Sexta-feira, 17 de Junho de 2011

A baixa da notação grega será o toque de finados para a zona euro? - Georges Ugeux

A baixa da notação grega é o toque de finados para a zona euro?

 

É difícil não considerar as obrigações soberanas gregas como estando na categoria de podres “junks” com rendimentos de 25% para maturidades a dois anos e 15% para dez anos. Nenhum país europeu atingiu uma tal deriva: CCC são três níveis abaixo da solvabilidade.

 

Esta notação representa  definitivamente o toque de finados da dívida grega : ela não vale mais do que apenas uma fracção do seu valor nominal e a ausência de solução a longo prazo para o país não permite mesmo mais uma nota de esperança. A este nível a Standard and Poor' s anuncia perspectivas negativas. Claramente, isto significa que a situação se pode ainda degradar mais. A razão: o risco, agora inegável, de uma reestruturação da dívida grega, inclusive os impactos negativos nos detentores de obrigações. Isto significa, uma falência virtual dos bancos gregos e um impacto severo nos bancos europeus dos quais 3% dos fundos próprios estão investidos em obrigações gregas.

 

O contexto europeu não ajuda. Este quadro dá uma ideia da situação dos países europeus. Trata-se do custo de uma cobertura de seguro contra uma situação de não pagamento ( Credit Default Swaps). Os outros países estão largamente abaixo de 1%. Aquilo quer dizer que o detentor de uma obrigação de 1.000.000 € está pronto a pagar anualmente 161,000 € para cobrir o risco de não reembolso pela parte da Grécia.

 

Grèce

16.1%

Portugal

7.0%

Irlande

6.9%

Espagne

2.5%

Italie

1.6%

Belgique

1.5%

 

 

Esta notação é o toque de finados da gestão da zona euro: mais ninguém acredita hoje que as tentativas desesperadas de evitar uma reestruturação serão frutuosas. O Parlamento alemão votou a semana passada uma moção que prevê que uma reestruturação implicará reduções de valores para o sector privado. Há um ano, ter-se-ia ter podido evitar esta carnificina. Mas desde as indecisões a medidas erradas ou falsas medidas, diremos, reencontramo-nos agora numa situação já claramente irreversível. Só os actos permitirão voltar a dar esperança. E aqui trata-se de dezenas de milhares de milhões de euros que terão sido deduzidos na conta dos contribuintes europeus.

 

Esta notação não é o toque de finados para a zona euro. Disse-se demasiado frequentemente que o Euro ia desaparecer ou que a Grécia ia sair da zona euro. A única esperança de salvar a Grécia é mantê-la na zona euro. O regresso ao dracma mergulharia o país numa falência virtual. Além disso para os membros da zona euro, não há outra escolha que não seja a opção de apoiar a Grécia que enfraquece o Euro sem o destruir. O custo da saída da Grécia para as nossas economias calcula-se em centenas de milhares de milhões.

 

Entre dois males, devemos escolher o mal menor. A agência Standard & Poor’s diminui a nota da Grécia porque há uma grande probabilidade de reestruturação da dívida. Os bancos conseguem ganhos suficientes para absorver uma tal reestruturação. Os bancos gregos deverão ter que ser ou inevitavelmente nacionalizados ou inevitavelmente recapitalizados pelo Governo.

A injecção de capitais a fundos perdidos para evitar uma situação de incumprimento vai ser taxada sobre os contribuintes europeus e não faz mais do que apenas adiar o problema. O plano previsto para a Grécia está agora morto e bem morto.

 

Tomemos, com coragem, o problema com muita garra mesmo. O tempo das poções mágicas já passou Chegou agora o tempo das grandes e urgenbtes cirurgias. Quanto mais cedo aceitarmos a realidade e reestruturarmos a dívida grega menor será o sofrimento a que seremos sujeitos .

 

publicado por Augusta Clara às 12:00
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Sexta-feira, 10 de Junho de 2011

A dívida soberana na zona Euro: pode a emissão de Eurobonds funcionar ? - 1 - por Domenico Mario Nuti


 

Nota de entrada

 

Um texto a juntar a outros textos  que se seguirão ao texto da minha última aula, um texto de um antigo conselheiro de Jacques Delors

onde se fala de  incompetência ou de maldade de dirigentes europeus  face à terrível crise que a Europa atravessa.

 

Por cá talvez tenhamos um doutoramento Honoris causa de um dos maiores responsáveis pela incompetência  politicamente manifestada ao nível das Instituições Europeias quanto à necessidade de respostas coerentes e rápidas face à tragédia que na Europa se tem estado a desenrolar: a submissão dos Estados nacionais à arrogância e à ganância dos mercados de capitais. E esse responsável dá pelo nome: Durão Barroso. Ignorar essa responsabilidade é uma irresponsabilidade que só uma Universidade de low-cost  pode assumir e digo-o  com toda a sinceridade.

 

Ao Professor Mario Nuti os nossos agradecimentos, em meu  nome pessoal e de toda a equipa de Estrolabio, pelo  envio de mais um magnífico texto.

 

Coimbra, 7 de Junho de 2011-06-07

 

Júlio Marques Mota

 

 

 

 

 

Jean-Claude Trichet  está em contradição



A  27 de Janeiro, em Davos, no Fórum Económico Mundial, o Presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, afirmou e com firmeza  que "o euro não está em crise". Trichet deve ter sentido o dever de o afirmar em alta e boa voz  numa tentativa para  tranquilizar os mercados financeiros
internacionais, independentemente do que ele realmente pensava sobre o assunto. Se realmente estava a acreditar  no que dizia, depois, isto significa que  Trichet está em contradição, que é uma base bastante fraca, quer  para uma discussão frutífera sobre a crise actual do euro quer para  progredir no sentido da sua solução.



Claro que, se olharmos  exclusivamente para a  taxa de câmbio actual entre o dólar e o euro assim como para a sua tendência recente, pode-se ter a falsa impressão de que não há crise nenhuma. A  29 de Janeiro, o euro era cotado a 1,37 dólares, uma taxa mais alta  do que antes da crise da dívida grega que começou em  Fevereiro de 2010 (1,33 dólares), e muito superior à taxa de 1,18 dólares valor para que desceu  no início de Maio de 2010 (e mesmo que fosse 1 por cento  superior à  taxa de câmbio inicial de 1,17 euros com que a vida do euro se iniciou em 1999). A valorização do euro, no entanto, foi devida principalmente ao facto do  Banco Central Americano ter injectado  cerca de  600 mil milhões de liquidez ao longo de 8 meses, em comparação com as políticas mais restritivas e conservadoras do BCE, e deve-se também às perspectivas económicas dos EUA estarem a ser  piores do que o previsto. Depois de um pico de 1,42 dólares em Novembro passado, o euro voltou a cair para 1,30 dólares repetidamente (até à quinze dias atrás) com um efeito de  contágio da Grécia para  a Irlanda, em seguida, para Portugal, e em seguida, a ameaçar a Espanha.

 


As  diferenças nas  taxas de juros

Para além  da taxa de câmbio ter aumentado a sua  volatilidade e da baixa de notação nos ratings de crédito nacionais, uma medida concreta e exacta da crise da dívida soberana do euro é-nos verdadeiramente  dada em cada país pela  diferença de  taxas de juros em relação às obrigações alemãs (normalmente comparaando  títulos a  10 anos), o rendimento actual dos títulos existentes determina a taxa através da qual os países podem contrair  empréstimos para liquidarem (renovarem)  a sua divida antiga ou para  incorrerem em novas tomadas de fundos por efeitos de acréscimos da dívida existente. O spread sobre os títulos alemães (cuja remuneração  também cresceu como resultado da crise, por medo da exposição dos  alemães  ao resgate de eventuais países que possam entrar em situação de possível incumprimento) aumentou em média e significativamente alargou-se entre os países europeus  ao longo do tempo, especialmente desde a crise da dívida soberana   grega, e está  agora em níveis recorde, superiores aos alcançados em  Maio passado. Normalmente, uma diferença  de 2% é já considerado como o nível de perigo, mas  hoje em Espanha está um pouco mais alto, na Itália está à justa sobre  aquele nível, Portugal tem cerca de 4% de diferença, a Irlanda mais de 6% enquanto  a Grécia tem oito e meio por cento.

 

Dados mais recentes, dados  de 7 de Junho de 2011 :

 

Na base de  um outro ataque resultante  da aversão ao risco deu-se o aumento do spread  sobre os títulos italianos e espanhóis, de novo.

 

 

Previous Day Close

Yesterday’s Close

This morning

France

0.300

0.312

0.312

Italy

1.582

1.622

1.637

Spain

2.180

2.250

2.269

Portugal

7.343

7.427

7.267

Greece

13.159

13.075

13.19

Ireland

7.876

7.829

7.758

Belgium

1.001

1.082

1.089

Bund Yields

3.245

3.025

3.01

 

 

A taxas de juros superiores às taxas de crescimento nacional (quer em termos nominais ou reais, tanto quanto estas  são medidos da mesma maneira) a dívida nacional deve aumentar relativamente ao PIB, a dívida torna-se insustentável  e a situação de incumprimento começa a mostrar-se como possível. Mesmo com os fundos fornecidos pelo FEEF (Fundo Europeu de Estabilização Financeira, mecanismo criado em Maio passado), a Grécia e a Irlanda pagam  5,8%, uma taxa inferior às taxas do mercado, mas mais altas do que o que seria  sustentável[1] e assinalando-se assim uma falta de confiança na  Europa quanto à  capacidade destes países poderem  pagar. O reescalonamento da dívida da Irlanda e Grécia - com o alongamento dos  respectivos períodos de  vencimento e a imposição de  um corte na dívida  para os investidores - está agora sobre a mesa.

 


[1] Relembremos, de qualquer manual, a condição de evolução da dívida pública por unidade PIB db = dp+b(i - g), onde db é a evolução da dívida pública por unidade PIB, b é a ratio da dívida pública relativamente ao PIB, dp é o défice público primário por unidade de PIB, que também pode ser visto como sendo a diferença entre o que os contribuintes pagam ao Estado e o que dele recebem, mais geralmente definido como a posição rçamental por unidade do PIB, sem o serviço da dívida, i a taxa de juro da dívida pública e g a taxa de crescimento nominal do PIB. A estabilidade, por definição, significa  pois db=0, ou seja : -dp= b(i - g), Com b elevado, taxas de juro altas e g baixas exige-se então excedentes primários não sustentáveis, para que a dívida por unidade de PIB possa não crescer..

 

(Continua)

publicado por Carlos Loures às 23:30

editado por Luis Moreira às 22:46
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Segunda-feira, 30 de Maio de 2011

Grécia, atrás já da linha separadora da reestruturação - Charles Wyplosz

Aos  leitores de estrolábio, um texto aqui vos deixo.


Tal como o FMI organizou a queda da Argentina em 2001, está agora a caber a  vez ao país berço da nossa democracia, a Grécia  .  Andam ladrões à solta, andam muitos criados ao serviço destes ladrões pelos bolsos de todos nós a sacar, andam polícias a demitirem-se  das sua funções   de zeladores da coisa pública para se transformarem em guardas públicos  da coisa privada e assim os capitais continuam a fugir da Grécia até esta cair completamente exangue, mas há liberdade de capitais, claro! E até, pasme-se, o Financial Times vem protestar contra o facto de que  "na sua  "grande sabedoria ", a zona euro tenha decidido que as perdas dos credores do sector privado tenham que ser socializadas ... e o fardo final tenha de ser assumido pelos contribuintes dos  países deficitários. " Liberdade de  uns receberem, obrigação de outros pagarem, liberdade de uns se movimentarem, os capitais,  obrigação de outros se fixarem, os contribuintes, é  esta a liberdade da Eurolândia,  são estas as características do seu reino  por um incompetente dirigido que dá pelo nome  de ser português.

 

 

Nada vai bem  na zona euro. A Grécia está na berlinda um ano depois de ter sido salva  pelo programa imaginado pelo FMI e pela Comissão Europeia. A Espanha está  numa corda bamba  e a Itália foi colocada sob vigilância pela Standard and Poor’s . Os deputados do CDU estão em rebelião contra Angela Merkel, que sofre derrota eleitoral após derrota eleitoral. O seu ministro das Finanças, que tinha  agitado os mercados financeiros evocando publicamente um reescalonamento da dívida grega, acaba de mudar de opinião. Jean-Claude Trichet reage agressivamente contra Jean-Claude Juncker que defendia a hipótese  “re-perfilar ” a dívida grega e o BCE ameaça mesmo vir a deixar de  alimentar os bancos gregos. Um responsável deste país indica que, neste caso, seria necessário deixar a zona euro. Eis pois, aproximadamente, o estado das coisas que resultam da notável solidariedade europeia prometida por Angela Merkel e por Nicolas Sarkozy. Há então sérias razões para nos questionarmos.

 

 

Porque é que o défice grego não se reabsorve?

 

A Comissão prevê um défice de 9,5% do PIB em 2011 e de 9,3% em 2012 depois de  10,4% em 2010. Não é por falta de esforços pela  parte do governo. De acordo com a última avaliação dos progressos conduzida  pelo FMI datada de Março  último, lê-se : “ A economia evoluiu como previsto, com uma baixa de 4,5% do PIB em 2010, uma taxa de inflação que continua a ser fraca, e com  custos unitários do trabalho que começam a descer . Face a  estes  ventos contrários, as autoridades terminaram com um ajustamento orçamental de 5,75% em 2010. ” Explicação destes cálculos em aparência contraditórios: o governo apertou fortemente a tarraxa  ( os 5,75%), mas a recessão  é profunda (os -4,5%)  e sem fim, precisamente, devido a este ajustamento precipitado. De repente,  as receitas orçamentais reduzem-se e… o défice realmente não se reabsorve (- 9,5%).

 

O que fazer agora?

 

Para o FMI e para a Comissão, é necessário fazer mais e ainda melhor . “A Grécia progrediu em direcção dos seus objectivos [os que lhe foram impostos como condição do empréstimo], e as reformas orçamentais e estruturais necessárias são levadas a efeito gradualmente . Contudo, reformas essenciais devem ainda ser preparadas e levadas a prática  para construir a massa crítica necessária à sustentabilidade orçamental e à  retoma económica. ” Por outras palavras, é necessário ainda continuar a apertar a tarraxa ou o cinto, o que é equivalente. Mas se as medidas do ano passado prolongam a recessão  e não permitem de modo nenhum   reduzir o défice, como previsto pela Comissão, o que fará a Grécia num ano? Apertar ainda mais o cinto. Continua-se a aplicar um remédio que enfraquece ainda mais  o doente já de si muito fraco.

 

Porque   é  que os Alemães quebraram o tabu da reestruturação de dívida?

 

Como o défice não se reabsorve e porque o governo grego não pode mais vir a contrair empréstimos nos mercados financeiros internacionais, é necessário que  o FMI e a Europa continuem a conceder  empréstimos. A Alemanha, sendo o primeiro mutuante dos  fundos em questão, daí que uma surda  inquietação  comece  a aparecer além-Reno  (mas não em França onde, aparentemente, a opinião pública não se preocupa com o montante destes empréstimos). Uma reestruturação reduziria o montante dos empréstimos suplementares a realizar, o que aliviaria a pressão sobre Merkel.

 

O que é uma reestruturação?

 

Incumprimento,  reescalonamento, diminuição de dívida, etc. são diversos meios para reduzir uma dívida. Como um país não pode ser colocado na  prisão, pode decidir de maneira unilateral não reembolsar a totalidade da sua dívida pública. É ilegal mas é um  facto de príncipe. Os seus credores têm poucos recursos de oposição  e a sua melhor opção é, em geral, negociar o que irão  perder - “ haircut ” como se diz  deliciosamente  em inglês ou  a tesourada como se diz em bom português. Que isto assuma  a forma de pagamentos diferidos, uma baixa da taxa de juro ou uma redução directa da soma devida, há incumprimento desde que os termos  iniciais sejam  unilateralmente alterados. Certos responsáveis políticos falaram de reescalonamento “ voluntário e bem organizado”. É uma pura ficção. Os credores, e há dezenas dos milhares ou mesmo muito mais, nunca  serão voluntários e alguns  batem-se com energia negociando de forma muito dura  e recorrendo aos tribunais. De repente,  o procedimento é desordenado, longo e complicado.

 

Que pensam os mercados financeiros?

 

A opinião geral, mas não unânime, é a de que a Grécia não escapará a  uma reestruturação. Os mercados são habituados a estes acontecimentos e preparam-se. Uma parte dos bancos e os investidores que detinham a dívida grega desfizeram-se dela , frequentemente a sofrerem   perdas moderadas; agora estão posicionados para ganharem dinheiro  quando isso se produzir. Outros quiseram evitar perdas  a  revender  e estão agora inquietos. Ninguém  duvida que estes mantêm  a angústia dos governos de modo a que o contribuinte  os venha salvar da sua aposta. Ganham-se  hábitos.

 

Porque é que a França  se opõe a  uma reestruturação?

 

Segundo a linguagem oficial afirma a Europa não é a América Latina, a solidariedade não é uma palavra vã e o remédio corre o risco de ser pior que o mal porque existe um risco de contágio. O contágio é possível, com efeito. Resta  uma outra interpretação, perfeitamente hipotética. Os bancos franceses (e alemães) parecem deter uma parte da dívida grega e poderiam  vir a ter grandes prejuízos . Se estes bancos estão menos sólidos do que o que se pensa , poderiam ficar ainda mais seriamente destabilizados  , e ainda mais se houvesse contágio. Mas a informação sobre estas questões não está disponível, pode-se apenas imaginar o pior.

 

Porque é que o BCE  é violentamente contra  uma reestruturação?

 

O BCE está em dificuldades  e por muito tempo, sobre esta questão . Às advertências sucedem as ameaças. Como toda gente, o BCE teme o contágio. Este também avisou que o sistema bancário grego se desmoronaria, o que é possível, mas não seria dramático. Com efeito, se o governo reduz a sua dívida, digamos, de 50% do PIB e que deve então situar-se sobre a linha de água , ou seja (nacionalizar ) o sistema bancário por  um custo de aproximadamente 20% do PIB, o ganho fica então de  30% do PIB, uma bela  operação financeira.

 

As angústias do BCE podem estar  num outro lugar. Desde Maio de 2010, sob uma pressão intensa dos governos, comprou muitos títulos das diferentes dívidas  públicas. Cuidadoso, aplicou um haircut da ordem de 20% mas os incumprimentos em série deixá-lo-iam com perdas muito substanciais. Certamente seria recapitalizado pelos governos, mas  o Banco Central Europeu teme uma perda vertiginosa do seu prestígio, já colocado em maus lençóis pelas suas compras não muito voluntárias de dívidas, e mais geralmente, por um aumento do  cepticismo no que diz respeito à moeda única. As suas advertências soam  como um sinal de pânico, dando a ideia de que terá com o dedo imprudentemente  accionado uma engrenagem que não controla.

 

Quem decide ?

 

A Grécia é um país soberano e é ela que decidirá. Desde o início da crise, os seus parceiros europeus ditam-lhe o  caminho  a seguir e esta aceita estas injunções na esperança evidente de vir a  ser ajudada, ainda que as ajudas não sejam  dons, é necessário recordá-lo, mas sim empréstimos que aumentam a sua dívida. Como todos os outros, o governo grego pesa os prós e os contras das suas opções. Uma declaração de incumprimento dar-lhe- -ia para respirar um momento e permitir-lhe-ia aliviar a pressão sobre a sua população. Mas a decisão poderia tornar-se inevitável se os Gregos acelerassem o movimento, de momento lento, de retirada de fundos dos bancos, informados que estes estão pelo BCE que o sistema bancário pode desmoronar. O voluntarismo político quebra-se frequentemente contra o rochedo da dura realidade

 

 

 

publicado por Augusta Clara às 23:00

editado por Luis Moreira em 31/05/2011 às 11:35
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Quarta-feira, 4 de Maio de 2011

Dívida: quem pagará? Pierre-Cyrille Hautcoeur Le Monde

O Norte da Europa a viver à custa do Sul da Europa, esta é a política da União Europeia, esta é a política conduzida pelo Durão Barroso. Certo ?

 

Errado? Leiam o texto que se segue.

 

Júlio Marques Mota
Coimbra, 3 de Maio  de 2011.

Dívida: quem pagará?
Pierre-Cyrille Hautcoeur

 

Le Monde

 

Portugal, a Grécia, a Irlanda e a Espanha multiplicam os planos de austeridade e prometem pagar as suas dívidas, mesmo se para isso devam  “reestruturar a sua economia”, ou seja devam  reduzir a protecção social, reduzir os salários e aumentar o desemprego.

 

Estas purgas não são, no entanto, suficientes para  tranquilizar os credores: as taxas de juro pagas sobre as dívidas públicas dos países ditos “periféricos” aumentam  constantemente e atingem níveis insustentáveis. A dívida grega a  10 anos rende cerca  de  14%, a irlandesa quase 10%, a portuguesa 9%, contra cerca de  3,5%  “no centro” da Europa.

 

Para além da subida das taxas, a queda na oferta de crédito provoca falências em série  e agrava a recessão . Se esta não for compensada por políticas expansionistas noutros lugares  na zona euro, então a recessão vai-se  estender-se de forma duradoira por  toda a Europa.

 

Com efeito, a principal lição da história das zonas de câmbios fixos  como a zona euro - uma história conhecida menos desde Keynes - mostra-nos  que forçar os países em défice a reequilibrar a sua posição sem que os países credores relancem a sua procura interna nunca tem êxito - a queda do rendimento agrava as taxas de endividamento  mesmo quando a dívida nominal recua - mas generaliza a depressão económica.

 

Hostil a qualquer inflação

 

Perante as tensões sobre o sistema financeiro e a grave recessão destes  últimos anos, a zona euro utilizou a política monetária com uma relativa moderação (em relação aos Estados Unidos). O Banco Central Europeu (BCE) é independente mas está, sobre este ponto, próximo da hostilidade alemã  a toda e qualquer  ideia de inflação.

 

Tranquilizada quanto à  política monetária - que outros desejariam utilizar para reduzir as dívidas sem dor -  Alemanha deveria praticar uma política orçamental expansionista, da qual beneficiaria a sua população, reduzindo a taxa de IVA ou aumento os salários.

 

Esta atitude  apoiaria a retoma e reduziria o peso da dívida que pesa sobre as outras economias da zona euro.

 

Com efeito, as suas políticas orçamentais, postas a contribuir  aquando da recessão, hoje estão ameaçadas pelo risco de incumprimento.

 

Se as opiniões públicas do centro da Europa não querem pagar para os reformados da periferia, os da periferia ameaçam deixar de  pagar os juros das  obrigações detidas pelos reformados do Norte.

 

Emprestar dinheiro público aos Estados periféricos - a solução utilizada até agora - revela-se insatisfatória: o sobre-endividamento aumentou, daí ainda mais austeridade, mais recessão,  enquanto a socialização das perdas  incita à irresponsabilidade.

 

É tempos de dar a palavra os anunciantes de falências. Desde há vinte anos, os governos reduzem os direitos sociais em toda a Europa - um movimento que reforça os efeitos da crise para além do que pode ser considerado suportável.

 

Tornou-se  razoável de reduzir os direitos financeiros  que se tem vindo sucessivamente a reforçar e que estão, com o aumento das taxas de juro sobre as dívidas públicas da periferia, em concorrência directa com os direitos sociais.

 

A Europa tem a chance de ter  sistemas de reforma por distribuição que asseguram um mínimo de rendimento aos mais idosos. Este facto  permite reduzir os rendimentos do capital sem estar a arriscar a ruína dos accionistas, que tinham feito  a cama do nazismo entre as duas guerras.

 

Pierre-Cyrille Hautcoeur, Dette: qui paiera ?, Le Monde, 27 de Abril de 2011.

publicado por Luis Moreira às 23:00
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Domingo, 17 de Abril de 2011

A Grécia terá ela meios para reembolsar a sua dívida? - por Marie de Vergès,

 

Nota de introdução por Júlio Marques Mota

 

 

A crise está para ficar, está para durar e tanto mais será assim quanto se continuar a querer geri-la no quadro das práticas que a criaram. Procurar soluções neste quadro é impossível. A recente cimeira mostra-o à evidência, mas desta falaremos mais tarde. Por agora e nestes próximos dias iremos olhar para a situação actual dos países ditos periféricos, onde a Troika (Banco Central Europeu, Comissão Europeia, FMI) já está instalada no quadro da pressuposta resolução da crise, a Irlanda e Grécia.

 

 Depois de com os trabalhos de Sterdyniak e dos Economistas Aterrados, publicados na íntegra pelo Estrolábio, termos percebido o quadro em que se movimentam as Instituições Europeias, o seu quadro de análise e o conjunto de instrumentos de política económica de que se serve e que só servem para piorar a situação, depois de termos percebido com estes mesmos textos quais deverão ser os caminhos a percorrer, olhemos então para as consequências da aplicação dos remédios que a Comissão Barroso tem vindo a aplicar. A Irlanda, a Grécia, aos nossos olhos, portanto.

 

Uma pergunta vos deixo, aos visitantes de Estrolábio, na sequência  da leitura destes textos: da crise seremos nós apenas os agentes portadores, ou seremos nós os seus actores e os seus autores, por interpostos agentes, as Instituições Europeias, ao permitir que os instrumentos de política por aquelas utilizados sejam afinal os que têm conduzido à situação presente? Se assim é, outra consciência em política se exige. Que esta se ganhe, então.

 

A Grécia terá ela meios para reembolsar a sua dívida?

 

Decididamente, nada está feito. Apesar dos esforços do governo de Georges Papandréou para colocar o país sobre os carris, investidores, analistas e economistas altamente colocados continuam a duvidar da capacidade de reembolso da Grécia muitíssimo endividada. “Não haverá forma de escapar a uma reestruturação" da dívida, assim afirmou Otmar Issing, o antigo economista‑chefe do Banco Central Europeu (BCE), numa entrevista, segunda-feira 21 de Março, à revista alemã Der Spiegel.

 

A afirmação não é passível de contestação, na mesma altura em que os dirigentes europeus acabam de melhorar as condições da ajuda financeira concedida em Maio de 2010 a Atenas. A 11 de Março, aceitaram reduzir a taxa de juro exigida e prolongar a duração dos empréstimos realizados a fim de dar mais tempo ao país para restaurar a sua credibilidade. Uma lufada de oxigénio bem-vinda mas que, de acordo com numerosos especialistas, não dispensará o país de uma re-negociação com os seus credores. O sentimento dos operadores financeiros é extremamente pessimista: de acordo com um inquérito do banco Barclays Capital feito junto de um milhar de investidores, são cerca de 70% deles que acreditam no cenário de uma reestruturação de dívida na zona euro nos três próximos anos.

 

À beira da insolvência? A análise é rapidamente feita: a austeridade a que se está a obrigar Atenas, de acordo com as recomendações dos Europeus e do Fundo Monetário Internacional (FMI), incide negativamente sobre o crescimento. E muito fortemente. As baixas de salários e os aumentos dos impostos afectam o poder de compra das famílias. A Grécia não pode mesmo contar com a arma da desvalorização para estimular as suas exportações.

 

O produto interno bruto (PIB) diminuiu 4,5% em 2010. Deverá ainda diminuir 3% em 2011 enquanto a taxa de desemprego atinge os cerca de 15%. Sempre no capítulo das más notícias, o governo tem dificuldade em melhorar as receitas de impostos. Resultado, o défice aumenta e a dívida pula. Aproxima-se dos 150% do PIB, um nível recorde na zona euro!

 

Para o centro Bruegel, um instituto de investigação de grande influência na Europa, o país “roça claramente a insolvência". Assim, de acordo com os cálculos deste think tank, para que Atenas chegue a trazer a dívida pública para a barra dos 60% do PIB daqui até 2035, ser-lhe -ia necessário alcançar anualmente um excedente primário - sem o serviço da dívida - de 6% do PIB. “É uma tarefa de Hércules, indica André Sapir, professor na Universidade Livre de Bruxelas e investigador em Bruegel. O único caso no conjunto dos países da OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico) com tais excedentes, é a Noruega, mas é graças aos seus rendimentos do petróleo. “

A Grécia conta voltar aos mercados a partir de 2012. Mas a sua dívida continua a negociar-se sempre a taxas proibitivas. “No mercado dos CDS (títulos de seguro com os quais é suposto proteger-se contra o risco de incumprimento de um emitente), a Grécia é julgada de mais risco que o Iraque!“, ironiza Jean-François Robin, estratega no Banco Natixis. De acordo com este analista, esta avaliação é insensata. Mas, sublinha, que se os investidores exageram ou não, o certo é que “se as taxas permanecem onde estão, isto não é sustentável".

 

As razões para esperar. Acontece que a Grécia, o FMI e as Instâncias Europeias afastam a opção de uma reestruturação e alegam que o quadro está longe de ser muito negro: o governo efectua as suas reformas a um ritmo impressionante. Conseguiu reduzir o seu défice orçamental de 6 pontos de percentagem num ano, fazendo-o descer de 15,4% do PIB em 2009 para 9,4% em 2010. Para aumentar as suas receitas, Atenas além disso decidiu realizar um plano de privatizações de 50 mil milhões de euros. O objectivo é ambicioso. Se for atingido, do que duvidam certos peritos - o governo poderia dispensar-se de impor novos aumentos de impostos que correm o risco de enfraquecer ainda mais o crescimento económico.

 

Para toda a gente, é urgente esperar. As razões são bem compreendidas. Porque se a Grécia reconhecesse que não pode reembolsar as suas dívidas, isto constituiria um perigoso precedente: “Não se tem nenhum outro exemplo na história recente da Europa Ocidental, sublinha Jean-Michel Six, chefe economista na Europa de Standard & Poor’s. Não se conhecem, portanto, antecipadamente quais as consequências. Estas tanto poderiam ser relativamente benignas como extremamente graves", refere.

 

O perigo é o de um contágio aos outros países vulneráveis da zona euro. Os investidores, inquietos que um mesmo cenário se repita com a dívida irlandesa ou portuguesa, prefeririam largá-la. O sector bancário seria sujeito a uma muito dura prova, nomeadamente os estabelecimentos bancários alemães e franceses, muito expostos. "Muitos dizem “não agora” por medo de provocar a faísca de uma crise sistémica na zona euro", explica André Sapir.

Para uma reestruturação negociada. Os economistas do centro Bruegel julgam inevitável que Atenas venha a passar por uma redução de 30% da sua dívida negociável, calculada em 290 mil milhões de euros. Mas preconizam então que antecipadamente o sector bancário europeu seja saneado financeiramente e capitalizado.

 

Seja como for, a Grécia não procederia a uma declaração de incumprimento unilateral que tomasse os seus mutuantes de fundos desprevenidos. Os peritos crêem antes no cenário de uma reestruturação negociada, que lhes permita obter uma dilatação dos prazos de pagamento e uma baixa das taxas de juro. A Europa parece estar a preparar o terreno. Primeiro, por ter aceite um reescalonamento dos seus próprios créditos concedidos a Atenas, depois, porque esta decisão está ligada  com a de ter diminuido a taxa de juro. E, sobretudo, ao poder vir a reflectir-se sobre o mecanismo de resolução das crises após 2013, data em que expira o actual Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FESF).

 

É este um dos desafios da cimeira que reúne os dirigentes da zona euro a 24 e 25 de Março em Bruxelas. No futuro, a assistência financeira da Europa será condicional. Implicará uma participação dos investidores privados a partir do momento em que o país em dificuldade será considerado insolvente. Ninguém duvida que esta situação se colocará primeiramente para a Grécia se esta não recuperar a sua sustentabilidade daqui até 2013.

 

Marie de Vergès,  La Grèce a-t-elle les moyens de rembourser sa dette ?, Le Monde,

24 de Março de 2011.

 

 



[1] Tradução de Júlio Marques Mota, revisão de António Gomes Marques.

publicado por Carlos Loures às 20:00

editado por Luis Moreira em 16/04/2011 às 21:55
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Sábado, 16 de Abril de 2011

Será necessário reestruturar as dívidas soberanas europeias? Parte II - Por Dominique Plihon

 enviado por Julio Marques Mota

 

 

 

 

Economistas Aterrados (Continuação)

 

 

A segunda crítica que deve ser feita ao novo dispositivo europeu é o de escolher o procedimento “das cláusulas de acção colectiva” para definir as modalidades das reestruturações futuras. Esta cláusula, que deverá ser inserida em todos os contratos de emissão de dívida a partir de 2013, prevê o princípio de um acordo entre todos os credores no termo do qual estes aceitarão poderem ser reembolsados apenas parcialmente no caso de incumprimento; se tal acordo se revelar impossível, as partes instaurarão um processo. Este procedimento contratual não é aceitável porque cria uma incerteza sobre o bom fim da operação de reestruturação e não garante um equilíbrio satisfatório entre os interesses das populações dos países emissores e os interesses dos credores. Uma solução melhor é a criação de um tribunal das dívidas soberanas, no qual seriam representados os credores e os devedores. Certos economistas, próximos do FMI e da Comissão Europeia, propõem criar para esse efeito uma câmara especial do Tribunal Europeu de Justiça. Quando se vêem os acórdãos deste último em matéria de direito do trabalho, não se pode fazer outra coisa que não seja o de ficar com extremas reservas sobre esta ideia: o Tribunal apoia-se sobre os Tratados, que atribuem o superioridade ao direito da concorrência e à igualdade de tratamento entre os credores, enquanto seria necessário diferenciar as soluções de acordo com a natureza dos credores. Uma solução mais vantajosa seria pedir a criação de um tribunal europeu da dívida, constituído pelos poderes públicos e pelas organizações relevantes da sociedade civil, apoiando-se numa auditoria de cidadania e no contraditório das dívidas públicas. O mérito deste procedimento seria o de poder ser desencadeado pelos movimentos sociais.

A reestruturação das dívidas soberanas: necessária mas insuficiente

A reestruturação das dívidas soberanas aparece por conseguinte inevitável e poderia contribuir para quebrar a espiral recessiva do desemprego na qual a Europa se tem estado a afundar. Mas se as operações de reestruturação são a curto prazo necessárias, elas não serão suficientes, por si sós, para se sair da crise e se reconstruir a União Europeia sobre novas bases. Estas operações de reestruturação, para que venham a dar os seus frutos e libertar os Estados da tutela dos mercados, deverão inscrever-se no âmbito de uma renovação das políticas europeias em redor de três eixos principais:

 

1. Primeiro eixo — o financiamento de uma parte da dívida pública pelo banco central: os estatutos do BCE (artigo 21.º e artigo 123.º do Tratado de Lisboa) proíbem-lhe em princípio financiar os Estados efectuando a criação monetária.

 

No entanto, por duas vezes, o BCE transgrediu esta regra para fazer face à crise da dívida soberana na zona euro. A partir de Maio de 2010, como o FED (banco central) americano, o BCE começou a comprar as obrigações soberanas dos países da zona euro endividados a fim de se opor, com um sucesso bem limitado, ao disparar dos prémios de risco. A estas medidas “não convencionais” que tinham ficado sujeitas às críticas virulentas do banqueiro central alemão Axel Weber, acrescente-se outra viragem doutrinal do BCE: enquanto em Janeiro, Jean-Claude Trichet tinha declarado que não abrandaria as suas exigências quanto à qualidade (notação) que aceitava como garantia (o chamado colateral) para fornecer liquidez aos bancos, este anuncia em Maio de 2010 que “até nova ordem”, o limiar mínimo de notação dos títulos admitidos pelo BCE ficava suprimido…

 

A primeira lição que se tira dos episódios precedentes é que — paralelamente às operações de reestruturação — a criação monetária pelo BCE é necessária para facilitar a gestão da crise da dívida soberana na zona euro.
Uma segunda lição é que os estatutos do BCE são demasiado rígidos e estão hoje ultrapassados. Não somente o BCE deve financiar os bancos no seu papel “de credor em último instância”, como deve igualmente assegurar, a partir de agora, que é o “pagador em última instância”, o garante último do sistema. Esta brecha na aplicação dos estatutos do BCE deixará vestígios depois da crise: no futuro, um princípio deverá ser posto (imposto) e segundo o qual o financiamento dos défices públicos deve ser assegurado em parte pelo BCE, em função dos objectivos económicos, sociais e ambientais, tendo em conta os constrangimentos de estabilidade monetária e financeira.

 

Uma última lição da crise da dívida soberana é que, contrariamente ao que deixam entender as instituições internacionais e o discurso dominante dos economistas, um Estado não pode abrir falência na acepção do direito privado. Porque, contrariamente a uma empresa que pode ser levada a desaparecer devido à sua situação de insolvência, um Estado dispõe de dois meios para fazer face à uma situação quer de défice quer de dívida excessiva: utilizar a criação monetária e cobrar impostos.

 

2. Segundo eixo — desarmar os mercados: procurar “acalmar” os mercados é uma política dedicada ao malogro, dado que todas as medidas tomadas para este objectivo, desde o início da crise, não tiveram nenhum êxito, quer se trate dos programas de austeridade, exigidos pelos mercados, quer se trate dos dispositivos de gestão da crise da dívida, colocados em prática pelas autoridades europeias em 2010. Assim, em vez de se andarem a dar garantias aos mercados, é necessário atacar-se o poder da finança sobre os mercados e fazê-lo por todos os meios possíveis. Os principais eixos desta luta são bem conhecidos: paraísos fiscais, a tributação das transacções financeiras, controlo rigoroso dos hedge funds e dos mercados de produtos derivados, agências de notação, normas de contabilidade… tantos objectivos enunciados pelas sucessivas cimeiras do G20 sem resultados significativos!

 

No que se refere à luta contra a especulação nos mercados da dívida soberana, três medidas são prioritárias:
(1) a proibição das vendas a descoberto que permitem especular sobre a baixa de um título vendendo a prazo este título do qual não se dispõe no momento da venda. Uma tal interdição foi tomada na Alemanha, tendo-se as autoridades francesas oposto a esta medida;

 

(2) o encerramento dos mercados de produtos derivados fora da bolsa, uma vez que são mercados opacos, escapando a qualquer vigilância, a qualquer regulação. O principal vector da especulação contra a dívida grega foi o mercado dos CDS (credit default swaps), uma espécie de apólice de seguros permitindo a um investidor financeiro proteger-se contra o risco de não reembolso de um crédito ou simetricamente de especular sobre o risco de incumprimento de um devedor. As autoridades europeias têm uma política perigosa e incoerente a este respeito porque, por razões ideológicas, incentivaram a concorrência dos mercados organizados (supervisionados) feita pelos mercados não regulados, fora das bolsas, (dark pools) com a directiva MIF (Mercado dos Instrumentos Financeiros). Mais recentemente, na sequência da crise, estas autoridades iniciaram uma nova directiva que visa incitar os operadores nos mercados não regulados (out the counter) a registarem-se junto de câmaras compensação, o que não põe em causa a existência destes mercados;

 

(3) a aplicação de regras estritas às agências de notação e a criação de uma agência pública europeia. As agências de notação têm tido uma parte importante de responsabilidade no desenrolar da crise das dívidas soberanas na Europa. Ao degradarem brutalmente, de maneira excessiva, a notação das dívidas soberanas, as agências de notação desencadearam movimentos de pânico e de especulação nos mercados e puseram em perigo a estabilidade do conjunto da zona euro. As autoridades europeias decidiram em Dezembro de 2010 colocar as agências de notação sob a tutela da ESMA (European Securities and Markets Authority), uma das autoridades pan-europeias que devem iniciar a sua actividade em 2011 no âmbito da nova arquitectura de supervisão financeira da Europa. Esta decisão é insuficiente porque não põe em causa a lógica meramente financeira das agências de notação. A decisão que se impõe, mas que não foi a opção retida, é a criação de uma agência de notação pública europeia, funcionando de acordo com normas objectivas e diferentes das agências de notação privadas.

 

publicado por Luis Moreira às 20:00
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Quarta-feira, 30 de Março de 2011

A Grécia terá ela meios para reembolsar a sua dívida? (2) - Marie de Vergès

Júlio Marques Mota  Nota de introdução

 

 

A crise está para ficar, está para durar e tanto mais será assim quanto se continuar a querer geri-la no quadro das práticas que a criaram. Procurar soluções neste quadro é impossível. A recente cimeira mostra-o à evidência, mas desta falaremos mais tarde. Por agora e nestes próximos dias iremos olhar para a situação actual dos países ditos periféricos, onde a Troika (Banco Central Europeu, Comissão Europeia, FMI) já está instalada no quadro da pressuposta resolução da crise, a Irlanda e Grécia.

 

 Depois de com os trabalhos de Sterdyniak e dos Economistas Aterrados, publicados na íntegra pelo Estrolábio, termos percebido o quadro em que se movimentam as Instituições Europeias, o seu quadro de análise e o conjunto de instrumentos de política económica de que se serve e que só servem para piorar a situação, depois de termos percebido com estes mesmos textos quais deverão ser os caminhos a percorrer, olhemos então para as consequências da aplicação dos remédios que a Comissão Barroso tem vindo a aplicar. A Irlanda, a Grécia, aos nossos olhos, portanto.

 

Uma pergunta vos deixo, aos visitantes de Estrolábio, na sequência  da leitura destes textos: da crise seremos nós apenas os agentes portadores, ou seremos nós os seus actores e os seus autores, por interpostos agentes, as Instituições Europeias, ao permitir que os instrumentos de política por aquelas utilizados sejam afinal os que têm conduzido à situação presente? Se assim é, outra consciência em política se exige. Que esta se ganhe, então.

 

 

 

 Marie de Vergès  A Grécia terá ela meios para reembolsar a sua dívida? [1]

 

 

Decididamente, nada está feito. Apesar dos esforços do governo de Georges Papandréou para colocar o país sobre os carris, investidores, analistas e economistas altamente colocados continuam a duvidar da capacidade de reembolso da Grécia muitíssimo endividada. “Não haverá forma de escapar a uma reestruturação" da dívida, assim afirmou Otmar Issing, o antigo economista‑chefe do Banco Central Europeu (BCE), numa entrevista, segunda-feira 21 de Março, à revista alemã Der Spiegel.

 

A afirmação não é passível de contestação, na mesma altura em que os dirigentes europeus acabam de melhorar as condições da ajuda financeira concedida em Maio de 2010 a Atenas. A 11 de Março, aceitaram reduzir a taxa de juro exigida e prolongar a duração dos empréstimos realizados a fim de dar mais tempo ao país para restaurar a sua credibilidade. Uma lufada de oxigénio bem-vinda mas que, de acordo com numerosos especialistas, não dispensará o país de uma re-negociação com os seus credores. O sentimento dos operadores financeiros é extremamente pessimista: de acordo com um inquérito do banco Barclays Capital feito junto de um milhar de investidores, são cerca de 70% deles que acreditam no cenário de uma reestruturação de dívida na zona euro nos três próximos anos.

 

À beira da insolvência? A análise é rapidamente feita: a austeridade a que se está a obrigar Atenas, de acordo com as recomendações dos Europeus e do Fundo Monetário Internacional (FMI), incide negativamente sobre o crescimento. E muito fortemente. As baixas de salários e os aumentos dos impostos afectam o poder de compra das famílias. A Grécia não pode mesmo contar com a arma da desvalorização para estimular as suas exportações.

 

O produto interno bruto (PIB) diminuiu 4,5% em 2010. Deverá ainda diminuir 3% em 2011 enquanto a taxa de desemprego atinge os cerca de 15%. Sempre no capítulo das más notícias, o governo tem dificuldade em melhorar as receitas de impostos. Resultado, o défice aumenta e a dívida pula. Aproxima-se dos 150% do PIB, um nível recorde na zona euro!

 

Para o centro Bruegel, um instituto de investigação de grande influência na Europa, o país “roça claramente a insolvência". Assim, de acordo com os cálculos deste think tank, para que Atenas chegue a trazer a dívida pública para a barra dos 60% do PIB daqui até 2035, ser-lhe -ia necessário alcançar anualmente um excedente primário - sem o serviço da dívida - de 6% do PIB. “É uma tarefa de Hércules, indica André Sapir, professor na Universidade Livre de Bruxelas e investigador em Bruegel. O único caso no conjunto dos países da OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico) com tais excedentes, é a Noruega, mas é graças aos seus rendimentos do petróleo. “

 

A Grécia conta voltar aos mercados a partir de 2012. Mas a sua dívida continua a negociar-se sempre a taxas proibitivas. “No mercado dos CDS (títulos de seguro com os quais é suposto proteger-se contra o risco de incumprimento de um emitente), a Grécia é julgada de mais risco que o Iraque!“, ironiza Jean-François Robin, estratega no Banco Natixis. De acordo com este analista, esta avaliação é insensata. Mas, sublinha, que se os investidores exageram ou não, o certo é que “se as taxas permanecem onde estão, isto não é sustentável".

 

As razões para esperar. Acontece que a Grécia, o FMI e as Instâncias Europeias afastam a opção de uma reestruturação e alegam que o quadro está longe de ser muito negro: o governo efectua as suas reformas a um ritmo impressionante. Conseguiu reduzir o seu défice orçamental de 6 pontos de percentagem num ano, fazendo-o descer de 15,4% do PIB em 2009 para 9,4% em 2010. Para aumentar as suas receitas, Atenas além disso decidiu realizar um plano de privatizações de 50 mil milhões de euros. O objectivo é ambicioso. Se for atingido, do que duvidam certos peritos - o governo poderia dispensar-se de impor novos aumentos de impostos que correm o risco de enfraquecer ainda mais o crescimento económico.

 

Para toda a gente, é urgente esperar. As razões são bem compreendidas. Porque se a Grécia reconhecesse que não pode reembolsar as suas dívidas, isto constituiria um perigoso precedente: “Não se tem nenhum outro exemplo na história recente da Europa Ocidental, sublinha Jean-Michel Six, chefe economista na Europa de Standard & Poor’s. Não se conhecem, portanto, antecipadamente quais as consequências. Estas tanto poderiam ser relativamente benignas como extremamente graves", refere.

 

O perigo é o de um contágio aos outros países vulneráveis da zona euro. Os investidores, inquietos que um mesmo cenário se repita com a dívida irlandesa ou portuguesa, prefeririam largá-la. O sector bancário seria sujeito a uma muito dura prova, nomeadamente os estabelecimentos bancários alemães e franceses, muito expostos. "Muitos dizem “não agora” por medo de provocar a faísca de uma crise sistémica na zona euro", explica André Sapir.

 

Para uma reestruturação negociada. Os economistas do centro Bruegel julgam inevitável que Atenas venha a passar por uma redução de 30% da sua dívida negociável, calculada em 290 mil milhões de euros. Mas preconizam então que antecipadamente o sector bancário europeu seja saneado financeiramente e capitalizado

 

Seja como for, a Grécia não procederia a uma declaração de incumprimento unilateral que tomasse os seus mutuantes de fundos desprevenidos. Os peritos crêem antes no cenário de uma reestruturação negociada, que lhes permita obter uma dilatação dos prazos de pagamento e uma baixa das taxas de juro. A Europa parece estar a preparar o terreno. Primeiro, por ter aceite um reescalonamento dos seus próprios créditos concedidos a Atenas, depois, porque esta decisão está ligada  com a de ter diminuido a taxa de juro. E, sobretudo, ao poder vir a reflectir-se sobre o mecanismo de resolução das crises após 2013, data em que expira o actual Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FESF).

 

É este um dos desafios da cimeira que reúne os dirigentes da zona euro a 24 e 25 de Março em Bruxelas. No futuro, a assistência financeira da Europa será condicional. Implicará uma participação dos investidores privados a partir do momento em que o país em dificuldade será considerado insolvente. Ninguém duvida que esta situação se colocará primeiramente para a Grécia se esta não recuperar a sua sustentabilidade daqui até 2013.

 

Marie de Vergès,  La Grèce a-t-elle les moyens de rembourser sa dette ?, Le Monde, 24 de Março de 2011.

 

 



[1] Tradução de Júlio Marques Mota, revisão de António Gomes Marques.

publicado por Augusta Clara às 20:00

editado por Luis Moreira em 02/04/2011 às 02:02
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Segunda-feira, 14 de Fevereiro de 2011

Neoliberalismo ou Democracia: O Debate Está Aberto - por Júlio Marques Mota - 7

(Continuação)

d) Bem vindo à Europa Unificada

How Italy shranks its decit

Euromoney, 1 de Dezembro de 2001

Quando é que uma cobertura de risco não é uma cobertura? Quando é que um empréstimo é disfarçado como sendo uma cobertura, ou seja como sendo um "hedge". A International Securities Market Association (ISMA) e o Council of Foreign Relations consideram ter encontrado a prova de um contrato de swap a ser utilizado por um país para ocultar o seu nível de défice, a fim de satisfazer as Critérios de Maastricht.

A ISMA ficou suficientemente preocupada e cancelou uma conferência de imprensa com Gustavo Piga, o autor do relatório, porque se considerou não ser seguro. Piga descobriu indícios de um contrato de swap entre um país e um banco que este considera que foi usado para deturpar o tamanho do défice do país o que lhe permitiu participar na criação da moeda única europeia. Embora Piga não o quis dizer directamente, o país em questão é a Itália.

Em Maio de 1995, a Itália emitiu títulos no valor de 200 mil milhões de ienes (US $ 1,6 mil milhões de dólares). A taxa de câmbio na época era 193 liras por iene. Até Dezembro de 1996, o iene desvalorizou -se para 134 liras a. Com 12 países europeus a tentarem desesperadamente cumprir os cinco critérios de adesão à moeda única, a Itália queria proteger os seus ganhos com um hedge cambial, e foi assim que terá entrado num swap de divisas com um banco estrangeiro.

Mas este swap tinha algumas características peculiares. A taxa do swap era de 193 liras ou seja a taxa no momento da emissão de obrigações. Isto era raro - a grande maioria dos swaps cambiais são feitos em a taxa de câmbio em vigor, como o Eurostat, o gabinete estatístico da União Europeia, o admite. A taxa do swap foi muito pior do que a Itália poderia ter obtido. Esta estaria a perder muito dinheiro no longo prazo, pois iria pagar os ienes na data de maturação dos títulos a 193 liras e não a 134 liras por iene.

Também o que foi fora de comum foi a taxa de juro do swap - Libor menos 16,77 % ou seja 1677 pontos de base. Esta taxa de juro era quase inédita no mercado de swaps cambiais. Significava que a contraparte do swap, o banco, estava a pagar à Itália adiantamentos em dinheiro através de pagamentos de juros trimestrais.

Tudo isto tinha sido confirmado por ambas as partes. Onde estas diferem é nas suas razões para justificar o que aconteceu do porquê deste aconteceu.

Piga diz que o swap não foi nunca uma cobertura cambial, um "hedge", foi sim uma forma inteligente de conseguir que o país recebesse quatro adiantamentos em dinheiro graças à taxa de juro negativa da do banco, a sua contraparte. O swap foi um empréstimo, onde o país aceita uma muito má taxa de câmbio em troca de dinheiro à cabeça, em vez de ser um hedge. O recebimento destes pagamentos permitiram à Itália reduzir o seu défice orçamental de 0,02%.

publicado por Carlos Loures às 21:00

editado por Luis Moreira às 22:07
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Sábado, 16 de Outubro de 2010

O Orçamento e as mulheres a dias...

Luís Moreira
Serve tudo para encher os buracos sem fundo ha muito escondidos na desorçamentação, nas empresas publicas, nos hospitais EP, nas Parcerias Publico-Privadas...

O mais triste disto tudo e que as medidas agora anunciadas so chegam para nos prepararmos para o grande embate que ai vem em 2013, com o pagamento por parte do Estado da divida contraída com as parceiras Publico-Privadas. Ninguém sabe muito bem quanto será, mas vai chegar so para pagar os juros, a divida vai permanecer, estamos enterrados vivos num ciclo infernal que nos leva no caminho do empobrecimento.

Calcula-se que a divida total ande pelos 130%, o que equivale a toda a riqueza produzida pelo pais em 15 meses, e que so os juros andarão pelos 8% do PIB, o que corresponde aos custos do Serviço Nacional de Saúde num ano. Apesar das ameaças com os mega projectos a verdade era conhecida ha muito, mas ha sempre gente capaz de fazer o trabalho da mulher a dias, limpar o lixo para debaixo do tapete, esconder a falta de limpeza, apregoar vezes sem conta que estamos muito melhor que os outros e somos apreciados e admirados, bla,bla,bla...

Esta ai a factura destes dez anos de Sócrates que, não devemos esquecer, herdou uma divida de 67% ( a volta disto) foi o fartar vilanagem, com os negócios com as grandes empresas publicas, os bancos, as construtoras, os consultores...

Ainda este ano, irresponsavelmente, o sindicato dos professores arrancava mais 430 milhões de euros ao Tesouro exaurido, em troca do silencio do governo.

Gente sem preparação para exercer funções de responsabilidade, toma medidas e decisões que raiam o absurdo , todos se dão bem no papel de mulheres a dias
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publicado por Luis Moreira às 13:30
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