Este é um texto sobre o processo eleitoral, o que se deseja que dele resulte para o país, e como se vê o futuro de todos.
Estamos a três dias das eleições legislativas. Os portugueses estão profundamente traumatizados com a situação em que o país se encontra. Vão votar sob o peso de pesados condicionalismos, nomeadamente os derivados da situação económica e financeira, que lhes são apresentados como sendo sem saída, obrigando-os a pagar pesados encargos a entidades supranacionais, em relação às quais não dispõem de qualquer poder, nem sequer o das eleger numas quaisquer eleições.
Para a generalidade dos portugueses, habituados secularmente à submissão ao rei, à igreja, aos ricos e poderosos, a situação parece sem dúvida sem saída. O que há á fazer é escolher quem vai negociar com essas entidades, de preferência alguém que esteja bem visto por elas. Pode ser que assim se consiga alguma indulgência. Mais uns fundos, mais uns empréstimos. Ir ao fundo das questões nunca, porque quem está acima pode sentir-se melindrado e ameaçar com mais medidas restritivas.
Não estou a dramatizar ou a querer chocar quem tiver a paciência de me ler. Perdoar-me-ão, mas este é o estado de espírito de muitos portugueses. Há os que entram em fuga psicológica e não vão votar, nem querem ouvir falar das eleições. Não os condeno. Simplesmente penso que a sua atitude é de quem está farto desta tragicomédia, desistiu, e deixa andar o destino. Entretanto, há outros, sem dúvida o maior contingente, que vai votar para escolher o mais sedutor, o que melhor consegue assumir o ar de bem comportado, mais convincente, para levar a Merkel, o Trichet, o Sarkozy, o FMI, etc. Obviamente que não vão escolher ninguém que defenda que tem de se bater o pé a quem nos quer subjugar, ou que diga que a subida que a subida das taxas de juro não se deve assim tanto aos nossos pecados, mas muito mais à ganância de alguns senhores.
A verdade é que no domingo o grosso do pessoal vai votar nos bem comportados, e que Portugal vai estar cada vez mais mergulhado numa depressão profunda.
Pouco interessa que vá para lá o Sócrates (sem dúvida um tipo muito mau) ou o Passos Coelho (não deve ser melhor) e que o Paulo Portas esteja no governo pela certa. O problema é que os portugueses (perdoem a imagem tauromáquica) não aceitam que têm de agarrar o destino pelos cornos, e torcê-lo bem torcido. Que não é matando-se a trabalhar ou deixando-se morrer de fome que vão conseguir endireitar o país. Nem emigrando em massa (ia a dizer fugindo em massa).
É claro que tem de se produzir mais e melhor. Mas para se conseguir esse grande objectivo é preciso antes do mais romper com a santa aliança que controla a vida económica do país, formada pela banca, pelos grupos económicos, com relevo entre estes, durante os últimos cinquenta anos, pelos empresários ligados á construção civil e pela massa trabalhadora, com salários baixos, mas a quem foi concedido o “privilégio” (entre aspas, mas que aspas) do crédito barato e acessível. Os frutos dessa santa aliança estão à vista. Em 1969 estimava-se que em Portugal seria preciso construir quinhentos mil fogos. Hoje em dia fala-se em centenas de milhar acabados e prontos para a venda, mas que não encontram comprador. A taxa de natalidade caiu abruptamente, e a população envelhece a olhos vistos. A emigração voltou a aumentar. Importa-se 80 % do que se consome.
Os grupos económicos, muito centrados na construção civil e afins, procuram agora virar-se para a saúde, a educação e a área social (veja-se o caso dos lares, residências, apoio domiciliário, e outras valências destinadas aos idosos. Claro que aos idosos que podem pagar). No que respeita à indústria e à agricultura, só se interessam pelos produtos que se destinam à exportação. Estas exportações estão sempre afectados pelo valor alto do euro, em relação ao dólar, ao iene, yuan, e outras moedas. Este valor alto dificulta as exportações, e favorece as importações, contribuindo de certo modo para desencorajar a nossa indústria. A este respeito, veja-se o caso dos produtos chineses.
Sobre estes assuntos o programa da troika nada diz. O que só demonstra que não vai resolver os nossos problemas. Vai contribuir para um endividamento ainda maior, e agravar a dependência ao exterior. É óbvio que não estamos em tempo de autarcia, e que a abertura ao exterior não é, em si, necessariamente, um mal.
Mas há que produzir mais e melhor, não só para exportar, mas também para fazer face, numa escala muito maior, ás nossas necessidades. O problema do crédito exigiria um grande reforço da Caixa Geral de Depósitos, que nunca poderia ser privatizada, ao contrário do que, insensatamente, preconiza Passos Coelho (nem Ricardo Salgado apoia tal disparate).
Não vou propor que votem neste ou naquele partido. Mas a realidade é esta. Sair da Europa, ou mesmo só do euro, nesta altura, parece muito difícil. Mas as directrizes que visam sobretudo defender os bancos e os mercados financeiros têm de ser contrariadas.
Sejam pela clareza e pela frontalidade. Votem bem. Um abraço.
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