Com o testemunho de Luís Moreira, continuo a publicar memórias do 25 de Abril. Venham mais!
Dois civis entram com Salgueiro Maia no quartel do carmo
Cheirava a qualquer coisa pouco comum embora ninguém dissesse nada com medo de atrapalhar, mas depois dos 16 de Março, percebeu-se que era desta. E a "comissão do reumático" foi um sinal, nenhum operacional lá estava, Costa Gomes e Spínola faltaram à chamada, a esperança era mais que muita.
Eu estava em casa quando recebi uma chamada a dizer " eu não te dizia?", a habitual sabedoria "após" que nós portugueses transformamos numa cumplicidade "antes". Claro que ele nunca me tinha dito nada, tinha esperança, agora é que é , mas como dizem os ingleses " prever antes é dificil".
Levantei-me com a rádio a dizer para os cidadãos não saírem de casa, mas lá fui eu, deixei o carro ali para os lados da Rodrigo Sampaio.A pé, comecei a ver guardas republicanos no Rossio cosidos à parede da estação e perseguidos à distância por civis. Meti velocidade e esgueirei-me para o Terreiro do Paço ainda a tempo de ver a corveta por-se ao largo.
Fuga para o Largo do Carmo, onde encontrei uma multidão a dar mais trabalho aos militares do que a guarda do quartel. Eu tinha saído há pouco tempo da vida militar ainda sabia o que não se devia fazer, e vi, aterrado, jovens soldados com as G3 voltadas para a multidão ou prestes a caírem, enquanto bebiam e comiam o que as mulheres lhes ofereciam.
Muita confusão, muita juventude, muito entusiasmo, muita desorganização onde devia haver organização e serenidade. Encontrei-as estampadas no rosto do Capitão Salgueiro Maia. Aquele estava ali para alcançar os objectivos, sereno, morria se fosse preciso, adversário temível. Acalmei, acreditei, os soldados iriam até onde ele quisesse.
A multidão, se houvesse troca de tiros, era um alvo privilegiado, aquele pessoal tinha o "pescoço no cepo", ainda conhecedor das técnicas militares mínimas de defesa, encostei-me a uma esquina que dava fuga para dois lados e que me dava uma visão aberta do portão do quartel. O Francisco Sousa Tavares subiu para cima de uma Panhard e com um megafone começou, com a sua voz forte e roufenha , a dar por adquirida a derrota do "regime fascista".
Salgueiro Maia exige, pelo megafone, a rendição do quartel e manda disparar rajadas de G3 ( esta arma dá tiro a tiro e de rajada) que fazem saltar o cimento da parede frontal da parede do edificio.
Entram dois civis, quem são? capitães à civil? corre que se trata de dois enviados do governo, mas porra, agora vamos conversar ? tiro neles, gritava-se! A seguir entra Salgueiro Maia , a multidão pronta para assaltar o quartel se o capitão ficar preso, mas então o chefe da força não tem ordens para assaltar o quartel? Veio depois a saber-se que sim, Otelo na Pontinha autoriza a rendição de Marcelo a Spínola.
Carros de vidros fumados entram no quartel, será o Spínola? mas esse gajo não é das direitas? dúvidas, até que é anunciada a rendição, e a saida de um carro militar com Marcelo que é apupado com murros e pontapés na viatura. Desce em direcção ao Rossio.
Apanho o carro e vou em grande velocidade para casa ver e ouvir a televisão.Afinal quem são estes gajos?
Cara(o)s amiga(o)s
Mais uma vez dizemos presente, na evocação do “dia inicial inteiro e limpo”, como afirmou Sophia de Mello Breyner.
Mais uma vez dizemos presente, para reafirmar a nossa alegria, pelas “portas que Abril abriu”, como disse Ary dos Santos.
Estamos aqui, para reafirmar a nossa convicção de que valeu a pena! Para reafirmar, se ainda é necessário, que não estamos arrependidos!
Sim, não nos confundamos! Não permitamos que nos confundam!
Como é possível haver quem diga que hoje estamos pior que antes do 25 de Abril? Apesar das enormes dificuldades que atravessamos, apesar de Portugal se afastar cada vez mais do que sonhámos em 1974, o país que hoje temos é incomparavelmente melhor do que o que tínhamos há 37 anos.
A responsabilidade do actual estado de coisas, da situação de crise que Portugal atravessa não é do 25 de Abril!
Não é no acto fundador da democracia – onde a Liberdade e a Paz deram as mãos para terminar com a repressão e a guerra, para abrir as portas ao desenvolvimento e à independência de novos países – que estão as causas dos males de hoje!
Não é devido ao 25 de Abril que nos confrontamos com uma lógica de facilitismo e de benefício do interesse privado, em detrimento do interesse público.
Não foi o 25 de Abril que promoveu o individualismo e a especulação, que não combateu eficazmente a corrupção e a evasão fiscal, permitindo a transferência de activos do sistema público para o sistema privado.
Não foi o 25 de Abril que permitiu que o poder económico capturasse a maioria dos dirigentes políticos, permitindo a promiscuidade entre o público e o privado, sempre em detrimento do que era público.
Não foi o 25 de Abril que permitiu ao poder económico a aquisição e o controlo da comunicação social.
Não foi o 25 de Abril que permitiu a captura da democracia política e a estagnação da crítica, o que só favorece o crescente fosso social, entre os que mais têm e os que são cada vez mais pobres e desfavorecidos.
Não foi o 25 de Abril que provocou a colonização do estado e das empresas públicas pelos aparelhos partidários do chamado arco do poder.
Não está no 25 de Abril a origem do falhanço estrondoso da nossa classe dirigente e dos principais políticos, que continuam a dar um triste espectáculo de guerrilhas internas e ataques mútuos, incapazes de equacionar os reais problemas do país e de mobilizar os cidadãos para uma resposta adequada.
Não, não podemos culpabilizar o 25 de Abril pela contínua atitude dos responsáveis políticos que, com a sua acção desbarataram a nossa confiança, destruíram esse bem precioso e vêm demonstrando não estar à altura das funções para que foram escolhidos.
O que nos coloca numa situação verdadeiramente dramática: a perda de confiança dos cidadãos nos seus dirigentes é bem mais perniciosa do que a dívida pública!
Que, como primeira consequência provoca o alheamento dos cidadãos da vida pública.
A responsabilidade dessa situação não pode ser atribuída ao 25 de Abril.
Essa responsabilidade cabe-nos a todos, pois temos sido nós que, pela acção ou pela abstenção, temos escolhido os responsáveis políticos que nos trouxeram a este estado de coisas.
Por isso, para ultrapassarmos a actual crise, temos de ser capazes de alterar as nossas atitudes. Todos, e cada um de nós, somos responsáveis, cabendo-nos participar no encontrar de soluções!
Se aos dirigentes é exigível que sejam exemplo de competência e de dedicação à causa pública, homens e mulheres respeitados e de mãos e passados limpos – sem autoridade moral não é possível a mobilização de vontades – a cada um de nós é exigível o nosso não alheamento.
A nossa História, de quase mil anos, diz-nos que em tempos de crise somos capazes de encontrar soluções. Confio que, mais uma vez, vamos conseguir!
Há 37 anos, se fosse hoje, poderíamos dizer que estávamos à rasca: enfrentávamos a ditadura, a guerra sem solução à vista, o atraso atávico.
Estamos em destaque no Sapo e queremos fazer o melhor nesta Páscoa cheia de dias importantes que queremos assinalar.
Sábado - dia 23, dia do livro, com uma série "Os dez livros da minha vida" da autoria de vários autores do estrolabio
Domingo - dia 24, textos alusivos ao 25 de Abril, alternando com a programação habitual
Segunda - feira, dia 25, poemas, canções, fotos e vídeos alusivos ao dia da Liberdade.
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