Prof. Manuel Sobrinho Simões Entrevista
Nunca é demais ouvirmos o Prof. Sobrinho Simões, um prestigiado cientista que não fala só de ciência
Manuel Sobrinho Simões, médico, investigador, professor, contador de histórias.
O Norte e o Porto são o seu território, o Hospital de São João e a
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto a sua casa,
o Ipatimup (Instituto de Patologia e Imunologia Molecular) a sua ilha.
Uma ilha que está ligada aos cinco continentes através da ciência e do ensino.
Manuel Sobrinho Simões, 63 anos, prémio Pessoa em 2002,
recebeu muitas outras distinções nacionais e internacionais
e é um dos mais consagrados peritos do mundo
em oncologia, sobretudo em cancro da tiróide.
Sobrinho Simões é um português ao serviço da humanidade.
Admiramos o sucesso dos aldrabões
O empobrecimento das famílias entristece-o. A desgovernação do país tira-o do sério.
Manuel Sobrinho Simões, médico, investigador e professor universitário, diz que Portugal continua a ser vítima do conflito de interesses que grassa entre as conveniências dos partidos e dos políticos e as necessidades do país e dos portugueses. Uma análise interessada para ajudar a sair da crise e a permanecer no euro. Nem que tenhamos de fazer o pino.
- Em três semanas tivemos quatro dias de descanso extra.
Ele foi a tolerância de ponto para Lisboa, a greve geral, um feriado civil e na próxima quarta-feira teremos um religioso. Como é que avalia a nossa relação com o trabalho?
No nosso país, uma pessoa que trabalhe todos os dias e que tenha de assinar ponto é visto como um falhado. Quando me tornei professor catedrático até os meus amigos de Arouca ficaram decepcionados quando perceberam que a minha vida ia continuar a fazer-se das mesmas rotinas. E mais recentemente, no Hospital de São João (Porto), a maior parte dos professores da Faculdade de Medicina foram contra a fiscalização do horário de trabalho dos médicos através da leitura da impressão digital - o dedómetro - mas eu fui a favor. É humilhante? É. Sobretudo para quem tem funções de direcção. Mas tem de ser assim, porque infelizmente muitos de nós não cumprimos. Caricaturando a coisa, pode dizer-se que em Portugal só quem não sabe fazer mais nada é que trabalha, isto é, tem uma rotina, cumpre horários, produz e presta contas.
- Esses traços são distintivos só dos portugueses?
Não, este problema não é só nosso. A Europa conseguiu garantir boas condições de vida aos seus cidadãos à custa da exploração dos povos e dos países da Ásia, da América Latina e de África. Uma boa parte do Estado Providência assentou na exploração das matérias-primas e do trabalho daqueles países. Com o aparecimento de economias emergentes muito competitivas e a deslocalização das fábricas, a Europa começou a criar menos riqueza e as dificuldades em conseguir manter o chamado estado social começaram a aparecer. Não é por acaso que a França tem de mudar a idade da reforma. É um sintoma.
- Prenúncio do fim do Estado social?
Com o crescimento da Índia, da China e do Brasil, a Europa ressentiu-se e as pessoas começaram a perceber que vão ter de mudar de vida, que o tempo das mordomias já passou.
- Mas para nós, portugueses, esse tempo mal começou...
Pois é, mas para nós vai ser ainda pior. Os portugueses, além de europeus, são culturalmente mediterrânicos, o que não nos afasta muito dos gregos, dos italianos e dos espanhóis do Sul, com todas as influências que são ditadas pela geografia, pelo clima e pela religião. Sermos judaico-cristãos é muito diferente de sermos calvinistas e protestantes. Além disso nunca corremos o risco de morrer de frio e estamos na periferia, não tivemos guerras e ninguém nos chateou. Na verdade, somos muito individualistas e estamos mais próximos dos norte-africanos do que dos povos do Norte da Europa. Somos um país mais mediterrânico do que atlântico, com todas as implicações que isso tem até na nossa produtividade.
- Então a diferença entre nós e o resto da Europa, sobretudo os nórdicos, não está nos genes?
Claro que não. A diferença entre nós e os nórdicos não está nos genes, é fruto da cultura e da educação, da geografia, do clima e da religião. Eles tinham frio, era-lhes difícil cultivar cereais e não tinham vinho. Para sobreviverem tiveram de estimular a inovação e a cooperação. Ao contrário de nós, que tínhamos um bom clima, uma agricultura fértil e peixe com fartura. E depois tivemos África, a seguir o Brasil e logo os emigrantes. Não precisámos de nos organizar e não precisámos de nos esforçar. Não era preciso. Não planeávamos, desenrascávamos. Continuamos assim, gostamos de resolver catástrofes.
- É sindicalizado?
Não.
- Fez greve?
Sim, eu e a maioria dos professores de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina. Fizemos greve e estamos furiosos mas assegurámos o serviço no hospital e demos aulas na Faculdade, onde também não faltámos por causa dos alunos. É uma questão de respeito.
- Estão furiosos com quê?
Com a desgovernação. E o mais grave é que demos sinais errados às pessoas. Agora, vamos ter de evoluir de novo para uma sociedade com capacidade de produção real, com agricultura e pesca.
- Mas todos temos na memória os subsídios que foram concedidos aos agricultores para não produzirem.
Foi terrível. E para piorar as coisas, muitos ficaram deprimidíssimos e frequentemente alcoólicos. Destruíram as vinhas, a sua âncora, que lhes dava prestígio e dignidade pessoal nas suas comunidades, e começaram a passar os dias na taberna. Isto aconteceu em todo o Minho. E no Alentejo também.
- Podemos dizer que o nosso super-Estado tem descurado as necessidades reais dos cidadãos e da sociedade?
Desde o tempo do Dr. Salazar que o Estado faz questão de proteger os seus e nós temos aprovado esse amparo. Por estas e por outras, nas últimas décadas, dominado por ciclos eleitorais curtos, o Estado passou a viver acima das suas possibilidades e a substituir-se à realidade. E, de repente, a realidade caiu em cima do povo.
- Os portugueses têm razões para se sentirem enganados ou não quiseram ver a realidade?
As duas são verdade. Podemos ofuscar o real durante algum tempo, mas não para sempre. As imagens da Grécia, com reformas aos 55 anos ou até mais cedo para as chamadas profissões de desgaste rápido, permitiram-nos perceber que se eles tinham entrado em colapso também nós corríamos o risco de vir a acontecer-nos o mesmo. Até essa altura, creio que muitas pessoas acreditavam, lá no seu íntimo, que nem os países, nem a segurança social, nem o Serviço Nacional de Saúde (SNS), nem as câmaras municipais podiam entrar em bancarrota. Agora já perceberam que isto pode mesmo entrar em ruptura. Para já reduziram até dez por cento o ordenado dos funcionários públicos, mas no ano que vem pode vir a ser necessário chegar aos vinte por cento.
- Não há dinheiro para o Estado social mas tem havido para obras e infra-estruturas. O que pensa disto?
Eu não sei o suficiente para perceber quando é que é necessário um novo aeroporto em Lisboa ou em Beja. Mas como sou um prático, penso que se não é preciso no imediato e temos falta de dinheiro, então temos de investir na criação de riqueza e de emprego e não em obras que têm um retorno mais longínquo.
- Não quer um TGV para o Porto?
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