Máquina-máter Máquina-mártir Máquina-poedeira Máquina-batedeira Máquina-enfardadeira Máquina-yogurteira Há quem lhe chame Companheira Levante-se a ré Mulher-deitada Mulher-sentada Mulher-de-pé Mullher-deterGente Mulher-deCoração Mulher-obeDecente Mulher-matreira Há quem lhe chame Companheira Levante-se a ré Mulher-deitada Mulher-sentada Mulher-de-pé Mulher-sofá-cama Mulher-carrinho-de-rodas Mulher-cabide-de-modas Mulher-rabinho-de-freira Há quem lhe chame Companheira Levante-se a ré Escreve o seu nome com todas as letras Descuida a cabeça e cuida das tetas Levante-se a ré No Dia da Mulher tem direito a jantar Uma flor e um café E se nada tiver no Dia da Mulher Para o ano há mais e é para quem quer Levante-se a ré Há quem lhe chame Companheira Ela anda Ela desanda Entre o colo e a coLEIra
Apanha do pai Apanha do irmão Apanha do
marido Apanha do patrão Apanha do padre Apanha do professor Apanha do chulo Apanha por amor Gosta de apanhar Dizem os machistas Adoram levar Dizem os maricas Se quiser igualdade tem de muDar de sexo O homem está a mudar e sem qualquer protesto Levante-se a ré Enfrenta o tribunal com panelas ao lume Insulta a autoridade com esfregona e perfume Sai a mulher em ombros Sai nos noticiários Pois levantou as saias aos julgaDores sumários Começou a guerrilha da mulher ideal Há um juiz sem toga Outro sentiu-se mal Levantou-se a arguida e foi o fim do mundo
A cena é repetida de segundo em segundo
Levante-se a ré
Mulher-a-dias Mulher-a-noites
Um falo duro Três falas mansas
São três amores São três açoites
Três são no ventre Três são nas ancas
(inCorreio Vermelho, Editora Seara de Vento, 2008)
Às minhas irmãs que me criaram ; à minha mãe que me abandonou ; à mãe do meu filho; a todas as namoradas e amigas que me aturaram; às amantes; às mulheres que comigo colaboraram na vida profissional; às mulheres que fizeram a diferença ; às mulheres que todos os dias acordam homens; às mulheres que todos os dias acordam animais; às mulheres que todos os dias acordam bestas. Bem Hajam!
Neste dia, do ano de 1857, as operárias têxteis de uma fábrica de Nova Iorque entraram em greve, ocupando a fábrica, para reivindicarem a redução de um horário de mais de 16 horas por dia para 10 horas. Estas operárias que, nas suas 16 horas, recebiam menos de um terço do salário dos homens, foram fechadas na fábrica onde, entretanto, se declarara um incêndio, e cerca de 130 mulheres morreram queimadas. Em 1910, numa conferência internacional de mulheres realizada na Dinamarca, foi decidido, em homenagem àquelas mulheres, comemorar o 8 de Março como "Dia Internacional da Mulher". De então para cá o movimento a favor da emancipação da mulher tem tomado forma, tanto em Portugal como no resto do mundo.
O QUE SE PRETENDE COM A CELEBRAÇÃO DESTE DIA
Pretende-se chamar a atenção para o papel e a dignidade da mulher e levar a uma tomada de consciência do valor da pessoa, perceber o seu papel na sociedade, contestar e rever preconceitos e limitações que vêm sendo impostos à mulher.
Mas as mulheres têm tomado consciência do seu papel no mundo, têm participação activa nos movimentos de cidadania, ontem uma delas foi agredida a pontapé porque se insurgiu contra Sócrates quando este estava a discursar . Querem serem ouvidas , desejam uma vida profissional e lutam não ficam em casa. Este movimento da "Geração à rasca" está a espalhar-se, para além das simpatias ideológicas é uma boa notícia, num país onde a diferença dos que ganham milionariamente e dos que não têm emprego é cada vez maior.
Acabei de ler há dias um romance da Ana Cristina Silva, As Fogueiras da Inquisição. Trata-se de um romance histórico, centrado no problema da Inquisição e das perseguições aos judeus e cristãos novos. A autora faz a reconstituição histórica da época partindo da observação que dela fazem duas mulheres, avó e neta.
A Ana Cristina Silva nasceu em 1964, em Vila Franca de Xira. É professora no ISPA - Instituto Superior de Psicologia Aplicada há 19 anos. Doutorada em Psicologia da Educação, lecciona as cadeiras de Psicologia da Comunicação e da Linguagem, e é responsável por seminários de estágios. Da sua experiência consta também trabalho de campo, como psicóloga, integrada no PIPSE - Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Escolar. Vive aqui em Vila Franca de Xira. Para já, é sobre a sua obra literária que vos convido a debruçar.
Apresento-vos uma lista das suas obras principais:
Não-ficção
Como ensinar a estudar. Editorial Presença. 1998.
Até à descoberta do princípio alfabético. Gulbenkian. 2003.
Ficção
Mariana, todas as cartas. Gótica. 2002.
A Mulher Transparente. Gótica. 2003.
Bela. Ambar. 2005
À Meia Luz. Ambar. 2006.
As Fogueiras da Inquisição. Editorial Presença. 2008.
A Dama Negra da Ilha dos Escravos. Editorial Presença. 2009.
Crónica do Rei Poeta Al-'Um 'Tamid. Editorial Presença. 2010.
Nos seus romances, Ana Cristina Silva procura quase sempre mostrar-nos o mundo através de uma visão feminina, partindo de alguém que participa directamente nos factos narrados. A excepção será À Meia Luz. A reconstituição das várias épocas históricas e dos diversos ambientes em que decorrem os enredos que nos apresenta é muito interessante, denotando um trabalho de pesquisa cuidadoso. A efabulação e a intensidade dramática são convincentes, fazendo com que as suas obras sejam de boa leitura, não se tornando cansativas. Leiam, e digam a vossa opinião.
Aí está ele, o mar, a mais ininteligível das existências não humanas. E aqui está a mulher, de pé na praia, o mais ininteligível dos seres vivos. Como ser humano fez um dia uma pergunta sobre si mesmo, tornou-se o mais ininteligível dos seres vivos. Ela e o mar.
Só poderia haver um encontro de seus mistérios se um se entregasse ao outro: a entrega de dois mundos incognoscíveis feita com a confiança com que se entregariam duas compreensões.
Ela olha o mar, é o que pode fazer. Ele só lhe é delimitado pela linha do horizonte, isto é, pela sua incapacidade humana de ver a curvatura da terra.
São seis horas da manhã. Só um cão livre hesita na praia, um cão negro. Por que é que um cão é tão livre? Por que ele é o mistério vivo que não se indaga. A mulher hesita porque vai entrar.
Seu corpo se consola com sua própria exiguidade em relação à vastidão do mar porque é a exiguidade do corpo que o permite manter-se quente e é essa exiguidade que a torna pobre e livre gente, com sua parte de liberdade de cão nas areias. Esse corpo entrará no ilimitado frio que sem raiva ruge no silêncio das seis horas. A mulher não está sabendo: mas está cumprindo uma coragem. Com a praia vazia nessa hora da manhã, ela não tem o exemplo de outros humanos que transformam a entrada no mar em simples jogo leviano de viver. Ela está sozinha. O mar salgado não é sozinho porque é salgado e grande, e isso é uma realização. Nessa hora ela se conhece menos ainda do que conhece o mar. Sua coragem é a de, não se conhecendo, no entanto prosseguir. É fatal não se conhecer, e não se conhecer exige coragem.
Vai entrando. A água salgada é de um frio que lhe arrepia em ritual as pernas. Mas uma alegria fatal – a alegria é uma fatalidade – já a tomou, embora nem lhe ocorra sorrir. Pelo contrário, está muito séria. O cheiro é de uma maresia tonteante que a desperta de seus mais adormecidos sonos seculares. E agora ela está alerta, mesmo sem pensar, como um caçador está alerta sem pensar. A mulher é agora uma compacta e uma leve e uma aguda – e abre caminho na gelidez que, líquida, se põe a ela, e no entanto a deixa entrar, como no amor em que a oposição pode ser um pedido.
Os olhos, vindos do outro lado do mundo, fundos de ausência, casavam o branco e o negro para dizerem o que a boca não conseguia. O nariz afilava de um só traço o rosto magro, e os cabelos errantes fugiam da testa, cada pedaço para seu lado. A pele transluzia uma imagem por detrás dos vidros, imagem baça do avesso da vida.
Uma dor subtil desenhava os lábios maduros, finamente trémulos, como se estivessem prestes a chorar. Nunca alguma lágrima por eles correu ou voou algum beijo. Apenas o cigarro acendia e consumia a sua virgindade.
A Maria olhava-me sempre fixamente, olhos cravados nos meus como que a dizer: - tu entendes-me, tu és capaz de me compreender -. Ela percebia o sim do meu silêncio por baixo dos olhos vencidos.
Conheci duas mulheres iguais à Maria, fotocópias da Maria, ambas se chamavam Maria, uma brasileira e outra francesa, uma pisava o teatro, outra o anfiteatro. Inquilina de soleiras e vãos, a Maria pisava a grande cidade da noite.
As mulheres da fama e da ciência derivavam a vida por entre a lanugem dos cardos e a tangência do sentimento. A mulher da vida era vertical e secante como folha de piteira. A Maria mijona não tinha idade nem tempo, nem antes nem depois, era apenas instante.
Nunca se sentara na mesa do canto fugindo de si mesma. Escolhia sempre a mesa central, desafiando os olhares, vidrando o espaço em seu redor. Comia a sopa, o prato de sempre, como quem tocava violino. Apesar da mão trémula nem um pingo deixava cair no desbotado regaço, sumido de cores pelo uso e abuso. Se moedas cresciam da sopa não dispensava o brande, sua única bebida.
Por detrás do corpo sujo de Maria mordiscava uma beleza intrigante. Tivesse ela banheira e emergiria da espuma, como sereia das águas. Penso que nunca vi a Maria fora deste retrato, para cá da sombra. Por outro lado, tenho a certeza de que já dormi com ela...ou terá sido um sonho?
A Maria nunca mais apareceu. A última vez que a vi não tinha olhos nem boca nem cigarro. Não tinha sopa nem brande, apenas falta de ar. Engolira o violino e a música era uma dispneia sibilante, cântico fúnebre gemido pelas entranhas.
Toquei-lhe no ombro e ela percebeu que eu queria levá-la. Levantou a ponta de um sorriso e esboçou um gesto negativo com a mão. Afastei-me com a sensação de que tinha profanado um sacrário.
Frederico Mendes Paula “A defesa patrimonial da laicidade é levantada pelos gauleses contra as mudanças culturais. Mas é difícil lutar contra essas mudanças quando trazidas pelos próprios franceses. Já não podemos brincar ao nós e eles quando são francesas convertidas ao Islão a usar o niqab”.
Muito se tem falado em relação á presença Islâmica na Europa, sobretudo em França, sobre o facto de os imigrantes tentarem impor os seus costumes enquanto estrangeiros mal agradecidos á sociedade ocidental, a qual os acolheu benevolentemente.
Vou-me centrar em França, país onde o debate está na ordem do dia e que personifica a meu ver a contradição ocidental entre tolerância e xenofobia.
Em primeiro lugar convém lembrar que a população de origem magrebina existente em França resulta do facto de os franceses terem colonizado os seus países durante décadas, concedendo posteriormente a esses povos o direito de viverem e trabalharem em França.
Em França, onde fazem o trabalho sujo que os franceses não querem fazer e onde pagam os seus impostos, que contribuem para pagar as reformas dos franceses. Hoje em dia os franceses de origem magrebina são aproximadamente 5.000.000 de pessoas, quase 10% dos 65.000.000 de franceses, cidadãos de pleno direito desse país e maioritariamente muçulmanos.
Algumas das mulheres que professam a religião muçulmana, cerca de 2.000, usam o niqab, um véu que esconde a face, associado ao hijab ou ao xador, que lhes cobrem a cabeça e o pescoço.
Essas 2.000 mulheres representam cerca de 0,003% da população de França e 0,08% do total de mulheres muçulmanas francesas.
É deste “problema” que estamos a falar, ainda por cima com uma nuance _ a grande maioria dessas mulheres são jovens de origem magrebina nascidas em França ou francesas convertidas ao Islão.
Segundo as estatísticas existem cerca de 60.000 franceses convertidos ao Islão, a maioria dos quais mulheres, número que aumenta anualmente em cerca de 3.600 cidadãos.
Para “resolver este problema” o governo de Sarkozy vai apresentar um projecto de lei, que para muitos dificilmente terá pernas para andar do ponto de vista jurídico, pretensamente para defender a dignidade da mulher muçulmana.
Esse projecto de lei contém, de entre vários artigos, dois fundamentais:
O artigo 1 que pune com uma coima de 150 euros o uso de qualquer adereço destinado a dissimular a face no espaço público, podendo a coima ser substituída por um “serviço de cidadania”; o artigo 2, que está a ser fortemente contestado pela comunidade muçulmana, que prevê 1 ano de prisão e 15.000 euros de multa a quem “instigar” o uso de qualquer adereço que dissimule a face (este segundo artigo destina-se a abrir a porta á prisão de homens por denúncia de mulheres).
Na minha opinião o resultado prático desta lei, a ser aprovada, será o mesmo que teve a proibição do hijab nas escolas francesas em 2004 _ aumentou exponencialmente o seu uso entre as alunas de origem magrebina.
A própria falta de tacto com que Sarkozy está a lidar com o problema, apelidando o niqab de burqa, comparando os cidadãos muçulmanos franceses aos talibãs, chamando ignorantes aos franceses ao pretender que não sabem distinguir uma coisa da outra, mostra que a forma de o governo combater o fundamentalismo em França só vai contribuir para engrossar as fileiras dos obscurantistas “islâmicos”.
O aparecimento desta lei neste momento tem como razão desviar as atenções da população dos verdadeiros problemas existentes na sociedade, procurando um bode expiatório para a crise, e assim tentar reconquistar os votos que Sarkozy perdeu para a extrema-direita de Le Pen.
Se bem que algumas mulheres o utilizem por opção com justificação religiosa ou pressão dos maridos, a maioria utiliza-o como forma de contestação política e tomada de posição face aos valores do ocidente, que segundo elas, permite a degradação da imagem e dignidade da mulher, por exemplo aceitando a prostituição em lugares públicos e a pornografia.
Esta tomada de posição ideológica joga contra o próprio Islão e aumenta o sentimento de islamofobia por parte da sociedade ocidental que vê na religião islâmica, e diga-se que legitimamente, um factor de atraso social e de “marcha atrás” da humanidade no seu caminho para o progresso.
Não esquecer que fobia significa medo e é de facto o medo que motiva a xenofobia dos ocidentais.
Faço notar que do lado “islâmico” não estamos a falar de religião nem de espiritualidade, mas sim de obscurantismo, intolerância, ignorância, aproveitamento político e manipulação, que os integristas ou fundamentalistas não desperdiçam para cativar pessoas para as suas fileiras.
Os defensores do véu integral legitimam o seu uso invocando o versículo 59 da Surat Al-‘Ahzab do Alcorão, que diz:
“Ó Profeta! Dize a tuas mulheres e a tuas filhas e às mulheres dos crentes que se encubram em suas roupagens. Isso é mais adequado, para que sejam reconhecidas e não sejam molestadas. E Allah é Perdoador, Misericordiador.”
A interpretação manipuladora e imediatista do Alcorão, que estes sectores da sociedade fazem, esvaziando-o do seu misticismo, espiritualidade e carácter gnóstico, não vendo no Livro nada para além das letras, é certamente o maior inimigo da Religião Islâmica e dos Muçulmanos enquanto comunidade de crentes.
Em Dezembro de 2009, o recém-falecido reitor da Universidade de Azhar do Cairo, Muhammad Sayyed Tantawi, afirmou que o niqab, o xador e a burqa não são islâmicos, são signos tribais.
E proibiu o seu uso nas várias instituições dependentes da Universidade, seguindo-lhe outras instituições.
O uso do véu integral não é islâmico. Nem no Alcorão nem na Sunnah.
Aliás o véu constituía até meados dos anos 90 uma excepção dentro do universo islâmico, altura em que começa a generalizar-se por motivo da influência integrista, sendo inclusivamente imposto pelos regimes mais retrógrados como por exemplo pelo dos talibãs, curiosamente na altura financiados e apoiados pelos Estados Unidos da América.
O véu integral é assim uma tomada de posição ideológica que surge por reacção á própria incapacidade dos países islâmicos em acompanhar a marcha do progresso, em proporcionar aos seus cidadãos liberdade, democracia e justiça.
Constitui de facto um factor de atraso social, discriminação da mulher e é atentatório da segurança pública.
Mas este problema terá de ser resolvido no seio da comunidade islâmica e não imposto por falsos moralistas como Sarkozy.
Cabe aos muçulmanos separar as águas, afirmando o Islão como uma religião tolerante, como uma via para a espiritualidade da sua comunidade, compatível com uma sociedade moderna e como contributo para a coexistência entre os povos.
Cabe aos muçulmanos separar a religião da prática social, separar o poder espiritual de poder político, conferir independência ao poder judicial, defender o carácter laico do estado nos países Islâmicos.
Já há quem hoje em França se interrogue sobre qual será a atitude do governo em relação ás poderosas sauditas veladas que anualmente visitam Paris e esbanjam milhões nas suas luxuosas lojas. Irão pagar a multa dos 150 euros? E os maridos, milionários que alimentam poderosos negócios europeus, serão encarcerados durante um ano por instigarem as suas mulheres a encobrir a face? A ver vamos.