Com a série de textos sobre France Télécom quase a terminar e agora a percebermos bem que tudo o que nesta empresa se passou faz parte e é consequência lógica de um modelo de sociedade que aos cidadãos tem estado a ser imposto, podemos bem perceber que a sequência não menos lógica das mesmas políticas será transformar a Europa num enorme espaço de pobres ou mesmo de párias, se com o nosso silêncio o consentirmos, se com o nosso voto o permitirmos. Afirmação crua e dura esta, mas não creio haver outra leitura possível, por exemplo, com o documento da Troika pelo Governo assinado e que pelos Durão Barroso desta Europa foi bem carimbado com a garantia terrível de que são os pobres que a crise produzida pelos ricos terão que liquidar e em que a estes a Troika, ah! a esses, tudo fez , tudo faz e tudo fará para os salvaguardar.
É pois todo o tecido social da Europa que se está a romper e é esta mesma Europa, como um todo, que passa a estar em perigo de se desfazer como sucessivamente o temos vindo a demonstrar. Por tudo isto, lembrámo-nos então de um jantar que ocorreu a 20 de Junho de 1790 em Nova Iorque, bem perto de Wall Street.
Gostaríamos de conseguir realizar um jantar equivalente e de sentir que os mesmos resultados foram conseguidos. Aceitam-se três candidatos para jantar no melhor restaurante português, com garrafas de vinho português, por causa da balança comercial, à descrição e com uma só restrição : não poderem ultrapassar os 500 euros por garrafa.
Vejamos então a história do outro jantar, do jantar que se comeu nas vizinhanças de Wall Street em 20 de Junho de 1790. Aceitam-se como vencedores o trio que conseguir repetir para a Europa de agora o que três homens de têmpera de ferro de então conseguiram para os Estados Unidos de então. Verificada a proeza, a melhor mesa possível à disposição de quem a ganhou.
Para já, a história desse famoso jantar, depois a realização do projecto equivalente para a Europa e a seguir, talheres na mesa e garrafas à temperatura escolhida. Para terminar, bom apetite, então.
PS. Há automaticamente figuras não admissíveis como candidatos para este jantar e são todos os políticos europeus que estão no poder. Excluem-se, imediatamente: José Sócrates, Passos Coelho, Durão Barroso, Herman Achille Van Rompuy, José Luís Zapatero, Silvio Berlusconi, Sarkozy, Tony Balir, Merkle, e muitas outros da mesma extirpe.
Razões para esta exclusão ? Excluem-se uns, por incapacidades mentais, para a história poderem sequer compreender quanto mais para a poderem refazer, e são muitos deles, e os outros, mais inteligentes, mais cínicos também, excluem-se por falta de garantias de idoneidade intelectual e moral, por serem capazes de nos inventar uma realidade de tal modo credível que nela seriamente venhamos a acreditar tal o poder de mistificação de que são capazes e disso já deram provas, criando uma realidade virtual portanto, e de que só daremos conta de enganados podermos ficar quando o jantar formos a pagar. E, desses, na lista, há alguns.
Júlio Marques Mota
Assim nasceu uma moeda, assim se construiu uma Nação - por Jacques Gravereau e Jacques Truman
Thomas Jefferson mora no 57 Maiden Lane em Nova Iorque, a dois passos de Wall Street .Ao passear pela rua encontrou o seu colega Alexander Hamilton, sombrio, de má cara, vestido de forma um pouco descuidada, ele que andava sempre bem vestido. O problema de tudo isto é o problema que ele tem em mãos para resolver e que lhe faz insónias. Para falarem , Jefferson convida-o para jantar na sua casa, para um domingo, o domingo
seguinte, a 20 de Junho de 1790. Convida igualmente um outro colega, James Madison.
Estas três personagens, não são simples desconhecidos, pertencem ao pequeno grupo dos pais fundadores dos
Estados Unidos. Jefferson é um dos signatários da Declaração de Independência. Os outros dois assinaram a Constituição americana.
Estamos a 20 de Junho de 1790. Os Estados Unidos só desde há três anos é que têm uma Constituição. O primeiro Presidente, George Washington tinha tomado posse apenas no ano anterior. Nova Iorque é o centro de gravidade do poder, na ausência de uma capital definida. As instituições estão ainda como a terra virgem, não criadas ou ainda não rodadas, sem moeda bem clara, sem sistema federal bem preciso. A imensa confusão criada com a guerra da Independência - que tinha acabado apenas sete anos antes - continua a perturbar toda a gente, entre os desmobilizados completamente arruinados, os interesses contraditórios e um Estado que está a dar os seus primeiros passos.
O jantar informal dos três homens terá grandes consequências, muito grandes mesmo, ainda hoje bem presentes na vida americana. Exactamente porque foi nesse jantar de 20 de Junho de 1790 que se fizeram as grandes escolhas para o funcionamento da América.
O problema do Ministro das Finanças Hamilton é um terrível problema. Os oito anos de Guerra da independência contra a Inglaterra( 1775-1783) uma sangria dramática a todos os níveis. Os 13 Estados que compõem a Federação Americana da época estão endividados até à ponta dos cabelos. Além do mais, ciosos da sua especificidade, cada um tem as suas próprias leis, o seu orçamento, os seus impostos, a sua moeda.
Neste país de agricultores, as explorações agrícolas estão todas endividadas junto dos banqueiros, em geral, filiais dos bancos ingleses em Nova Iorque. Os plantadores da Costa Leste, a única que conta, do Massuchetts à Geórgia, passando pela Carolina ou pela Virgínia, , estão ex sangues. E foram eles que levaram à independência.
George Washington, James Maddison, Thomas Jefferson, são todos eles grandes plantadores de Virgínia, perto do lago Potomac. São eles que estão à frente da Nação. Para o cidadão comum, é ainda pior. Os desmobilizados da guerra da Independência foram pagos em moeda que não tinha qualquer valor. Em forma de pré, os Estados emitiram certificados, uma forma de reconhecimento de dívida a que se chamou IOU (I owe you, deve-lhe).
Que devia fazer Hamilton? Retomar a dívida dos Estados ao nível federal e reembolsar pelo seu verdadeiro valor? Gerir de maneira central a assustadora complexidade de treze moedas diferentes? Mas aqui seria necessário que o Estado pudesse contrair empréstimos e levantar impostos. O Estado da federação e o establishment dos plantadores opunham-se ferozmente a toda e qualquer perda de autonomia e era por esta razão que a reforma necessária não avançava, semana após semana, enquanto que o conjunto do sistema vacilava. Era por isto que Hamilton já não sabia o que devia fazer.
A única solução que perspectivou o hábil Jefferson era negociação de igual para igual. Jefferson e Maddison não pertenciam ao mesmo círculo que Hamilton, que não era um plantador de Virgínia. O seu interesse político era de regular para vantagem deles a difícil questão da capital, o que ainda estava por decidir. Nova Iorque era a capital, mas provisória. A Constituição de 1887 diz claramente que é necessário encontrar um local mais
neutro. Dez cidades se batem para serem a escolhida. Esta questão da residência envenena os debates políticos da muito jovem república . Os plantadores da Virgínia não querem co-habitar com os financeiros de Nova Iorque que os tinham na mão dadas as suas dívidas e de quem desconfiavam como se da peste se tratasse. Nova Iorque era o Anti-Cristo; um centro de especuladores corruptos! Eles veriam com bons olhos que a capital fosse mais próxima deles, que eles poderiam, pensavam eles, controlar.
O jantar de 20 de Junho de 1790 termina com a realização de um acordo. Uma capital contra uma centralização financeira. Uma separação de poderes políticos e financeiros contra um poder federal forte. A partir do dia seguinte os pais fundadores ligam um a um os eleitos do Congresso exactamente como ainda o farão os futuros Presidentes dos Estados Unidos na véspera das grandes reformas. A 9 de Julho a questão da capital federal é resolvida pela maioria parlamentar. Será Filadélfia por dez anos antes de se mudar definitivamente para um território ainda virgem à beira do lago Potomac a que se dará o nome de Washington depois da morte do pai da Independência. A 26 de Julho Hamilton obtém o apoio dos membros do Congresso para fazer aprovar o seu plano.
Tratou-se de uma revolução. As moedas dispersas dos diversos Estados serão abolidas e é criada uma moeda federal, o dólar. O Estado Federal vê-se autorizado a emitir dívida e a levantar impostos nacionais. Pode então proceder à compra dos certificados de pré pelo seu justo valor e assim de imediato bloqueia uma revolução que já estava a fermentar . Para fechar o processo cria nessa dinâmica um Banco Central, the First Bank of United States. O debate entre centralismo e federalismo ficou assim resolvido pelo menos quanto a esta matéria crucial que é o nervo da guerra e a garantia da prosperidade futura.
As negociações do jantar de Junho de 1790 não envelheceram, não ganharam uma ruga sequer com o andar do tempo, dos séculos, perderam em actualidade, ainda hoje mesmo. A mesma questão se coloca na Europa: poder-nos-emos nós satisfazer de ter uma moeda única, o euro, sem controlar a dívida dos países e sem dispor ao nível europeu das alavancas do imposto, da dívida, de um orçamento digno deste nome? Nos Estados Unidos, a separação entre o poder político - em Washington- e económico - em Nova Iorque continua a dirigir dois mundos um contra o outro mas também a corrigir os excessos de um ou do outro.
Jacques Gravereau, Jacques Truman, L’Histoire incroyable de Wall Street, Albin Michel, 2011.
Depois disto mãos à obra e bom apetite, depois.
Júlio
Marques Mota
O Mistério de Lagarde
OK, então é Christine Lagarde que vai para o FMI. Desejo-lhe boa sorte. E gostava que tivéssemos alguma ideia quanto à qualidade do trabalho que ela vai fazer, quanto à linha de orientação que ao FMI vai dar.
Não é que ela ela seja particularmente enigmática: além de ser inteligente, é séria, responsável e criteriosa, sob todos os pontos de vista. Mas, é claro, isso é exactamente o que me preocupa.
Porque estamos hoje a viver numa época em que, por enquanto, aquilo a que dantes chamávamos convencionalmente loucura chama-se agora prudência e ao que dantes chamávamos prudência chama-se agora loucura. As coisas que as Pessoas Muito Sérias, as de hoje, querem fazer – reduzir imediatamente os défices, "normalizar" as taxas de juros, preocuparem-se com a inflação -- são exatamente o tipo de coisas que poderão transformar a crise de 2008 - até (? ) em décadas de estagnação.
Com a orientação de Strauss-Kahn, o FMI estava a caminhar para uma posição menos dogmática, com uma mentalidade mais aberta do que as principais organizações Internacionais. Isso também não quer dizer muito, mas foi muito melhor do que fizeram os loucos economistas que assumiram como o poder na OCDE ou no Banco Internacional de Pagamentos. .
Portanto, a questão é: será que o FMI vai tornar-se mais sensível sob a direcção de Lagarde? Para bem da economia mundial, não acreditamos que tal venha a acontecer.
As pessoas mudam mas não o FMI
2. Um texto de Attac
Christine Lagarde acaba de ser eleita directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI) em substituição de Dominique Strauss-Kahn. No momento em que o Parlamento grego vota um novo plano de austeridade injusto e inútil sob a pressão da União Europeia e do FMI, esta decisão leva a que se evite todo e qualquer debate sobre uma reorientação radical do Fundo. Mas a actualidade judicial francesa (processo Tapie) ou o agravamento previsível da crise financeira poderão muito bem voltar a colocar este debate na ordem do dia e dentro dos próximos meses. É por esta razão que Attac mantém a candidatura da sua co-presidente Aurélie Trouvé para a direcção do FMI e compromete-se desde já a desencadear diligências para que venha a aparecer uma candidatura altermundista que venha do Sul do planeta..
É a quinta vez que este posto, tradicionalmente reservado a um Estado europeu, cabe à França, e não tem nenhuma razão para com isso se congratular conveniente infelizmente congratular-se. Desde os anos 80, a política do FMI continua a ser a mesma, qualquer que tenha sido o seu Director-Geral. Assim, é sob a direcção de Jacques de Larosière (1978-1987), depois sob a direcção de Michel Camdessus (1987-2000) que foram elaborados os planos de ajustamento estrutural que têm conduzido à ruína tantos países da América Latina, da África ou da Ásia, e de tal modo foi assim que a maior parte dos países emergentes ou em desenvolvimento recusaram recorrer ao FMI ou ao Banco Mundial (foi de resto o que acabou de fazer muito recentemente o Egipto).
As coisas iriam mudar com DSK? Era necessário ser bem ingénuo para acreditar nisso. Com excepção de uma ligeira maquilhagem , o funcionamento da instituição continuou a ser o mesmo: continua a ser “um dólar = uma voz”, de modo que os Estados Unidos, com mais de 17% das votos , dispõem de um direito de veto que lhes permite controlar o FMI, onde os grandes países da União Europeia desempenham também um papel essencial. Há contudo uma coisa que mudou : com a crise financeira, que o FMI foi de resto incapaz de ser capaz de prever , são agora os países europeus que são obrigados a aplicar planos de austeridade tão draconianos como os precedentes impostos aos países em desenvolvimento. A Hungria, Ucrânia, a Letónia, a Irlanda, a Grécia, Portugal são as mais recentes vítimas de programas de uma rara violência social. Com Christine Lagarde, pelo menos, não haverá mais a mínima ambiguidade: esta advogada de negócios é ultraliberal e não o esconde. Mas não vamos também acreditar que o seu concorrente ao lugar de Director-Geral, o Mexicano Agustín Carstens, teria sido uma melhor escolha. Este que se quer assumir como o representante dos países emergentes é sobretudo um economista procedente da escola de Chicago, tão neoliberal como Christine Lagarde. É por isso que uma candidatura alternativa é necessária para defender a ideia de que uma reforma radical do FMI, que deve deixar de privilegiar a defesa dos credores e dos bancos e deve existir e virar-se para a ONU e tendo , com regra essencial “um país = uma voto”. E é com esta condição que o FMI poderá talvez encontrar a credibilidade que hoje não tem aos olhos dos povos.
Attac France, Les têtes changent, le FMI ne change pas,
Paris, 29 de Junho de 2011
enviado por julio Marques Mota
“Não é uma crise, é uma fraude”
Um texto de Attac
“Não é uma crise, é uma fraude”, dizem indigndos os espanhóis. Esta quarta-feira, o Parlamento grego acaba de adoptar um novo plano de austeridade, símbolo da inverosímel fraude que se está actualmente a realizar na Europa.
Apesar da ineficácia mais que provada das medidas de austeridade para melhorar a situação das finanças gregas, o Parlamento é obrigado a aprovar um novo programa de austeridade , com reduções de salários e uma reforma fiscal que vai fortemente atingir a classes média e as pessoas de menores rendimentos;
Apesar da injustiça profunda destas medidas que visam fazer com que o povo grego pague sem estar a pôr em causa as políticas fiscais desastrosas que foram efectuadas pelos precedentes governos, os desequilíbrios inerentes ao bom funcionamento da zona euro ou ainda os enormes lucros realizados pelos bancos e outros especuladores à conta das finanças públicas gregas;
Apesar da resistência do povo grego, que se levantou dignamente e ocupa desde há quase três semanas a principal praça de Atenas - onde se situa o Parlamento - para contestar, de maneira pacífica e democrática, estas escolhas impostas apesar da sua falta de bom senso ;
Apesar de tudo isto , os deputados gregos escolheram submeterem-se à chantagem da União Europeia e do FMI, que aceitam em troca deste plano de austeridade que se atribua “uma ajuda” de cerca de cem mil milhões de euros à Grécia - sem a qual o governo se reencontrar-ia incapaz de financiar o seu funcionamento (incluidos os serviços públicos, hospitais, etc.). Este pretenso plano de “ salvamento” é feito mais para os bancos franceses e alemães do que para a Grécia: “O CAC 40 acentua os seus lucros, confiando na Grécia” pode ler sobre o sítio do jornal Point.fr.
Representa realmente uma vasta operação de socialização das perdas: um estudo do jornal Les Echos mostra que “graças” a estes planos, “a parte da dívida grega nas mãos dos contribuintes estrangeiros passará de 26% para 64% em 2014. Tudo isto significa que a exposição de cada família da zona euro vai passar de 535 euros actualmente para cerca de 1.450 euros”. Ora todos os economistas estão de acordo em afirmar que a Grécia não poderá reembolsar a integralidade das suas dívidas.
Opondo-se de forma selvagem a qualquer reestruturação, Sarkozy joga uma corrida contra-relógio a favor dos bancos franceses; Quando a Grécia não for capaz de pagar , serão as finanças públicas dos outros países europeus que estarão na primeira linha… E os povos europeus pagarão a factura através de novas medidas de austeridade.
“Privatizar os lucros, socializar as perdas”, esta lógica parece mais do que nunca de uma extrema actualidade: com a nova governança económica, promovida pelos governos europeus e pela Comissão e votada pelo Parlamento Europeu , as finanças públicas serão postas sob tutela, e à imagem da Grécia, será a austeridade permanente para os povos que garantirá os benefícios dos bancos.
É essencial que os povos europeus se mobilizem para levar ao completo malogro esta “estratégia do choque” à escala europeia. À imagem do povo grego, é necessário não somente se “indignar”, mas mostrar-se “determinado” a pôr um fim ao diktat dos bancos e dos mercados financeiros, começando por impôr uma auditoria democrática das dívidas públicas. Em França nomeadamente, as mobilizações devem redobrar de intensidade: o que se decide na Grécia hoje é a capacidade dos povos na Europa de sairem da armadilha na qual nos coloca a finança que está em causa.
Na quinta-feira 30 de Junho, no dia seguinte ao da mobilização sem precedentes do povo grego, e enquanto que os movimentos sociais e os sindicatos britânicos organizam uma greve geral contra os cortes maciços nos orçamentos públicos, Attac apela a que as pessoas se reunam as 18h em frente da embaixada da Grécia para um apoio às mobilizações que se desenrolam na Europa, na Grécia, no Reino Unido, na Espanha, para afirmar que os seus combates são mais do que nunca os nossos combates também.
3. Goldman Sachs assume oficialmente a direcção do BCE
Attac, França,
Paris, 29 de Junho de 2011
Goldman Sachs assume oficialmente a direcção do BCE
Mario Draghi, antigo Presidente de Goldman Sachs para a Europa, assume hoje a presidência do Banco Central Europeu. Era Presidente da Goldman Sdachs na altura em que o banco de negócios americano , nos anos 2000, ajudava a Grécia a maquilhar as suas contas públicas. O seu papel vai ser agora o de preservar os interesses dos bancos na actual crise europeia.
Podiamo-nos até agora interrogar sobre as razões que levavam o BCE e Jean-Claude Trichet a opôrem-se de maneira mesmo violenta - incluindo face à chanceler alemã - a toda e qualquer ideia de reestruturação da dívida grega.
Esta atitude parecia incompreensível dado que todos os analistas, incluindo os economistas dos bancos, estavam de acordo em considerarem que a Grécia não poderá assegurar o serviço da sua dívida nas actuais condições contratuais. Um reescalonamento, ou mesmo uma anulação parcial parece ser inevitável de acordo com a opinião geral. Querer atrasar esta solução faz apenas agravar os estragos económicos e sociais provocados pelos planos de uma austeridade brutal e impopulares impostos aos Gregos.
A nomeação de Draghi clarifica por conseguinte as coisas. O BCE defende não o interesse dos cidadãos e de contribuintes europeus, mas sim o interesse dos bancos. Um estudo britânico citado ontem por Les Echos tem o mérito de quantificar claramente o processo em curso. Este estudo indica que graças “aos planos de salvamento” da Grécia e ao “ mecanismo europeu de estabilidade” instaurado pelo BCE, pelo FMI e pela União Europeia, “ a parte de dívida grega nas mãos dos contribuintes estrangeiros passará de 26% para 64% em 2014. Isto significa que a exposição de cada lar da zona euro vai passar de 535 euros actualmente para 1.450 euros”.
“O salvamento” da Grécia é pois de facto uma gigantesca operação de socialização das perdas do sistema bancário. Trata-se de transferir o essencial da dívida grega - mas também espanhola e irlandesa - das mãos dos banqueiros para a mão dos contribuintes. Será em seguida possível fazer assumir os custos da inevitável reestruturação destas dívidas pelos orçamentos públicos europeus.
Como o afirmam os Indignados espanhóis, “não é uma crise, é uma fraude! ». O Parlamento Europeu votou ontem “o pacote da governança” que reforma o pacto de estabilidade, reforçando os constrangimentos sobre os orçamentos nacionais e as sanções contra os países em infracção. O Conselho Europeu reunido hoje e amanhã vai terminar o seu trabalho. E não é a próxima nomeação de Christine Lagarde à frente do FMI que reduzirá a influência dos bancos sobre as instituições financeiras internacionais, bem pelo contrário.
Felizmente as resistências sociais e de cidadãos vão em crescendo em toda a Europa. Governar para os povos ou para a finança? A resposta é hoje clara: vai ser necessário que os povos europeus se dêem as mãos para construirem juntos uma outra Europa.
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Traduzido e por apresentado por Júlio Marques Mota.
Los indignados
Junho de 2011
Estes dias de indignação são a expressão de um verdadeiro e adequado direito, diremos mesmo que são a expressão de um sentimento de indignação que de modo quase que obrigatório devemos todos nós sentir e exprimir. Foi fortemente defendido por Stéphane Hessel, um homem de 93 anos ex-combatente da resistência francesa, no seu influente documento de reflexão Indignez-Vous (2010) embora muitas vezes este texto apareça citado como panfleto. "Nestes nossos dias, escreve Hessel -" existem coisas intoleráveis ... A indiferença é a pior de todas as atitudes possíveis .. Uma das indispensáveis capacidades [do homem] é a capacidade de se sentir ultrajado, e com os comportamentos que daí derivam ". Gramsci disse muito sobre o tema bem antes dele.
Na Espanha no início de Março, uma pequena rede social ligada por via e-mails, Facebook e Twitter, que se auto-intitulou Real Democracia Ya, reuniu um enorme e crescente consenso de muita gente e apelou aos seus seguidores para ocuparem as ruas em 15 de Maio. E foi o que eles fizeram, pontual e maciçamente, pois foram mais de 60.000 deles que vieram para as ruas, apesar das proibições existentes devido às próximas eleições administrativas de 22 de Maio. Eles tornaram-se El Movimiento 15M; eles auto-intitularam-se Los Indignados. Em Madrid ocuparam a Plaza del Sol, em Barcelona a Plaza de Catalunya, bem como as principais praças na maioria das cidades do interior da Espanha. Eles responderam às provocações com reuniões pacíficas e ordeiras, com discussões e com uma livre alimentação colectiva. Eles saíram no último fim de semana, depois de terem limpo as praças mas planearam repetir a acção.
A 15 de Junho estes manifestantes reencontraram-se novamente em frente do Parlamento catalão, em Barcelona. El Pais noticiou que "os protestos foram dos mais violentos desde a restauração da democracia", mas um vídeo do Youtube fornece provas incontestáveis de que os manifestantes violentos foram agentes provocadores. Um pequeno grupo identificável de jovens teve comportamentos deploráveis e no final os jovens deste grupo acabaram por sair sob “escolta da polícia”, sic); os manifestantes pacíficos tinha cantado para estes provocadores " Secreta, idiota, tu crês que não se nota, Secreta, idiota, te crees que no se nota". Uma vergonha para José Luis Rodríguez Zapatero, este comportamento.
Em tempos que parecem ter sido apenas ontem, recebi um texto de duas origens politicamente opostas e o texto era o mesmo, um documento assinado por Álvaro Santos Pereira com publicidade a um livro cujo autor era o próprio Álvaro Santos Pereira. Auto-estima bem elevada, é o que se pode dizer.
A forma como o texto estava feito dava indícios de que se tratava de alguém que no poder desejava estar, mas enfim, uma secretaria de Estado, talvez.
O texto era de uma pobreza teórica enorme mas de consequências políticas altamente gravosas para o país se à letra fosse aplicado e reagi. Reagi de imediato (http://estrolabio.blogs.sapo.pt/1331073.html) e de imediato escrevi um texto de crítica àquele, escrito ao sabor da pena e da velocidade dos meus dedos grossos a bater num teclado onde a tinta das letras já quase que se sumiu e a vista também. O tempo que passa por debaixo das nossas múltiplas e variadas pontes, esse não perdoa. Tão rápido foi que apenas tomei como base da crítica um texto que tinha acabado, minutos antes, de traduzir para o Estrolabio e que dava pelo nome de Feliz austeridade, creio, onde se desmontava o cinismo que está por detrás da lógica que defende contra todos os que emprego já não encontram, contra todos os que pão já não têm, contra todos os que direitos à esperança de um futuro poderem ter, essa já a perderam, lógica essa que é a da Troika, que é a de um programa que o actual governo promete cumprir e mesmo ultrapassar na sua intenção de estar em consonância com os mercados. E esse texto acabado de traduzir estava mesmo a calhar para a crítica que rapidamente escrevi contra um documento que mais parecia um vergonhoso panfleto a defender de forma encapotada as duras políticas de austeridade contra as quais o povo do meu país se há-de vir fortemente a manifestar. O texto aí está, o texto que agora proponho que se reedite e que assim, quem puder, face ao que se avizinha, nele então medite.
Afinal, estava a reagir a um texto de alguém que ministro desejava ser mas que ainda o não era e em que o referido documento, a mais parecer um panfleto do que outra coisa, era um resumo da sua carta de intenções, da sua carta de condicionalidade, como a Troika já consegue agora escrever, uma vez perdida a vergonha inicial em que apenas falava de memorando de entendimento. Mas a Troika sabia que era preciso cuidado com a sua linguagem, mas distraiu-se e, num texto publicado pelo Estrolabio, falou já em carta de condicionalidade face à Grécia, país de muitos e bons activos a aproveitar. Ora uma carta de condicionalidade lembra outros tempos, lembra o roubo do século que foi feito na Argentina orquestrado pelo FMI e em defesa da liberdade de fuga dos capitais, lembra África posta a saque em nome das multinacionais das indústrias extractivas e não só, lembra por essa via a entrega deste continente à China e aos seus contratos do século como foi o caso com o Congo Kinshasa. E que o digam as vitimas de Darfour.
Reagi a um texto que era uma carta de condicionalidade de um candidato a ministro, reagi a um texto de um autor que agora ministro já é. Tratemo-lo como tal. Mas agora que já o é, que senhor Ministro deve ser chamado, neste caso a ter que cumprir um programa da Troika que não fez, que não escreveu, que não concebeu, um desejo lhe desejo como antigo aluno que foi meu : para bem do meu país e para bem, portanto, de todos nós publicamente e com muito carinho lhe manifesto o desejo de que o seu e nosso governo venha rapidamente a ser um governo de que se possa dizer, dentro de muito pouco tempo, que foi um governo de que já cada um de nós se esqueceu.
Coimbra, 17 de Junho de 2011
Júlio Marques Mota
Ontem passou-me pela frente dos olhos uma síntese do relatório elaborado pelos homens da Troika sobre a situação na Grécia . A visão que nos dão é aterradora mas pelos vistos para elas é a solução , isto é aquilo que nos aterra é aquilo que eles defendem para a Grécia, tudo com um objectivo: a consolidação orçamental , não nos tempos das vagas gordas, o que seria normal, mas sim no tempo das vagas magras e de tão magras muitas delas já estão que se corre o risco de ficarem eternamente doentes, mas insistir nesse objectivo nessas condições de recessão terrível é politicamente criminoso. É o mínimo que se pode considerar dos lideres políticos que nos levaram a esta situação. Gentilmente, dois professores ingleses dirão que os homens de Bruxelas são mais ignorantes que as crianças, pegam num telescópio e procuram ver ao longe pelo lado oposto! A lição de Keynes é que se deve primeiro olhar para os níveis de emprego e tratá-los. Depois os défices tratam-se quase que por si. Trata-se de olhar pelo telescópio mas pelo lado correcto, não como faz Durão Barroso e os seus altos funcionários. Pelo lado correcto, este é o nosso lado para olhar pelo telescópio, esse é também o de milhões de desempregados que por essa Europa fora estão impedidos de procurar ou de encontrar emprego , esse é o lado pelo qual as crianças desta Europa que pelos criminosos políticos está a ser massacrada, gostariam que se olhasse para assim se vislumbrar o seu futuro, não o seu inferno.
Dessa síntese do relatório , o primeiro parágrafo que aqui repetimos é exemplar: "A recessão parece ser um pouco mais profunda e prolongada do que aquela que se esperava inicialmente de acordo com as nossas projecções ... Há indícios bem claros de que o reequilíbrio da economia está a realizar-se e que o período da mais profunda contracção já passou ... No entanto, está ainda prevista uma nova contracção do PIB real para o segundo semestre de 2011,.assim como a necessidade de consolidação orçamental adicional e das restrições de liquidez vai adiar ainda a recuperação por um bom par de trimestres. O crescimento real do PIB para 2011 está projectado para ser de menos -3,8 por cento. Negativo portanto, embora estejam projectadas taxas moderadas de crescimento a partir de 2012”.
A situação da Grécia está mal, vai ficar pior com as medidas já tomadas, vai ainda continuar a piorar mais com as medidas ainda a tomar, mas a Grécia, como diz o documento da Troika é ainda rica e a conclusão é então aproveitar. Diz-nos o referido relatório:
“o governo grego é um dos soberanos europeus com a mais rica carteira de activos... A maioria desses activos não fornecem quaisquer receitas pertinentes;. empresas estatais deficitárias que têm sido efectivamente uma fonte de custos suportados pelos contribuintes.
Deixemos os juros disparar, e deixar é o verbo a utilizar, o verbo que e então a essa situação se deve aplicar será pois… privatizar,
privatizar. Privatizar, para quê? Para descer o peso da dívida grega. Vejamos como.
Na nossa última aula publicada pelo estrolábio vimos que o peso da dívida relativamente ao PIB na Grécia era de aproximadamente 150% . Também aí explicámos que a expressão de variação da dívida pública por unidade PIB é dada pela expressão db = dp+b(i - g), onde db é a evolução da dívida pública por unidade PIB, b é a ratio da dívida pública relativamente ao PIB, dp é o défice público primário por unidade de PIB, que também pode ser visto como sendo a diferença entre o que os contribuintes pagam ao Estado e o que dele recebem, mais geralmente definido como a posição orçamental por unidade do PIB, sem o serviço da dívida, i a taxa de juro da dívida pública e g a taxa de crescimento nominal do PIB.
Seja então a taxa de financiamento definida pelo taxa dos Bunds, os títulos alemães adicionado do CDS sobre os títulos gregos. A cotação de hoje era a seguinte:
|
Previous Day Close |
Yesterday’s Close |
This morning |
France |
0.334 |
0.337 |
0.340 |
Italy |
1.709 |
1.801 |
1.782 |
Spain |
2.330 |
2.422 |
2.411 |
Portugal |
7.770 |
7.930 |
7.910 |
Greece |
13.309 |
13.839 |
14.10 |
Ireland |
7.867 |
8.066 |
8.235 |
Belgium |
1.112 |
1.144 |
1.143 |
Bund Yields |
3.245 |
3.026 |
3.045 |
E a taxa dos títulos gregos a considerar é então 3.245+13.309, ou seja 16,550. Vimos pelos números da Troika que a taxa de crescimento da economia grega é de (-3,8) então temos :
db=dp+150 [16,550 - (-3,8)]= dp+ 150 (20%) = dp+30%. Se a dívida externa não crescesse, se db fosse igual a zero então dp teria que ser a menos 30%. Este facto significa que se teria que obter um excedente primário de 30% e isto significa pura e simplesmente que por cada euro, (por cada euro grego, ou se calhar por dracma novo, desculpem-me, enganei-me) cada cidadão teria que dar 30 por cento do que ganha para que pudesse ficar a dever o mesmo.
E aqui vai a síntese do relatório da Troika
Troika-report
BERLIM (Reuters) - A missão à Grécia da União Europeia, do BCE e do FMI, diz no seu mais recente relatório obtido pela Reuters na quarta-feira que a próxima parcela do auxílio concedido à Grécia não podia ser feito a não ser que a Grécia corrija a situação de subfinanciamento do seu programa de ajustamento.
Seguem-se aqui alguns pontos por nós destacados do relatório feito pelos peritos da chamada "Troika" da União Europeia, Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional:
RECESSÃO
"A recessão parece ser um pouco mais profunda e prolongada do que aquela que se esperava inicialmente de acordo com as nossas projecções ... Há indícios bem claros de que o reequilíbrio da economia está a realizar-se e que o período da mais profunda contracção já passou ... No entanto, está ainda prevista uma nova contracção do PIB real para o segundo semestre de 2011,.assim como a necessidade de consolidação orçamental adicional e das restrições de liquidez vai adiar ainda a recuperação por um bom par de trimestres. O crescimento real do PIB para 2011 está projectado para ser de menos -3,8 por cento. Negativo portanto, embora estejam projectadas taxas moderadas de crescimento a partir de 2012".
Metas Fiscais
"As receitas arrecadadas pelo Governo resultantes dos impostos continuam a ficar aquém do que nos planos se esperava, mesmo depois da revisão à baixa atribuída em relatórios anteriores.
"A missão de avaliação anterior (Fevereiro de 2011) identificou que, sem medidas adicionais, a meta fiscal para 2011 não seria lcançada em pelo menos três quartos de ponto percentual do PIB. Entretanto, a diferença entre as projecções fiscais e o limite do défice tem-se alargado substancialmente. Se nenhuma acção for tomada, o défice público em 2011 ficaria perto do nível de 2010, acima dos 10 por cento do PIB. "
"O objectivo da estratégia orçamental de médio prazo é o de identificar as medidas de redução do défice, que sejam de efeitos duradouros na redução do défice. O objectivo é reduzir o défice orçamental para 2,5 por cento do PIB em 2014 e reduzir mais ainda em
2015, e colocar o rácio da dívida em situação de ficar a descer de modo sustentado. Para atingir esse objectivo, o governo identificou medidas de consolidação orçamental de 10 por cento do PIB, de 2011 a 2014, e mesmo acima de 11 por cento do PIB, se for o considerado o período de 2011-15 . "
"Este pacote fiscal só pode ser bem sucedido se for posto em prática de forma decisiva e
consistente com o apoio de todos os ministérios . A legislação deverá ser
aprovada pelo Parlamento entre o final de Junho e a primeira semana de Julho."
PRIVATIZAÇÕES
"O governo grego é um dos soberanos europeus com a mais rica carteira de activos... A maioria desses activos não fornecem quaisquer
receitas pertinentes;. empresas estatais deficitárias que têm
sido efectivamente uma fonte de custos suportados pelos contribuintes. Deste modo, privatizar esses activos irá contribuir para reduzir a posição financeira do governo com um pequeno custo, se o houver, em termos de receitas futuras mas em que se pode realmente reduzir os custos actuais ... Para acelerar o processo, e para assegurar a sua completa irreversibilidade , deve ser posta em marcha uma adequada governação : uma agência de privatizações gerida por um conselho independente e profissional
deverá ser rapidamente estabelecido. A Comissão e os Estados membros da zona euro poderão nomear observadores para o conselho da agência. Além disso, para reforçar a sua credibilidade, a missão concordou que os objectivos vinculativos trimestrais quanto à obtenção de receitas das privatizações deveria fazer parte da condicionalidade nos memorando de entendimento actualizados
(updated memorandum of understanding MOU). "
SUSTENTABILIDADE
"O reforçar a consolidação orçamental e os planos de privatização poderá contribuir para levar relação dívida / PIB publica para uma trajectória sustentável. Com base nas projecções actuais, o rácio da dívida pública grega atingirá o pico em 2012/2013 ... e passará a decair a partir daí, com uma contribuição significativa do plano de privatizações .Embora a Grécia tenha que continuar rigorosamente com uma política de austeridade fiscal e da redução do rácio da dívida e terá que o fazer por muitos anos, a inflexão na relação dívida
/ PIB vai contribuir para melhorar a confiança do mercado na economia grega. "
Mecanismos de segurança nos bancos ( BUFFERS)
"O Banco Central da Grécia vai exigir reservas adicionais de capital contra a deterioração potencial do seu ambiente operacional, com base no perfil de risco específico de cada banco . Contudo, a missã faz questão de sublinhar que as perspectivas para o sector grego financeira não são independentes das escolhas assumidas para acabar com a enorme falha quanto ao financiamento soberano ".
REFORMAS ESTRUTURAIS
"Embora haja melhorias na competitividade, graças a uma redução dos salários, as reformas estruturais ainda não alcançaram uma massa crítica que lhes permita obterem um resultado concreto quanto à produtividade da economia e quanto à sua capacidade de crescimento."
CONSENSO POLÍTICO
"A missão identificou alguns pontos de convergência entre os programas de ajustamento e as medidas propostas pelo principal partido da oposição (ND). O Partido ND apoia um programa extensivo de privatizações.e há aqui uma convergência de pontos de vista na sua maioria favoráveis ao desenvolvimento das reformas estruturais e do crescimento, . ... Mais ainda, a missão concordou com a oposição sobre a fundamental importância que há em erradicar as dívidas aos fornecedores e em pagar os reembolsos de impostos o mais cedo possível, assim como estão de acordo sobre a necessidade de acelerar a utilização dos fundos estruturais. Contudo, a missão é de opinião de que os grandes cortes nos impostos.propostos no programa económico do principal partido da oposição são irrealistas e incompatíveis com os objectivos gerais do programa de ajustamento. Contudo, a missão concorda com o governo e com a oposição que se deve trabalhar para a reforma tributária fiscalmente neutra, a partir do Outono em diante, com o objectivo de alargar as bases tributárias, eliminando muitas das isenções fiscais, o que pode assim levar a uma redução nas taxas de imposto sobre o trabalho. No momento em que se está a redigir este relatório, parece muito pouco provável que o principal partido da oposição vá votar favoravelmente o novo pacote de medidas fiscais ".
FINANCIAMENTO
"Grécia, provavelmente, não será capaz de voltar ao mercado em 2012. No plano de financiamento acordado há um ano assumiu-se que a Grécia não iria ao mercado durante quase dois anos e que voltaria a renovar a sua dívida de médio e de longo prazo a partir do início de 2012. Este é agora um cenário muito remoto. O custo de financiamento no mercado continua proibitivo ... É improvável que os rendimentos sobre os seus títulos voltarão para níveis acessíveis em questão dentro de alguns trimestres. O cepticismo dos mercados está relacionado com as dúvidas existentes sobre a capacidade e sobre a vontade do governo grego e da sociedade em continuarem a executar o processo de consolidação fiscal e em conseguirem estabelecer a competitividade da Grécia. Além disso, a incerteza sobre o funcionamento da União Europeia e as possibilidades de financiamento na zona do euro agravou a tensão nos mercados financeiros. "
"A estratégia de financiamento tem de ser revista. Dada que é remota a possibilidade de a Grécia voltar aos mercados financeiros em 2012 para se financiar o programa de ajustamento agora estabelecido.está subfinanciado. A.próximá prestação não poderá ser executada sem que esta questão do sub-financiamento esteja resolvida."
Sobranceiramente ignorado pelos meios de comunicação social, sem dúvida por causa das suas teses contra a doutrina neoliberal dominante, Maurice Allais tornava efectiva a cortesia e recusava todas as entrevistas. E ainda vivo uma só entrevista e um só texto foram publicados, respectivamente em Fakir e em Marianne2. Aqui a publicação do texto publicado por Marianne 2.
Ah, o bonito baile dos hipócritas! Ignorado enquanto vivo por todos os jornalistas económicos sem excepção, boicotado pelas cadeias de televisão enquanto que actualmente é honrado por aqueles mesmos que negavam a sua existência e olhavam para outro lado sempre que eles publicavam um texto. Porque, recordam estes embalsamadores à Macintosh, é mesmo assim o nosso único prémio Nobel de economia… Um economista brilhante e livre, reconhece Os Ecos que muito pouco dele se lembraram nas suas suas colunas! O liberal e socialista, nota Le Figaro como para justificar que o diário conservador lhe tenha suprimido a sua única tribuna nos anos 90. La Voix du Nord considera Maurice Allais um pensamento único (sim, mas era necessário acrescentar contra O pensamento único).
Ironia da história, a morte de Maurice Allais coincide com um momento da história económica que valida mais do que nunca as suas previsões. A guerra das moedas mostra que das três grandes zonas da economia mundial (América, Ásia, Europa) a Europa é a única incapaz de utilizar o seu mercado para proteger a sua moeda. Os Estados Unidos acabam de adoptar um dispositivo proteccionista para forçar a China a cessar o seu dumping monetário. Quanto à China, sabe-se e desde há muito tempo que a sua adesão à OMC não a impediu de pisar aos seus pés todos os princípios do comércio livre. De imediato, a ideia proteccionista começa, ainda que timidamente, a alargar a sua área de influência. A última convenção internacional do PS é já disso testemunho. Eis-nos pois perante o que teria feito sorrir Maurice Allais que fulminava frequentemente o liberalismo ingénuo dos socialistas.
Desde que tive conhecimento do texto Testamento de Maurice Allais, o único prémio Nobel que a França teve, publicado por Marianne 2 que procurei obter a versão integral do referido texto. Um amigo meu. Jean-Paul Girard trouxe-me uma fotocópia de Marianne 2 mas em letra tão pequena que não era legível para um velho como eu. Desisti, até que anteontem, ao procurar de novo o documento para utilizar longamente num texto que estou a escrever, tive acesso via Internet, ao referido documento. Traduzi-o, disponibilizei-o aos meus estudantes e pedi que o mesmo fosse feito aos visitantes de estrolábio.
Conheci Maurice Allais de vários dos seus últimos livros, é um homem do mundo liberal, e eu era um dos que o confundia como sendo um neoliberal. Quis o acaso que eu há muitos anos ter tido a sorte de ler uma crónica sobre uma sua conferência feita num Grande École comercial em que o autor com uma lucidez extrema criticava as teorias em que se fundamentam os ideólogos da globalização e a sua posição crítica estava tão perto das que eu defendia que me espantei , como é que um neoliberal estava tão próximo das correntes mais à esquerda nesta matéria disponíveis aos estudantes de Economia, antes de Bolonha, antes das Universidades à Mariano Gago, claro. Daí a minha curiosidade e estas suas obras a seguir bem li e muitos extractos traduzi para colocar nos meus pontos de exame tal era a actualidade das ideias expostas, estas obras eu continuo a recomendar face à prática da ignorância que se faz de ontem, de hoje e de amanhã certamente , obras estas que vêm citadas no final do seu testamento. Se puderem, olhem por e para elas e não darão o tempo por perdido,
Aliás nesta Europa de ideias folgadas, dizem, mas bem condicionadas, garanto eu, ainda me lembro de um assistente alemão de nascimento e de profissão, ou seja, professor na Alemanha, entenda-se, ter dito mais ou menos o seguinte ao professor nessa referida conferência: Professor Maurice Allais, se eu tivesse a coragem de dizer no meu país o que o senhor aqui disse, eu não veria o meu contrato renovado! A sua exposição tinha sido uma crítica demolidora das teorias dominantes do comércio internacional e do seu teorema de base: o teorema das vantagens comparadas, o teorema de Ricardo, de que muitos dos meus alunos terão má lembrança, por não terem sido por este teorema ajudados no seu desejo de passagem na disciplina. Uma questão de vantagens, ou desvantagens, mas aqui de aprender, e houve quem com este teorema ficasse de facto a perder..
E boa leitura do testamento de Maurice Allais vos desejo. A sua riqueza é tal, a sua actualidade será lamentavelmente ainda a de amanhã como será igualmente ainda a de depois de amanhã, que dispensa todo e qualquer comentário. Deixemos apenas um lateral sobre o texto em questão. A Troika, aqui, em Atenas, na Irlanda e amanhã num outro país qualquer desta Europa agora pela incompetência amordaçada , procura rapar do tacho que dá pelo nome de PIB a comida com que a ganância dos grandes capitais há-de calar. Mas o tacho é mágico : quando mais se mete dentro dele mais ele fica a dilatar, porque com o investimento a aumentar, uma parcela do PIB, o emprego aumenta, a riqueza a distribuir igualmente, e o tacho fica a crescer e fica a engordar, a aumentar de volume. Mas tragédia, se aumenta por si só quando o fazem inicialmente aumentar, o movimento inverso é porém ainda mais rápido e extraordinariamente perigoso, pois o tacho diminui, por si só, em altura e em diâmetro quando dele o seu volume ficam a querer diminuir . Se dele tiram receitas para os capitais no mundo outras coisas poderem comprar , campos de golfe, casas no Dubai ou noutras coisas semelhantes poderem continuar a especular, é a procura interna que fica a cair, é a produção que depois fica a diminuir, é a receita do Estado que fica a regredir, é o desemprego a tudo poder fazer explodir . E, quando assim é, são depois os juros da dívida pública que ficam a subir, é a Troika a mais do tacho exigir quando ele já está a diminuír, e são os nossos liberais, esses sim neoliberais, de esquerda ou de direita chamados, a gritar pelas exportações para se procurarem salvar. Falta de memória, esqueceram-se que desarticularam as trocas internacionais com a sua estúpida desregulação global, com a sua assassina noção de concorrência mundial que nada mais é do uma bomba atirada ao tecido produtivo dos países europeus. Leia-se pois o texto de Maurice Allais para tudo isso se poder bem compreender. E à incompetência ele chama monstruosa, até mesmo assassina.
Acabo de ler no jornal The Guardian que um barco que tentava chegar a Lampedusa foi deixado à deriva no mar Mediterraneo durante por 16 dias, apesar do alarme que foi lançado.( Le Monde)
Há aqui abdicação de responsabilidades que levaram à morte de 60 pessoas , incluindo crianças. Isto constitui um crime que não pode ficar de modo nenhum por punir só porque as vítimas são migrantes africanos e não turistas de uma linha de cruzeiros de luxo, diz-nos o padre Moses Zerai, em Roma.
O neoliberalismo continua a fazer das suas vítimas, pelas múltiplas áreas em que actua. Este é mais um exemplo, apenas mais um.
Aos visitantes de estrolábio recomendo a leitura de um texto publicado há um ano no âmbito do Ciclo de Cinema da Faculdade de Economia de Coimbra (FEUC), organização de que faço parte e façamos da sua leitura uma homenagem aos que agora morreram, texto escrito por Embaixador de França em Malta, Daniel Rondeau , em onde se lê:
“A História continua apaixonante e terrífica. Mas hoje, a única promessa
cumprida, e demasiado frequentemente, é o túmulo. Ulisses é negro e morre no
mar, no silêncio das ondas, depois de meses de espera, de aflição.”
Para os mais interessados sobre o tema sugerimos os cadernos de textos de apoio que ao tema o Ciclo de Cinema na altura e na FEUC publicou, disponível em http://www4.fe.uc.pt/ciclo_int/2009_2010.htm
Amanhã (16 h) texto escrito pelo Embaixador de França em Malta, Daniel Rondeau .
Zona euro: uma organização deficiente
A zona euro teria podido ser menos atingida que os Estados Unidos ou que o Reino Unido pela crise financeira. Os sistemas financeiros nesta zona são mais arcaicos. As famílias estão na zona euro claramente menos envolvidas nos mercados financeiros. O euro teria podido ser um factor de protecção contra a crise financeira mundial. A taxa de câmbio fixa entre as moedas europeias eliminou um dos maiores factores da instabilidade. No entanto, não foi nada assim: a Europa foi mais duramente atingida e mais está prolongadamente afectada pela crise que o resto do mundo. Em 2010, o défice público global da zona euro (6% do PIB) é inferior ao dos Estados Unidos (11,%) ou ao do Reino Unido (10,5%). No entanto, praticamente todos os países da zona euro estão sob a pressão de Procedimento de défice excessivo. No entanto, ainda assim, os mercados continuam a especular contra certos países da zona, impondo-lhes taxas de juro insustentáveis, apesar da garantia do BCE e do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FESF).
Esta situação explica-se pelas próprias modalidades da União Monetária. As instâncias europeias estão centradas, desde a criação do euro, sobre o respeito do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) que devia impor aos países constrangimentos nas suas finanças públicas que não têm nenhum significado económico. Não foram capazes de impulsionar uma estratégia coerente na zona. Desde a criação do euro, os desequilíbrios aumentaram entre os países do Norte (Alemanha, Áustria, Países Baixos, países escandinavos), que contiveram os seus salários e as suas procuras internas assim como acumularam excedentes externos, e os países do Sul (Espanha, Grécia, Irlanda), que conheciam um crescimento vigoroso, impulsionado por taxas de juro baixas relativamente à taxa de crescimento e que acumulavam défices externos.
De 1999 para 2007, os mercados não se preocuparam com o aumento das disparidades da taxa de inflação na zona. Em Junho de 2007, as taxas de juro a 10 anos iam de apenas de 4,5% na Alemanha a 4,65% para a Grécia e para a Itália.
Durante a crise, o forte aumento das dívidas e dos défices públicos não provocaram aumentos das taxas de juro de longo prazo à escala mundial, antes pelo contrário, estas baixaram, os mercados estimavam que as taxas monetárias (a curto prazo) continuariam a ser baixas e durante muito tempo, uma vez que a depressão era tal que não havia risco de inflação ou de sobreaquecimento.
A partir daí, a partir de meados de 2008, os mercados deram-se conta de uma falha na organização da zona euro. Enquanto que os governos dos outros países desenvolvidos não podem declarar-se em situação de falência porque podem sempre ser financiados pelo seu Banco Central, se necessário pela criação monetária, os países da zona euro renunciaram a esta possibilidade. O BCE está proibido de refinanciar os Estados e o artigo 125 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia proíbe a solidariedade financeira entre os Estados-Membros. De imediato, o financiamento dos países da zona euro depende dos mercados financeiros e isto não está assegurado. A especulação pôde desencadear-se sobre aos países mais frágeis da zona: Grécia, Espanha, Irlanda, os países que tinham conhecido um forte crescimento antes da crise, mas que deviam alterar o seu modelo de crescimento. A crise financeira é transformada numa crise da zona euro.
O desenvolvimento da especulação sobre a dívida dos países desenvolvidos é paradoxal e perigoso. Desde 1945, nenhum país desenvolvido ficou numa situação de não cumprimento sobre a sua dívida pública. Os mercados especulam sobre um risco que nunca se materializou. Certamente, a situação alterou-se, dado que a independência dos bancos centrais (e em especial do BCE) poderia conduzir a situações inéditas onde o Banco central recusaria vir em socorro do Estado do seu país em dificuldade. Mas esta situação nunca se produziu; a crise de 2007-2008 tem, pelo contrário, mostrado a capacidade dos Bancos centrais em intervir em caso de perigo. Como imaginar que um Banco central não intervenha para socorrer o seu país, como o fez para salvar os bancos?
Tempos de crise ou tempos de geração parva?
Júlio Marques Mota
Dizem-nos agora que estamos perante uma geração parva! Naturalmente, se agora são parvos então fomos nós que os ensinámos, e como não se nasce parvo, faz-se parvo, então se o são, são pois o produto do nosso trabalho. Se assim é, foi então isso o que a sociedade fez deles, se assim é, foi portanto o que toda uma máquina de ensino e treze a dezasseis anos de escola deles fizeram, mas se assim é, tanto dinheiro gasto e tanta gente ocupada para produzir parvos, então é porque há muitos mais parvos, todos aqueles que conscientemente isto fizeram. Felizmente a juventude não é assim, nem nunca poderia ser e são precisos muitos anos para fazer de um jovem um parvo, convenhamos.
Estamos perante gerações sujeitas a terríveis situações de precariedade, isso sim, impostas por uma sociedade que não foram eles que a fizeram, determinados por um modelo económico e social que não foram eles que o conceberam, manietados por um sistema político onde não são eles que a política determinam, silenciados por uma imprensa que é incapaz de denunciar as condições contratuais que a muita gente obrigam a aceitar, violentados pela ausência de condições para um futuro poderem criar e que era nossa obrigação dever-lhes dar. Depois disso, os mecanismos de concorrência e de desregulação que desprotege cada um de nós impõe a quem procura emprego o salve-se quem puder. Por aí, diremos que o sistema neoliberal, definido aqui como um conjunto de discursos, de práticas e de dispositivos que determinam um novo modo de governação dos homens sob o princípio agora mundial da concorrência exacerbada, aponta uma a duas armas a cada um destes precários, sejam jovens ou não, porque a precariedade a todos atinge: uma ao coração procurando impedi-los de sentir, impondo-lhes o salve-se quem puder, e uma outra dirigida à razão, procurando impor condições para que estes sejam impedidos de alguma vez virem a ser capazes de verdadeiramente pensar e, por aí, a tudo se poderem depois sujeitar. Os exemplos disponíveis no mercado de trabalho são disso um claro exemplo, não os queiramos ignorar.
Com a reforma do ensino superior promovida por este governo, mas podia ser outro que o resultado seria o mesmo, com a reforma dita de Bolonha tudo isto me parece evidente. E disso o Professor Ferreira Machado Director da Faculdade de Economia da Universidade de Lisboa deu um bom exemplo na televisão ao considerar que um curso superior são apenas formações genéricas, competências genéricas e que o problema do desemprego está nas mãos de cada um de nós e não nas de qualquer um outro, afirmando ainda que há escolas e cursos onde a questão do emprego e da precariedade também não se levanta. Sem querer aqui fazer polémica com o senhor Professor, a ele que esteve na América, sugiro-lhe que antes de afirmar o que afirmou poderia ler a obra de Robert Reich, que foi ministro do Trabalho de Clinton, e que na linha desta obra e deste autor de renome mundial se esqueça do que entretanto aprendeu com Margareth Thatcher, porque nos tempos de crise que correm, dizer que o desemprego é problema de cada um e não da comunidade onde se está inserido, não abona, garantidamente, a favor de nenhuma Faculdade onde se ensine a ver a sociedade desta perspectiva, a dele, a deste senhor Professor. É evidente que a partir de agora, dos cursos de generalidades que com Mariano Gago se implantaram e com ele também se certificaram iremos ter um problema adicional com os novos licenciados a chegar agora ao mercado de trabalho, um problema ainda muito maior, as consequências da formação pelas Universidades de não empregáveis sequer. E este problema não pode ser escondida na multiplicidade de formações adicionais em que alunos, famílias e Universidades se vão desgastar em tempo, em dinheiro, em recursos, problema cuja dimensão poder atingir então a dimensão de catástrofe. E urgente a resposta antecipada a este problema antes de ele sequer se vir a tornar explosivo, dado que está apenas na sua infância, é urgente contrariar definitivamente o problema do ensino superior como ensino de generalidades e conferir-lhe as competências, os skills, os saberes, os conhecimentos, os méritos, que lhes devem estar associados. Restitua-se à Universidade a sua missão.
Mas nada disto se resolve a chamar parva à geração que criámos. Depois de todas estas nossas falhas, das nossas incapacidades, das nossas faltas de exigência como moeda de troca da nossa comodidade, para além das que deles são próprias, chamar-lhes parvos, é mesmo muita parvoíce junta . Se alguém merece esse adjectivo e ao quadrado somos todos nós que deixámos criar uma sociedade bloqueada e a seguir acusamos aqueles que directamente dela são vítimas do que também não são: de parvos . Parvos ao quadrado seremos então todos nós que directa ou indirectamente elegemos os governos que nos levaram a esta situação, criaram o sistema de valores que a justifica, que a sustenta, que a mantém, que deles, precários extremos, faz a variável central de ajustamento à volatilidade imposta pela globalização à economia real e deixemo-nos de ilusões, de malabarismos, simplesmente.
O momento é difícil, exigem-se grelhas de leitura para esta triste realidade , é o que procuraremos fazer nestes próximos dias no Estrolábio , e isto é também o mínimo a fazer por uma geração que dadas as nossas muitas falhas havidas para com eles, os devemos obrigatoriamente procurar ajudar e taambém, perante eles, muita humildade apresentar.
No fascismo não era necessário pensar, pensavam por nós, por isso era proibido pensar.
Há um dia ou dois ao falar com um dos meus colegas de trabalho sobre a carta aberta ao Ministro Mariano Gago, lembrei-me de uma conversa, há muitos anos havida, com o meu antigo professor, José Baptista Martins, a quem publicamente presto homenagem. Disse-me ele que em tempos de rapaz novo fazia com outros jovens uma espécie de think thank, junto do Engenheiro Araújo Correia que foi durante muitos o Presidente da Caixa Geral dos Depósitos e homem de extrema confiança de Salazar. E a esse propósito conta-me uma história que vale esta adenda: os americanos queriam Portugal inserido no Plano Marshall. Quem terá iniciado as negociações foi exactamente o engenheiro Araújo Correia. E o que os americanos estariam dispostos a financiar não era nada mais nada menos que a barragem do Alqueva e a regularização do rio Tejo em que ainda hoje falta muito para a concluir e de que a propósito dela se fala na carta quando nos referimos às águas sujas em Vila Franca de Xira. Salazar “heroicamente” recusou a ajuda, pois não precisávamos, podíamos viver “orgulhosamente sós”!
Ainda nesta linha, mais tarde estou com um dos herdeiros do Engenheiro Araújo Correia, meu amigo e colega de curso, João Augusto Domingos, e é-me dado a ver um documento fabuloso: o projecto de financiamento para o Bairro de Encarnação, creio, que foi apresentado ao primeiro ministro António Oliveira Salazar. Neste documento, duas coisas a ressaltar: a primeira, as contas do projecto eram verificados por Salazar, nas margens do documento, ao nível do tostão e a lápis. O nosso “homem de Estado” tinha do futuro a dimensão do centavo mesmo, uma dimensão curtíssima, reduzidíssima, portanto, e foi bem isso que se viu; e a segunda característica do documento, referia-se a uma nota digna de facto do fascismo. Dizia-se nesse texto mais ou menos isto, que me foi relatado nessa altura: as casas do bairro de Encarnação eram concebidas para que os locatários não tivessem sequer que se questionar, o locatário e o local não eram feitos para pensar, isso cabia a outros. Fiquei com a ideia que este texto escrito terá sido escrito pelo próprio Araújo Correia.
Desta nota ressalta a ideia que o espólio da biblioteca de Araújo Correia , hoje na mão da família Domingos, de Castelo Branco, família de raiz profundamente democrática, alberga muita informação que ao país conviria saber e que muitos jovens precisam mesmo de aprender para que assim aquela realidade nunca, mas nunca mesmo se permita esquecer. Fascismo, nunca mais. E, seria bom que homens apaixonados pela História e competentes na sua análise estivessem disponíveis para trazer à luz do dia muito desses factos ocorridos e que assim com a sua interpretação quebrassem a capa que a poeira do tempo lhes teceu. Estou-me a lembrar, por exemplo e só a título de exemplo, de João Ferreira do Amaral ou de uma equipa que ele pudesse dirigir e se a família proprietária assim o consentir. Mas disto, eu não duvido, é este o meu sentir.
Já depois do texto escrito contactei a família Domingos. Um dos herdeiros leu-me o texto acima referido pelo que me foi dito nos termos citados, nessa altura, e estamos a trinta anos de distância, onde se pode ler, o que passo a transcrever : “O novo plano de habitação tem que obedecer a condições de solidez, isolamento e distribuição de quartos que a tornem de fácil uso, higiénicas e de quase automática utilização. O novo habitante deve ser orientado pela casa, na disposição dos seus móveis, ser-lhe-á por assim dizer imposto o modo de ali viver, os lugares onde é colocada a cama, onde é lavada a roupa, a posição da mesa de comer, o espaço do quintal, onde crescerão as flores, o sítio mais propício para as crianças poderem brincar, e mesmo o lugar mais próprio para galinheiros, plantação de árvores ornamentais ou de fruto. Tudo se resume numa simples frase: ao novo habitante será poupado o esforço de pensar sobre o lugar ou lugares em que vai desenvolver a sua actividade doméstica.
A colaboração de boas donas de casa no arranjo do plano interno será provavelmente útil a todos os concorrentes” (arquitectos a concorrer com os seus projectos. Nessa sequência fui eu próprio informado de que a família com muito gosto porá a Biblioteca do Engenheiro Araújo Correia à disposição do Professor João Ferreira do Amaral.
Da minha parte, leitores no Estrolabio, é tudo.
Júlio Marques Mota
Heráclito [afirmou]: “Tudo é fluído, nada é estático. Nada perdura, mas muda”. É uma verdade. Em todo o caso, entre hoje e 2020, duas coisas se manterão constantes. Primeira, a natureza humana não mudará. Segunda, as funções financeiras básicas, tal como as definiremos, não mudarão, embora mude a forma como realizamos estas funções...
À medida que se generaliza a utilização das tecnologias, verificar-se-á um impacte na forma como serão realizadas as funções financeiras básicas. Estas funções são (1) financiamento, (2) gestão do risco, (3) corretagem, (4) aconselhamento e (5) processamento das transacções. Este texto ignorará, no entanto, muitos dos termos financeiros estandardizados do século XX. Embora as funções financeiras sejam as mesmas, serão encaradas de forma diferente no século XXI...
Na verdade, está a processar-se uma convergência entre diversas disciplinas, dado que a finança se torna cada vez mais ciência e arte. A teoria financeira está a tornar-se cada vez mais importante e extraordinariamente útil na sequência de avanços teóricos registados nos últimos anos. Nestes se incluem as teorias de portefólio, as teorias de preços dos activos, as teorias de cotação das opções e as teorias de eficiência dos mercados.
Muitas das mais criativas pessoas do mundo financeiro estão a dedicar o seu tempo a estas teorias e estão a melhorar de forma radical a nossa percepção e gestão do risco.
Estamos ainda numa era “Newtoniana” da “finança clássica”, na qual tendemos a olhar para os instrumentos financeiros — tais como acções, obrigações e empréstimos — em termos estáticos e altamente agregados...
Muitos dos modelos financeiros clássicos, perante o que aconteceu ao histórico banco americano Bankers Trust, concentrar-se-ia no factor “beta” das suas acções — a volatilidade das acções em relação ao mercado. Estes modelos teriam grande dificuldade em tratar a multiplicidade de factores de risco críticos fundamentais que induzem o factor “beta”. Definimos estes factores críticos como “atributos financeiros”. O factor “beta” ignora-os ou redu-los grosseiramente a um conjunto homogéneo de “ruídos brancos”.
Os teóricos, porém, não os ignoram. Os investigadores começaram a procurar uma teoria — que designamos por “teoria das partículas financeiras” — que nos ajudará a compreender melhor os atributos financeiros de um activo.
A concepção de uma tal teoria não está ao virar da esquina, mas assistimos a interessantes sinais de progresso e, por volta de 2020, teremos uma teoria financeira muito mais poderosa. Estamos a partir de uma perspectiva “Newtoniana”, que funciona ao nível dos objectos tangíveis (definidos pela dimensão e pela massa), para uma perspectiva mais em linha com o mundo não linear e caótico da física quântica e da biologia molecular.
A física quântica, que trata das partículas subatómicas, podendo eventualmente interligar fenómenos subatómicos e astronómicos, vai para além da física Newtoniana — para além dos objectos, até às moléculas, aos átomos e às partículas subatómicas.
Mais, a agregação não tem qualquer sentido. Os critérios utilizados são critérios de contagem e são globalmente relativos à capacidade que tem uma instituição em produzir uma grande quantidade de bons textos originais e de bons investigadores. A sua agregação é semanticamente coerente quanto aos indicadores 1, 2.1., 2.2., 3.1. e 3.2. dos critérios da classificação de Xangai acima referidos. Mas o critério 4, o dos resultados académicos relativamente à dimensão é de natureza totalmente diferente. Se os três primeiros critérios, com os seus cinco indicadores, representam a produção, o nosso “PIB” nas páginas acima, o último critério representa a “produtividade”, no mesmo exemplo, e o bom senso e a análise económica elementar diz-nos, senhor Ministro, que fazer uma soma ponderada do PIB e da produtividade conduz a um índice vazio de sentido. Isto basta-me, senhor Ministro, sem sequer ser necessário ir à substância de cada critério[1].
Sobre esta questão retome-se o relatório do Senado francês sobre ratings no ensino superior (Senado (França), 2008, p. 67 e s.) e que nesta parte segui de muito perto:
Os limites das classificações das universidades são inerentes à sua própria lógica, consistindo em medir a qualidade por indicadores que são quantitativos. A crítica das classificações internacionais incide sobre a legitimidade da medida e sobre a pertinência do método utilizado. Quanto à legitimidade, cada classificação tem os seus próprios limites: assentando sobre um número limitado de indicadores, uma classificação determinada só dá, naturalmente, um número limitado de objectivos.
Uma primeira questão é a de saber se os indicadores escolhidos estão claramente identificados com os que a sociedade considera prioritários. Deste ponto de vista, as classificações privilegiam os indicadores relativos à investigação e não ao ensino. Ora, em que medida é que será de facto interessante para os estudantes e futuros estudantes saber quem são os investigadores mais citados e aqueles que obtêm o prémio Nobel? Centrarmo-nos sobre estes indicadores não será desviar as universidades da sua missão de ensinar, em especial nos primeiros anos de estudos?
Uma outra questão é a de saber se os indicadores escolhidos têm em conta o valor acrescentado das instituições: não dependem eles mais das características dos estudantes, isto é, do seu nível académico à entrada e das suas origens geográficas e sociais? Ou pura e simplesmente não reflectem eles mais a dimensão das instituições do que a sua “produtividade”?
A fábula tratava da avaliação de instituições com a exclusão das pessoas, mas note-se a nota atribuída teria implicações profundas na vida de quem lá trabalhava. É assim também na realidade e, portanto, falar de avaliação de instituições ou de pessoas que nela trabalham é rigorosamente equivalente. Vê-se assim como se geram as cumplicidades. No nosso caso, dizem-nos que o processo de avaliação de desempenho serve para promover os docentes, mas os ratings que lhes estão inerentes servirão para quê? Não se quer atingir ninguém, acredita-se, mas nesta altura também não pode haver promoções. Já falei disto anteriormente, mas vale a pena perguntar outra vez: para que serve a avaliação? Para treinar, apenas para registo de promoções sem contrapartida financeira? Com esta pequena cenoura pensa-se que se consegue a anuição por parte dos docentes ou então a divisão entre eles. E o modelo neoliberal cumpre-se! É esta a posição por mim assumida em texto sobre a reforma de Bolonha e já referido (Mota, 2010). É isto a nossa Numerolândia. Mas como tudo na vida tem um curto, um médio e um longo prazo, também a questão da avaliação assim o tem.
No Expresso (de 30 de Dezembro de 2010), num artigo com o título “Instituições querem criar mais 431 cursos”, Alberto Amaral em declarações aí incluídas afirmava: “a Agência irá utilizar critérios rigorosos para a acreditação, uma vez que não existe qualquer problema de falta de oferta de cursos (o sublinhado é meu)”.Trata-se de uma agência de avaliação, a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, a A3ES. Mudemos de agência e podemos ter um outro avaliador a dizer então:“a Agência irá utilizar critérios rigorosos, uma vez que não existe qualquer problema de falta de oferta de professores” e a visão de médio prazo fica à vista. Fica à vista qual poderá ser o objectivo da avaliação a médio e a longo prazo, afinal.
Tudo isto que a nossa fábula nos mostra como representação da realidade parece não ter nenhum sentido, parece estarmos ao nível do inverosímel, ao nível do não aceitável. Parece que é inverosímel, mas é mesmo assim, isto é o que são os índices de classificação das universidades. Passemos então à análise do índice de Xangai que tanta tinta tem feito correr e que, de resto, parece estar na base das grandes manobras de concepção das políticas de ensino superior em vários países na União Europeia[1].
Em 1995, com o projecto 211, a China visa transformar uma centena de universidades repartidas pelo território chinês, cerca de 10 por cento do total, em estabelecimentos de excelência no domínio do ensino e da investigação. Foram assim reagrupados estabelecimentos universitários de modo a construirem-se universidades com dimensão suficiente para supostamente racionalizar a gestão dos estabelecimentos de ensino e de investigação. É nesta linha, parece-nos, que terá surgido a classificação da Universidade de Jiao Tong em Xangai, que é a classificação mais conhecida a nível internacional, daí a atenção particular que aqui lhe é dada.
Esta classificação de Xangai é publicada anualmente e classifica as 500 melhores universidades de acordo com os seus critérios e que são:
. Ligações
. A Mesa pola Normalización Lingüística
. Biblioteca do IES Xoán Montes
. encyclo
. cnrtl dictionnaires modernes
. Le Monde
. sullarte
. Jornal de Letras, Artes e Ideias
. Ricardo Carvalho Calero - Página web comemorações do centenário
. Portal de cultura contemporânea africana
. rae
. treccani
. unesco
. Resistir
. BLOGUES
. Aventar
. DÁ FALA
. hoje há conquilhas, amanhã não sabemos
. ProfBlog
. Sararau