Quarta-feira, 3 de Novembro de 2010

A Província Cisplatina

Carlos Loures


A Colónia do Sacramento, de que aqui falei ontem, fundada por Portugal e perdida para a coroa espanhola em 1777, voltou à nossa posse em 1817, quando D. João VI incorporou toda a região do actual Uruguai no Brasil. A região anexada recebeu o nome de "Província Cisplatina"- prefixo cis - do mesmo lado - e platina de Rio da Prata: portanto, do mesmo lado do Rio da Prata. Durante um século, Sacramento fora por diversas vezes ganha e perdida nas lutas com as tropas espanholas ou nas guerras diplomáticas, até que o Tratado de Santo Ildefonso, assinado em 1777, a fixou como possessão espanhola. Como sabemos, em Novembro de 1807, D. João VI, ameaçado pela invasão napoleónica, transferiu a Corte para o Brasil. No Congresso de Viena, em 1815, o Brasil foi integrada como Reino, constituindo o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve. Por outro lado, a ida da Corte para o Rio de Janeiro, levou o rei a preocupar-se com o engrandecimento daquela gigantesca possessão portuguesa.

Em 1815, a Casa de Bourbon fora banida do trono de Espanha pelas forças napoleónicas. D. João VI temeu que os espanhóis o imitassem, e que na região circundante do rio da Prata nascesse um reino poderoso. Por isso, em 1816, a "Divisão dos Voluntários Reais", sob o comando do general Carlos Frederico Lécor, invadiu região oriental, tomou Maldonado e ocupou Montevideu em 1817. Carlos Frederico Lécor, barão de Laguna (1764-1836) foi um militar e nobre português, mas que, como tantos outros, serviu o Brasil após a independência.

O Vice-Reino do Rio da Prata, que podia ser a base do tal «reino poderoso» temido por D. João VI, fora criado em 1776. Compreendia os territórios da actual Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai (este último dentro do território conhecido na época como Banda Oriental do Uruguai). Foi criado principalmente como aquilo que hoje designaríamos como zona-tampão, defendendo o império espanhol da cupidez britânica e portuguesa.

O plano português não foi mal recebido no vice-reinado em plena revolução independentista, mas falhou por oposição de Lord Strangford, embaixador britânico junto da Corte portuguesa, pois à Grã-Bretanha convinha a fragmentação das colónias espanholas em pequenos países formalmente independentes. Considerando o sistema de comércio vigente nas colónias da América, outro mastodonte como o Brasil, seria favorável a Espanha, mas inconveniente para os interesse económicos britânicos. Pelas mesmas razões, apoiar a expansão dos territórios portugueses nas região, também não interessava à Grã-Bretanha. E embora as guerras fossem entre Portugal e Espanha, era pelos interesses da Grã-Bretanha que se morria de um lado ou de outro. O costume.

Com a protecção do Governo de Sua Majestade, começara, anos atrás, a gesta da libertação da América Latina. Simón Bolívar ( 1783 —1830), o «Libertador», conquistava Caracas em 6 de agosto e proclamava a Segunda República Venezuelana. Bogotá, na Colômbia caiu em 1814. Em 1816 a Argentina proclamava a sua independência. No território da banda Oriental, desde 1810, o patriota uruguaio José Gervasio Artigas (1764 —1850) dera também início a um movimento independentista que enfrentou os portugueses até 1820 e depois os brasileiros que, proclamada a sua independência em 1822 mantiveram no entanto a colónia. De notar que, embora a história oficial brasileira nunca o diga, os primeiros brasileiros eram portugueses que viram na independência uma oportunidade de passar a outro patamar de riqueza e prestígio. A começar pelo imperador. Não estranhemos, pois, que a política externa brasileira não tenha mudado.

Integrando-se neste movimento geral de libertação das colónias espanholas, Artigas juntou-se aos insurrectos, sendo nomeado tenente-coronel pela junta de Buenos Aires. Derrotou os espanhóis na batalha de San José, em 1811, obrigando-os a refugiar-se em Montevideu. Venceu-os também na batalha de Las Piedras e sitiou a cidade. José Artigas, considerado o pai da pátria uruguaia, presidiu ao primeiro governo nacional sendo, no entanto, em 1820 forçado a refugiar-se no Paraguai.

Em 1811, as forças portuguesas haviam ajudado os espanhóis, sitiados em Montevideu, a repelir Artigas e a combater os rebeldes argentinos. Derrotado pelas forças portuguesas na batalha de Catalán, em 1817, Artigas durante três anos remeteu-se à guerrilha. Não podendo mais resistir, após a derrota na Batalha de Tacuarembó em 1820, asilou-se no Paraguai, onde morreu trinta anos depois, sem voltar ao seu país. Com a Independência do Brasil (1822), a Colónia passou a integrar os domínios do novo país até à Independência da República Oriental do Uruguai, em 1828.

Teve então lugar uma prolongada guerra (seis anos) entre o Brasil e a Argentina (que se designava por Províncias Unidas), reivindicando ambos o países a posse do território da Cisplatina. A Grã-Bretanha, a superpotência da época prosseguindo a sua estratégia de fragmentação do império espanhol, obrigou os dois jovens países a assinar um tratado de paz pelo qual reconheciam a independência do novo Estado. Foi em 28 de agosto de 1828 que foi assinado o Tratado do Rio de Janeiro, ratificado em 4 de Outubro do mesmo ano, consagrando a independência do Uruguai. Uma das condições ditadas pelos ingleses era a de o novo estado nunca se unir ao Brasil ou à Argentina.

Comentando o Tratado, um alto responsável britânico, disse: «Pusemos algodão entre dois vidros». Pois foi. E os interesses britânicos ficaram assim bem defendidos.

Ilustracões, de cima para baixo: Tropas portuguesas marchando para a Província Cisplatina; José Gervasio Artigas; a Província Cisplatina e o Brasil.

publicado por Carlos Loures às 12:00
link | favorito

.Páginas

Página inicial
Editorial

.Carta aberta de Júlio Marques Mota aos líderes parlamentares

Carta aberta

.Dia de Lisboa - 24 horas inteiramente dedicadas à cidade de Lisboa

Dia de Lisboa

.Contacte-nos

estrolabio(at)gmail.com

.últ. comentários

Transcrevi este artigo n'A Viagem dos Argonautas, ...
Sou natural duma aldeia muito perto de sta Maria d...
tudo treta...nem cristovao,nem europeu nenhum desc...
Boa tarde Marcos CruzQuantos números foram editado...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Eles são um conjunto sofisticado e irrestrito de h...
Esse grupo de gurus cibernéticos ajudou minha famí...

.Livros


sugestão: revista arqa #84/85

.arquivos

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

.links