Quinta-feira, 27 de Janeiro de 2011

Dia das Beiras - Introdução por Porfírio Ramos

As Beiras, divididas em três Províncias, Beira Baixa, Beira Alta e Beira Litoral, estão espalhadas por seis distritos, Castelo Branco, Guarda, Viseu, Coimbra, Aveiro e Leiria, sem se contar com o distrito de Santarém, de que apenas o concelho de Ourém pertence às Beiras, com noventa e seis concelhos e mil trezentas e trinta e seis freguesias, constituem cerca de um terço do território do continente português. O nome desta extensa região pode conduzir-nos à ideia de que se trata de um todo uniforme, mas contém toda a variedade seja de clima seja, de estrutura geográfica, seja de produções agrícola ou arbóreas ou mesmo piscícolas, seja de costumes, tradições, culinária ou de História.

 

Em termos de clima, tem variedades tão grandes como o gélido clima interior da Serra da Estrela e raiano, ao clima mediterrânico do Alto Douro e ao clima ameno do litoral. A estrutura geográfica vai das planícies da orla marítima às elevadas serranias da Estrela. Os modos de vestir, vão dos safões dos pastores da Estrela às sete saias das mulheres do litoral. Os costumes do litoral influenciados pelas mil aventuras do mar, pouco ou nada têm a ver com as aventuras das lutas pela independência vividas pelos povos raianos.

 

São bem diferentes as comidas do interior em que o peixe é raro e o peixe fresco é quase inexistente, das do litoral em que o animal bovino não é tão abundante por serem menos frequentes as pastagens. E mesmo a carne suína do litoral tem diferenças muito grandes da do interior com os animais criados à base da bolota de carvalho. Também o queijo do litoral tem características diferentes das do queijo de ovelha da Serra da Estrela ou mesmo do de Castelo Branco. Os enchidos do interior fumados nas lareiras sempre acesas e condimentados com o colorau espanhol têm sabor diferente do dos maranhos da Sertã e da morcela de arroz de Leiria, tal como diferem o doce de abóbora, da Guarda, as brisas do Lis, de Leiria, os pastéis de Tentúgal e os ovos moles de Aveiro.

 

Não são comparáveis os vinhos de Ourem com os vinhos de Fozcoa, os vinhos do Dão os de Figueira de Castelo Rodrigo ou da Covilhã. As casa do litoral têm uma construção e um estilo bem diferente das do interior, tal como não são comparáveis as aldeias piscatórias com as de Monsanto ou de Sortelha. São bem diferentes os monumentos, como acontece com o Jardim das Estátuas de Castelo Branco, a Sé da Guarda, o Museu Grão Vasco e a sé de Viseu, a “CABRA”, em Coimbra, a Basílica de Fátima, no concelho de Ourém e o Castelo de Leiria.

 

Os carvalhos e os castanheiros da Beira Alta, as cerejeiras do Fundão o mostajeiro, hoje em vias de extinção, no concelho do Sabugal, as amendoeiras de Fozcoa, as salinas de Aveiro, as finas areias da Figueira da Foz e as azinheiras e os pinheiros de Leiria concedem diferenças substanciais à tonalidade da paisagem. Também os costumes decorrentes do isolamento dos povos do interior são marcadamente diferentes dos dos povos do litoral, mas numa coisa são iguais: É no seu religiosismo. As Beiras são um pouco do Portugal.

 

Porfírio Ramos (elemento dos orgãos sociais da Casa das Beiras)

publicado por siuljeronimo às 00:02

editado por Luis Moreira em 24/01/2011 às 22:54
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Domingo, 31 de Outubro de 2010

Que Lisboa teríamos hoje sem o Terramoto?

                                 
                                          Lisboa antes do Terramoto (Museu da Cidade)


Luis Moreira

Conhecemos cinco dos seis projectos apresentados ao Marquês para reconstruir Lisboa. O sexto desapareceu, o quinto foi construído. Como ainda hoje se pode ver, o motivo principal é que as construções obedeceram a rígidas regras, três fachadas, três andares, o rés-do-chão para lojas e cavalariças, o primeiro andar com varanda e o segundo e terceiro com amplas janelas todas iguais. Tudo o que se vê hoje fora destas regras, como o famoso quarto andar (serviu para compensar alguns proprietários das decisões arbitrárias do velho Marquês) não são originais.

A primeira ideia foi construir Lisboa na área de Belém, mas depois ganhou a reconstrução sobre as próprias ruínas da cidade. Esta reconstrução permitiu abrir amplas avenidas e ruas, o famoso xadrez da baixa de Lisboa. E se não tivesse aconteciso o terramoto como seria hoje Lisboa?

Podemos dar conta de cidades medievais que permaneceram, mas a que mais me chamou a atenção é o centro da cidade de York, no norte da Escócia, com as suas casas de madeira exíguas, as suas ruas estreitas a desaguarem no amplo largo defronte da velha Catedral.

Lisboa, teria crescido ao longo do rio Tejo para sul e para norte ou teria, como aconteceu, crescido em cima das ribeiras que são hoje a avenida de Ceuta em Alcântara, a avenida da Liberdade e a avenida Almirante Reis? Estas três avenidas são o traçado mais lógico, em qualquer circunstância, pois é certa a existência do Alto da Ajuda, onde o rei fez construir a real barraca, o bairro Alto, Mouraria e Alfama. As listas de passageiros e tripulantes dos navios das descobertas não deixam margem para dúvidas que aqueles bairros já eram povoados. Ora este povoamento exige que a ligação entre bairros se fizesse à custa das ribeiras, como aconteceu.

Resta o xadrez da baixa de Lisboa que, obviamente, não existiria. Mas que mudanças os fogos, a degradação e as novas construções introduziriam na malha urbana? O que é certo é que o Terreiro do Paço já existia mas não com o presente perfil e grandeza. Sem a actual dimensão não serviria de "âncora" para a existência da Praça da Figueira (onde já existia o Hospital de Todos os Santos, e a ainda existente Igreja de S. Domingos) e, muito menos, para a dimensão da actual Praça do Rossio.

Tudo indica que a Lisboa sem terramoto, se estenderia de modo semelhante ao actual, mas sem a monumentalidade da sua baixa que, contudo, seria muito diferente, objecto de reconstruções várias ao longo dos séculos.

Mas o mais certo é que lhe teria acontecido o mesmo que a Londres, por exemplo, devorada por fogos imensos que permitiram, tal como o terramoto, a reconstrução a regra e esquadro.
publicado por Luis Moreira às 23:00
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Terça-feira, 5 de Outubro de 2010

O Zeca fadista e a Amélia cantadeira.

Luis Moreira

O Zeca fadista, canta e toca viola na Baixa de Lisboa e emite uns sons tipo assobio, uma espécie de solista, de gaita de beiços. É um artista que nunca frequentou escola nenhuma de música, nasceu com aquele talento musical, com um ouvido que, se não é "absoluto" é muito próximo, pois ele não faz fífias no meio daquela algazarra. Mas o Zeca, tem outras interessantes caracteristicas. Uma delas é que o Zeca já não tem a idade do tempo em que arrasava as garotas da noite, era só elevar a voz num fado trinado e o mulherio era aos magotes. Agora engordou e empobreceu, mas o Zeca é dos que engorda na barriga e na cara, como não tem dinheiro, usa os óculos escuros comprados quando arrasava o "mulherame" o que faz que os óculos lhe fiquem pendurados na ponta do nariz , mas as astes não lhe chegam às orelhas, o que lhe dá um ar de quem se está rir, mesmo quando canta.

A Amélia cantadeira, é daquelas mulheres pequeninas e magrinhas, de idade indefinida, espreme-se toda para arrancar um som à sua voz já cansada, não engorda por mais que coma, é toda nervos, ajeita o chaile sobre os ombros num tique que lhe ficou da juventude nas casas de fado, fecha os olhos, levanta-se sobre os pés, ah, fadista.

Fui-lhe dizer que ela tinha nascido fadista, bastava olhar para ela, o ar gingão, a voz a trinar, a emoção a tomar conta dela, enquanto o Zeca fazia um dos seus intervalos, tocava viola num compasso repetido mas sem falhas, desconfio que passa pelas brasas e está explicado o uso dos óculos escuros, e ela, no meu tempo os homens morriam por mim, mas só amei o meu, que já lá está, ele "era assim grande como você" e esta frase é um livro aberto, "era", porque já se foi e ela ficou e "grande",porque mesmo magrinha podia bem com ele, coitadinho que não saía da taberna, e depois dormia à porta que quando eu chegava às tantas queria era dormir, não estava para aturar bebedeiras e ataques de ciúmes...
publicado por Luis Moreira às 13:00
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