Sábado, 2 de Julho de 2011

Assumirá Largarde a direcção do FMI? A propósito de Lagarde, dois pontos de vista, o de Krugman e o da Attac. Opiniões coligidas por Júlio Marques Mota

 

  1. O ponto de vista de Krugman

 

O Mistério de Lagarde


OK, então é Christine Lagarde que vai para o FMI. Desejo-lhe boa sorte. E gostava  que tivéssemos alguma ideia quanto à qualidade do  trabalho que ela vai fazer, quanto à linha de orientação que ao FMI vai dar.

Não é que ela ela seja particularmente  enigmática: além  de ser  inteligente, é  séria, responsável e criteriosa, sob todos os pontos de vista. Mas, é  claro,  isso  é  exactamente o que me preocupa.

Porque   estamos hoje a viver numa época  em que, por enquanto, aquilo a  que dantes chamávamos  convencionalmente   loucura chama-se agora prudência e ao que  dantes chamávamos prudência chama-se  agora loucura. As coisas que as Pessoas Muito Sérias, as de hoje,  querem    fazer – reduzir imediatamente os défices, "normalizar" as taxas de juros,  preocuparem-se  com a inflação -- são exatamente o tipo de coisas que poderão transformar a crise de 2008 - até (? ) em décadas de estagnação.

Com a orientação de  Strauss-Kahn, o FMI estava a caminhar  para uma posição  menos dogmática, com uma mentalidade mais aberta do que as principais organizações Internacionais. Isso também não quer dizer  muito, mas foi muito melhor do que fizeram os loucos economistas que  assumiram como  o poder  na OCDE ou no Banco Internacional de Pagamentos. .

Portanto, a questão é: será que o FMI vai tornar-se mais sensível sob a direcção de Lagarde? Para  bem da economia mundial, não acreditamos que tal venha a acontecer.

 

 


As pessoas  mudam mas não  o FMI

 

           2. Um texto de Attac


Christine Lagarde acaba de ser eleita  directora-geral  do Fundo Monetário Internacional (FMI) em substituição de Dominique  Strauss-Kahn. No momento  em que o Parlamento grego vota um novo plano de austeridade injusto e inútil sob a pressão da União Europeia e do FMI, esta decisão leva a que se evite todo e qualquer debate  sobre uma reorientação radical do Fundo. Mas a actualidade judicial francesa (processo Tapie) ou o agravamento previsível da crise financeira poderão  muito bem voltar a colocar este debate na ordem  do dia e dentro dos próximos meses.  É por esta razão  que Attac mantém a candidatura da sua  co-presidente Aurélie  Trouvé para  a  direcção do FMI e compromete-se desde já a desencadear  diligências para que venha a aparecer  uma candidatura altermundista  que venha  do Sul do planeta..

 

É a quinta vez que este posto, tradicionalmente reservado a um Estado europeu, cabe à França, e não tem nenhuma razão para com isso se congratular  conveniente infelizmente congratular-se. Desde os anos 80, a política do FMI continua a ser a  mesma, qualquer que tenha sido  o seu  Director-Geral. Assim, é sob a direcção de Jacques de Larosière (1978-1987), depois sob a direcção de  Michel Camdessus (1987-2000) que foram elaborados os planos de ajustamento estrutural que têm conduzido à ruína tantos  países da América Latina, da África ou da Ásia,  e de tal modo foi assim que  a maior parte dos países emergentes ou em desenvolvimento recusaram  recorrer ao  FMI ou ao Banco Mundial (foi  de resto o que acabou  de fazer muito recentemente o Egipto).

 

As coisas iriam  mudar  com DSK? Era necessário ser bem ingénuo  para acreditar nisso. Com excepção de uma ligeira maquilhagem , o funcionamento da instituição continuou a ser o mesmo: continua a ser “um dólar = uma voz”, de modo que os Estados Unidos, com mais de 17% das votos , dispõem de um direito de veto que lhes permite controlar o FMI, onde os grandes países da União Europeia desempenham também um papel essencial. Há contudo  uma coisa que mudou : com a crise financeira, que o FMI foi de resto incapaz de ser capaz de prever , são agora os países europeus que são obrigados a aplicar  planos de austeridade tão  draconianos como os precedentes impostos aos países em desenvolvimento. A Hungria, Ucrânia, a Letónia, a Irlanda, a Grécia, Portugal são as mais recentes vítimas de programas de uma rara violência social. Com Christine Lagarde, pelo menos, não haverá mais  a mínima ambiguidade: esta advogada de negócios é ultraliberal  e não o esconde. Mas não vamos também acreditar que o seu concorrente ao lugar de Director-Geral, o Mexicano Agustín Carstens, teria sido uma melhor escolha. Este  que se quer  assumir como  o representante dos países emergentes é sobretudo um economista procedente da escola de Chicago, tão neoliberal  como Christine Lagarde. É por isso que uma candidatura alternativa é necessária para defender  a ideia de que uma reforma radical do FMI, que deve deixar de  privilegiar a defesa dos credores e dos bancos e deve  existir  e virar-se para  a ONU e tendo , com regra essencial “um país = uma voto”. E é com esta  condição que o FMI poderá talvez encontrar a credibilidade que hoje não tem aos olhos  dos povos.

 

Attac France, Les têtes changent, le FMI ne change pas,
Paris, 29 de Junho de 2011

 

 

publicado por João Machado às 17:00
link | favorito
Domingo, 12 de Junho de 2011

Quando a austeridade falha - por Paul Krugman - Prémio Nobel da Economia

Quando a austeridade falha

por Paul Krugman, Publicado em 25 de Maio de 2011

 

Prémio Nobel da Economia

 

Tornou-se evidente que a Grécia, a Irlanda e Portugal não serão capazes de pagar as suas dívidas na totalidade


Queixo-me muitas vezes, justificadamente, do estado actual da discussão económica nos EUA. A irresponsabilidade de certos políticos - por exemplo dos republicanos que defendem que o incumprimento no pagamento da dívida pública americana não seria tão grave como isso - é assustadora.

Mas pelo menos nos Estados Unidos os que defendem que aumentar as taxas de juros e cortar na despesa, apesar do nível altíssimo de desemprego, vai melhorar as coisas enfrentam a oposição da Reserva Federal e da administração Obama.

Na Europa, pelo contrário, são eles que mandam há mais de um ano, insistindo que a estabilidade da moeda e o equilíbrio orçamental são a resposta a todos os problemas. Por trás desta insistência estão algumas fantasias económicas, em particular a da fada da confiança - isto é, a convicção de que cortar na despesa vai de facto criar emprego, porque a austeridade vai criar confiança no sector privado.

Infelizmente, a fada da confiança está a fazer-se rogada e a discussão em torno da melhor maneira de lidar com esta realidade desagradável ameaça tornar a Europa o centro de uma nova crise financeira.

Depois da criação do euro, em 1999, verificou-se em vários países europeus anteriormente considerados de risco, e que enfrentavam por isso limites ao endividamento, enormes fluxos de entrada de capital. Afinal, pareciam pensar os investidores, se a Grécia, Portugal, a Irlanda e Espanha faziam parte de uma união monetária europeia, o que é que poderia correr mal?

A resposta a esta pergunta tornou-se, como é evidente, dolorosamente óbvia. O governo da Grécia, vendo-se em posição de pedir dinheiro emprestado a um custo apenas ligeiramente superior ao que a Alemanha tinha de pagar, endividou-se demasiado. Os governos da Irlanda e da Espanha não o fizeram (Portugal fica no meio), mas os seus bancos sim, e quando a bolha rebentou os contribuintes viram--se encurralados pelas dívidas dos bancos. O problema foi agravado pelo facto de o boom de 1999-2007 ter feito subir os preços e os custos nos países endividados a um nível muito superior ao dos dos seus vizinhos.

Que fazer? Os líderes europeus ofereceram empréstimos de emergência aos países em crise, mas apenas em troca de compromissos com programas de austeridade selvagens, feitos sobretudo de cortes da despesa. A objecção de que estes programas põem em causa os seus próprios objectivos - não só impõem efeitos negativos drásticos à economia, mas ao agravar a recessão reduzem a receita fiscal -, foi ignorada. A austeridade acabaria por estimular a economia, dizia-se, porque aumentaria a confiança.

Ninguém adoptou a ideia da austeridade como estímulo da economia com mais convicção que Jean-Claude Trichet, o presidente do Banco Central Europeu (BCE). Sob a sua liderança, o banco pregou o rigor financeiro como elixir universal a aplicar de imediato em toda a parte, incluindo em países como o Reino Unido e os Estados Unidos, onde o desemprego continua alto e que não estão a sofrer a pressão dos mercados financeiros.

No entanto, como já disse, a fada da confiança até agora ainda não apareceu. A crise económica nos países europeus com problemas de endividamento agravou-se, como seria de esperar, e a confiança, em vez de aumentar, está em queda livre. Tornou-se evidente que a Grécia, a Irlanda e Portugal não serão capazes de pagar as suas dívidas na totalidade, embora Espanha talvez se aguente.

Se quiser ser realista, a Europa tem de se preparar para aceitar uma redução da dívida, o que poderá ser feito através da ajuda das economias mais fortes e de perdões parciais impostos aos credores privados, que terão de se contentar com receber menos em troca de receber alguma coisa. Só que realismo é coisa que não parece abundar.

Por um lado, a Alemanha adoptou uma atitude dura em relação a qualquer ajuda aos vizinhos em dificuldades - isto apesar de uma das principais motivações do actual programa de resgates ser proteger os bancos alemães de perdas.

Por outro lado, o Banco Central Europeu está a comportar-se como se estivesse determinado a provocar uma crise financeira. Para começar, está a subir as taxas de juros, apesar do estado terrível de muitas economias europeias. Além disso, os responsáveis do BCE têm-se pronunciado contra a ideia de qualquer reestruturação da dívida - na realidade, a semana passada um dos membros do conselho de governadores sugeriu que mesmo uma restruturação pouco ambiciosa da dívida grega bastaria para o BCE deixar de aceitar os títulos da dívida grega como garantia em empréstimos aos bancos do país. Isto é equivalente a declarar que se os gregos pedirem qualquer reestruturação o BCE retira o apoio ao sistema bancário grego, completamente dependente dos seus empréstimos.

Se os bancos gregos caírem, a Grécia pode ser forçada a sair do euro - e é fácil ver como isto pode ser a primeira peça de um dominó que se estende a grande parte da Europa. Então que estará o BCE a pensar?

Estou convencido que isto é apenas falta de coragem para enfrentar o fracasso de uma fantasia. Parece-lhe tolo? Quem é que lhe disse que era o bom senso que governava o mundo?

Jornal i/The New York Times

 

WebRep

 

http://www.nytimes.com/2011/05/23/opinion/23krugman.html

 

publicado por Luis Moreira às 23:50
link | favorito
Quinta-feira, 1 de Julho de 2010

A terceira depressão - Paul Krugman (saído no New York Times no dia 28 de Junho)


O Paul Krugman foi Prémio Nobel da Economia em 2008. É americano e nasceu em 1953. É professor na Universidade de Princeton. Ensina Economia e Assuntos Internacionais. Descreve-se a ele próprio como um liberal (à maneira americana, com o significado de tolerante, progressista, de ideias abertas). Geralmente classificado como de centro-esquerda, concorda a economia de mercado e a globalização. É portanto um tipo com ideias moderadas (como se costuma dizer). Há imensa coisa sobre ele na internet. Tem uma obra enorme e é colunista no New York Times e escreve para muitas publicações. Pessoalmente penso que a depressão actual é muito profunda, e que se não sairmos rapidamente, a bem ou a mal, do sistema capitalista, vamos sofrer um grave retrocesso civilizacional. Por isso proponho que incluamos este artigo no nosso blogue Estrolabio. (João Machado)


As recessões são comuns, mas as depressões são raras. Tanto quanto eu conheço, apenas dois períodos da história económica foram na altura comummente descritos como "depressões": os anos de deflação e instabilidade após o Pânico de 1873 e os anos de desemprego em massa que seguiram a crise financeira de 1929 a 1931.

Nem a Longa Depressão do século XIX nem a Grande Depressão do século XX foram períodos de declínio ininterrupto - pelo contrário, ambas incluíram fases de crescimento económico. Mas estes momentos de melhoria nunca foram suficientes para anular os prejuízos causados pela quebra inicial, e foram seguidos por recaídas.

Receio que estejamos nos primeiros estágios de uma terceira depressão. A probabilidade é que ela seja mais parecida com a Longa Depressão do que com a Grande Depressão, que foi muito mais severa. Mas o custo – para a economia mundial e, acima de tudo, para os milhões de vidas arruinadas pela falta de empregos – será, ainda assim, imenso.


E essa terceira depressão será em primeiro lugar o resultado de um fracasso das políticas económicas. Por todo o mundo – como no fim de semana passado na desanimadora reunião do G – 20 – os governos estão obcecados com a inflação quando o perigo real vem da deflação, e pregam a necessidade de apertar o cinto quando o verdadeiro problema está nos gastos inadequados.

Em 2008 e 2009 parecia que tínhamos aprendido com a história. Ao contrário dos seus predecessores, que aumentaram as taxas de juros face à crise financeira, os líderes actuais da Reserva Federal e do Banco Central Europeu cortaram os juros e apoiaram os mercados de crédito. Ao contrário dos governos do passado, que tentaram equilibrar os orçamentos face à economia em declínio, os governos de hoje permitiram que os défices aumentassem. E melhores políticas ajudaram o mundo a evitar o colapso total: a recessão provocada pela crise financeira terá talvez terminado no Verão passado.

Mas os futuros historiadores vão dizer-nos que a terceira depressão não acabou aqui, tal como a melhoria económica em 1933 não foi o fim da Grande Depressão. Afinal de contas, o desemprego – especialmente o desemprego de longo prazo – mantém-se em níveis que seriam considerados catastróficos há pouco tempo, e não parece estar a diminuir. E tanto os Estados Unidos como a Europa estão prestes a cair na armadilha deflacionária tal como já aconteceu ao Japão.

Perante perspectivas tão sombrias, esperávamos que os responsáveis políticos se dessem conta de que ainda não fizeram o suficiente para promover a recuperação. Mas não: nos últimos meses, observou-se um assombroso regresso da ortodoxia em relação a restrições monetárias e orçamentos equilibrados.

No que diz respeito à retórica, o ressurgimento da velha religião é mais evidente na Europa, cujos responsáveis parecem basear as suas declarações na colectânea de discursos de Herbert Hoover(1) para compor as suas afirmações, chegando a declarar que impostos mais altos e cortes nos gastos irão de facto fazer expandir a economia, fazendo aumentar a confiança dos empresários. Na prática, no entanto, os Estados Unidos não estão muito melhor. A Reserva Federal parece ter consciência dos riscos da deflação – mas nada se propõe a fazer para contrariá-los. A administração Obama sabe dos perigos de uma austeridade fiscal prematura – mas, como os republicanos e democratas conservadores se negam a autorizar um auxílio maior aos governos dos estados, essa austeridade é inevitável, sob a forma de cortes nos orçamentos estaduais e municipais.

Porquê esta viragem política errada? Os defensores da linha dura referem muitas vezes os problemas da Grécia e de outros países europeus periféricos para justificar as suas acções. E é verdade que os investidores viraram-se contra os governos com défices incontroláveis. Mas não há provas de que a austeridade fiscal de curto prazo, face a uma economia em depressão, os tranquilize. Pelo contrário: a Grécia optou pela austeridade severa e teve como resultado um aumento ainda maior das classificações de risco; a Irlanda impôs cortes ferozes nos gastos públicos e viu-se a ser tratada pelos mercados como se oferecesse um risco maior do que a Espanha, que tem sido bem mais relutante a aceitar os remédios dos defensores da linha dura.

É quase como se os mercados financeiros conseguissem entender o que os responsáveis políticos não conseguem: que enquanto a responsabilidade fiscal de longo prazo é importante, o corte de gastos no meio de uma depressão agrava ainda mais essa depressão e abre o caminho à deflação, e é na realidade uma estratégia contraproducente.

Por isso não acho que a questão seja realmente a Grécia, ou mesmo qualquer apreciação realista da relação entre o défice e o nível do emprego. O que enfrentamos é a vitória de uma ortodoxia que tem pouco a ver com uma análise racional, e cujo credo principal é que impor sofrimento às outras pessoas é a maneira de mostrar quem manda em tempos difíceis.

E quem pagará o preço pelo triunfo da ortodoxia? A resposta é dezenas de milhões de trabalhadores desempregados, muitos dos quais ficarão sem trabalho durante anos, e alguns dos quais nunca mais voltarão a trabalhar.

Tradução revista por João Machado

__________________________

(1) - Herbert Clark Hoover (1874 – 1964). Foi Presidente dos EUA de 1928 a 1932. Republicano, defendeu políticas económicas ortodoxas. Durante o seu mandato ocorreu a Grande Depressão. Em 1932 candidatou-se à reeleição e perdeu contra Franklin Delano Roosevelt.
publicado por Carlos Loures às 17:15
link | favorito

.Páginas

Página inicial
Editorial

.Carta aberta de Júlio Marques Mota aos líderes parlamentares

Carta aberta

.Dia de Lisboa - 24 horas inteiramente dedicadas à cidade de Lisboa

Dia de Lisboa

.Contacte-nos

estrolabio(at)gmail.com

.últ. comentários

Transcrevi este artigo n'A Viagem dos Argonautas, ...
Sou natural duma aldeia muito perto de sta Maria d...
tudo treta...nem cristovao,nem europeu nenhum desc...
Boa tarde Marcos CruzQuantos números foram editado...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Eles são um conjunto sofisticado e irrestrito de h...
Esse grupo de gurus cibernéticos ajudou minha famí...

.Livros


sugestão: revista arqa #84/85

.arquivos

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

.links