Ontem escrevi sobre o dever da heresia, por causa de vários políticos andarem a correr para o cargo de Presidente da República. Não há texto em que eu não tenha escrito sobre o debate da hecatombe que deveria percorrer todo o país. Fala-se de tudo, vive-se como se entende, gastam-se as poupanças em divertimentos, o crédito é o rei do dia-a-dia, os debates são sempre entre candidatos e pela televisão que vemos e ouvimos calmamente desde a cama. Não há comícios nem desfiles para apoiar o candidato preferido. Ninguém fala das suas preferências: resultaria num sortilégio, como cumprimentar alguém antes do seu aniversário, dá má sorte…O que pretendemos do próximo Presidente, é apenas debatido na Assembleia da República ou nas reuniões de pessoas do mesmo partido. Do que se fala, é de louvar os candidatos. É raro que, esse pretendente à mais alta magistratura da Nação, sai à rua para esclarecer pontos obscuros do seu programa. Portugal é infantil: não debate, aguarda e espera sem saber qual o programa do candidato da sua preferência, normalmente um programa retirado da ideologia do fechado partido político que apenas admite debates entre os seus membros. Não tenho visto nem ouvido palestras ideológicas públicas: ou não há tempo, ou não há interesse. A maioria dos candidatos tem partidos que os apoiam à porta fechada, apenas entre eles.
Convicções que ninguém pode mudar. Não sabemos, não entendemos, os discursos de 1985 são os mesmos do dia de hoje. A crise económica que sofremos, iniciada por um dos candidatos que não soube gerir os bens nacionais nem tomar conta do entesourar das arcas do estado, continua a usar as mesmas palavras de 1985, do tempo em que era 1º ministro.
Não sabemos quem diz a verdade, quem se interessa pelo povo, quem pode representar à sua soberania. Todas as palavras, programas, ideologias, não têm mudado, excepto a que nos mata: retirar ao povo o montante das dívidas que os nossos governantes não souberam pagar. Os governantes, procuram na nossa pobreza, a luz da sua escuridão de líderes que não convencem porque não souberam governar.
Será que voltaremos a viver os tempos antes do 25 de Abril de 1974? Perante esta incógnita, penso apenas em mim e tento fugir das manifestações dos que nada dizem e tudo prometem. Pelo que, dentro deste texto, faço uma viragem de tema, que também corresponde ao título do ensaio. E que os candidatos deviam ler.
Esta é a minha ironia para os governantes que apenas se orientam pelas suas ideias, regalias, sem fazerem um pacto de união que salve o país da crise financeira.
Esta é a minha irónica mensagem para os que dizem resolver os problemas da nação, mas não conseguem, especialmente endereçada ao candidato que preside actualmente à República e pensa numa divindade, em estreito contacto com a que diz existir:
Sem saber como, nascemos. Nascemos sem saber muito bem porquê. Somos resultado da paixão dos nossos adultos.
Essa paixão que não permite pensar, apenas agir. Essa paixão que tem, quase sempre como consequência, dar vida. O caminho ao Gólgota, como o nosso com os candidatos, começa mal nasce a pessoa[1].
Dizer que viver não custa e, depois, referir o caminho do calvário, parece uma contradição. No entanto, não o é. Dizer que viver não custa é já definir esse caminho semeado de espinhos dos preços, dos horários de trabalho prolongados, das esperas imensas de transportes lotados. De lutar contra a doença, porque o dinheiro descontado, no parco salário, faz falta. Desconto feito pelos mais poderosos que apenas querem continuar a acumular riquezas com a força do trabalho dos outros. Estes espinhos são inevitáveis. A vida ensina como somos matéria e que essa matéria se cansa, se aborrece ou nem sabe como se entreter. Não é em vão que Alice Miller comenta o que está na citação de nota de rodapé[2]. Criança isolada para ser bem dotada.
É por meio destas ideias de Alice Miller, do abuso que as crianças e os adultos sofrem com os políticos, ao serem sempre consideradas pessoas cuja dotação intelectual é inferior ao normal, que entendemos finalmente, que viver não custa, o que custa é ensinar a saber viver. Viver não custa desde que se saiba escapar às doenças, entender de economia e gerir o corpo e a inteligência, com diligência e com informação, como os pretensos candidatos deviam fazer.
Os mais novos aprendem estas ideias e outras, pelo real calvário dos seus pais com os líderes da República, esses adultos que são a força de trabalho de uma nação, como já advertia Marcel Mauss em 1924[3].
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