Segunda-feira, 14 de Junho de 2010

Opinião. Serviço Nacional de Saúde, onde acaba já não volta


Carlos Mesquita

O Serviço Nacional de Saúde (SNS) conseguiu em Portugal, a maior diminuição da taxa de mortalidade infantil da Europa, e o acesso aos cuidados de saúde de toda a população, em particular daquela que dependia das obras de caridade. O SNS tem vindo nos últimos anos a ser vítima da degradação dos seus serviços, em muitas zonas do país; trata-se da passagem gradual e planeada dos serviços públicos de saúde para a mão de privados. O encerramento ou a redução do Atendimento Permanente, sem estarem criados serviços de substituição, o fim de valências e deterioração de especialidades em hospitais públicos, deu azo ao aparecimento de clínicas e hospitais particulares por todo o lado. A cada serviço que encerra ou deixa de prestar atendimento e cuidados de saúde com competência, surge uma empresa privada para preencher o espaço desocupado. A Saúde é uma área económica muito lucrativa, menos sujeita a riscos do que todos os outros sectores, do primário à industria e como se vê até o financeiro; não depende da macro economia, dos índices de confiança e outras variáveis económicas. Desde o nascimento ao fim dos dias todas as pessoas são clientes da “Saúde”. É um sector cobiçado, onde paulatinamente os privados vêm entrando, já dominando os meios complementares de diagnóstico e a maioria das consultas de especialidade. Segundo o economista Eugénio Rosa, que fez as contas, metade das próprias despesas do SNS já serão com serviços exteriores e subcontratos com privados. É sintomático que as grandes empresas da Saúde Privada sejam detidas por grupos bancários das famílias dos antigos “capitães da indústria”. Estiveram protegidos durante a ditadura pela contingentação industrial, passaram a ser amparados pelo regime das privatizações, após o 25 de Novembro, e querem mais, o aniquilamento do SNS tal como o conhecemos, deixando um serviço público residual, barato e de menor qualidade para os mais pobres. A razão é evidente, Portugal não tem população abastada em número suficiente para viabilizar a saúde privada, não chegam os que pagam integralmente do seu bolso as despesas da própria família com a saúde, mas há um freguês rico, chamado Orçamento Geral do Estado, cuja riqueza advém dos impostos directos e indirectos de todos os portugueses. O SNS é o seguro de saúde universal, desconta-se para ser socorrido em caso de necessidade, e é simultaneamente factor de solidariedade social, dos que têm para os que menos possuem; é exemplo na nossa sociedade de igualdade de tratamento e direito consagrado na Constituição. Nem tudo tem estado bem no SNS; à gestão deficiente e aos gastos supérfluos, somam-se a escassez de profissionais da saúde, particularmente médicos especialistas, que a Ordem, a Universidade e os governos não acautelaram de formar e deixar formar em devido tempo. Era no interior que essa falta mais se fazia sentir, mas com a reforma antecipada de muitos médicos e o êxodo para o sector privado, vai-se generalizar e agravar a incapacidade de assegurar urgências e outros serviços essenciais do SNS.


Tenho acompanhado de perto o que aconteceu com o caso do Hospital de Chaves que serve também os concelhos de Boticas, Montalegre, Valpaços, Vila Pouca de Aguiar e Ribeira de Pena; é paradigmático do caminho da destruição do SNS encetado pelos governos Sócrates e que poderá ter o seu epílogo no caso hipotético de Passos Coelho chegar a ser governo; para ele (e para o PSD) cortar na despesa é cortar no SNS, é a oportunidade que a crise lhes proporciona, caso os portugueses o permitam, coisa em que não acredito. É também antevendo estes perigos, que vejo como prejudicial para os interesses da maioria, a reeleição de Cavaco Silva. Adiante.

O Hospital de Chaves foi um projecto abraçado pelos profissionais da saúde que nele trabalharam, bem equipado e moderno. Como outras instalações da saúde do interior, foi dos primeiros a sofrer o desinvestimento no sector; em vez de se potenciarem as capacidades existentes, foi administrativamente reduzindo as valências e piorando as condições de trabalho, o que já levou à saída de 18 médicos, reformados antecipadamente. As urgências são um caos por falta de médicos, de macas, de organização, de pessoal, em particular nos períodos em que a região recebe os milhares de emigrantes e turistas. A degradação do hospital foi deliberadamente provocada por opções políticas, do fecho da Maternidade à integração no Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD). Escrevia eu num jornal local em 2006, que quando estivesse pronta a via rápida para Vila Real, ia embora a maternidade pública. Foi, com o argumento do Ministério da Saúde, de que não cumpria os parâmetros de segurança, 1.500 partos anuais. Como poucos atingem esse número o governo (em 2009) recua, e o número de partos deixa de ser critério, também para o sector privado. A maternidade não voltou a Chaves, obviamente. A integração no CHTMAD foi a ultima machadada na unidade hospitalar de Chaves, agora transformada num anexo, que é uma dor de cabeça para o reduzido quadro de pessoal e outra para os utentes que deixaram de ter Hospital. Entretanto um tal Hospital Privado anunciou a abertura em Chaves com maternidade e urgências 24 horas, e já estão a funcionar clínicas, uma das quais junto ao Hospital em decadência.

Para suportar os privados lá estão os acordos com os vários regimes pagos com o Orçamento de Estado. Fazia parte do programa eleitoral do PS em 2005 o fim dos subsistemas de saúde, já não fez parte do programa das últimas eleições. Na região do Alto Tâmega os autarcas pedem agora a desintegração do Hospital de Chaves do Centro Hospitalar de Vila Real, são os mesmos do PS e do PSD que permitiram ou apoiaram o actual estado de coisas, mas isso é crónica para outro destino.
publicado por Carlos Loures às 09:00
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