Luis MoreiraA saúde vai ser um dos sectores onde se verificará uma mudança mais dramática. Não é razão suficiente para a começarmos a discutir? Aqui podem ler dois estudos que tiram as mesmas conclusões. Gente muito diferente, conhecida, mas com as mesmas preocupações.
O corte foi de 6% no OE para 2011, assim sem ser planeado, às cegas, o primeiro efeito é o corte ao acesso, acordamos tarde (como sempre) para o déficit na Saúde.
Quando nós há vinte anos fizemos ( e bem) a grande modernização hospitalar já Ingleses e Alemães estudavam um "chamado pacote mínimo de serviços de Saúde públicos", já sabiam que não é possível o acesso e a sustentabilidade universal a todo o tempo, focando-se no que é realmente importante a que segmentos da população e quando.
Há hospitais a mais e camas de agudos a mais e há camas a menos para "cuidados continuados", há que fazer rapidamente a reconversão (mais um investimento público de proximidade e de recuperação imediata), o Estado tem que saber onde se deve concentrar e em que serviços.
Aqui, entre nós, sem discussão prévia, sem programação atempada o corte nas despesas na saúde vai ser cego e, se ao nível macro isto pode ser aceitável, no dia a dia vai levantar enormes conflitos. A Ministra da Saúde já veio dizer que os gestores gastadores vão ser afastados.
Tudo indica que o sector privado vai fornecer o grosso dos serviços de elevada tecnologia e que as unidades de serviço público vão ser mais pequenas e mais viradas para a comunidade (o contrário do que se tem feito).Isto implica o fecho de hospitais nas áreas em que os há a mais. Curiosamente, enquanto estas questões são discutidas nos países mais desenvolvidos, aqui continua-se, furiosamente, a construir hospitais em parcerias público/privadas.
Na área da gestão tem que se levantar e facilitar esta rede burocrática complexa que impede uma gestão flexível, e há que despartidarizar,o gestor não pode estar sujeito a constrangimentos de quem é nomeado por amiguismo ou razões partidárias.O dia a dia complexo de uma unidade de saúde não se compadece com falta de autoridade, autonomia e responsabilidade.
A evolução demográfica leva a que milhares de cidadãos idosos se encontrem anos a fio ligados a máquinas, sem qualquer hipótese de recuperação, há muto que se discute se estamos a "prolongar a vida se a prolongar a morte" e, sob o ponto de vista financeiro é pura e simplesmente insustentável.Portugal passa ao lado desta e doutras questões igualmente insustentáveis.
Paulo Moreira, director do "Journal of Management and Marketing in Heathcare"
afirma que em 2014 a saúde, tal como a conhecemos, estará irreconhecível.
Um estudo financiado pelo Heath Cluster da Saúde, liderado pelo presidente da Bial, Luis Portela e levado a efeito por uma equipa do Instituto Superior de Economia (ISEG) sob a direção de Augusto Mateus, concluiu que o sistema de saúde chegou a um ponto manifestamente insustentável.
" Se nada for feito, o sistema de saúde torna-se insustentável. Com o envelhecimento da população e a inovação terapêutica cada vez mais cara, o aumento de custo de tratar os doentes cresce a um ritmo muito superior à criação de riqueza. Injectar milhões que não existem não é solução, o país deixará de conseguir pagar a saúde.Se nada for feito, a estimativa para 2020 aponta para que um quarto da despesa pública seja alocada à saúde, o que é ímpossivel. Perante esta impossibilidade, o resultado seria um sistema com mais desigualdade no acesso."
"Se não soubermos aplicar melhor os recursos e valorizar melhor os investimentos, apostando na inovação, não temos solução para este problema.O estado vai acumulando uma dívida que vai atirando para a frente, para ser paga pelos cidadãos que vêm a seguir. É tão simples quanto isto"
Um sistema misto como na Alemanha, onde nem tudo é pago e prestado pelo Estado mas também pelos parceiros sociais. Garantindo sempre que há uma base pública (porque há um conjunto de aspectos que não podem ser resolvidos pelo mercado), contratualiza-se.
"Não podemos continuar a andar a dizer que os cidadãos gozam de direitos quando não temos capacidade económica para manter. Se insistirmos numa lógica de direitos consagrados à saúde sem preocupação de eficiência e optimização de recursos, atingiremos valores insustentáveis.Se dissermos que vamos fazer apenas aquilo para o qual temos recursos, seria um retrocesso muito grande nos cuidados de saúde, penalizando os mais fracos."
Apenas um exemplo. A mãe de um dos colaboradores de estrolabio, com 88 anos, precisa de uma pequena intervenção cirúrgica. O hospital encaminhou-a para casa dizendo-lhe para esperar que receberia em casa instruções. Estas chegaram dois meses depois para dizerem que, em Lisboa , para fazer a operação teria que esperar 2 meses; no centro do país (Espinho, Leiria?) esperaria um mês; no norte do país (Vale de Sousa, Braga?) a operação far-se-ia dentro de dois dias.
Agora somem milhares de casos destes em todas as especialidades,e calculem o que significa em termos de pessoal médico mal aproveitado, equipamento subutilizado; doentes a sofrer.
Isto na sociedade da informação em que estamos é inaceitável é facílimo montar uma base de dados nacional que seja alimentada por todos os hospitais e sempre actualizada. E nos medicamentos que faltam aqui mas que há a mais acolá, as próteses...
Muitas vezes não se trata de dinheiro, trata-se de organização, mérito, abertura à inovação, ser eficiente e eficaz.
A sã concorrência entre o estatal, o privado, as cooperativas, as misericórdias, faz milagres. O monopólio é o diabo seja em que actividade for, bem bastam aquelas actividades em que só o estado pode e tem legitimidade para oferecer serviços.