Sábado, 8 de Janeiro de 2011

Carta aberta a Durão Barroso - 6 - por Júlio Marques Mota

(Continuação)

 

Da Estratégia de Lisboa a uma outra política, a uma outra Europa, à Europa do futuro

 

Senhor Presidente, com a Estratégia de Lisboa em 2000 à União atribuiu-se um novo objectivo estratégico para a década seguinte: “Tornar [-se] no espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo baseado no conhecimento e capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social”. A partir deste objectivo sobre o qual tantos louvores se escreveram, pensámos, a partir daí, que o modelo europeu ia assentar na deslocalização da produção de bens salariais e de tecnologia pouco evoluída para África, para o sueste asiático e em particular para a China. Paralelamente, faria investimentos maciços na educação, na investigação, na formação, assistir-se-ia a um forte aumento do seu “capital imaterial”, o nível de desenvolvimento científico e profissional, assistir-se-ia a um aumento crescente de produções de alto valor acrescentado e teríamos desencadeado o mecanismo da troca desigual, possível sobretudo nas economias globalizadas, entre países de baixos e altos salários para os mesmos níveis de qualificação e com os capitais produtivos completamente móveis à escala internacional. A União Europeia iria, pensávamos, assegurar a obtenção do pleno emprego, com altos salários médios por hora de trabalho e a taxa de lucro igual à do resto do mundo, como resultado da concorrência dos capitais à escala mundial, iria assegurar os mecanismos de riqueza adicional a que se chama de troca desigual. A União Europeia iria crescer fortemente, assente quer nas políticas de pleno emprego quer no resultado do excedente comercial obtido também com o mecanismo da troca desigual: venda de produtos caros, resultantes dos altos salários, compra de produtos baratos devido aos baixos salários dos países produtores destes bens. Por esta via, instalar-se-ia um novo imperialismo, imperialismo não financeiro, imperialismo comercial e tanto mais assim quanto não há no quadro internacional os mecanismos desejáveis de compensação, mas se a saída fosse essa, a Europa seria também outra e generosa poderia compensar estes mecanismos via a ajuda externa. Enganámo-nos redondamente.

 

publicado por Carlos Loures às 21:00

editado por Luis Moreira às 14:55
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Sexta-feira, 7 de Janeiro de 2011

Carta aberta a Durão Barroso - 5 - por Júlio Marques Mota

(Continua)

 

O tsunami silencioso e os direitos dos trabalhadores na Europa

 

Senhor Presidente, enquanto se dá esta desindustrialização, o tsunami silencioso avança, invade a vida daqueles que pouco mais têm que isso, daqueles que não têm meios próprios para viver, daqueles que vivem da riqueza por eles e para outros criada e, muitas vezes, daqueles cuja própria dignidade profissional, por anos de lutas conquistada e pela pressão de agora começam a sentir esmagada. Que o digam trabalhadores da Fiat quando afirmam: “é garantido que votarei sim, que querem que eu faça, tenho uma família”, é garantido que aceitaremos as condições impostas por Sergio Marchionne, patrão da Fiat, é garantido que perderemos os nossos direitos para salvar o emprego. Esta foi a chantagem da Fiat, ao ameaçar não investir na Itália, mas na Polónia; com isto, e mais uma vez, se descobre que a concorrência da União Europeia, do seu Presidente, que os seus mecanismos, preenchem os invernos do nosso descontentamento; esta é a concorrência pelo custo salarial mínimo, assente no mínimo de direitos possíveis em que se pode trabalhar. Mudarmos de produção e de multinacional e tomemos, por exemplo, o que se passou com a General Motors em Estrasburgo. Também aqui os trabalhadores aceitaram perder parte dos seus direitos para conservarem os seus postos de trabalho. Estes disseram sim à compra da unidade fabril pertença da General Motors Corporation, a antiga General Motors, pela General Motors Company, a nova General Motors, disseram sim numa maioria de mais de dois terços. Mas, a General Motors Company apenas compraria esta unidade fabril, especializada na produção de caixas de velocidades automáticas, à General Motors Corporation, se e só se os custos de mão-de-obra baixassem cerca de 10%, de modo a reduzir a diferença de competitividade com uma unidade fabril do mesmo grupo que produz as mesmas caixas no México. Foi a estas condições que a maioria dos trabalhadores disse sim! Tristeza bem amarga de um trabalhador desta unidade fabril que recusava que se tivessem de comparar aos trabalhadores que se exploram no México ou na China, mas na verdade era o que estava a ser feito, era o que estava a ser feito e a um passo, portanto, de se tomar como referência os custos de produção na China. Será, pelos vistos, uma questão de resistência ou de não resistência, uma vez que o mercado é global, regido pela lei do custo mais baixo, do custo de produção mínimo e independentemente da forma como esse custo é obtido.

 

publicado por Carlos Loures às 21:00

editado por Luis Moreira às 12:01
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Quinta-feira, 6 de Janeiro de 2011

Carta aberta a Durão Barroso - 4 - por Júlio Marques Mota

(Continuação)

O tsunami está inserido na economia global e nas suas Instituições

 

Senhor Presidente, para se chegar à situação presente como expressão lógica do modelo seguido foram décadas de trabalho intelectual dos altos-quadros da Comissão Europeia e dos seus organismos a cavarem o vazio teórico de que todos nós nos ressentimos hoje, e a ficarem dele prisioneiros, sem percepção da realidade que lhes cabe prevenir ou, em suma, lhes cabe assumir. E ao cavá-lo fazem-nos com uma linguagem formalmente elegante, conceptualmente falsa ou vazia. Verdadeiro e eficaz tsunami, mas silencioso para mais duradoiro e eficaz ser ainda. Vale a pena retomar aqui um excerto da entrevista dada recentemente por Helmut Schmidt:

 

P. A Grécia e Portugal integraram a união monetária com uma balança externa mais ou menos equilibrada: os seus activos externos e as suas dívidas externas eram mais ou menos equivalentes. Seguidamente, registaram anualmente, durante uma dezena de anos, défices da balança corrente que equivalem a 10% do seu PIB. Não é necessário ser grande perito para compreender que a sua dívida externa líquida atinge hoje cerca de 100% do seu PIB.

 

R. A questão que é necessário colocar é a seguinte: como é possível que ninguém tenha visto nada — nem em Basileia [sede do Banco Internacional de Pagamentos], nem em Bruxelas, nem em qualquer Instituto de Estatística? Ninguém parece ter compreendido.

Deixe-me dizer, de passagem, que durante um longo período, a elite política alemã não compreendeu que registávamos excedentes na nossa balança corrente. Nós, os alemães, fazemos a mesma coisa que os chineses — com a grande diferença que os chineses têm a sua própria moeda, o que não é o nosso caso. Se tivéssemos a nossa própria moeda, esta já teria sido reavaliada há muito.

 

 

 

(Continua)

publicado por Carlos Loures às 21:00

editado por Luis Moreira às 20:33
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Quarta-feira, 5 de Janeiro de 2011

Carta aberta a Durão Barroso - 3 - por Júlio Marques Mota

(Continuação)

 

Dizem-nos ter “modernizado” a função pública

 

E multiplicaram-se os institutos, com as remunerações fora das carreiras da função pública, multiplicam-se as comissões de regulação que na desregulação em que se funciona não sabemos o que se regula então, a começar pela Alta Autoridade da Concorrência. Multiplicaram-se os organismos públicos com remunerações fora das carreiras da função pública. Multiplicaram-se os contratos individuais de trabalho, destrói-se a lógica das carreiras na Administração Pública, vive-se e trabalha-se fundamentalmente para se ser avaliado, como os professores no ensino secundário e a partir de agora os do ensino superior também, e muitas vezes sob critérios estabelecidos de forma avulsa por dirigentes nomeados politicamente. Externalizam-se serviços, privatizando-os no plano dos factos; recorre-se cada vez mais aos serviços privados até para a elaboração de legislação fundamental, sendo disso um bom exemplo a Sérvulo Correia e Associados a quem o recurso à elaboração de pareceres e de assessoria jurídica é frequente. Parecem igualmente evidentes as conexões entre os grandes consultórios de advogados e o poder político, que os alimentam com tarefas do foro jurídico que poderiam ser do domínio da função pública, havendo até quem insinue que algumas das transposições de directivas para o direito português lhes terão sido bem pagas. Seria bom ter-se a dimensão exacta, em valor e em substância, quanto às despesas gastas pela Administração Pública com consultorias privadas e com escritórios de referência, não muitos. São bem ilustrativas as despesas gastas na mesma linha no BPN enquanto banco nacionalizado, a dar crédito à notícia publicada pelos meios de comunicação nacionais. Compromissos anteriormente havidos, anteriormente estabelecidos, compromissos mantidos, neste caso pelo que podemos inferir de quem conhecemos, nada mais que isso certamente.

 

 

publicado por Carlos Loures às 21:00

editado por Luis Moreira às 15:43
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Terça-feira, 4 de Janeiro de 2011

Carta aberta a Durão Barroso - 2 - por Júlio Marques Mota

(Continuação)

 

O Tsunami silencioso

 

Senhor Presidente, percebida de vez a questão que não se trata de desconstruir a Europa, mas sim de a reconstruir, então isto reenvia-nos para algo que antecede a situação presente, reenvia-nos para o conjunto das políticas neoliberais que antecederam a crise e a criaram, o tsunami silencioso que lentamente invadiu as nossas instituições, minando-as, que desarticulou as nossas economias, globalizando-as selvaticamente, que invadiu as nossas mentalidades, roubando-nos a capacidade de criticar, que queimou a nossa capacidade de imaginar mundos melhores, tirando-lhes a visão de futuro, É sobre esse tsunami silencioso e sobre a responsabilidade da sua existência que falarei. Mas, uma coisa é certa, senhor Presidente, sabemo-lo com o general de Gaulle quando em Pnom Penh afirmava, e cito de memória, que a democracia para se afirmar verdadeiramente como tal tem que ser capaz de reconhecer os seus erros e crescer com esse reconhecimento. Bela lição que terá perto de meio século, bela lição que é agora tempo de retomarmos em mãos, é agora tempo de os nossos dirigentes nos mostrarem que assim é ou de lhes exigirmos que no-lo mostrem. Reconhecer os seus erros, foi disso que falava o general de Gaule, corrigi-los é agora o desejo que nos vai na alma, na alma de milhões de europeus também face à catástrofe que lhes estão a impor e que têm medo, medo, medo de uma catástrofe ainda maior. Não é querer muito, é apenas querer para a Europa a democracia real.

Numa nossa carta ao Presidente da República de Portugal escrevi:

 

 

 

publicado por Carlos Loures às 21:00

editado por Luis Moreira às 18:56
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Quinta-feira, 4 de Novembro de 2010

Boaventura de Sousa Santos no Estrolabio - A lucidez na incerteza

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Não vivemos tempos normais. Como a normalidade é o pressuposto das sondagens suspeito que os resultados eleitorais nos trarão surpresas. Em que consiste a anormalidade? O clima de insegurança generalizada sobre a sustentabilidade do nível de vida que se vem deteriorando desde o início da década e que sofreu abalos acrescidos nos últimos tempos, primeiro, com os ataques ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) por parte do Governo de Durão Barroso e do actual Governo durante o período Correia de Campos e, segundo, com a precarização dos direitos dos trabalhadores (código do trabalho) e a eclosão da crise económica com o consequente aumento do desemprego.

A insegurança gera uma atitude de espera sem grande esperança que perscruta, entre as propostas de governo, a que cause menos dano, não a que traga mais benefícios. Esta atitude é feita de uma mistura de incerteza e de lucidez donde emerge uma insondável ambiguidade. A incerteza decorre de os cidadãos não saberem se o que perderam com o governo PS é superior ou inferior ao que deixaram de perder por ser um governo PS e não um governo PSD. A lucidez reside em saber que, dos dois abalos recentes — a erosão do SNS e a crise económica — só o primeiro pode depender do governo. A superação da crise económica não depende do governo de um país pequeno, de desenvolvimento intermédio, integrado na economia europeia mais desenvolvida. Ao governo caberá gerir a crise e esperar por melhores ventos que certamente soprarão de fora. Naturalmente essa gestão terá nuances diferentes com impactos nas políticas sociais e sobretudo nas políticas de saúde. Mas para que tais nuances sejam significativas é necessário que ocorra uma maior polarização política, o que para uns passa pelo fortalecimento do CDS e, para outros, pelo fortalecimento do BE e do PCP. Neste domínio, a direita tem uma desvantagem importante. Manuela Ferreira Leite carrega consigo, sem querer, o espectro do salazarismo. Para os portugueses, o discurso da austeridade, do equilíbrio financeiro, e do sacrifício significa, nos subterrâneos da memória, estagnação, atraso, mediocridade histórica. Este é o fardo que MFL, de facto, já descarregou sobre os portugueses quando governou. Acontece que, estando nós em democracia — a asfixia não está na TV; está na exclusão social e na desolação silenciada que produz — MFL não será eleita se disser o que vai fazer. Os silêncios do programa são, assim, um misto de honestidade e de autoritarismo. Mas o PS também tem um fardo pesado: a promiscuidade entre o sector público e o sector privado de que são um exemplo chocante os negócios de Jorge Coelho, o caso extraordinário de alguém que, não tendo podido governar o país a partir do Estado, parece pretender fazê-lo a partir de uma empresa.

É nas políticas sociais e sobretudo de saúde que o próximo governo pode fazer a diferença. A grande maioria dos portugueses precisa e vai precisar cada vez mais do SNS. Da direita sabe que não pode esperar o seu fortalecimento. E do PS? Depende do partido com quem fizer acordo de governo, pois o PS, por si, está afundado na promiscuidade acima referida. Pouco tempo depois de entrar em funções a actual Ministra da Saúde, o Ministro das Finanças fez um contrato escandaloso entre a ADSE e o Hospital da Luz, criando assim um mercado de saúde à custa do Estado e em detrimento da melhoria dos hospitais públicos. Entretanto, o sector privado responde segundo a sua lógica, a do lucro, e comete duas ilegalidades perante as quais a Entidade Reguladora da Saúde nada faz. Apesar de beneficiados com a ADSE, os hospitais privados discriminam os beneficiários do sistema: dão prioridade às marcações de consultas vindas dos seguros privados. Segunda ilegalidade: quando as doenças se agravam as seguradoras cancelam as apólices e “mandam” os doentes para os hospitais públicos de quem, entretanto, se pede uma gestão empresarial. Perante a incerteza que tudo isto cria a lucidez do voto é mais do que nunca necessária. E mais do que nunca difícil.

(Publicado na revista "Visão" em 24 de Setembro de 2009)
publicado por Carlos Loures às 21:00
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Sexta-feira, 29 de Outubro de 2010

Noctívagos, insones & afins: Carta aberta a Angela Merkel,

Rolf Dahmer

Carta aberta à Chanceler da República
Federal da Alemanha

“A estratégia sem táctica é o caminho mais lento para a vitória.Táctica sem estratégia é o ruído antes da derrota.”

Sun Tzu (544 – 496 A.C. – General chinês e um dos maiores estrategas militares de todos os tempos e autor de “A arte da guerra”)

Cara Sra. Merkel,

A situação no país, na União Europeia e no mundo, torna-se cada vez mais
confusa. As velhas regras deixam de estar em vigor e as novas ainda não
nasceram. A ameaça de que as coisas fiquem fora de controlo é cada vez maior e a
perda de poder da Pax Americana – god’s own country and his partners in
misleadership, a UE, nós – torna-se cada vez mais óbvia. Basta pensarmos como
há pouco, em Copenhaga, os líderes do sistema de líderança da Pax Americana,
incluindo o Presidente Obama, foram afrontados e humilhados. Um acontecimento
ultrajante que, no futuro, deverá repetir-se cada vez com mais frequência – se não
agirmos.

E não é só pelo país fora que isto se sente. Também pelo aspecto cansado da
senhora se pode notar que luta, cada vez mais em vão, contra os mecanismos de
correcção cibernéticos da natureza – invisible hands de sinais contrários –, contra
os quais não pode ganhar. Sobretudo se continuar a dispersar-se perdidamente e a
atacar todos os problemas materializados individualmente, em vez de identificar e
resolver o problema central – com a “espada” e não mais com os “dedos”.
Aumentar a quantidade das suas queridas mensagens sms? Esqueça, isto só iria
piorar a situação ainda mais.
Que tal se experimentasse quebrar finalmente o seu tabu férreo e tentasse uma
simples mudança de estratégia?




Em 26 de Agosto 2007 escrevi-lhe – e ao mesmo tempo ao Sr. Barroso – sob o
assunto “Um “New Deal” para o Terceiro Mundo, a União Europeia e a Alemanha
― três grandes objectivos que se excluem?”, uma carta pessoal na qual, entre
outros, lhe chamei a atenção para o seguinte problema central: a estratégia linear,
e por isso errada, da União Europeia e, naturalmente, a dos seus mandantes nas
capitais europeias – sem os quais o Sr. Barroso não dá nenhum passo para a frente
e prefere concentrar-se em coisas tão importantes como a poibição de venda de
lâmpadas incandescentes e foscas.

Acerca do referido problema central que faz estagnar a UE, escrevi-lhe:
“Para isso, é preciso admitir primeiro, com toda a sinceridade, que o objectivo da
agenda de Lisboa de Março 2000 ―“tornar a UE no espaço económico mais
dinâmico e competitivo do mundo, baseado no conhecimento e capaz de garantir
um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e maior
coesão social” ― está errado. Errado, porque constitui um objectivo primariamente
introvertido e egocêntrico, cuja perseguição conduz a efeitos e resultados errados,
por não ser recompensado pelo meio envolvente em que a Europa se insere.” Com
efeito: "Se o objectivo principal for de definição errada, também todos os
posteriores passos dirigidos na direcção daquele objectivo o são, mesmo que
fossem correctos se dirigidos na direcção de um objectivo diverso. O facto de se
poder alcançar sucessos passageiros com o consequente uso de vistas curtas, não
altera nada na sua nocividade a longo prazo", ensinou-me o meu professor, o
investigador de sistemas Prof. h.c. Wolfgang Mewes, criador da “Teoria da Gestão
Cibernética (EKS)”E depois o princípio de aproximação à solução do problema: „... O novo objectivo poderia ser: “...tornar-se (a UE), através dos seus Estados membros, de perfis e de know how social e técnico diversos e multíplices, (tal como um canivete suiço multifunções), a preferencial parceira e solucionadora de problemas para os países do mundo menos desenvolvidos, contribuindo para desenvolvê-los sistematicamente em virtude de um New Deal...“

Infelizmente a minha carta caiu, juntamente com o meu esboço estratégico – New
Deal –, nas mãos de um dos seus assesores na Chancelaria, o qual não foi capaz de
distinguir uma matéria de importância para o patrão, de um assunto de chacha.
Talvez na altura a hora ainda não tivesse chegado, mas com a rapidez com que as
coisas actualmente se precipitam, muito em breve até propostas de solução de
problemas totalmente disparatadas e descabeladas – talvez um qualquer „metodo
de borras do café“ !? – poderão passar o referido „filtro“.
E tinhamos ainda a Europa, a Europa dos objectivos sublimes e nobres de outrora,
que eu conhecia na minha juventude e defendia com fervor, recomendando-a
também desde 1964 aos meus amigos na minha segunda pátria – Portugal. Que
aconteceu com esta Europa? Ora, depois de três décadas de comportamento linear
e de crescente falta de liderança, o sistema se encontra de candeias às avessas.
Em vez de avançar com o topo da pirâmide, tenta avançar com a base, através de
esforços cada vez mais sobrehumanos e vãos. E depois dos europeus – os seus
líderes impotentes e sem rumo agarraram-se ferreamente ao comportamento linear
– terem perdido a capacidade de superar a unidade polar entre espírito e matéria,
indispensável para garantir o equilíbrio do sistema, o espírito esgueirou-se. O que
restou foi mera matéria – dinheiro! “O espírito que se dane, venha cá o “cacau” de
Bruxelas ou a Alemanha e o resto é conversa”, é o que hoje porventura pensa a
maioria do povo. É por isso que agora o “cacau” começa a mirrar.

Foi já desde o início dos anos 90 que adverti os meus amigos portugueses, e não
só, contra as consequências dessa falta de estratégia, em cartas, conversas, mails
e artigos de jornal, reafirmando sempre de novo: “... quando uma União Europeia
às avessas, que de outrora extrovertida e alterocêntrica virou introvertida e
egocêntrica, chegar ao fim da linha, serão os seus subsistemas menos
desenvolvidos os primeiros que terão que passar pelas armas”. A título de
prevenção – de Bruxelas, já na altura sem perfil nem liderança – não vieram sinais
nenhuns, já então recomendava aos portugueses no meu artigo de 1997 “Porque
vale a pena apostar em África” , que criassem, finalmente, um claro perfil sócio-
económico de país solucionador de problemas para um determinado grupo-alvo no
mundo e que desenvolvessem e executassem neste sentido uma estatégia,
independentemente de Bruxelas. Eles um dia viriam a precisar disto urgentemente.

Todavia, as minhas repetidas advertências e os meus postulados não foram
percebidos nem seguidos. Pois é, tal como já sabia Friedrich von Schiller é “contra
os subsídios que até os próprios Deuses lutam em vão” – ou terá dito “contra a
estupidez?”
Infelizmente o meu vaticínio cumpriu-se e a primeira vítima, Grécia, já se encontra
no trampolim de dez metros, debaixo de si uma piscina sem água. E Portugal já
vestiu o calção de banho, também a Espanha já anda à procura dele, na esperança
desesperada de não precisar dele. Who is next?
Diga-me, cara senhora Merkel, já alguma vez reparou que também a Alemanha,
um dos principais co-responsáveis desta marcha sem rumo, se encontra na mesma
fila, só um pouco mais atrás? Já reparou que nos encontramos à beira de uma
negativa reacção social em cadeia, capaz de pôr fim a toda esta fantochada? Como
física doutorada, certamente tem conhecimentos de cibernética – pequenas causas,
grandes efeitos. Mas sabia que também em sóciosistemas valem essas mesmas leis
da natureza? Já teve a ideia de que em todos os sistemas naturais é sempre a
estratégia que determina tudo – “Structure follows strategy”- S.C.Chandler – e que
a actual estratégia, a nível supranacional da UE e aos níveis nacionais, pode estar
totalmente errada?

Seria bom que pensasse sobre estas coisas. E particularmente sobre o facto de que
a senhora é, em Berlim, a responsável principial e em Bruxelas a principal co-
responsável, por um sóciosistema outrora aberto e bem sucedido que pouco a
pouco se transformou num sistema fechado, já não receptivo a sinais externos e
em vias de fracasso, que só funciona quando alguém entra com um cheque sempre
que a crise aperta?

Com efeito, não são a Grécia, Portugal e outros os responsáveis pelo desastre que
se vislumbra. Pelo contrário, os responsáveis são aqueles que durante décadas
perderam oportunidades de efectuar mudanças de estratégias eficazes em
Bruxelas, ou mesmo as impediram por motivos egocêntricos e delegaram o governo
em gente medíocre. Ambos os referidos países, e outros, puderam fazer o que
fizeram porque tiveram o poder para tal, precisamente porque Bruxelas anda sem
liderança e sem rumo. Ora, os referidos países naturalmente são co-responsáveis,
pois houve certamente uma altura em que tiveram a oportunidade de criar, eles
próprios, e mediante uma mudança de estratégia auto-responsável, aquilo que o
Prof. Hans-Werner Sinn, Director do ifo-Institut de Munich, numa recente entrevista
em SPIEGEL-Online designou de um “modelo de negócios” (inexistente). É pena,
pois em caso de sucesso até poderiam ter emitido um sinal positivo a nível da UE,
promovendo uma mudança.

A senhora, a não ser que queira demitir-se, agora tem – do ponto de vista linear –
duas hipóteses: 1) Insiste na sua estratégia, que na realidade não passa de mera
táctica, até ao fim amargo. 2) Insiste, face ao desastre que cada vez mais se
aproxima, numa reforma da UE não baseada em princípios sistémicos-holísticos,
que na realidade não passaria de uma pseudo-reforma (combate aos problemas
singulares que agora surgem em catadupa, com meios materiais-mecanicistas,
continuando a não considerar as suas causas imateriais-psíquicas).

Todavia, ainda existe uma terceira hipótese, a não linear, dinâmica: a senhora
finalmente deixa de brincar às tácticas e começa a introduzir estratégia, a par com
a arte de liderança cibernética. Isto poderá ter lugar reconhecendo primeiro que a
sua estratégia é inexistente ou errada. Seguidamente, começa a planear uma
realização de grande impacto, a qual já em 2005 acariciou (Prof. Kirchhof!?). Na
actual situação, porém, terá que tratar-se de vender algo aos alemães e à UE que
tenha como consequência uma grande realização libertadora: a reorientação da UE
e da Alemanha para objectivos novos, extrovertidos e alterocêntricos no sentido do
meu esboço estratégico do qual, a pedido, lhe poderei enviar um novo exemplar.
Isto seria o “factor mínimo” externo, o decisivo por dizer respeito a necessidades
“candentes” de um determinado grupo-alvo. Lembro, pois, que se trata de eliminar
a armadilha da pobreza do 3º mundo pela qual a UE é uma das principais co-
responsáveis, fazendo com que cerca de 3 mil milhões de recebedores de esmolas
no mundo se tornem os nossos parceiros de trocas e clientes (cf. “New Deal” ).

Que gigantesco desafio para a os povos da UE e que grande oportunidade para todos nós, que hoje só olhamos para os nossos botões, voltarmos a ser úteis. A nossa aconteceria – esta é a notícia menos boa – de maneira tão dura e drástica e no meio de graves turbulências sociais – insurreição! – que a senhora entraria na
história como administradora de declínio, mal sucedida, da Alemanha e da Europa.
Porém, se estiver disposta e na posição de enveredar pelo caminho sistémico-
holístico do são juizo humano, transformando assim o actual sistema fechado
novamente num sistema aberto, criando ainda novo crescimento orgânico, então
causará – repito – nova confiança, fé, entusiasmo e motivação, a par com uma
vibrante atmosfera de alvoroço e de abalada para novos horizontes. O sublime e
nobre espirito europeu, indispensável para o equilíbrio do sistema, então voltaria
retomando a sua acção benéfica de outrora. Tanto a nível da UE, como em Berlim,
Paris, Londres, Madrid, Lisboa, etc. e no mundo.

Cara senhora Merkel, ponha um fim ao „tempo do adiamento, das meias medidas,
dos expedientes apaziguadores e frustrantes, dos atrasos“ – cf. abaixo – dos
últimos anos. Deixe para trás os lugares comuns e palavras ocas, em que já
ninguém acredita. Deixe de reagir e comece finalmente a agir. Pense, face à actual
situação mais que desesperada, no famoso discurso de Sir Winston Churchill de
1936 sobre o appeasement: “O tempo do adiamento, das meias medidas, dos
expedientes apaziguadores e frustrantes, dos atrasos, está a chegar ao fim. No seu
lugar, estamos a entrar num período de consequências.” Está a reconhecer o seu
perfil no discurso? Contudo, pense também, como sinal de esperança, nas palavras
do nosso grande Rei da Prússia, Frederico II: "Quem apelar à fantasia e à mente do
homem, vencerá aquele que tenta apenas influir sobre a razão".
Aja, senhora Merkel! Se agir terá uma boa hipótese de dar a volta por cima às
coisas na última da hora, tornando-se Líder de Renovação bem sucedida – na
Alemanha, na UE e com impactos benéficos em todo o mundo. A decisão é sua –
ainda.
Com os melhores cumprimentos de Estoril / Portugal
Rolf Dahmer
publicado por Carlos Loures às 03:00
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Quinta-feira, 23 de Setembro de 2010

Boaventura de Sousa Santos no Estrolabio - Em vez da Europa


Num período em que os governos nacionais se mostram reféns do modelo de (des)regulação neoliberal e da pequena elite financeira que causou a profunda crise económica e social em que nos encontramos, o próximo acto eleitoral bem poderia ser a vez da Europa. Pelo seu voto, os cidadãos europeus teriam a oportunidade de se manifestar a favor de uma outra política e de um outro modelo económico e social. Esta oportunidade pareceria particularmente imperdível para os portugueses, em cuja memória está bem vincada a profunda transformação, em larga medida positiva, por que passou a sociedade portuguesa em resultado da adesão à União Europeia. Porque não é assim? Porque é que as próximas eleições, longe de serem a vez da Europa, têm lugar em vez da Europa? Porque é que, em vez da Europa, o que vai a votos é tão só a resignação ou a revolta dos cidadãos europeus perante as políticas dos governos nacionais? Porque é que o provável alto grau de abstenção será uma mistura envenenada e paradoxal de altos níveis de resignação e de altos níveis de revolta?

A resposta é complexa mas os seus traços principais são os seguintes. A UE é hoje um fantasma da Europa. Existe em vez da Europa em que os cidadãos europeus acreditavam e para ocultar a verdadeira dimensão da “substituição”. Um exemplo apenas. A UE foi um dos mais fascinantes processos plurinacionais contemporâneos, inspirado numa lógica de inclusão social transnacional, assente num círculo virtuoso entre altos níveis de competitividade e de protecção social, portadora de uma concepção avançada de cidadania em cujo cerne se alojavam os direitos económicos e sociais dos trabalhadores. Foi este, em suma, o célebre modelo social europeu.

Nos últimos quinze anos, este modelo foi minado por dentro e por fora, através de uma insidiosa convergência entre o neoliberalismo imposto pelos EUA e as elites económicas e financeiras europeias, desejosas de se verem livres da regulação estatal forte e dos custos das políticas sociais. Paulatinamente, os cidadãos europeus foram sendo “convencidos” de que o Estado era um problema e que o mercado era a solução, que a segurança social era insustentável, que a educação e a saúde públicas eram cerceadoras da autonomia do cidadão-consumidor, que os imigrantes eram um fardo e um factor de insegurança, que, no plano internacional, a Europa devia deixar de ser uma alternativa à globalização predadora protagonizada pelos EUA para ser um seu parceiro incondicional. Tudo isto se foi convertendo na obsessão pela contenção do défice orçamental, condensada no Pacto de Estabilidade e Crescimento que nos legou uma cultura de travagem da economia real e de destravada aceleração da economia de casino da alta finança. Foram estas políticas europeias que geraram a crise e que, ao converterem os governos nacionais em mini-europas, os deixaram com pouca margem de manobra para reagir quando a crise estalou.

Nos últimos anos, Durão Barroso foi a imagem mais fársica desta Europa-em-vez-da-Europa e, por isso, o Plano Barroso para enfrentar a crise não podia deixar de ser um embuste: dos 400.000 milhões de euros anunciados para ajudas às políticas de resposta só 35.000 milhões eram dinheiro fresco; o resto era dinheiro já afectado aos planos nacionais. Podem os cidadãos europeus acreditar numa Europa que, ao manter Durão Barroso, mostra mais dificuldades em se libertar da herança Bush que os próprios EUA?

Nestas eleições, os cidadãos vão ter de esperar pela vez da Europa. A Europa da solidariedade e da interculturalidade; da democracia de alta intensidade; do controle público e participativo dos sectores-chave, como o sector financeiro e da energia; da defesa; do direito ao ambiente, à saúde e à educação e do direito ao trabalho com direitos; da política de imigração anti-racista; da política de investigação e de desenvolvimento tecnológico ao serviço dos cidadãos; da política externa assente na cooperação fraterna com os países do Sul global e na recusa da imposição unilateral e da guerra.

(Publicado na revista "Visão" em 04-06-2009)
publicado por Carlos Loures às 21:00
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Quinta-feira, 26 de Agosto de 2010

Mortos: 300 000 Iraquianos/1 500 americanos

Luís Moreira

"Uma morte é uma tragédia; 300 000 são uma estatística" não sei quem disse isto mas tem absoluta razão, não há, aliás, capacidade emocional para lidar com um número destes senão transformado num valor estatístico.. Os americanos, com a possível excepção da Grande Guerra, na Europa, onde se metem militarmente, dão um exemplo deplorável de uma nação democrática.


As Forças Armadas são sustentadas pelos impostos dos contribuintes americanos que tambem entram com os filhos, estes como soldados, que abrem caminho aos negócios das empresas americanas e das dos seus "amigos" europeus (mas pouco). Acostumaram-se, agora é dificil travá-los, afinal foi o que fizeram em plena crise, "socializaram os prejuízos e privatizaram os lucros".

A verdade é que todos os políticos (com a honrosa excepção de Blair que tem às costas um processo crime por ter mentido ao seu povo) que juraram a pés juntos que tinham visto armas nucleares no Iraque, foram todos devidamente agraciados (Portas foi mesmo aos US receber a "comenda") e Durão foi para a UE fazer o que gosta. Reuniões, declarações, televisões e nenhum problema concreto para resolver (é muito português este gajo).

Agora, com o "rabo entre as pernas" vão sair, com uma guerra civil à vista, ainda hoje morreram dezenas de pessoas num atentado, 100 Saddam prontos a discutir o poder e a arrasar com o resto do país e do povo. Mas esta humilhação, é muita cara, depois do Vietnam ficaram vacinados por alguns anos, mas logo que pressentiram que o povo, o bom povo, tinha esquecido e acabado de chorar os seus entes queridos, voltaram ao que melhor sabem fazer.

A pata imunda do poder militar, pode esmagar sem contemplações quem se lhes opõe.
publicado por Carlos Loures às 02:00
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Segunda-feira, 7 de Junho de 2010

Hipocrisias!

Rolf Damher (convidado)

“What do you want to achieve or avoid? The answers to this question are objectives. How will you go about achieving your desire results? The answer to this you can call strategy.”

William E Rothschild

Simplesmente fantástico este discurso de “Dany Le Rouge” no Parlamento Europeu. Lembro que foi ele o grande protagonista das revoltas estudiantis de Maio 68 que fez com que a “Grande Nation” ficasse suspensa e com as fronteiras escancaradas durante mais de uma semana, enquanto o seu presidente, o General Charles de Gaulle, julgando que tinha sido deposto, se refugiu na “Nation Grande” (Baden-Baden), no então quartel-general das tropas francesas estacionadas na Alemanha sob o comando do Gen. Koenig.

O discurso muito responsável (legendado em português) de Daniel Cohn-Bendit mostra que ele continua com a chama bem acessa – e tem razão. (Diga-se de passagem: ele além da nacionalidade francesa também tem a alemã )

E vale a pena olhar para a cara de “Monsieur Barrosó”, o medíocre-mor da UE escolhido pelos chefes de governo (maioriatarimente) medíocres da UE que pela sua estratégia errada de há décadas nos levaram à situação onde actualmente nos encontramos.

publicado por Luis Moreira às 11:00
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