Sexta-feira, 19 de Novembro de 2010
Carlos Mesquita
As pressões para que o FMI venha a Portugal, com as suas medidas de austeridade mais gravosas que as do orçamento aprovado para 2011, são mais internas que de fora. Todos os organismos internacionais, incluindo o próprio FMI, consideram que os portugueses são capazes de resolver o problema grave da crise, sem recorrer ao fundo de emergência da União Europeia que trará o FMI. No entanto, a imprensa portuguesa mais relevante, televisões e jornais de referência, continuam a campanha da inevitabilidade de apelarmos ao FMI. Parece estúpido é estúpido; ainda por cima havendo já empresas jornalísticas a dispensar pessoal.
São vários os títulos alarmistas retirados de entrevistas que lidas os contradizem. Estudos como o “Fiscal Monitor” do FMI que considera “as perspectivas orçamentais terem melhorado a um ritmo muito mais rápido que o esperado” e que o Fundo lamenta que os mercados possam estar a sobrestimar o risco de incumprimento dos países problemáticos, deu lugar a títulos como – FMI lamenta a falência “quase certa” de Portugal – o quase certa está entre aspas porque é retirado do estudo, que diz, “a ocorrência de eventos de crédito em algumas economias avançadas é quase certa aos olhos dos mercados” (eventos de crédito são falhas no pagamento), FMI lamenta a falência de Portugal, não está entre aspas porque o FMI não diz nada parecido com isso no estudo, no entanto é título, é manipulação, não se entendem as intenções. Suponho que os jornais no oportunismo de acompanharem presumíveis ventos de mudança na governação, nem se aperceberam que Passos Coelho já mudou de discurso. Ele agora diz “acreditar na capacidade do país para sair da crise” e até considerou importante o crescimento do PIB.
A burrice dos meios de comunicação ficaria com eles se não tivesse influência no comportamento dos portugueses, mas tem como se nota pelos indicadores de confiança quer na procura interna quer no investimento.
Na última sexta-feira o Instituto Nacional de Estatística divulgou que o Produto Interno Bruto (riqueza criada) cresceu no 3º trimestre 0.4% face ao 2º trimestre, e 1,5% face ao mesmo período do ano passado; mas a procura interna, que foi positiva no 2º trimestre, foi negativa no 3º. As campanhas de descrédito feitas em território português por portugueses têm estes efeitos, provavelmente sem a histeria mediática e o medo instigados, poderíamos ter um orçamento para 2011 menos recessivo, com recuperação de emprego e desenvolvimento económico. O aumento das exportações estão a suportar a economia, os outros sectores poderiam pelo menos não estragar o que de bom está aí a ser feito; a começar pelos partidos cuja necessidade de estar em permanente campanha eleitoral só tem trazido dificuldades ao país produtivo.
Sexta-feira, 17 de Setembro de 2010
Carlos Mesquita
Os números oficiais sobre a economia nacional não são suficientes para a compreensão do momento que passamos.
Hoje foi dia de alerta para a divida pública, amanhã será para outro indicador, em seguida para um outro, e com o decorrer dos episódios pode ser que os menos autistas percebam o enredo.
Toda a gente ouve falar das dificuldades das empresas, mas quem está no convento é que sabe o que lhe vai dentro. Contacto diariamente com industriais de PMEs, vou às empresas, falo com os quadros e outros profissionais, acompanho a produção, e vejo os seus semblantes. Conheço há muitos anos a maioria dos meus fornecedores e dos seus empregados, nunca os vi tão preocupados como agora, apesar de terem passado por várias crises económicas.
Sei o que é tentar sobreviver enquanto vemos em redor empresas como a nossa a fechar. Escapar num naufrágio generalizado pode ser deitar fora lastro para se manter á tona da água, mas não estão a largar o que é supérfluo, estão a dispensar os trabalhadores mais qualificados que pesam demasiado nos custos. Já não compram novos equipamentos para bater através da inovação a concorrência, nivela-se por baixo, produz-se com ferro-velho, está tudo no mesmo barco.
A indústria transformadora portuguesa nunca esteve de tão fraca saúde, sem crédito bancário, sem trabalho, acumulando dívidas aos fornecedores e ao Estado, esperando por melhores dias que lhe permitam restaurar a actividade e ter lucros suficientes para suprir as dívidas. Esperança vã em minha opinião, com as margens de lucro esmagadas com que se produz, jamais haverá recuperação. Dantes sabia-se que as crises eram passageiras, agora começa a haver a percepção que podem vir para ficar, ou pelo menos tempo suficiente para destruir o tecido empresarial existente de forma irreparável. Depois do que se passou no sector primário, agricultura e pescas, é chegada a vez da indústria. Sem medidas correctivas ao nível do crédito, dos custos energéticos e da fiscalidade, mais empresas vão encerrar, e o desemprego que ainda não reflecte a totalidade dos efeitos da crise, só pode aumentar.
A verdade é que o investimento está a baixar, a melhoria das exportações e a retoma do consumo privado foram (segundo o INE) suprimidas pelas importações (duplicadas pela compra de material militar e o aumento do preço do petróleo) e as ordens da Alemanha é de que não nos preocupemos com o crescimento, mas apenas e só com a divida pública.
Todos os partidos discutem o sexo dos anjos e a eunuca revisão constitucional, e nós o que podemos fazer? Talvez só nos reste esperar pela pancada, e ir abordando os assuntos sérios no meio da alienação geral.
2010-09-17 Carlos Mesquita