os primeiros a darem o exemplo, têm que ser os que na sociedade civil, nada têm garantido, os que pagam os impostos que o Estado depois distribui injustamente e desperdiça a seu belo prazer. Os que para terem vencimento têm que manter  empresas viáveis com o seu trabalho e dedicação,e que não podem esperar por "compensações" do estado, nem por negócios "finos" com a Caixa Geral de Depósitos. Esses são os únicos que possuem um crédito de ética e que podem exigir aos "confortados" o bom senso que vem faltando.

 

Se juntarmos a tudo isto uma economia que não cresce há uma década, não cria riqueza, então os que pedem mais estão, na prática, a tirar aos outros que não podem pedir nada. Ao contrário, se uma economia consegue criar riqueza, esse acréscimo pode ser mal distribuído mas chega a todos.

 

E, termino fazendo esta pergunta: já repararam que na CARRIS não há greves e que é a única empresa de transportes urbanos que dá lucros? Será que os gestores que lá estão merecem o que ganham? Dizem-me que o sucesso da empresa tem a ver com programas de médio prazo, envolvendo os trabalhadores, onde são fixados os objectivos e as pessoas ganham segundo o mérito! Quem não estará satisfeito com esta "performance" devem ser os sindicatos.

 

Alguma coisa será !

 

publicado por Luis Moreira às 13:00
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Sexta-feira, 11 de Fevereiro de 2011

Ser e ter - por Carlos Loures

Talvez  Shakespeare pudesse ter formulado a famosa dicotomia deste modo – To have or not to bethat is the question. Para que assim tivesse sido, teria de conhecer a sociedade actual onde, para se ser, para se existir, é preciso ter. Nos nossos dias, introspecções sobre o ser ou o estar? Perda de tempo – uma olhadela à conta bancária resolve a questão. Se tem, é e está. Não tem? Não existe, é como se não estivesse.

E, no entanto, o bom William já vivia na época em que os dados estavam a ser lançados. O protestantismo vinha impor o dever da riqueza, o pecado de ser pobre e de um homem não poder prover todas as necessidades da sua família, por oposição ao catolicismo que defendeu sempre (e persiste)  na pobreza como virtude. Esta mentalidade, plantada no Novo Mundo, resultou naquilo que sabemos – uma nação que impõe os seus valores, em última instância a ferro e fogo.

 

No entanto, no  interior da sociedade norte-americana, todos os estigmas que a mentalidade ianque espalhou estão presentes – consumismo feroz e acéfalo, marginalidade, tóxico-dependência, violência, subvalorização da cultura. Tudo o que de nefasto os E.U.A. exportam, existe no seu interior. É o que se chama provar do próprio veneno.

 

Quando se fala tanto no magno problema do Ensino, pareceu-me oportuno lembrar Être et avoir (Ser e Ter) um filme realizado por Nicholas Philibert em 2002 e interpretado por George López. Vi-o em DVD, não me recordo, mas penso que não foi exibido comercialmente. Conta a história de um ano lectivo numa pequena escola de aldeia, em França. Um jovem professor candidata-se ao lugar e é aceite. O seu objectivo é ensinar, mas um problema se lhe depara – tem de ministrar o ensino numa sala onde há crianças de várias idades (entre os quatro e os onze anos), graus de conhecimento e de educação diferentes, etnias também distintas, pois há filhos de emigrantes.

 

A maneira engenhosa, metódica, profissional, como resolve o problema (os problemas), constitui uma lição magnífica sobre a arte de ensinar. Há outros filmes como, por exemplo, o «Clube dos Poetas Mortos» que nos chamam a atenção para essa dimensão de qualquer espécie – transmitir os conhecimentos adquiridos ás crias. Generosidade é um conceito humano. Deveria ter dito antes, o sentido da sobrevivência. Só sobrevivem as espécies que transmitem o saber acumulado às novas gerações. Nesta medida o que está em perigo não é a sobrevivência do homo sapiens, é a sua transformação em homo ignarus ou em homo nescius.

 

No filme de Nicholas Philibert,  narra-se de forma exemplar a forma como este professor programava as aulas e as preparava, sempre sem esquecer as capacidades de cada um dos alunos, fixando objectivos, prazos. É  evidente que tem consciência de que os mais velhos o deixarão no Verão para acederem ao segundo ciclo, ao liceu.

 

Sabendo que o acompanhamento aos seus alunos estava limitado no tempo, o professor conversava com cada um deles, ajudava-os a vencer a angústia de enfrentar o grupo nas idas ao quadro e as risadas que cada erro despertava nos que sabiam, com os mais pequenos fazendo eco. O pânico de enfrentar multidões, de falar em público, acompanha-nos muitas vezes até à idade adulta.

 

Naturalmente que este professor dispunha de autoridade, não enfrentava um grupo disposto a incinerá-lo. Esta sociedade de grandes superfícies, sexo e violência, transpira ódio à cultura. É uma atitude da imbecilidade perante a inteligência, um confronto em que a estupidez procura vencer o saber, tornando-o ridículo e risível. É um sentimento que passa de pais para filhos. O professor enfrenta pequenos energúmenos arrogantes, crianças que podiam ser normais, mas que a falta de educação em casa, substituída pela função deletéria da televisão, transforma em aberrações.

 

Em «O Clube dos Poetas Mortos», outro exemplo de como ensinar, o professor John Keating, ensaia a sua pedagogia pouco ortodoxa perante um grupo de alunos com características pessoais diferentes, mas não existem exemplares como os que o professores actualmente enfrentam. A exortação do verso de Horácio, carpe diem quam minimum credula postero (Colhe o instante, sem confiar no amanhã), teria nas colmeias suburbanas, uma leitura diferente e de efeitos imprevisíveis, pois os conceitos de fruição são completamente diferentes.

 

Ter ou não ser. Se não tens um carro topo de gama não és ninguém.

 

 

 

 

publicado por Carlos Loures às 12:00
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Sábado, 5 de Fevereiro de 2011

Sabe qual é a diferença entre economia e finanças?

Tem algum tempo mas vale a pena voltar a contar para que se perceba o que está a acontecer com as finanças e com a economia dos países e como se ganha dinheiro sem produzir riqueza.

 

Um vendedor chegou a um pequeno hotel de uma cidadezinha no interior e pagou, adiantado, 100 euros por uma dormida. O dono do hotel correu ao talho e pagou os mesmos 100 euros que devia por fornecimento da carne ao hotel. O talhante foi pagar ao produtor e criador dos animais os mesmos 100 euros que, por sua vez, foi pagar ao dono do hotel uma dívida de uma dormida de um seu fornecedor. No fim do dia o vendedor pediu os 100 euros que tinha pago adiantadamente, por não poder permanecer na cidade essa noite.

 

Sem produzir rigorosamente nada, o vendedor chegou a uma cidade endividada e partiu deixando para trás uma cidadezinha sem dívidas.

 

Isto pode acontecer "n" vezes até que quem produz riqueza deixe de poder financiar a sua produção de riqueza. Nessa altura, deixa de haver carne, não chegam vendedores ao pequeno hotel, e todos devem a todos. As pessoas perdem os empregos, deixam de poder consumir carne e de dormir no hotel, o hotel fecha e o talhante pede dinheiro ao banco para importar de uma cidade distante a carne que ninguém lhe compra. A seguir deixa de poder pagar ao banco que se apressa a vender os seus bens em leilão a, alguem, que vai esperar pela próxima "bolha"  para ganhar muito dinheiro, ele também sem acrescentar nada aos bens que comprou na "baixa" para vender na "alta".

 

A grande cidade vendo-se cercada por cada vez mais cidadezinhas endividadas, começa a distribuir dinheiro que adquiriu a taxas muito elevadas e que "rapam" o lucro de quem produz, assim aumentando os preços dos produtos que os desempregados têm que comprar para sobreviver. Começa a importação dos produtos que os consumidores compram  muito baratos e que vêm de uma cidade longínqua e onde os consumidores (muito pobres) não têm poder para consumir mas que produzem muito ganhando muito pouco.

 

Nesta altura temos consumidores pobres a comprar a trabalhadores muito pobres e que vão aceitar trabalhar em condições cada vez mais dificeis e a receber dada vez menos pelo seu trabalho.

 

É, isto, que está a acontecer na chantagem da direcção da FIAT que o prof Júlio Marques Mota aqui nos tem trazido com os seus magnificos textos. O dinheiro passou a ganhar-se na movimentação financeira que nada produz (embora seja uma das condições a reunir para produzir) e não na economia onde na realidade se acrescentam mais valias aos bens e serviços. Este circuito infernal explica,( são a gota de água) as recentes movimentações de revolta nos países árabes( a troca de alimentos por petróleo é a solução, apressam-se a gritar os "fariseus"). E o Chile de Pinochet e o seu "milagre" económico (à custa de prisões e assassínios em massa), e o Portugal de Salazar ( cheio de gente pobre  mas com os cofres cheios de ouro), e toda a miséria que perdura por esse mundo . O neoliberalismo só é possível com o conluio dos estados ditos democráticos ( e, alguns  ditos socialistas) ou em ditaduras. Ninguém aceita viver eternamente sem futuro e sem esperança!

 

Mas é preciso produzir antes de distribuir! (verdade de La Palice mas que é o principio da política económica mais vezes desprezado)

publicado por Luis Moreira às 13:00
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Domingo, 16 de Janeiro de 2011

Gamasutra - a infinita arte do gamanço - de Mia Couto

Luis Moreira

 

 

A miséria é, infelizmente, fértil nesse paradoxo: em vez de produzirmos riqueza, produzimos ricos. Antes fossem ricos. Porque são apenas endinheirados. E endinheirados que não produzem.

 

O Kamasutra não seria a prenda mais apropriada para a presente quadra. Nem sequer seria oferta original. Se é para dar um presente que seja algo que fale do gosto de nos darmos, da identidade de quem dá. Por isso, este Natal vou dar um livro que traduza a nossa originalidade e que, sendo publicação recente, cedo rivalizará com o célebre livro sobre os prazeres do amor.

A longa lista de tentadoras posições sexuais do Kamasutra cedo ficará esquecida perante o rasgão criativo desta outra obra. Falo, é claro, do “Gamasutra, a infinita arte do gamanço”. Um manual ilustrado sobre a roubalheira como modo de viver. Começo deste modo, fazendo paródia junto à fronteira do solene e do sagrado. Não o faço gratuitamente. Tenho uma intenção.

 

Entenderão ao lerem, se assim tiverem paciência. O melhor do Natal é a festa, a família, a sugestão de um mundo solidário. O tempo do verbo terá que ser, no entanto, alterado: o melhor do Natal já foi o Natal. Porque uma descarada subversão do espírito natalício foi convertendo em mercadoria e comércio aquilo que parecia ser generosidade pura e simples: darmo-nos nós, como somos, e tornarmo-nos mais próximos dos outros. Se ressuscitasse hoje, Cristo não teria que abordar apenas os vendilhões de um templo. O mundo inteiro é um bazar onde tudo se compra e se vende. Incluindo o chamado espírito natalício.

Rectifico o início desta crónica: o melhor do Natal é o espírito do Natal. Esse espírito não resiste à manipulação oportunista que a imagem de um simpático mas estafado Pai Natal, vestido com as cores da Coca Cola, apenas confirma a lógica de lucro a que nem os mitos escaparam. Um dos piores tormentos dos novos tempos de Natal são as mensagens feitas a metro. Por via de email, de telefone celular, as mensagenzinhas entopem as caixas de correio e obrigam-nos a um exercício penoso de as apagar às dúzias. Corro o risco de ser ingrato.

 

 

 

publicado por Luis Moreira às 22:00
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