«Tenho o direito de escolher a melhor escola para o meu filho!», clamava para as câmaras da TV uma manifestante de T-shirt branca durante um dos barulhentos protestos SOS com que as «escolas públicas» (com aspas) privadas têm tentado convencer o governo a continuar a pagar-lhes mais pelo serviço do que paga às escolas públicas sem aspas. O problema talvez não seja, porém, o do direito da manifestante de escolher a melhor escola para o seu filho. O problema é ela achar que a factura da sua por assim dizer «liberdade de escolha» deve ser paga pelo Estado, ou seja, por todos os contribuintes, incluindo aqueles cujos filhos têm o direito de «escolher» a escola pública da sua área de residência e é um pau.
Zangaram-se as comadres, ministérios da Educação e das Finanças por um lado, empresariado do «ensino público» privado por outro, e descobriram-se espantosas e desvairadas verdades. Que, por exemplo, como reconhece o próprio site das escolas com contrato de associação (www.e-contrato-associacao.com), «nos termos da lei», o financiamento do Estado deveria ser uma coisa e que, «todavia, a prática seguida tem sido» outra, sendo dessa «prática» outra que os colégios querem continuar a usufruir. Não seria altura de apurar que cumplicidades permitiram que, ao longo de décadas, milhões de euros do Estado tenham ido parar a mãos privadas, na maior parte dos casos da Igreja Católica, sem suporte legal ou para além dele?
Os privados argumentam que prestam um serviço público «onde a oferta da escola do Estado é (presente do indicativo) insuficiente ou, em muitos casos, inexistente». A verdade, porém, é que o Estado anda a financiar escolas privadas em localidades onde há uma, ou mais, ou mesmo muitas mais – e, às vezes, literalmente a meia dúzia de metros – escolas públicas com falta de alunos.
Dizem-se ainda os colégios com contratos de associação «escolas públicas, pois, ao abrigo desse contrato, os alunos podem frequentar a escola gratuitamente e a escola não pode recusar a frequência de alunos da sua área de implantação».
Ora basta ir à net e ler os regulamentos internos de numerosas dessas escolas para verificar como despudoradamente aí se anunciam critérios de selecção bem diferentes da «sua área de implantação», sejam eles o «percurso educativo do candidato» e a sua adesão, e dos pais, ao «Ideário e Projecto educativo do Colégio» (isto num colégio de «Ideário «maiusculamente católico de Coimbra, em que é «dever» dos alunos «desenvolver uma devoção especial a Nossa Senhora» e dos professores «participar na oração comunitária da manhã na capela») seja reservando-se um outro colégio (igualmente católico) «o direito de aceitar o pedido de inscrição do aluno, bem como o de recusar a renovação da matrícula ou a sua continuidade de frequência», seja ainda divulgando-se preçários de propinas a pagar para os alunos poderem frequentar a tal «escola pública» gratuita.
O rol de ilegalidades e indignidades parece não ter fim e, havendo verdade no que diz o SPRC (alguma verdade haverá, pois várias dessas situações foram já objecto de condenação judicial), incluem recibos de professores com valores superiores aos efectivamente pagos, obrigação de devolução em cash, dos subsídios recebidos, professores em licença de maternidade que tiveram de entregar ao colégio os seus cheques da Segurança Social, registos biográficos falsificados, pagamentos de actividades feitos pelo ME e pelos pais que não chegam às mãos dos professores, etc.
Até a mim, que não tenho nada com o assunto a não ser enquanto cidadão, me apetece gritar SOS.
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Interessa defender as boas escolas, as que apresentam resultados, baseadas no mérito e na avaliação de todos os que nela trabalham. É, nestes principios, que temos que centrar o debate e não na escola estatal versus privada. Soubemos hoje que os professores das escolas privadas, para assegurarem o seu emprego aceitam baixar o vencimento, por forma a que as despesas sejam contidas de acordo com o financiamento definido pelo Estado. Esta posição mostra bem como são diferentes as realidades de quem tem emprego assegurado para toda a vida, seja qual for o resultado do seu labor ou o seu comportamento quanto à assiduidade e os que têm que lutar pela vida. |
Este tema tem estado a ser debatido com o pluralismo de opiniões que é norma neste blogue. Algumas das teses expendidas reflectem, naturalmente, as tendências ideológicas dos seus autores o que, numa perspectiva mais ampla, fere a objectividade das conclusões. Este texto de Rui de Oliveira, publicado em Dezembro passado, repõe essa objectividade, fugindo à manipulação que usualmente se faz dos números. Parece-nos útil repetir a publicação de A OCDE e os seus números.
Dados factuais vindos a público nos últimos tempos merecem certamente a reflexão dos leitores do Estrolabio, nuns casos desfazendo algumas inverdades , noutros tentando colocar numa perspectiva mais justa a crítica às políticas educativas governamentais.
1. Surpreendeu-me, da parte de alguns que tinham há cerca de 2 anos criticado como demasiado “favoráveis” ao Governo as estimativas da OCDE, afirmar-se agora, na defesa do ensino privado, que “…um aluno do ensino não-estatal contratualizado (ENEC) custa-nos a todos 4.200 euros por ano, um aluno do ensino estatal custa-nos 5.200 euros por ano (OCDE)” (in Joaquim Azevedo, Público 26-11-2010).
Não será exacto. Não só o esclarecimento “oficial” em artigo do Secretário de Estado da Educação (vide Torcato da Mata, in http://www.aventar.eu/2010/12/04/hoje-nasceram-galinhas-com-dentes/) contraria aqueles valores, como um acérrimo contraditor da política educativa do Governo, Santiago Carrilho, em artigo no Público (8-12-2010) explica “… como os números usados pela OCDE se referem ao ano de 2007, há que ir ao respectivo Orçamento do Estado para os colher sem a tal ponderação. Vemos, assim, que foram despendidos 4.971,7 milhões de euros com 1.313.523 alunos. O que dá um custo médio de 3.785 euros. Bem longe dos 5.200 euros invocados por Joaquim Azevedo. E se os 4.200 que aponta como custo do privado estão certos, então a conclusão inverte o ónus da mentira: o custo do ensino privado é superior ao custo do ensino público.” E, sobre o fundo da questão, a revisão das condições de financiamento das escolas privadas, clarifica, com o que estou em acordo absoluto, “…
O sistema de ensino português tem dois subsistemas: um público, outro privado. Querer tornar os dois indiferenciáveis é uma subtileza para fazer implodir o princípio da responsabilidade pública no que toca ao ensino.” E essa está fixada constitucionalmente e é a obrigação de criar “uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população”.
2. Outro leque de dados é o divulgado pelo PISA (Programme for International Student Assessment) recentemente. A sua leitura confirma uma incontestável melhoria, não tanto no lugar dos estudantes portugueses (ainda modesto) na tabela do universo escolar dos países testados, mas sobretudo na boa taxa de progressão na literacia da leitura e das ciências, menos boa na literacia matemática. Parece indiscutível que medidas estruturais favoreceram esta progressão, o Plano Nacional de Leitura, o Plano de Acção para a Matemática, a modernização do parque escolar e a melhoria das suas bibliotecas, entre outras.
Como também, no plano curricular, um reforço de avaliação através de exames formais, mesmo as aulas de substituição, devem ter pesado para um clima de maior responsabilidade que se reflecte a prazo nos resultados obtidos. E, como os testes do PISA, isentos (segundo os observadores) de influência governamental, são aleatórios e (quase) iguais para todos os 470 mil alunos dos 33 países avaliados, cairá bastante por terra o mito do facilitismo intencional dos nossos exames, sendo mais provável o carácter errático da sua preparação a nível ministerial.
Por último e segundo especialistas, o volume de dados fornecidos pela OCDE (ainda não totalmente) é de dimensão suficiente para um estudo científico aprofundado durante algum tempo, no sentido de avaliar com exactidão aspectos parcelares como o investimento em computadores portáteis, o acesso à banda larga, o aumento do apoio social escolar, a formação dos docentes, a criação de novas ofertas em cursos profissionais, etc, etc. Dispensar-se-ia, pois, tanto uma euforia governamental excessiva, quanto uma reacção sindical e corporativa dos professores que não saem mal deste retrato internacional – desde que aceitem de boa fé uma sua avaliação rigorosa.
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