Carlos Godinho
Quando era miúdo e vivia no Barreiro, havia seis ou sete momentos por ano no futebol que me enchiam de adrenalina, quase como se jogasse. Eram as visitas do Benfica e Sporting e os jogos com a CUF e o Vitória de Setúbal. Eu e os outros miúdos vivíamos esses jogos com enorme entusiasmo. Além desses jogos, havia dois acontecimentos por ano, que nos marcavam com grande intensidade, embora sem os vivermos no local. Eram os Benfica/Sporting, na Luz e em Alvalade. Através de "A Bola" e mais tarde do "Record", e das rádios, a televisão nessa altura tinha muito pouco impacto, a repercussão desses jogos atingia o país e quase o fazia parar, secando tudo à sua volta. Que grandes momentos, com grandes jogadores, mas com pouca informação, onde quase tudo girava à volta da imaginação e do sonho. Hoje, esses jogos, perderam muito do seu fulgor, por força da rivalidade surgida com o crescimento do FC Porto e também com as fragilidades, surgidas à vez, dos clubes lisboetas. Além disso, a informação entra-nos pela casa dentro em catadupa, não deixando mais espaço ao sonho. Agora estamos dentro do acontecimento, tanto ou mais que os espectadores no campo, e praticamente tudo é antecipado para os espectadores de sofá. Só falta descobrir o resultado. O resto sabe-se e vê-se tudo.
(de «Todos Somos Portugal»)