Nota resumo do texto pelo autor
http://www.youtube.com/watch?v=8kAILLMJK04
A Cavalgada das Valquírias - Richard Wagner - FEMUSC 2010
Não há dia especial para render tributo a una mulher. É um facto quotidiano: dela nascemos, com ela amamos, a ela respeitamos até o fim dos nossos dias. É a ideia que pretendo transferir em este texto, a falta de legislação para as mulheres, e as famosas, sobre as que escrevi en outros textos: Sofia da Melo Brayner e Agustina Bessa Luis, em Portugal, como Gabriela Mistral, Violeta Parra, Isabel Allende Sónia Montecinos, no Chile, Marcela Serrano no México, entre outras, com vidas narradas por mim, em textos separados. Como as cientistas e de obras de arte, como Marie Curie em radium, com Prémio Nobel, e Camille Claudel em escultura, obra roubada pelo seu amante August Rodin. O meu argumento neste texto é a procura dos textos que fazem às senhoras, iguais a todo o resto do mundo. Como a mulher que amamos e a que nos oferece filhos ou, já em idade avançada, trata de nós. São o mar que consola as nossas lágrimas, tristezas e alegrias e tratam de nós, um oceano sem fundo…
Acordei com essa ideia de hoje ser o Dia Internacional da Mulher, e enviei mensagens a todas as senhoras que estimo, as minhas amigas íntimas, e que estou certo ser amigo íntimo delas. Várias responderam com essa doçura que esperamos sempre de uma fêmea [1]. Esse ser humano que não é apenas para fazer e ter filhos; não é unicamente um mecanismo reprodutor. Corri à procura de textos meus, e encontrei vários. O que gostei mais, foi esse livro editado em 2000, o título definia tudo [2]. O amor não é um simples desejo erótico, bem como a amizade entre um macho e uma fêmea, nem sempre é desejo: é apenas um carinho simples, um acompanhamento, uma colaboração que pode ou não, passar a ser amor com desejo. Mas, nos tempos que correm, como tenho escrito noutro texto [3], amar e desejar é amplo e ambíguo. Perguntei a uma das minhas lindas amigas e disse-me, neste dia tão especial, que a mulher em Portugal [4] teve que lutar desesperadamente pelos seus direitos de igualdade. Essa igualdade definida por Thomas Jefferson [5] e pelo Abade Emmanuel Sieyés [6], o primeiro, para a Independência das Colónias Inglesas na América do Norte, o segundo, para a França de 1789: "Todos nascemos livres e iguais". No caso de França, foi o Abade quem apresentou à Assembleia Constituinte o texto designado Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Mas, a minha amiga esqueceu um facto bem mais importante: quer Jefferson, quer Sieyés escreveram para os homens, nos tempos de mulher fêmea e não Senhora. Não é por acaso que tenho dado esta volta pela História.
Pietá, de Michelangelo ( Miguel Ângelo) di Ludovico Buonarroti. É a mais bela obra que alguma vez vi. E, já visitei, os mais famosos museus do mundo, extasiado perante obras primas de todos os tempos e de todas as correntes artísticas. Tive sorte desta vez, porque estava acompanhado por um professor de história que passa as férias em Portugal, em Serpa e em Mértola a trabalhar em arqueologia e que, perante a minha evidente comoção, me segredou. " o corpo de Jesus ainda está quente..."
Claro que percebi tudo. É mesmo essa emoção que aquela obra nos transmite, foi "criada" no exacto momento em que Cristo dá o último suspiro. O seu corpo ainda está quente e sua mãe ainda tem esperança que a vida não o abandone.
Tinha visto e sentido esta mesma emoção muitos anos antes, num pobre casebre, uma mãe protegia o filho ainda e sempre...
Coitado de mim, saiu-me isto:
Era
talvez a vida
que a mosca importuna
trazia
quando rápida ao acenar do lenço
da pobre mãe que sofria
fugia..
e eu
já estivera com ele
naquela posição
só que me animava a vida
que ele não tinha agora no caixão
Tão hirto e tão frio!
PS: poema escrito aos 16 anos quando um amigo meu morreu. Esta é a imagem da mãe que me atormentou por tanto tempo.
coordenação de Augusta Clara de Matos
Quem Conta Um Conto...
Maria Teresa Horta Eclipse
No dia em que a mãe saiu de casa, vestida de shantung escarlate e casaquinho cintado cor de marfim, levando consigo duas malas de cabedal depois de ter largado as chaves em cima da cama por fazer, cobertores revolvidos puxados para trás, deixando ver o lençol de baixo ainda com a marca leve do seu longo corpo de porcelana branca, houve um ciclone que derrubou a vida de todos.
É o inferno, imaginou Laura. A tempestade com o seu estrépito parecia vir das entranhas da terra, de onde também partia o bafo escaldante e um fumo denso, mais névoa ou negrume de cobrir o sol, num imenso breu ou estivesse cega e fosse preciso encontrar a saída do escritório, tacteando à volta, recorrendo ao instinto e à memória:
Nas paredes maiores estão as estantes até ao tecto, com as suas prateleiras compridas de madeira encerada, por onde ganhara o hábito de passar os dedos numa espécie de carícia breve, a supor as histórias dos romances que lhe eram proibidos, assim como as palavras dos poemas degustados com lentidão estremecida, perturbando-se se o primo mais velho lhe ia espreitar sobre o ombro, com o seu hálito quente, levando-a tropeçar nos versos. Mais adiante estava a mesa de canto D. Maria, com a floreira de rosas-damascenas, a moldura trabalhada de casquinha, o cinzeiro e a caixa da Vista Alegre, e do outro lado o relógio de pé alto, pêndulo de precisão a trabalhar o tempo, numa regular monotonia entorpecedora.
Mas, aquela manhã chegara embrulhada em negror, que num rapidíssimo galgar se espalhara, acre como o enxofre, num lastro de tragédia, e o jogo de faz de conta da menina acabou por se transfigurar numa espécie de ficção assustadora.
A precipitá-la no abismo.
Assustada, ela estremeceu e tapou inutilmente os olhos de um azul líquido feito de lágrimas retidas, no instante em que a desordem começou a tomar conta de tudo à sua roda: primeiro foram as jarras dos gladíolos, as canetas, o tinteiro, os cadernos de capa de oleado e os livros do pai, que se soltaram, os discos, as gravuras, o lustre de cristal de Veneza, as figuras de biscuit voando como se tivessem asas; e em seguida as cadeiras, os candeeiros, as mesas, a secretária, e mesmo o seu banquinho de madeira com assento de palha entrançada, onde estivera subida à janela a espiar a mãe, que sem olhar para trás percorreu no seu passo dançante o curto caminho das pedras até à cancela de ferro entreaberta e alcançou a rua, cabelos louros ondulando nos ombros, um pequeno chapéu de feltro vermelho posto de lado.
— Mais valia que ela tivesse morrido —, desejara malévola, vingativa, tornando a repetir numa zanga revolvida; — Mais valia que ela tivesse morrido —, choro oculto pelo novelo do seu fio de voz.— Isso não se diz da própria mãe —, repreendera-a a avó, a fitá-la com severidade. Sem rebuço ela insistiu, hostil, dando força aos sentimentos ruins, impiedosa e fraca. E no entanto, era como se continuasse na sua obsessiva vigia voyeurista, pela porta entreaberta do quarto onde ela se arranjava, agitada, esvoaçando meio-despida, o robe a adejar como uma asa, mostrando-lhe as pernas longas e esguias.
"Como uma garça", lembrava-se de ter pensado, ao vê-la a hesitar entre o saia-e-casaco verde água que lhe realçava a pele alva de loura, e o vestido de shantung escarlate com o qual acabaria por sair, tendo como testemunha a filha, que por trás das vidraças lhe seguiu fascinada o andar dolente, tentando fixar-lhe para sempre a silhueta esquiva. Durante anos Laura acompanhara-lhe a indiferença, doendo-lhe o desinteresse aliviado, a alegria inconsequente, a imprevisíbilidade dos seus actos, alternando entre a ardência e a frieza, o entusiasmo e o desprendimento. Não se admirou, portanto, ao aperceber-se de que ela se vestia para partir, nem ao escutar o som dos saltos dos seus sapatos no mármore do patamar que dava para o jardim de gerânios, antecedendo a rua; limitou-se a subir para o banco junto da janela, de onde a observou a afastar-se.
Pequeno chapéu de feltro vermelho a escorregar nas ondas do cabelo lustroso, detido apenas pelos ganchos invisíveis e a travessinha de tartaruga a aflorar-lhe a orelha de concha rosada. Alheia aos ventos uivantes que a sua fuga desencadeara.
Laura atirou-se para o chão no momento em que os objectos começaram por erguer-se em torno dela com enganadores vagares de levitação, para logo treparem no ar gelado, rodopiando perigosamente, levados pela vertigem de um vento incontrolável, que no seu desatino ora os atirava para longe, ora os trazia até si e os devorava, desmesurado e punidor, usando a vergasta do medo. E ela escutou esse medo, o peitinho ferido por uma dor revolvida e absurda, os lábios secos, descorados e mordidos pela lâmina dos dentes. Imóvel, como se um sortilégio a prendesse e em simultâneo a invadisse pela devassa de menina culpabilizada, desamada e esquecida por falta de merecimento.
Ou de culpa merecida.
Tal como se sentira na obscuridade do corredor, a espreitar, pela fresta da porta, a mãe que fazia as malas: no fundo os soutiens de renda e as calcinhas de cetim, as camisas de noite e em seguida as meias de vidro, as blusas, os vestidos de seda e tafetá, e num canto o volume encadernado de "Madame Bovary", como se fosse uma bíblia. O cofre das jóias, os boiões dos cremes, o rouge, os frascos de perfume com essências de lobélia, de narciso e de nardo, iam na outra mala, que ela fechou pensativa e pálida. A caixa do pó de arroz e a cigarreira de prata, guardou-as na carteira de verniz encarnado, igual aos dos sapatos de salto alto muito fino, idênticos aos das actrizes que copiava, seguindo-as nas páginas das revistas e no écran dos cinemas.
— Mais valia que ela tivesse morrido! — pensou, quando ela entrou no carro e partiu, sem sequer acenar a despedir-se. — Mais valia que ela tivesse morrido! — teimou com afinco, sabendo quanto esse desejo lhe era interdito, mas não se arrependendo dele.
E foi nesse momento que Laura escutou pela primeira vez o rugido do temporal que irrompeu implacável,
a sacudi-la, tomando-a e enregelando-a, chegando-se a ela, a envolvê-la e a empurrá-la, ansiando por guindá-la até ao tecto e dai às nuvens, de onde a soltaria no espaço. Ao sentir-se atraída para o centro de onde provinha a voragem insondável, enrolou-se sobre si própria, tentando passar despercebida, culpando-se já do que estava a acontecer, desmerecedora de felicidade e sossego; mas desconhecendo o significado dessas palavras estranhas, diante das quais, contudo, se sentia incerta e insegura. Face oposta da obstinação destemida da mãe, da sedutora segurança do seu andar elegante, atenta em não ondear as ancas estreitas, desagradada ao sentir o pequeno chapéu de feltro a oscilar nos cabelos dourados, só então dando conta de ter-se esquecido de o prender com os pregos de pérolas e granadas que, na pressa de fugir, largara no tampo da cómoda.
Da janela de onde a vigiava, a filha viu-a hesitar um tudo nada, como se fosse virar-se ou mesmo voltar atrás, para logo se arrepender e com um ligeiro encolher de ombros continuar até ao carro preto estacionado rente ao passeio. E Laura distinguiu uma mão masculina, forte e tisnada, abrindo a porta para ela entrar, tanto o pulso moreno com o relógio de ouro a contrastarem com o punho alvo da camisa.
Instante esse que entreabriu a guarda da menina, oferecendo o seu flanco à lâmina da espada, fio de lápis-lazúli a desenhar nela uma incisão muito fina, fissura que a tornará vulnerável. Tão vulnerável que, apesar de longe, a mãe estremeceu num pressentimento ruim, para logo mudar a expressão transtornada do rosto em riso leviano, por demais ciente de não gostarem os homens de mulheres melancólicas, de mulheres tristes. E atirou para trás os caracóis soltos, contente de o ter seguido na aventura. Cansada da inexistência árdua, menos bibelot do que aristocrata, vaticinada a um destino rasgado pelo brilho das grandes histórias de desespero e amor clandestino; um dia ansiosa pela banalidade de Emma Bovary e no seguinte a preferir o drama de Anna Karenina.
Acabando por recusar a abnegação e escolher a fatalidade.
Hipóteses que Laura inventava enquanto se apercebia do deflagrar da tensão do final da manhã, entretanto transformada em vendaval implacável; poderoso e veloz como uma águia e tal como ela, cruel e carnívoro, garras em riste para a pegar pela cintura de friso da sua magreza e a levar consigo. Mas, ela instintivamente esquivou-se, saltou do banco e rastejou a esconder-se entre o sofá de veludo e a parede, e aí se enrolou como fazem os bichos, a cara protegida pelo ninho dos braços, a cabeça apoiada nos joelhos de ossos salientes e miúdos a cheirarem ao verdete e ao ferro da escada de caracol de serventia às traseiras.
Escadas que balançavam um tudo nada no ar, degraus oscilantes onde então se refugiara, sentada ao início da tarde, entontecida e acuada, a aguardar que se acalmasse a violência da tarde.
- Estás a arder em febre! — afligira-se a avó ao encontrá-la, pondo-lhe a mão muito leve e esguia e fresca na testa escaldante, a empurrá-la de volta à amenidade da sombra, onde a deitou na sua cama a cheirar a madressilva, manta leve a acalmar-lhe os calafrios e a secar-lhe os suores. Mal se afastou julgando-a calma e adormecida, a menina correu meio despida e descalça, sabendo como encontrar o trilho do odor materno, que a guiou resvalando de mansinho até ao quarto dos pais, onde ficou a tremer do lado de fora da porta, espionando pela estreita frincha os movimentos nervosos da mãe a preparar-se para abandonar a casa, que depois de ela
sair a tormenta varreria, tão feroz como um animal predador escapado da selva.
- Mais valia que ela tivesse morrido! — pensara, consciente da heresia, do desaforo, mas igualmente da chaga aberta no sentimento, num encantamento que já não queria para si. Um dia ouvira dizer que "mãe é mãe, mesmo se for uma silva"... Mas ela recusava a silva, o silvo, a ortiga, o espinho. Na verdade, mais do queo tornado, Laura temia o espinho, pois não havia salvação se o espinho ficasse cravado na alma, sem antídoto para o veneno daninho. Recuando diante dos picos aguçados dos cactos, ou dos picos afiados das rocas das histórias de fadas más e madrastas desalmadas, a quem nenhuma menina escapava. Rasura a intrometer-se na felicidade que o abandono destrói sem piedade de nenhuma espécie. Desconhecendo qualquer frescor capaz de atenuar a mágua que a secura afiava, numa solidão sem apaziguamento.
- Mais valia que ela tivesse morrido... — confessará Laura misturando a ânsia com a reza, ajoelhada na capela do colégio do Sagrado Coração de Jesus, terço de madre-pérola esquecido na mãozinha suada, sob a vigilância severa das madres atentas ao cumprimento da disciplina, ao ensino do catecismo, à orações diárias das alunas deuniforme azul-cobalto. E ela por ali ficava quanto podia, como se apesar de tudo esperasse um milagre no qual
nunca acreditara, porque ao deixar de crer, passara a dedicar-se com empenho a disfarçar a pequena assassina que nela tomara o seu lugar.
- A tua mãe é maluca —, irão dizer-lhe mais tarde, mas ela nunca virá a entender, se as pessoas achavam que a sua mãe era louca ou a acusavam de leviana e adúltera. Lembra-la-á, isso sim, cintilando à medida que ia cedendo para acabar seguindo o trilho da paixão, deixando atrás de si um imenso rasto de desmoronamento, como se depois da tormenta uma onda gigantesca rolasse ávida, a arrecadar o que encontrara de mais precioso.
E rolando sobre si mesmo o furacão não se acalmava, sibilante e desvairado, a construir o casulo à sua volta, e nele a menina-larva, ínfima, menor. Angustiada ao ficar diante do eterno entendimento que fizera das duas: a mãe, um pássaro colorido e emplumado, e ela, uma mosca que a tempestade assassinaria de bom grado; sem comparação possível no comparável uma da outra, "tu minha ilharga e pensamento escuso, no temor e no júbilo, tu meu afago mesmo se não me afagas, tu meu outro eu e idêntico lado"... Dividindo-se Laura entre o encantamento e o desprezo, demasiado pequena para tão desmesurada tarefa e intenso julgamento ou desatino camuflado de perda.
"Tu minha perda, tu minha pedra".
Olhos secos e fechados tentando olhar por trás das pálpebras de pétala descida, ou por entre os dedos peganhentos de vómito, de saliva e ranho. Não, não havia mais lágrimas para ela chorar, nem socorro que podesse aguardar, embora sem esperança ou apesar do seu avesso. Abandonada e inquieta, desarticulada, fugaz e igualmente feroz.
A ignorar as vozes.
A avó encontrou-a de borco e desacordada no chão do escritório, com a lividez da morte, a boca entreaberta num soluço calado, as mãos emaranhadas uma na outra por cima da cabeça, num inexplicável e misterioso gesto de defesa.
E depois de voltar a si, continuou ausente e muda, alheada, olhar azul-hortense fito no absoluto nada.
- Inconsciente... — diagnosticou o pai que era médico, e estava interessado em que ela fosse considerada vítima do abandono materno, exasperado de nela reconhecer traços da mulher que o abandonara. — Sai daqui menina, que me fazes lembrar a tua mãe! - repeli-la-á mais tarde, ao vê-la aproximar-se em busca de carinho, como os animais.
- Catatónica, quem sabe... — acrescentou evasivo, à cebeceira da filha para quem nem olhava.
No entanto, ela levantou-se pela calada da noite, as tranças desmanchadas ao longo das costas, olheiras a ensombrarem-lhe o rosto, insistindo em dissimular o corpo débil que, com acinte, colava à escuridade através da qual passava com jeito de assaltante, tentando disfarçar o sopro que era a sua respiração mínima, e iludir o roçagar dos pés nus, deslizando silenciosos no soalho encerado. De braços estendidos para a frente como se fosse sonâmbula, mas afinal cuidadosa, andar aplicado, temerosa de que o negrume onde mergulhara iludisse a percepção que o seu corpo possuía dos poços, dos precipícios, das quedas de água, das armadilhas que as trevas sempre guardaram no fundo limoso e lodoso das cisternas.
Pelas palmas de ambas as mãos juntas e abertas em leque perpassou um levíssimo tremor de apreensão, de quem pretende transportar, preservando, o pouco que resta de si, delicado e frágil. E à medida que ia fluindo, Laura curvava-se mais e mais um tanto, na protecção do que levava unido ao peito, na concavidade tépida criada pelo gesto imóvel que os dedos sustinham, sem brechas, sem esquinas, nem aspereza de nenhuma espécie: um pequeno coração rubro a pulsar sobressaltado. Idêntico a uma rosa de sangue.
Tremeluzindo na cerração do eclipse.
Maria Teresa Horta
Lisboa, 2 de Março de 2008
(in O Prazer da Leitura, Teorema)
Texto e ilustração por Adão Cruz
Tento fechar os olhos com força para ver no escuro a luz dos teus dedos e das rosas e o afago e a carícia e o olhar que a vida não tem.
Tento à luz deste vento carregado de todos os espaços e luzes não ter olhos de ouvir outra voz e de ver o som da água no reino da sede e dos musgos.
Talvez eu sinta ainda o tojo agreste da encosta do outeiro tão longe tão distante tão verdadeiro como o cristal dos teus olhos.
Talvez quem sabe eu sinta ainda a verdade-mentira do sopro de Deus aos predadores da razão.
Na fluidez desta manhã quero sentir o silêncio de tudo a liberdade das pálpebras cerradas sofrendo-sonhando tempos de nuvens densas de amor sem voz e sem face.
Quero dormir esse rosto engelhado de luz a palha centeia do teu regaço as tuas mãos brancas de seda enrugada.
Quero ser o perfume das rosas que te iludem e ainda prendes entre os dedos...mãe!
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