Aquest espai, dedicat a tots els amics d'Estrolabio i, de manera molt especial, als que segueixen el nostre bloc des de les terres de parla catalana. Aquí parlarem de cultura lusòfona i de cultura catalana, i de les qüestions i els problemes que ens afecte als uns i als altres.
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Mário de Sá-Carneiro (1890-1926)
Traducció de Josep A. VidalIMATGE FALSAÉs sols or fals allò que em fa el ulls d'or;
sóc esfinx sens misteri en el ponent.
La tristesa de tot el que no fou
en la meva ànima cau veladament.
Al meu dolor s'hi esberlen coltells d'ànsia,
rebrots de llum amb tenebra es mixturen.
Les ombres que propago no perduren,
com l'Ahir, m'és l'Avui només distància.
Ja no tremolo davant del secret;
res no m'exalça ja, res no m'aterra:
la vida em passa pel damunt en guerra,
sense ni el més petit estremiment!
Sóc l'estel ebri del cel desviat,
sirena folla que fugí del mar,
sóc temple sense déu que prest caurà,
imatge falsa encara al pedestal.
Mário de Sá-Carneiro num desenho de Almada Negreiros Estátua falsaSó de ouro falso os meus olhos se douram;
Sou esfinge sem mistério no poente.
A tristeza das coisas que não foram
Na minha'alma desceu veladamente.
Na minha dor quebram-se espadas de ânsia,
Gomos de luz em treva se misturam.
As sombras que eu dimano não perduram,
Como Ontem, para mim, Hoje é distância.
Já não estremeço em face do segredo;
Nada me aloira já, nada me aterra:
A vida corre sobre mim em guerra,
E nem sequer um arrepio de medo!
Sou estrela ébria que perdeu os céus,
Sereia louca que deixou o mar;
Sou templo prestes a ruir sem deus,
Estátua falsa ainda erguida ao ar...
(da obra "Indícios de Oiro", publicada postumamente em 1937 pela Presença)
Mário de Sá-Carneiro (1890-1916) - XPoeta e novelista, natural de Lisboa. Filho único de um engenheiro, a mãe morreu quando Sá-Carneiro tinha apenas dois anos e, em 1894, o pai iniciou uma vida de viagens, deixando o filho com os avós e uma ama na Quinta da Victória, em Camarate. Em 1900, entrou no liceu do Carmo, começando, então, a escrever poesia. Entretanto, o pai, de regresso dos Estados Unidos, levou-o a visitar Paris, a Suíça e a Itália. Em 1905 redigiu e imprimiu O Chinó, jornal satírico da vida escolar, que o pai o impediu de continuar, por considerar a publicação demasiado satírica. Em 1907 participou, como actor, numa récita a favor das vítimas do incêndio da Madalena, e no ano seguinte colaborou, com pequenos contos, na revista Azulejos. Transferido, em 1909, para o Liceu Camões, escreveu, em colaboração com Thomaz Cabreira Júnior (que viria a suicidar-se no ano seguinte), a peça Amizade.
Impressionado com a morte do amigo, dedicou-lhe o poema A Um Suicida, 1911.
Após infância e adolescência marcadas por solidão e sofrimentos, matriculou-se na Faculdade de Direito de Coimbra em 1911, mas não chegou sequer a concluir o ano. Iniciou, entretanto, a sua amizade com Fernando Pessoa e seguiu para Paris, com o objectivo de estudar Direito na Sorbonne. Às dificuldades emocionais, somaram-se as materiais. Fernando Pessoa foi seu amigo e o único a ajudá-lo, havendo farta correspondência deste período entre ambos.
Na capital francesa dedicou-se sobretudo à vida de boémia dos cafés e salas de espectáculo, onde conviveu com Santa-Rita Pintor e escreveu, de parceria com António Ponce de Leão, em 1913, a peça Alma. Em 1914, publicou A Confissão de Lúcio (novela) e Dispersão (poesia). No ano seguinte, durante uma passagem por Lisboa, começou, conjuntamente com os seus amigos, em especial Fernando Pessoa, a projectar a revista literária que se viria a publicar com o nome de Orpheu. Nesse mesmo ano, o pai partiu para a então cidade de Lourenço Marques e Sá-Carneiro voltou para Paris, regressando novamente a Portugal, com passagem por Barcelona, após a declaração da guerra.
Depois de algum tempo passado na Quinta da Victória, voltou a Lisboa, onde conviveu com outros literatos nos cafés, alguns dos quais membros do grupo ligado à revista Orpheu.
Orpheu era no panorama nacional, uma revista trimestral de literatura, destinada a Portugal e ao Brasil e de que veio a lume o primeiro número, em 1915, correspondente a Janeiro, Fevereiro e Março. As 83 páginas da revista, impressa em excelente papel e tipo elegante, abriam por uma «introdução» em que se pretendia definir os intuitos da obra a que meteu ombros um grupo de jovens que com frequência se reuniam em alguns cafés da baixa lisboeta.
O primeiro número, saído em Abril de 1915, esgotou-se em três semanas, por uma espécie de sucesso negativo: compravam a revista para se horrorizarem com o seu conteúdo e se encolerizarem com os seus colaboradores. Um destes conta que eram apontados a dedo nas ruas, olhados com ironia e julgados loucos, para quem se reclamava, com urgência, o hospício de Rilhafoles.
Um segundo número sairia em Julho do mesmo ano, com conteúdos bem mais futuristas; um terceiro número foi organizado e mesmo impresso parcialmente, mas não se publicou. Era mais uma revista literária que morria à míngua de recursos. Não bastara o talento e o arrojo dos seus colaboradores para prolongar-lhe a vida; eram os financiamentos de Sá Carneiro (ou antes, de seu pai, que lhos mandava para Paris) que a sustentavam. Uma reviravolta nos negócios, a cessação da mesada, e fica no nada o que viria a ser o Orpheu 3.
Feitos, em parte, para irritar o burguês, para escandalizar, estes dois números alcançaram o fim proposto, tornando-se alvo da troça dos jornais; mas a empresa não pôde prosseguir por falta de dinheiro.
Em Abril de 1916, o suicídio de Sá Carneiro privou o grupo de um dos seus grandes valores. Agravaram-se, por esta altura, as crises sentimentais e financeiras do poeta (já por várias vezes tinha escrito a Fernando Pessoa comunicando o seu suicídio).
Sá-Carneiro suicidou-se, com vários frascos de estricnina, a 26 de Abril de 1916, num Hotel de Nice, suicídio esse descrito por José Araújo, que Mário Sá-Carneiro chamara para testemunhar a sua morte. Deixou a Fernando Pessoa a indicação de publicar a obra que dele houvesse, onde, quando e como melhor lhe parecesse.
O grupo entretanto continuou a publicar noutras revistas e, em 1917, surgiu a revista Portugal Futurista, com poemas futuristas de Sá Carneiro (póstumos) e Pessoa, sobretudo sob o seu heterónimo de Álvaro de Campos e onde foram também reproduzidos quadros de Sousa Cardoso e Santa Rita Pintor.
Pintor português, natural de Lisboa, Santa Rita colaborou na Orpheu e foi responsável pelo número único de Portugal Futurista. Em 1917, assegurou a animação da sessão futurista do Teatro da República. Frequentou a Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa onde fez estudos de pintura. Em 1910, partiu para Paris e aí tomou contacto com correntes artísticas mais radicais, das quais se destaca o movimento futurista e artistas como Marinetti, Picasso e Max Jacob. De regresso a Portugal em 1914, iniciou uma pesquisa orientada sobretudo em direcção à conceptualidade manifestada pela pintura futurista italiana, afirmando-se como pioneiro, nos meios vanguardistas portugueses. O seu temperamento exótico e agressivo tornou-se também visível na sua pintura, que exprime essencialmente uma vontade de ruptura vanguardista, contendo, em termos plásticos, referências cubistas notórias. Devido à sua morte precoce aos 28 anos, apenas ficaram visíveis obras como Orfeu nos Infernos (c.1917), marcado já por uma estética expressionista, uma réplica de Olímpia de Manet e Cabeça (c.1912); esta última, numa clara evocação da estética cubista, constitui um dos quadros mais representativos da carreira do artista pela maturidade do seu nível estético, apreciável na reconstrução plástica da máscara negra através de uma linearidade de elipses de grande dinamismo. Da obra de Santa Rita Pintor destacam-se ainda trabalhos como: A Cabeça da Velha e Retrato de Camponesa.
Como escritor, Mário de Sá-Carneiro demonstra, na fase inicial da sua obra, influências do decadentismo e até do saudosismo numa estética do vago, do complexo e do metafísico. Aderiu posteriormente às correntes de vanguarda apresentadas por Fernando Pessoa. O delírio e a confusão dos sentidos, marcas da sua personalidade, sensível ao ponto da alucinação, com reflexos numa imaginativa exuberante, definem o seu egocentrismo, uma procura de exprimir o inconsciente e a dispersão do eu no mundo. Este narcisismo, frustrada a satisfação das suas carências, levou-o a um sentimento de abandono e a uma poesia auto-sarcástica, expressa em poemas como Serradura, Aqueloutro ou Fim, revendo-se o poeta na imagem de um menino inútil e desajeitado, como em Caranguejola.
A sua crise de personalidade, que se traduziu no frenesim da experiência sensorial e no desejo do extravagante, foi a da inadequação e da solidão, da incapacidade de viver e de sentir o que desejava (veja-se o poema Quase), que o levou a uma tentativa de dissolução do ser consumada na morte.
O início do século XX foi um momento de crise aguda, de dissolução de muitos valores. Os artistas reagiram ao cepticismo social, marcado por um laxismo próximo do «laissez-faire, laissez-passer» através da agressão cultural, pelo sarcasmo, pelo exercício gratuito das energias individuais, pela sondagem, a um tempo lúcida e inquieta, das regiões virgens e indefinidas do inconsciente, ou então pela entrega à vertigem das sensações, à grandeza inumana das máquinas, das técnicas, da vida gregária nas cidades.
No início desse século as minorias criadoras manifestaram-se por impulsos de ruptura com as diversas ordens vigentes. As forças da aventura romperam as crostas das camadas conservadoras e tentaram redescobrir o mundo através da redescoberta da linguagem estética. Na área da poesia recusam-se os temas poéticos já gastos, as estruturas vigentes da poética ultrapassada. A arte entra numa outra dimensão: os objectos não-estéticos e o dia-a-dia na sua dimensão multiforme entram na arte. Recusa-se o código linguístico convencional e, sob o signo da invenção, surgem novas linguagens literárias: desde a desarticulação deliberada até à densamente metafórica, quase inacessível ao entendimento comum.
É a toda esta recusa, desejo de ruptura e redescoberta do mundo através da linguagem estética que se chama modernismo ou movimento modernista. No caso português, o modernismo pode ser considerado um movimento estético, em que a literatura surge associada às artes plásticas e por elas influenciada. Nomes como Fernando Pessoa, Sá Carneiro e Almada Negreiros são marcos importantes desta época.
Foi em 1913, em Lisboa, que se constituiu o núcleo do grupo modernista. Pessoa e Sá Carneiro haviam colaborado na Águia, órgão do Saudosismo; mas iam agora realizar-se em oposição a este, desejosos como estavam de imprimir ao ambiente literário português o tom europeu, audaz e requintado, que faltava à poesia saudosista.
A Águia, revista mensal de literatura, arte, ciência, filosofia e crítica social, importante órgão da Renascença Portuguesa, foi publicada entre os anos 1910 e 1932, conhecendo a sua fase áurea entre 1912-1916 sob a direcção de Teixeira de Pascoaes, "o teorizador do saudosismo metafísico".
Outros nomes importantes no panorama cultural da época foram também colaboradores da revista: salientam-se Mário Sá-Carneiro (com passagem efémera pelo Modernismo).
O modernismo português não foi um movimento homogéneo, mas sim uma síntese de várias tendências quer literárias quer plásticas, manifestando-se ao invés dos movimentos literários anteriores basicamente em Lisboa, apenas com algumas adesões de Coimbra e ecos vagos noutros pontos da província.
A geração modernista continuou a manifestar-se, quer em publicações individuais, quer através de outras revistas, como é o caso de Exílio (1916), com um só número e Centauro (1916). Em Portugal, a nova geração combatia o academismo bem pensante de republicanos burgueses que tinham feito carreira à sombra do partido.
Devido à intensa prática política, à luta pela democracia e à preocupação de os autores se fazerem entender por grandes massas, o ensaio, o jornalismo, as conferências, os discursos e as entrevistas dominaram a actividade literária durante o período da I República.
No entanto, entre os vários poetas que se destacaram neste período, citamos
Guerra Junqueiro e Gomes Leal. No teatro, apontam-se nomes como os de Júlio Dantas e Henrique Lopes de Mendonça. O romance histórico foi aceite com muito agrado, principalmente nos meios urbanos e progressistas. A literatura caracterizou-se por uma tendência nacionalista e, em certos casos, por afinidades com o simbolismo (Eugénio de Castro), pelo saudosismo (caso de Pascoaes, Teixeira deTeixeira de Pascoaes), sob influência de António Nobre embora se tenham verificado também outras tendências.
Mário de Sá-Carneiro constitui um dos principais representantes do Modernismo português. A figura de Mário de Sá-Carneiro assume uma importância basilar para a compreensão do modo como o Modernismo português se foi formando com caracteres próprios na recepção das correntes de vanguarda europeias, processo de que a correspondência que estabeleceu com Fernando Pessoa dá um testemunho documental precioso e que culminaria com a publicação de Orpheu, em 1915. Os poemas que edita no primeiro número de Orpheu, destinados a Indícios de Oiro, são, a este título, significativos da sua adesão às estéticas paúlica e sensacionista, que na correspondência entre os dois grandes poetas fora gerada, glosando, então, em moldes muito devedores do simbolismo-decandentismo, a abjecção de um eu em conflito com um outro, reverso da sua frustração e insatisfação, ao mesmo tempo que a publicação de "Manucure", no segundo número de Orpheu, revela uma incursão por uma forma poética mais próxima da escrita da vanguarda futurista. Já antes de Orpheu, a colaboração de Mário de Sá-Carneiro na revista Renascença (1914) – onde Fernando Pessoa publica Impressões de Crepúsculo –, com a publicação de Além (apresentado como uma tradução portuguesa de certo Petrus Ivanovitch Zagoriansky), instituíra a sua experiência poética na charneira entre a herança simbolista e as tentativas paúlicas e interseccionistas. Mário de Sá-Carneiro constitui ainda um paradigma da prosa modernista portuguesa pela publicação das narrativas Céu em Fogo e A Confissão de Lúcio, construídas frequentemente a partir do estranhamento de um narrador insolitamente introduzido em situações onde o erotismo, o onirismo, o fantástico, se associam aos temas obsessivos do desdobramento e autodestruição do eu. O seu suicídio, com 26 anos, parecendo vir selar aquele sentimento de inadaptação à vida, de permanente incompletude, de narcísico auto-aviltamento e, sobretudo, de consciência dolorosa da irremediável cisão do eu, consubstanciada na dramática tensão entre um eu, vil e prosaico, e um outro, seu duplo ideal, que alimentaram tematicamente a obra, nimbou-o para a posteridade de uma aura de poeta maldito, que deixaria um forte ascendente sobre a poesia contemporânea de gerações posteriores à sua.
Aos 26 anos incompletos, retornou a Paris, sofreu uma crise moral e financeira, abandonou os estudos, brigou com o pai e passou a levar a vida boémia da cidade, Porém, desesperado e deprimido, trancou-se em seu quarto, no Hotel Nice, vestiu um smoking, deitou-se e envenenou-se com enorme dose de arsénico. Conta-se que, obeso por natureza, seu corpo ficou monstruosamente inchado, não cabendo na roupa elegante que vestira, nem no caixão que para ele se encomendou. Antes de se matar, enviou poesias inéditas a Pessoa que apareceram em 1937, com o título de Indícios de Oiro.