Terça-feira, 18 de Janeiro de 2011

O 18 de Janeiro de 1934 – por Carlos Loures

No dia 18 de Janeiro de 1934, faz hoje 77 anos, eclodiu uma insurreição armada na Marinha Grande. O vídeo que antecede este texto parece estar carregado de simbologia partidária do PCP, mas não é bem assim. O hino «A Internacional», foi  composto durante a comuna de Paris, em 1888, por Pierre Degeyter, operário anarquista de origem belga. A letra foi escrita pelo anarquista francês Eugène Pottier. Foi a partir de 1896, após a realização do congresso do Partido Operário Francês realizado em Lille e durante o qual foi tocado e cantado, que o hino se difundiu por toda a Europa através dos delegados presentes.

 

O autor da versão portuguesa da letra foi o anarco-sindicalista Neno Vasco (Gregório Nazianzeno Moreira de Queiroz e Vasconcelos) que, no ano de 1909, traduziu para o português a letra do hino, a qual segue o original francês, reflectindo a influência da literatura e poesia inspiradas pelo socialismo utópico que ficara da geração de 70, quando não mesmo pelo anarco-sindicalismo, maioritário no movimento operário português nas primeiras décadas do século passado.  Dei esta explicação, pois «A Internacional» não é comunista, mas sim o hino de que quase todas as correntes de esquerda. O vídeo acima reflecte, de facto, a sua origem partidária, não por ter «A Internacional» na banda sonora, mas porque as três vítimas que destaca, são militantes do PCP.

 

Para se entender o que aconteceu no dia 18 de Janeiro de 1934, é preciso ir um pouco atrás. Com efeito, a nova Constituição plebiscitada em 1933, dava margem ao Estado Novo para retirar todas as liberdades cívicas aos cidadãos, apoiando-se num texto que, oficialmente, a maioria do eleitorado aprovara. No dia 23 de Setembro desse ano foi publicada a legislação sobre a organização corporativa do trabalho. No que ao universo laboral se referia, a  liberdade sindical era extinta, pois só seriam legais os sindicatos nacionais, enquadrados na estrutura corporativa.

 

Foi criada uma «Frente Única» para fazer face a esta nova arrancada no sentido de consolidar a ditadura. As organizações dos trabalhadores, sobretudo a Confederação Geral do Trabalho, dominada pelos anarquistas, defendeu a realização de uma greve geral insurreccional. O  PCP preconizou uma estratégia diferente - das assembleias gerais dos sindicatos marcadas para votar os estatutos, deviam sair moções repudiando a nova legislação, criando-se uma grande movimentação de massas que poderia resultar na tal greve geral  projectada pelos anarquistas.

 

Porém, a proposta da CGT prevaleceu e os próprios  militantes do PCP envolvidos na organização aderiram à ideia mais radical.  Na noite de 17 explodiram algumas bombas: duas em Lisboa e uma em Coimbra. Contudo, no dia 18 de Janeiro, a adesão à greve geral foi decepcionante. Paragens de laboração apenas em fábricas de Almada, do Barreiro e do Algarve. Na Marinha Grande, as coisas passaram-se de modo diferente. Tudo começou de acordo com os planos traçados – nas fábricas a laboração foi suspensa, cortou-se comunicações e houve manifestações de rua. Depois, a situação alterou-se quando os responsáveis locais, entusiasmados com a adesão maciça da população, resolveram criar um soviete.

 

Foi eleito um soviete que assumiu o controlo da vila, tomando o posto da GNR e a estação dos Correios. Beneficiando do factor surpresa, tudo foi feito sem derramamento de sangue, decidido passo a passo. À medida que as questões surgiam, iam sendo resolvidas. O comandante do posto da GNR e a sua família foi «aprisionado» numa pensão local. Os guardas ficaram sob custódia de um administrador de uma fábrica. O chefe da estação dos CTT, ao ser-lhe detido, pediu para ver a família. Conduzido à residência e respeitada a sua privacidade, aproveitou essa conduta dos revoltosos para, telefonicamente, denunciar o golpe às autoridades.

 

Durante algumas horas, a vila esteve ocupada pelos revolucionários, até que as forças militares que iam chegando os foram cercando, jugulando de forma violenta a revolta. Mais uma vez, o regime capitalizou esta acção, com ela justificando a criação do Campo de Concentração do Tarrafal.

A vila foi cercada por forças militares e, na madrugada de 19, as posições ocupadas pelos trabalhadores foram tomadas e a rebelião jugulada. Seguiu-se o que era de esperar de um regime como o que Salazar instituíra – prisões em massa, interrogatórios acompanhados de tortura, simulacros de julgamentos, deportações para as colónias.

 

O campo de concentração do Tarrafal foi criado para acolher presos do 18 de Janeiro.  Na primeira leva de 152 presos que o foram estrear, 37 tinham participado no 18 de Janeiro. António Guerra, que liderou a ocupação da Estação dos Correios, condenado a 20 anos de degredo, ali morreu em 1948. O líder do movimento, o ferroviário, militante do PCP, Manuel Vieira Tomé foi brutalmente torturado, vindo a morrer no cárcere em Abril do mesmo ano. Houve centenas de prisões e de deportações.

 

Os sovietes ou conselhos operários foram uma inovação na luta de classes criada na Revolução Russa de 1905.  Antes,  na Comuna de Paris (1875), haviam existido estruturas semelhantes. Foi Rosa Luxemburgo, sobretudo na sua Greve de Massas, Partidos e Sindicatos, uma das primeiras teorizadoras deste tipo de organização. Os «conselhos operários» voltaram a aparecer  na Rússia de 1917, na Revolução Húngara de 1919, na Revolução Espartaquista, na Alemanha, entre 1918 e 1919.

 

Estas e outras experiências forneceram as bases para a tese dos conselhos formulada por Anton Pannekoek. Os conselhos surgiriam  também  em Espanha durante a Guerra Civil. Em Portugal após o 25 de Abril de 1974, sobretudo o Partido Revolucionário do Proletariado, defendeu a criação de conselhos operários, que, com outras assembleias de base, dariam lugar a um sistema de democracia directa, conceito oposto à democracia representativa que nos governa.

 

 

publicado por Carlos Loures às 07:00

editado por Luis Moreira em 17/01/2011 às 22:36
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Quinta-feira, 22 de Julho de 2010

Bakunine por Bakunine

CARTA A ELISÉE RECLUS

Meu caro amigo. Agradeço-te muito pelas tuas boas palavras. Jamais duvidei da tua amizade, este sentimento é sempre mútuo e eu julgo o teu em relação ao meu.

Sim, tens razão, a revolução no momento foi ao leito, recaímos no período das evoluções, quer dizer, naquele das revoluções subterrâneas, invisíveis e frequentemente mesmo insensíveis. A evolução de hoje é muito perigosa, se não para a humanidade, pelo menos para certas nações. É a última encarnação de uma classe esgotada, jogando seu último jogo, sob a protecção da ditadura militar macmahono – bonapartista na França, bismarckiana no resto da Europa.


Lugano, 15 de Fevereiro de 1875. Archives Bakounine, Tomo V. op-pp. LXXXIII - LXXXIV.

Eu concordo contigo em dizer que a hora da revolução passou, não por causa dos horrorosos desastres dos quais fomos testemunhas e das terríveis derrotas das quais fomos vítimas culpadas, mas porque, para meu grande desespero, constatei e constato todos os dias que o pensamento, a esperança e a paixão revolucionários não se encontram absolutamente nas massas, e quando elas estão ausentes, de nada vale fazer esforços inúteis. Admiro a paciência e a perseverança heróicas dos prussianos e dos belgas – estes últimos moicanos da falecida Internacional - e que apesar de todas as dificuldades, adversidades, apesar de todos os obstáculos, no meio da indiferença geral, opõem sua fronte obstinada ao curso absolutamente contrário das coisas, continuando a fazer tranquilamente o que fizeram antes das catástrofes, quando o movimento geral era ascendente e o mínimo esforço criava uma força. Trabalho ainda mais meritório, visto que não colherão os frutos, mas eles podem estar certos de que o trabalho não será perdido nada se perde neste mundo – e as gotas de água, por serem invisíveis, nem por isso deixam de formar o oceano.

Quanto a mim, meu caro, tornara-me muito velho, muito doente, muito desencorajado, e, devo-te dizer, sob muitos pontos de vista muito desiludido, para sentir o desejo e a força de participar nesta obra.

Decididamente retirei-me da luta e passarei o resto dos meus dias numa contemplação não desocupada, bem ao contrário, intelectualmente bem activa, e que, espero, não deixará de produzir alguma coisa de útil.

Uma das paixões que me domina, neste momento, é uma imensa curiosidade. Uma vez que tive de reconhecer que o mal triunfou e que não pude impedi-lo, pus-me a estudar as suas evoluções e os seus desenvolvimentos com uma paixão quase científica, completamente objectiva.

Que actores e que cena. No fundo, e dominando toda a situação na Europa, estão o Imperador Guilherme e Bismarck, à frente de um grande povo lacaio. Contra eles, o papa, com seus jesuítas, com toda a Igreja católica e romana, ricos em biliões, dominam uma grande parte do mundo através das mulheres, pela ignorância das massas, e pela habilidade incomparável dos seus inúmeros filiados, tendo os seus olhos e as suas mãos em todos os lugares.

Terceiro actor – A civilização francesa, encarnada em Mac-Mahon, Dupanloup e Broglie, colocando as correntes num grande povo em declínio. E em torno de tudo isso, a Espanha, a Itália, a Áustria e a Rússia, fazendo cada uma sua careta de ocasião, e de longe a Inglaterra, não podendo decidir-se a voltar a ser alguma coisa, e ainda mais longe, a República modelo dos Estados Unidos da América, já se engraçando com a ditadura militar.

Pobre humanidade!

É evidente que ela só poderá sair desta cloaca por uma imensa revolução social. Mas como fará esta revolução? Nunca a reacção internacional da Europa esteve tão formidavelmente armada contra todo o movimento popular. Ela fez da repressão uma nova ciência que se ensina sistematicamente nas escolas militares aos tenentes de todos os países. Para atacar esta fortaleza inexpugnável o que temos? As massas desorganizadas. Mas como organiza-las, quando elas não são suficientemente apaixonadas pela sua própria salvação, quando elas não sabem o que devem querer e quando não querem a única coisa que pode salvá-las.

Resta a propaganda, tal como a fazem os jurassianos e os belgas. É alguma coisa sem dúvida, mas muito pouca coisa, algumas gotas de água no oceano; e se não houvesse outro meio de salvação, a humanidade teria tido tempo de apodrecer dez vezes antes de ser salva.

Resta uma outra esperança: a guerra universal. Estes imensos Estados militares devem-se entre destruir e se entre devorar, cedo ou tarde. Mas que perspectiva!

__________________________________________

Bakunine refere os habitantes da Cordilheira de Jura: O Jura é uma cadeia de montanhas culminando a 1720 m, situada ao norte dos Alpes, na França, Suíça e Alemanha.

Em França, cobre essencialmente a região Franche-Comté e estende-se pela região Rhône-Alpes, a leste do departamento de Ain e a noroeste do départamento da Savoie (Savóia) (chaîne de l'Epine e dent du Chat).
Na Suíça, cobre a fronteira oeste com a França, nos cantões de Basiléia, Soleura (Solothurn), Jura, Berna, Neuchâtel e Vaud.
A cordilheira prolonga-se pela Alemanha por dois planaltos calcários de altitude modesta, o Jura suabo e franconiano, situados principalmente na Baviera.
O Jura deu nome ao departamento francês do Jura e ao cantão suíço do Jura

O túmulo de Bakunin no cemitério de Bremgarten, em Berna.
publicado por Carlos Loures às 15:00
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Sexta-feira, 16 de Julho de 2010

Bakunine por Bakunine (Raúl Iturra)

 MARX E A INTERNACIONAL: CARTA AOS INTERNACIONAIS DE BOLONHA - 5 (Continuação)




Os operários de todas as profissões, de todas as comunas, de todas as regiões e de todas as nações, constituem uma grande e única fraternidade internacional, organizada para empreender esta luta contra o mundo burguês; quem falte a esta solidariedade prática na luta, indivíduo, secção, ou grupo de secções, é um traidor.


Eis a nossa lei realmente, única obrigatória. Há, além disso, as disposições do regulamento primitivo que impõe a cada secção o dever de pagar anualmente ao Conselho Geral dez centavos por cada um dos seus membros, enviar-lhe a cada três meses um relatório detalhado sobre a sua situação interna e atender a todas as suas reclamações quando elas estiverem conformes aos estatutos gerais, e eis tudo. Quanto ao resto, quer dizer, tudo o que constitui a própria vida, o próprio desenvolvimento, o programa e o regulamento particulares das secções, as suas ideias teóricas, assim como a propaganda destas ideias, a sua organização e a sua federação material, desde que nada do objectivo real esteja em contradição com os princípios e com as obrigações explicitamente enunciados nos estatutos gerais, é deixado à plena liberdade das secções.

Esta inexistência de um dogma único e de um governo central na nossa grande Associação Internacional, esta liberdade quase absoluta das secções, revoltam o doutrinário e o autoritarismo do homem de Estado – profeta Mazzini. E, entretanto, foi precisamente esta liberdade que ele denomina anarquia e que, fundada sobre a verdadeira fonte e base criadora da nossa unidade real, sobre a identidade real da situação e das aspirações do proletariado de todos os países, foi esta liberdade que criou uma verdadeira conformidade de ideias e de toda a potência da Internacional.

Até 1871, como eu já disse, a acção do Conselho Geral foi completamente nula. Ele fez intrigas e formou esse partido da democracia – socialista na Alemanha, quer dizer, viciou o movimento do proletariado alemão. Foi um mal positivo. Ele ocupou-se também da organização da Internacional em Inglaterra e na América. Isto foi positivo, mas no resto da Europa, na Bélgica, em França, em toda a Suíça romanche, na Itália, em Espanha, ele não fez absolutamente nada. Entretanto, foi precisamente durante este período da sua inacção forçada que a internacional apresentou um crescimento formidável na maioria destes países. Bruxelas, Paris, Lyon e, naquele momento, mas não agora, Genebra, formaram centros de propaganda, as secções de todos os países confraternizaram e federaram-se espontaneamente entre elas, inspirando-se num mesmo pensamento. Foi assim que membros da secção da Aliança da democracia socialista, fundada no final de 1868, em Genebra, formaram as primeiras secções da Internacional em Nápoles, Madrid e Barcelona. Hoje, a Internacional em Espanha, cujos primeiros germes foram levados por um italiano, tornou-se uma verdadeira potência. O Conselho Geral não somente não teve nenhuma parte nesta propaganda e nestas criações, como também as ignorou, enquanto as novas secções, tanto espanholas e italianas quanto francesas, não lhe notificaram a sua constituição.

Alguém poderia perguntar que utilidade pode ter tido a existência de um Conselho Geral, cuja influência sobre o caminho e o desenvolvimento de uma grande parte da Europa, e especialmente de todos os países latinos e eslavos, foi tão completamente nula.

Ora, a utilidade desta existência foi imensa. O Conselho Geral era o sinal visível da internacionalidade para todas as secções nacionais e locais. Lembrai-vos que as secções da Internacional são secções operárias; que elas são compostas de homens pouco instruídos, pouco habituados às amplas concepções e, além do mais, esmagados por um trabalho mortificante e pelas preocupações ainda mais mortificantes de uma existência quotidiana miserável.

Abandonadas a elas próprias, estas secções estenderam com dificuldade o seu pensamento e a sua solidariedade prática para além dos limites da sua própria comuna e da sua própria profissão.

Mas havia os estatutos gerais, o programa e o regulamento internacionais das secções; isso não bastava. Os operários, a grande massa dos operários lê pouco e esquece facilmente o que lê. Assim, a simples existência desse programa e desse regulamento escrito, e o seu simples conhecimento teórico, não bastavam. Sabemos por experiência que os operários só começam a conhecê-los realmente quando os praticam, e uma das primeiras condições desta prática era precisamente esta convergência unânime das secções de todos os países para um centro internacional comum. Todas as secções, os operários internacionais de todos os países, lá se encontravam, se abraçavam, confraternizavam por assim dizer, em imaginação, em ideia.

As relações reais com o Conselho Geral, é verdade, eram nulas. Mas os dez centavos que cada operário, de qualquer país e de qualquer secção que fosse, enviada por intermédio do seu comité seccional e do seu comité federal ao Conselho Geral de Londres era para ele o sinal visível, sensível, da sua adesão ao princípio humano e amplo da internacionalidade. Era para ele a negação real das estreitezas da nacionalidade e do patriotismo burguês.

O próprio distanciamento do Conselho Geral, a impossibilidade real na qual se encontrava, e na qual se encontra ainda hoje, de se imiscuir de uma maneira efectiva nos assuntos das secções, das federações regionais e dos grupos nacionais, era ainda um bem. Não podendo intrometer-se nos debates quotidianos das secções, só o tornava mais respeitado, e ao mesmo tempo não impedia as secções de viver e de se desenvolver com toda a liberdade. Ele era respeitado, é verdade, um pouco como se respeitam os Deuses, muito em imaginação.

Entretanto, ele não estava tão afastado assim para que não pudesse dizer algo quando necessário. Mas só lhe reconheciam esse direito de falar quando se tratava de lembrar a uma secção ou a um grupo algum artigo esquecido dos estatutos gerais, do qual ele era considerado como o guardião e o explicador, quando necessário, excepto o pedido no congresso, em presença do qual ele cessava de existir. Como até 1869 pelo menos, jamais tinha deixado o seu papel e havia escrupulosamente respeitado todas as liberdades nacionais e locais, quando ele falava, a sua voz era escutada por todos, com respeito. Como ele era e como permanece ainda em grande parte composto de homens que tinham tomado parte activa na própria fundação da Internacional, ele gozava de autoridade moral ainda maior porque a usava raramente e nunca havia abusado dela. Em todas as dificuldades que advinham, seja uma secção, seja uma federação regional ou nacional, dirigia-se a ele de bom grado, não como a um tutor ou a um ditador, mas como a um amigo experiente. Se se reclamasse de alguma coisa era de sua preguiça e de sua negligência, pois não respondia quase nunca, e sempre muito tarde.

Enfim, ele tinha ainda dois grande deveres práticos a cumprir, os quais, é preciso que se diga, quer por falta de tempo – os seus membros não sendo remunerados tinham de trabalhar para viver, – quer por falta de meios, ele sempre se saiu muito mal.

O primeiro dos seus deveres era o de dar conhecimento a cada grupo nacional do que se passava em todos os outros grupos. Este dever foi-lhe lembrado por todos os congressos. Nunca ele o tinha cumprido.

Outro dever era, em caso de greve de operários internacionais num país qualquer, chamar os operários internacionais de todos os outros países em seu socorro. Pois bem, o apelo do Conselho Geral sempre veio muito tarde nessas ocasiões.

Mas essas negligências mais ou menos forçadas do Conselho Geral foram suficientemente compensadas pela própria actividade das secções e pelas relações de fraternidade real que espontaneamente se estabeleceram entre diferentes grupos nacionais. Por esta federação espontânea das secções e dos grupos, pela correspondência entre elas, e não pela acção do Conselho Geral, foi que se formou pouco a pouco a unidade real de pensamento, de acção, e a solidariedade prática dos operários de diferentes países, na Internacional.

Ilustração: cartão de membro de Bakunin na Liga de Paz e Liberdade

publicado por Carlos Loures às 15:00
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Quarta-feira, 14 de Julho de 2010

Bakunine por Bakunine (Raúl Iturra)

MARX E A INTERNACIONAL: CARTA AOS INTERNACIONAIS DE BOLONHA - 3  (Continuação)


Na realidade, é a camarilha alemã que domina e faz tudo no Conselho Geral. Os seus membros ingleses, como verdadeiros insulares, e ingleses que são, ignoram o continente, só se preocupam exclusivamente com a organização das massas operárias em seu próprio país. Tudo o que se fazia no Conselho Geral era unicamente feito pelos alemães sob a direcção exclusiva de Marx.

Por sinal, até Setembro de 1871, a acção do Conselho Geral, do ponto de vista propriamente internacional, foi totalmente nula, de tal forma nula que jamais cumpriu com as obrigações que os Congressos tinham, um de cada vez, imposto, como por exemplo as circulares que ele devia publicar todos os meses sobre a situação geral da Internacional e que jamais publicou. Em relação a este facto houve muitas razões. Inicialmente, o Conselho Geral sempre foi muito pobre. Nós que conhecemos bem o estado das finanças da Internacional, rimos e continuamos a rir quando lemos, nos jornais oficiais e oficiosos de diferentes países, as fábulas sobre as somas imensas que Londres envia para todos os lugares para fomentar a revolução. O facto é que o Conselho Geral sempre se encontrou numa posição financeira excessivamente miserável.

Não deveria ser assim se todas as secções que se encontram estabelecidas sob a bandeira da Internacional, em todos os países, lhe tivessem regularmente enviado os dez centavos por membro ordenados pelos estatutos. A maioria das secções não o fez, até aqui.

A segunda causa da inacção do Conselho Geral foi a seguinte: não havia a mínima possibilidade, até 1871, para o estabelecimento da dominação alemã. As secções francesas e belgas e, em parte, as da Suíça romanche que dominavam nos Congressos eram muito orgulhosas, muito ciumentas da sua independência para se submeter à ditadura de uma seita alemã. Os delegados das sociedades operárias da Alemanha e da Suíça alemã só começaram a tomar parte das discussões dos Congressos da Internacional depois de 1869. Apresentaram-se pela primeira vez, em número considerável, no último Congresso de Basileia (Setembro de 1869), após se terem constituído previamente em partido da democracia socialista pangermânico, sob a inspiração directa e sob a direcção indirecta de Marx que, residindo em Londres, fazia-se e faz-se representar ainda no seio do proletariado, tanto da Alemanha propriamente dita, quanto da Áustria, principalmente por seu discípulo, judeu como ele, Liebknecht, e por muitos outros partidários fanáticos, na sua maioria judeus também.

Os judeus constituem hoje na Alemanha uma verdadeira potência. Ele próprio judeu, Marx tem em torno de si, tanto em Londres quanto em França e em muitos outros países, mas sobretudo na Alemanha, uma multidão de pequenos judeus, mais ou menos inteligentes e instruídos, vivendo principalmente da sua inteligência e revendendo as suas ideias a retalho.

Reservando para si próprio o monopólio da grande política, ia dizendo, da grande intriga, abandona de bom grado o lado pequeno, sujo, miserável, e é preciso dizer que, sob esse aspecto, possante centralização do Estado, e lá, onde sempre obedientes a seu impulso, à sua elevada direcção, eles lhe prestam grandes serviços: inquietos, nervosos, curiosos, indiscretos, tagarelas, agitados, intrigantes, exploradores, como o são os judeus em todos os lugares, agentes de comércio, académicos, políticos, jornalistas, numa palavra, corretores de literatura, ao mesmo tempo que corretores de finanças, apoderam-se de toda a imprensa da Alemanha, a começar pelos jornais monarquistas mais absolutistas até aos jornais absolutista radicais e socialistas, e desde muito tempo reinam no mundo do dinheiro e das grandes especulações financeiras e comerciais: tendo assim um pé no Banco, acabam de colocar nestes últimos anos o outro pé no socialismo, apoiando assim seu posterior sobre a literatura quotidiana da Alemanha... Podem-se imaginar o tipo de literatura nauseabunda que estes factos históricos devem criar...

Bem, todo esse mundo judeu que forma uma única seita exploradora, um tipo de povo sanguessuga, um parasita colectivo devorador e organizado nele próprio, não apenas através das fronteiras dos Estados, mas através mesmo de todas as diferenças de opiniões políticas, este mundo está actualmente, em grande parte pelo menos, à disposição de Marx de um lado, e dos Rothschild do outro. Eu sei que os Rothschild, reaccionários como são, apreciam muito os méritos do comunista Marx; e que, por sua vez, o comunista Marx se sente invencivelmente arrastado, por uma atracão instintiva e uma admiração respeitosa, em direcção ao génio financista dos Rothschild. A solidariedade judia, esta solidariedade tão possante que se manteve através de toda a história, une-os.

Isto deve parecer estranho. O que pode haver de comum entre o socialismo e o grande Banco? É que o socialismo autoritário, o comunismo de Marx quer a possante centralização do Estado, e lá, onde há centralização do Estado, deve haver necessariamente um Banco central do Estado, e lá, onde exista tal Banco, os judeus estão sempre certos de não morrer de frio ou fome. Ora, a ideia fundamental do partido da democracia socialista alemã é a criação de um imenso Estado pangermânico e, por assim dizer, popular, republicano e socialista – de um Estado que deve englobar toda a Áustria, os eslavos, a Holanda, uma parte da Bélgica, uma parte da Suíça pelo menos, e toda a Escandinávia. Uma vez que ele tivesse englobado tudo isso, natural e necessariamente ele acabaria por englobar todo o resto. A influência desmoralizante deste partido fez-se sentir há um ano na Áustria e faz-se sentir agora na Suíça.

Em 1868, ocorreu no proletariado da Áustria um movimento espontâneo magnífico. Nas suas assembleias populares, os operários de Viena e de muitas outras grandes cidades da Áustria tinham proclamado em voz alta que, compostos de raças diferentes, alemães, eslavos, magiares, italianos, eles não queriam nem podiam içar em comum nenhuma bandeira nacional, deixando a cada país o desenvolvimento absolutamente livre da sua nacionalidade particular, tão sagrada quanto o direito natural que é a própria individualidade de cada homem. Mas em comum eles só queriam içar a bandeira da emancipação dos trabalhadores, a bandeira da revolução social, a bandeira da fraternidade humana que deveria tremular sobre as ruínas de todas as pátrias políticas, quer dizer, das pátrias constituídas em Estados que se denominam nacionais, separados vaidosamente, ciumentamente, ambiciosamente, hostilmente, e para tudo dizer numa única palavra, burguesmente, um do outro (todo o Estado nada mais sendo do que uma exploração do proletariado organizada em favor da burguesia), e a pátria política jamais sendo a pátria das massas populares, mas sempre as das classes exploradoras e privilegiadas. A pátria do povo é natural, não artificial, e tem como base principal, real, a comuna. Eis porque Mazzini, teólogo e burguês, atacou com tanta obstinação o programa da Comuna de Paris, e eis porque o general Garibaldi, cujo grande coração bate uníssono com o coração do povo e que possui a intuição dos grandes instintos e dos grandes factos populares, declarou-se a favor da Comuna de Paris e pela Internacional, contra Mazzini.

Em consequência, numa assembleia popular imensa, os operários de Viena recusaram solene e unanimemente todas as proposições pangermânicas e patrióticas dos democratas burgueses da Alemanha e votaram uma mensagem de fraternidade, de aliança íntima com todos os trabalhadores revolucionários socialistas da Europa e do mundo. Eles adivinharam por instinto todo o programa da Internacional.

(Continua)

Ilustração: cartaz da década de 1880 retratando Bakunine como um "Danton moderno".
publicado por Carlos Loures às 15:00
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