Sábado, 17 de Julho de 2010
Carlos Leça da Veiga
Utopia que seja; quem quererá partilhá-la? (Continuação)Será utopia querer modificar o mundo em que nos tem sido dado viver?
Como tentar fazê-lo?
A Democracia, e só a Democracia, tem obrigação e tem possibilidades de poder consegui-lo.
No nosso País, a República, tal como é determinado pelo seu ordenamento constitucional, não parece ser capaz de encontrar a resposta mais favorável, aquela que nos dias de hoje, é imperioso exigir-se. Uma outra República haverá de sê-lo. Experiência após experiência – a História a isso obrigará – algum resultado deverá conseguir-se, pese embora, admitir a possibilidade de conseguir atingir-se uma qualquer perfeição seja, pelo certo, um procedimento muito insensato. Utopia não é um sinónimo de insensatez. Um lugar procurado pode, jamais, conseguir encontrar-se.
Procure-se inventar uma República fundamentada numa Constituição Política que, como disse de Fernando Pessoa, saiba “ter saudades do futuro”; que, como desejado por Teilhard de Chardin, não inquine a perspectiva de “crescermos para cima e para dentro”; que, como ensina Jonathan Wolff saiba “determinar a distribuição adequada de poder político” e que, como prescreve Rabindranath Tagore, leve muito em conta que, “se fechas a porta a todos os erros, deixarás de fora a verdade”. Bastar-lhe-á que seja uma Democracia com uma Constituição desejável e exequível aberta, o mais possível à verdade, à participação de todos e que, por igual, seja a Democracia do ser, a do ter e a do saber.
É preciso defender-se um novo projecto de organização política do todo nacional – um projecto constitucional alternativo – que elimine os erros e as insuficiências da ordem constitucional vigente que, todos eles, de há muito estão a fazer sentir-se e permitem, como está a acontecer, uma gestão política demagógica, autoritária e danosa desenvolvida ao sabor das conveniências mais inconfessáveis tanto dos possidentes como dos seus fâmulos que, mais outra desonestidade, para conseguirem salvaguardá-la, tudo fazem para mostrá-la bem condimentada pela influência poderosa dum dirigismo internacional tentacular, estribado numa orientação político-económica neo-liberal e nitidamente imperialista. A experiência tem demonstrado que este modo da actuação política e económica é lesiva das boas práticas democráticas o que, entre nós, por exacto e por calamidade, está num curso ininterrupto. Os desmandos das desonestidades vindas a público, em termos de grandeza, superam, de longe, aqueles outros, muito pobres, dos indicadores favoráveis ao desenvolvimento.
Que razões haverá para que, mais uma vez na História portuguesa, continue a existir, à sombra da própria Constituição Política, uma tão grande subserviência aos ditames do exterior cujos, de facto, são as determinantes maiores do retrocesso político, económico, cultural e social da população portuguesa.
Que razão haverá, para não procurar-se uma solução nacional elaborada conforme a nossa própria História, de sobremaneira, a mais recente do pós-25 de Abril.
É fundamental, agir-se na conformidade estrita dos interesses políticos, sociais, culturais, económicos e ecológicos da maioria da população portuguesa que, por múltiplas razões, as geoestratégicas, como bom exemplo, não têm de ser, como não são e como não podem ser, por necessário, as mesmas doutros estados europeus com passados e presentes doutra conformidade evolutiva. O caso português deverá ser devorado pelas perspectivas estratégicas, retintamente expansionistas, duma Europa continental?
Portugal é um estado europeu marítimo logo com perspectivas geoestratégicas diferentes das dos estados continentais europeus que, alguns deles, por aberração, insistem, como outrora, em querer comandar os destinos do nosso continente, neles incluídos aqueles que são muito próprios dos portugueses. Neste sentido, o IV Reich, na sua versão de União Europeia, dá passos avassaladores contudo, por ora, contenta-se e basta-se com o disfarce suficiente para que, por alarde dito democrático e por via pacífica, vir a conseguir alcançar os seus propósitos dominadores. As proporções duma crise económica em crescimento acelerado permitem adivinhar que, com o decorrer do tempo, elas mesmas acabarão como bastantes para fazerem estalar o verniz que encobre a encenação do entendimento político franco-germânico. Não virá longe o dia em que entre estes comparsas estalará uma controvérsia muito séria da qual, mais uma vez na História, todos quantos têm aceite o manto da subserviência política, haverão de ser as vítimas privilegiadas.
Outrora, em 1580, a prata de Castela entrava em Portugal no dorso das mulas de Cristóvão de Moura e, sessenta anos após, o retrocesso patrimonial nacional era uma realidade desastrosa, inegável e irrecuperável. Agora as mulas que por cá entram são montadas pelos negociadores governamentais e parlamentares que, em Bruxelas, recebem como dádivas os subsídios europeus e, como é patente, desta vez, os resultados práticos, em bem menos anos de dominação, reconheça-se, não são muito diferentes.
É fundamental, é estratégico, acima de tudo, contra tudo e custe o que custar, privilegiar-se uma transformação eminentemente política, como seja, a da defesa duma nova Constituição que, substancialmente, elimine os erros e as deficiências da actual, entronize a participação efectiva da população e, por igual, expresse ao máximo e com toda a intransigência a defesa da Independência Nacional e o respeito pela Soberania Nacional.
Quem quererá partilhar esta utopia?
Será, de facto, uma utopia?
Depois de oito séculos de História será desejável passarmos a ser, apenas, mais uma região federada num estado europeu coisa que, é bom lembrar, nunca foi reclamada por ninguém da arraia-miúda portuguesa?
Não bastará como exemplo indesejável, entre quantos há na Europa, o daquelas Nacionalidades sujeitas à opressão dos reinos castelhano, inglês, prussiano, piemontês, franco etc.?
A História de Portugal deverá deixar de ter a sua identidade própria para passar a ser a dum mero aspecto da História da Europa?
Os Descobrimentos portugueses deverão passar a ser os Descobrimentos europeus?
Domingo, 4 de Julho de 2010
Carlos Leça da VeigaCarlos Leça da VeigaQuem submete Portugal? (Continuação)A ligação à OTAN, para o estado português e, por necessário, para a sua população, não só acarreta custos políticos completamente inconvenientes como é, isso tem de insistir-se, um desrespeito grosseiro com o disposto na Constituição, cujo não cumprimento só pode considerar-se altamente desprimoroso para Portugal. Como se já tudo não bastasse, anos passados, a governação portuguesa, sem que os demais Órgãos da Soberania a contradissessem, ofereceu o exemplo desprestigiante de, sem tino nem sentido, decidir-se contra o pensamento político transportado pela Constituição e, como assim, apresentar-se a dar cobertura – colaborar – no inicio e na manutenção, reconhecidamente lamentáveis e reprováveis duma agressão militar, por parte dos EUAN/OTAN, a um estado soberano com quem Portugal nunca tinha anunciado qualquer diferendo, muito menos, pronunciado o mais pequeno desagrado, que este, muito razoavelmente, até poderia ter sido devido, a avaliar-se por uma indesejável ordem político-social interna. Para cúmulo, a governação portuguesa aceitou aprovar uma agressão militar feita sem qualquer razão que não fosse a dum mero expansionismo desencadeado sob pretexto falso, tudo tendo em vista conquistar uma exploração petrolífera pertença dum outro país e, sem mais nem menos, com despudor total, assenhorear-se dos respectivos lucros.
Para vergonha nacional demonstrou-se, mais uma vez, que a actual Constituição Política portuguesa está mal engendrada quanto à obrigatoriedade de ser cumprida e não mostra préstimos políticos designadamente sociais, económicos e culturais que sejam significativos para a maioria dos portugueses. O texto fundamental, tal como está feito, permite que a governação tenha a possibilidade de interpretar e contornar-lhe a letra para, conforme quiser, poder proceder e, assim – tem de lamentar-se – poder conseguir fazê-lo, com a mesma desfaçatez política – o autoritarismo – dos prosélitos salazaristas.
Se a dependência da OTAN não pode aceitar-se, aquela outra da UE, a prazos médio e longo, só trará dissabores políticos, económicos e sociais. Passada a euforia consequente à chegada dos subsídios europeus e dos inexplicados enriquecimentos daí derivados, passou-se àqueloutra da sujeição á falência, mais ou menos pronunciada, das economias centro-europeias que, por seu intermédio, arrastam a população portuguesa para um beco donde as governações por cá instaladas não têm ordem, muito menos mérito, para encontrar uma saída favorável.
A entrada para as Comunidades Económicas Europeias (CEE), para além duma intencionalidade maçónica, só pode entender-se como uma fuga para a frente dum soarismo politicamente perdido e sem capacidade para enfrentar, com coragem socialista, a situação política e económica nacional. Foi dada uma manifesta preferência aos subsídios europeus em vez de aceitar-se uma necessária reformulação da redistribuição do rendimento nacional cuja inevitabilidade, se já vinha de trás, depois da Descolonização, tornou-se numa circunstância imperiosa. Para não ferir interesses económicos gerados por anos de injustiça social preferiu manchar-se a Independência Nacional sob a desculpa, impossível de comprovar-se, que doutro modo não haveria uma sobrevivência com suficiente abastança económica antes sim, para amedrontar, ameaçava-se a população com o espectro dum terceiro-mundismo que, por fim, de facto, acabou por chegar e instalar-se – está á vista, é sentido – por via da tal adesão á Europa franco-germânica, a mesma que prometia um novo eldorado.
Sob o pretexto falacioso do bom entendimento internacional dos estados europeus (a maioria deles com Nacionalidades oprimidas) e duma necessidade fantasiosa de construir-se um estado europeu – uma pretensão velha dos expansionismos centroeuropeus – os portugueses viram-se transformados num povo ainda mais dependente do que quanto já era na época salazarista.
A União Europeia, uma evolução perigosa, indesejável e recusável da CEE, enquanto fosse uma mera confederação – jamais a federação que é – podia ter a sua legitimidade contudo, sempre, sob a exigência de que cada uma das suas múltiplas Nacionalidades – quantas oprimidas – ser reconhecida como um Estado soberano representado com autonomia total na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas.
Portugal, um Estado em que só há uma Nacionalidade, tem obrigação de defender activamente que todas as Nacionalidades devem seguir-lhe o exemplo de tal maneira os europeus passem a ter uma realidade política democrática com um respeito efectivo dos Direitos do Homem.
A União Europeia, como característica mais frisante, não passa doutra coisa mais que não seja um cóio do capitalismo expansionista europeu cuja existência está destinada a defender, representar e fomentar, de sobremaneira, os interesses dos seus estados centrais cujos, para conseguirem sobreviver como potências económico-políticas face aos EUAN e aos BRICAS (Brasil, Rússia, Índia, China e Africa do Sul) estão propostos a uma resistência sem tino, nem senso, nela envolvendo o compromisso duma multidão de pequenos estados europeus, por regra, em tudo, alheios à questão.
O tempo demonstrará que, na verdade, a chamada União Europeia não passa, senão, dum verdadeiro IV Reich dominado pelo consórcio de dois estados continentais do centro europeu que, ao contrário do anterior, de tão má memória, por agora, com astúcia bastante, permanece contente na imposição, com aparência pacifica – o Parlamento Europeu dá cobertura a tudo – da sua vontade omnipotente sobre os estados europeus desprovidos de potencial económico sensível e, grande vantagem, providos com dirigentes submissos. Os “Quislings”, como herança do nazismo, esses, sempre tem havido!
Sob o manto diáfano dos subsídios facilitados, os continentais centro-europeus garantem aos governantes – aos “Quislings” – dos estados economicamente mais débeis as possibilidades destes títeres assegurarem, anos a fio, o controlo eleitoral das governações dos seus estados e os concomitantes benefícios para os grupos sociais possidentes sem esquecer aqueles de ordem vária distribuídos, directa ou indirectamente, pelos os seus “rapazes” e pelos seus aparelhos partidários.
Nas condições consequentes às deliberações dos estados continentais centro-europeus que dirigem a União Europeia, o Povo Português tem sido arrastado para um declive económico que, como era esperado, não deixa de acentuar-se.
Sexta-feira, 2 de Julho de 2010
Carlos Leça da VeigaSó Portugal é que não podia ter colónias? (Continuação)Se Portugal, e muitíssimo bem, teve de deixar de ter colónias e, como assim, deu um contributo muito significativo para o desenvolvimento do pensamento e da acção em prol da Democracia, a justiça internacional que daí tem de decorrer – tal como Portugal tem de insistir em defendê-lo – não pode continuar a ignorar a circunstância, bem pelo inverso, tem de saber valorizá-la e apontá-la como uma atitude política eminentemente democrática que deve ser adoptada por quaisquer outros estados.
A manutenção das dominações exercidas sobre uma número considerável de Nacionalidades que, muitas delas, não desistem de querer afirmar-se, devem ter Portugal como um seu defensor estreme. Já não interessa procurar fazer vingar a injustiça um tanto belicista e despótica do Quinto Império antevisto pelo jesuíta António Vieira, nem, tão-pouco querer dar corpo à visão simpática, porque eminentemente cultural, mau grado reaccionária do outro Quinto Império que a intelectualidade de Fernando Pessoa adivinhava para o futuro de Portugal mas sim defender aquela visão que torna a Nação - Estado portuguesa como um farol activo das Libertações Nacionais e, como assim, do regresso a uma Europa das Nacionalidades, tudo feito sem ter de olhar, muito menos respeitar, supostos direitos históricos, fossem adquiridos ou colhidos mercê de actos de dominação política, conquista militar ou, sobretudo, pelas iniquidades dum suposto direito dinástico. Poder-se-á repor a esperança dum Quinto Império?
A Democracia – e a europeia com destaque – precisa de ser servida por um espírito e por uma acção de Libertação Nacional, uma tarefa cuja incumbência cabe ser dinamizada por Portugal, salvo querer-se que os cidadãos portugueses possam acusar as gerências nacionais de não verem – não quererem ver – o argueiro no olho alheio.
Só Portugal é que não podia ter colónias?
E os estados que as têm?
Quantos na Europa e na chamada União Europeia?
Para ser-se colonizado precisar-se-á de ter uma outra cor que não a branca?
Um basco, um andaluz, um galego, um sardo, um corso, um siciliano, um bávaro, um bretão, um alsaciano, um loreno, um galês, um irlandês, um escocês, um flamengo, um lapão, um tchetcheno etc., etc. não serão Homens e Mulheres colonizados? Que razão autêntica pode apresentar-se para impedi-los de possuírem a dignidade de eles próprios poderem estar representados, com autonomia completa, na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas?
Conseguir-se-á uma qualquer União Europeia na vigência dos seus actuais Estados?
A discriminação imposta pelos estados expansionistas que desde há muito exigem ter o direito de ocupação e dominação de várias Nacionalidades tem alguma legitimidade face aos valores supremos da Democracia?
Quem, em Portugal, não tem coragem para confrontar os estados europeus – esses, pelo menos – e colocar-se ao lado das suas inúmeras Nacionalidades que, com maior ou menor expressão, sabe-se, aspiram à sua Libertação?
Quem, em Portugal, é servil frente aos expansionismos europeus que dominam tantas Nacionalidades?
São os herdeiros dum pensamento estratégico timorato e acobardado, afinal, nada mais que uma inaceitável subserviência política das classes sociais dominantes deste Portugal e que prossegue, há séculos, desde que a governação nacional, depois de 1640, passou a viver, muito principalmente, à custa dos apoios externos.
Depois dos cinquenta anos da ditadura salazarista, o 25 de Abril devia e podia ter dado muito mais à população portuguesa. Teve que saber fazer-se uma descolonização que, sejam quais tenham sido as razões mais íntimas e as mais poderosas, com todo o acerto, não pecou – como todas as demais – por deixar restos de qualquer neocolonialismo porém, uma vez feita essa obra, face aos demais estados que continuam a colonizar – conhecem-se colonizações em todos os Continentes – não soube ter uma palavra no sentido de incentivá-los, senão mesmo de exigir-lhes, a terem de seguir o exemplo português.
Portugal, mercê da Descolonização – a consequência democrática internacional mais importante do 25 de Abril – passou a dispor dum capital de imensa legitimidade para apresentar-se ao mundo como defensor acérrimo de todos os povos oprimidos, a começar por quantos há no estado vizinho. Não será isso um vector importante da luta pela Democracia?
Se no plano da intervenção internacional, entre nós, ninguém soube – não pretendeu – tirar as consequências mais interessantes, mais lógicas, mais persuasivas e mais afirmativas para o Portugal posterior ao 25 de Abril, também, no plano interno os políticos que enxameiam a vida política nacional, na mira das vantagens estratégicas dos seus patrocinadores do exterior, só souberam – só pretenderam – arregimentar a população portuguesas ao sabor desses interesses alienígenas. Como é histórico – mais outra vez – todos esses interesses foram, tão-somente, aqueles exigidos pelos outros estados com hegemonia política.
Aos portugueses não compete ter contemplações, nem contemporizações para com as anexações territoriais operadas ao longo das suas histórias pela quase totalidade dos Estados europeus.
Só Portugal é que não podia ter colónias? É uma repetição obrigatória de continuar a fazer-se !
Sábado, 26 de Junho de 2010
Carlos Leça da VeigaO substrato mafioso do neoliberalismo económico Num discurso nacional começado a afirmar-se, com toda a razão de ser, por alturas da governação joanina do século XVIII, muito vivificado no consulado pombalino e, mais tarde, sem a razoabilidade e a oportunidade mais exigíveis, tornado num discorrer reiterado, insistente e desmesurado era reclamada a necessidade imprescindível duma pronunciada renovação da vida portuguesa que, conforme afirmado e reafirmado era, como continua a dizer-se, uma necessidade nacional irreprimível e inadiável, face ao que, já lá vão dois séculos, passou a ser designado ora por decadência nacional, ora por atraso nacional.
Embora nada deva opor-se, bem pelo contrário, ao inquestionável desiderato nacional de, a todo o custo, querer buscar-se para a sociedade portuguesa, com afinco máximo, um desenvolvimento político, económico, cultural, ambiental e social passível de poder reconhecer-se como justo, digno, saudável e democrático, importa contrariar-se sem receio – como não tem acontecido – um mero crescimento económico imaginado – como tem acontecido – primeiro sob o signo da modernidade, anos depois sob os auspícios do modernismo ou, como nos dias de hoje, sob o clamor europeísta e dum modo um tanto possidónio, da modernização.
Importa defender-se que o maior objectivo antevisto e proposto deva ser o da procura duma efectiva justiça social distributiva, fácil de reconhecer-se e que, para assim poder considerar-se, tem de estar assegurada por um caminhar sustentado numa Democracia verdadeiramente participada que ofereça as máximas possibilidade de realização do ser, do ter e do saber. Importa, também, que esse caminhar não seja alicerçado, como tem sido tentado, inconsequente e sucessivamente, desde o alvor da República, na transitoriedade dum positivismo filosófico posto ao serviço do jacobinismo político, na entrega do país aos ditames inconcebíveis duma ditadura fascista, na subserviência vergonhosa, como o foi, face a quaisquer dos dois expansionismos imperialistas em disputa ou, ainda, como tem sucedido nos últimos anos, nos sustentáculos economicistas rendidos à omnipotência do mercado neoliberal que se, ao longo de muito tempo, conseguiu permanecer servido por um racionalismo de sabor romântico, agora, nos últimos anos, a acompanhar de muito perto as imposições da multilateralidade política europeia, aparece enroupado com tiques um tanto messiânicos que, todos eles, uns após outros, ao falharem, acabaram por revelar o seu substrato mais verdadeiro, de sobejo, o mafioso.
Aquilo que para o futuro dos portugueses e das portuguesas deverá ser uma necessidade programática indubitável e premente, tem de ser escorado – para que não claudique – nas exigências dum pensamento dialéctico que só ele é susceptível de formular, por devir, um projecto de desenvolvimento autodinâmico capaz de ter em permanência e em linha de conta, sem hesitar, acima de tudo, a evolução histórica do país. Tem de reconhecer-se, que desde o término da sua hegemonia mundial, nos finais do quinhentismo, Portugal, pela mão das suas classes sociais dominantes e à revelia dos interesses da arraia-miúda, tem sofrido múltiplos e variados atropelos inclusive retrocessos que, quantos deles, dir-se-ão muito gravosos, porém, nada aponta no sentido de não ser possível e muito desejável querer repará-los ou, apenas, de tentar querer fazê-lo. Actualizar o país com a Democracia que não tem havido e considerar garantida, sem apelo, a equidade social mais imprescindível é, sem margem para dúvidas, a tarefa mais premente e a que tem de tornar-se no escopo dum novo estatuto constitucional capaz de fundar uma Terceira República.
Na ânsia da chamada “modernização” (um mero crescimento económico produzido a qualquer preço e sem olhar à justeza da sua redistribuição) tem sido esquecido, como continua a fazer-se que, Portugal, com séculos duma continuidade histórica, boa e má – coisa que, agora, não vem ao caso – tinha e deve ter ao seu serviço, como qualquer Nacionalidade, as particularidades estratégicas e de circunstância reconhecidas como as mais aptas, umas e outras, para afirmarem a defesa intransigente do seu legítimo percurso histórico e da sua própria evolução política, embora – como deve ser e por sua vontade expressa – uma evolução aberta ao mundo na tarefa nobre de defesa da Paz mundial e na do entendimento solidário de todas as Nacionalidades.
(Continua)
Segunda-feira, 21 de Junho de 2010
Meu Caro Carlos Loures,
Volto à frase que destinei para designar o "assunto". Hispânicos somos todos nós; espanhois é que não; nem os há.
Considero meramente expeculativo que prossigamos com esta nossa correspondência desencadeada pela minha defesa da independência da Galiza e transformada num diferendo sobre a minha defesa duma idêntica saída política para o caso muito respeitável da Nacionalidade Andaluza.
Esta minha resposta à tua última carta vai ser uma demonstraçâo de indisciplina porquanto não tenho cópia do teu escrito e, nesta condição, escreverei à medida de quanto possa recordar-me. Como sabes a minha provecta idade caustica-me com falhas - brancas - terríveis!
Primeiro) A utopia é o lugar onde o nosso imaginário pretende chegar; não é longe, nem perto. Será onde for e isso varia com quem o define, sonha e anuncia.Não vais querer ditar-me os seus/teus limites.
Segundo) O escuteiro estava muito bem ensinado mas agiu precipitadamente.Bastaria que tivesse incitado a Senhora inclusive lembrando-lhe que naõ atravessar o mais complexo mata a evolução.
Terceiro) Se os nascidos na Galiza não percebem que têm uma Nacionalidade, em termos político mas não só, bem pode dizer-se estarem alienados.
Quarto) Não pretendo obrigá-los a serem independentes, outro sim à política portugesa que, essa sim, deve bater-se pela Libertação de todas e quaisquer Nacionalidades. Se o não faz contradiz-se inexoravelmente. Verifico que o fenomeno nacional da Descolonização - imposto e pedido, tanto de fora como de dentro - continua a não nortear obrigatoriamente a chamada esquerda.Os outros são uns senhores que procedem como entendem; nós devemos comer e calar!! A política portuguesa não deve abdicar de ser o farol das Independências Nacionais.A coerência obriga a, mais uma vez, dar novos mundos ao mundo.O que disto irão dizer os esquerdalhos de serviço!!! ah! ah! ah!
Quinto) Em toda a Europa medieval nada havia de tão avançado como o foi a Andaluzia e, como é do teu conhecimento, não foi obra desfeita num só dia.
Será que os indigenas andaluzes actuais recusam o seu passado riquissimo em nome de terem sido conquistados pelos castelhanos? É preciso reconhecer que no estado espanhol só está autorizado falar-se de autonomia. Uma palavra em favor da Independência é crime.Querer ouvi-la para concluir que são independentistas é provocatório.
Sexto) É bem sabido que a política de Madrid tudo tem feito em favor da miscigenação e da deslocação das vàrias Nacionalidades reconhecido, como é, que os independentismos existem e não estão reduzidos, apenas, às tres Nacionalidades que tens referido.
Sétimo) A dado passo da tua última carta - obra de literatura muito apreciável - indicas-me o caminho do bom comportamento. Que não devo julgar. Mas que Democracia será essa em que não posso julgar comportamentos e pensamentos cujos, isso é indiscutível,não molestavam quem quer que fosse.
Oitavo) Parece útil pensar no caso dos Sérvios e dos Croatas sobre quem ninguém tinha dúvidas de serem uns "indefectíveis e acendrados Jugoslavos". Viu-se !
Abraça-te com amizade o
Carlos Leça da Veiga
Sábado, 19 de Junho de 2010
Uma História nacional inspiradora mas sempre desprezada “
A ignorância da nossa História tem proporcionado erros monumentais aos nossos políticos e a muitos portugueses”, Embaixador Luís Gaspar da Silva.A conquista duma Democracia do ser, do ter e do saber, deverá constituir o melhor e o maior objectivo a que a organização social humana deve e tem de guindar-se. Embora os benefícios políticos, culturais e sociais proporcionados directa e imediatamente pela Democracia sejam, de facto, o fim mais desejado pela generalidade dos Homens e das Mulheres, à Democracia, por igual, deve pedir-se que aceite esforçar-se, quanto possível, para produzir as reparações mais necessárias, nos estragos inegáveis que, ao longo da História, as prepotências dos mais variados absolutismos conseguiram criar e quantas vezes consagrar inclusive, tal a ignomínia do seu ferrete, terem deixado um rasto negativo susceptível de, muitos anos passados, continuarem a ter presença e força para condicionar o futuro, até no pior sentido.
O 25 de Abril, tenha-se consciência disso, obrou dum modo muito positivo no sentido de corrigir particularidades políticas nacionais que, há demasiado tempo, já não podiam conferir à população portuguesa um qualquer motivo de satisfação, uma qualquer réstia de orgulho e, muito menos, um qualquer prestígio internacional.
A História de Portugal, no decurso dos seus oito séculos, para além de quanto imensamente ímpar, inovador e positivo deve e tem de assacar-se-lhe, a seu par – isso não pode negar-se – produziu estragos insofismáveis que, mau grado os seus imensos inconvenientes e não menores repercussões negativas, apesar de tudo, não bastam e não servem para manchar, como seria injusto, o longo e notabilíssimo percurso histórico deste já velho país onde, curiosidade digna do maior realce – mas nada e nunca invocada – só há, como deve ser, e ao arrepio da generalidade dos casos, uma única Nacionalidade cuja expressão falada, obra sua, num crescendo continuo, prossegue a estender-se e a enriquecer-se por todo o mundo.
A realidade dessa constatação obriga a reconhecer-se a Portugal uma particularidade que, coisa inquestionável, é mais uma singularidade nacional com importância estratégica extrema, porém, salta à vista, muito pouco valorizada.
No conjunto dos factos históricos dos portugueses há muitas realidades dignas do maior destaque que, sem que possa dizer-se terem sido esquecidas, há quem insista em querer fazê-lo. De facto, não figuram, como merecem, nos lugares destacados em que devem estar e, com cuja recordação e bom exemplo, possivelmente, muitos comportamentos cívicos, a viverem-se nos nossos dias, podiam e deviam beneficiar. Porque será que não estão nos lugares que merecem?
Será por quantas dessas realidades históricas terem sido feitas, sobretudo, com o concurso destacado dos mais anónimos?
Será pelo receio duma imbecil conotação reaccionária?
Será por os seus obreiros inquestionáveis não representarem, ou servirem, os interesses dos mais poderosos?
Será porque os poderosos, muitas vezes, estiveram do lado errado?
Será, inclusive, por haver conveniências alienígenas a quem desagrade ver sublinhar-se qualquer contratempo ou revés que, no passado histórico, aqui tenham sentido e sofrido ou será, tão-somente, por causar-lhes desgosto ter de evidenciar-se-lhes um menor protagonismo na História do Mundo, se é que, nalgumas circunstâncias, com genuinidade assegurada, algum dele, com significado universal, possam ter tido?
Será pela infantilidade política de não vislumbrarem nos factos o imediatismo bem condimentado da luta de classes?
Há cerca de dois séculos, para um número sucessivamente crescente e muito significativo de portugueses do escol intelectual do país, começou a intensificar-se a repetição duma queixa que haveria de resultar socialmente muito influente e, por igual, não menos alienante cuja, até hoje, lamente-se, o tempo eternizou. Era a decadência portuguesa que, apontada desde a segunda metade do século XVIII, no mais essencial, por regra, passou a culpar os males com que Portugal tinha de confrontar-se e que, daí em diante, passou a ser a resposta que melhor explicava todos eles. O atraso material do país era – e tem sido – a evidência política considerada como o aspecto nacional mais negativo e, por igual, a circunstância que nunca deixou de receber a critica mais contumaz e mais constante, sempre, que o estado do país era, e é, sujeito a qualquer apreciação critica, face aquele crescimento material visto no exterior, de sobremaneira, no ocidente europeu.
Com efeito, nos últimos quase duzentos anos, os discursos sobre a decadência nacional e, por igual, aqueles outros sobre o desencanto com o viver pátrio, uns e outros, sem muito terem de esforçar-se – um desacerto lamentável – acabaram por conseguir ganhar foros duma explicação bastante e, também, duma desculpa suficiente para responder a quase todos os acontecimentos nacionais considerados menos felizes mas, também, a seu par, para explicar as suas circunstâncias determinantes e consequentes. Se, esse discursar, estivera bem expresso na acuidade, na oportunidade e na utilidade comprovada da prosa dos estrangeirados, anos após, sem um critério bem apurado, com muita ligeireza, passaram a constituir a panóplia absoluta e mais em voga, dos queixumes nacionais.
Infelizmente, para dar-se-lhes uma resposta necessária – irrecusavelmente necessária – insistiu-se, mas mal – exceptue-se o caso feliz do Setembrismo – em pedir, sucessivamente, no Vintismo, no Cartismo, na Regeneração, na Primeira República e na de agora – a Segunda* – uma qualquer acção política, económica, cultural e social desde que sujeita a um rigoroso mimetismo alienígena, no caso, substancialmente, o eurocentrista. O próprio salazarismo, para satisfação da sua sanha antidemocrática, entre o muito mal que fez, imitou, nos limites do possível, as ideias factícias do mussolinismo e, um tanto – tanto quanto conseguiu – algumas daquelas do hitlerianismo.
Na verdade, quem sempre por cá mandou e manda – não sejamos ingénuos – para assegurar-se duma mais fácil perseveração, senão mesmo dilatação, dos interesses da classe social dominante – afinal os mesmos do chamado escol intelectual produtor do discurso nacional decadentista – uns ou outros, com o seu mando abusivo foram quem, entre nós, mais vozeou em prol da salvação nacional desde que – hoje em dia como nunca – à custa da importação de quanto o eurocentrismo tem produzido, tudo sem bem ajuizar sobre quaisquer dos seus inconvenientes, designadamente, aqueles de natureza expansionista, com destaque, para os económicos.
A subserviência, mantida frente aos poderes expansionistas dimanados pela Europa, agora como sempre, só têm servido para protecção social dos possidentes portugueses e, afinal – ao contrário de quanto proposto – tem sido o comportamento político que mais tem favorecido o atraso material e a tal decadência nacional. Não é possível, com sucesso, importarem-se modelos de desenvolvimento para os quais o lastro indelével da História nacional não tenha deixado caminho aberto.
(Continua)