Quinta-feira, 30 de Setembro de 2010

Academia Galega da Língua Portuguesa apresenta o Portulano de Recursos em linha

A maior das dependências culturais estriba na imagem do mundo que nos dão trilhado, e que acompanhamos sem questionar.
Os galegos falamos há décadas das possibilidades para nos desempenhar com recursos e ferramentas lusófonas. Porém, uma vista de olhos aos principais centros de pesquisa das instituições públicas e privadas galegas evidenciam a mesma absoluta carência de recursos lusófonos que qualquer outra instituição espanhola, e uma idêntica estruturação hierárquica dos conteúdos e categorias de pesquisa que se impõe, alheia a esta nossa vantagem lusófona, sobre a qualidade dos recursos e ferramentas disponibilizadas.
A Academia Galega da Língua Portuguesa, consciente desta necessidade social e dentro dos seus princípios fundacionais, apresentou no II Seminário de Lexicologia realizado o sábado 25 de setembro em Compostela, desenhados com o programa de software livre Netvibes, três escritórios virtuais para uso da comunidade internauta:
O escritório institucional da AGLP O Portulano de Recursos em linha, O Survival Kit ou guia básico de recursos sobre língua.

O escritório institucional da AGLP é uma página Netvibes com a informação oficial da Academia antes publicada nesta página web: Objetivos da Academia, Membros, Parcerias, Publicações, informações sobre o Acordo Ortográfico e a Comunidade de Países de Língua Portuguesa, notícias e outras informações como a consulta do Léxico da Galiza.
O Portulano de Recursos em linha é hoje o maior arquivo de arquivos digitais em língua portuguesa, a conter mais de 3.000 ligações a páginas de recursos e informações de consulta livre sobre temas relacionados com as culturas lusófonas. Em menor medida, o Portulano de Recursos contém ligações a repositórios e ferramentas em língua inglesa, francesa e castelhana. Ótimo para uso de investigadores e curiosos, o Portulano de Recursos constitui a primeira ferramenta de pesquisa comum a todos os países lusófonos. Abrange, por isso, os repositórios e bibliotecas das principais universidades lusófonas, incluídas as galegas, tornando-se assim um grande instrumento a disposição da comunidade investigadora.


O Survival Kit, ou guia básico de recursos sobre língua portuguesa, é um escritório de recursos indispensáveis para o aperfeiçoamento da língua portuguesa. Desenhado especialmente para neo-escreventes galegas e galegos, o Survival Kit consta de duas abas ou separadores principais em que se acham os recursos sobre língua tais como dicionários, tradutores, conjugadores verbais, dicas de fraseologia, prontuários e pesquisas em rede, e alguns dos mais conhecidos centros sociais da Internet reintegrante galega, para além de algumas ligações escolhidas sobre literatura, história e música em língua portuguesa.



Os três escritórios estão ligados entre si e podem ser consultados desde qualquer um dos outros dous. No Survival Kit, ou maletim de sobrevivência, a dica diária Portulano do Dia oferece uma sugestão dentre as ligações contidas no Portulano de Recursos.
Para mudar os costumes podemos começar por colocar como página de início qualquer um dos três escritórios, pois os tempos dos galegos aproveitarmos as nossas vantagens práticas como lusófonos são chegados.



publicado por CRomualdo às 09:00
link | favorito
Sábado, 28 de Agosto de 2010

O FLiP8;, o dicionário Priberam online e o galego-português

Carlos Durão

Acedo com gosto ao amável convite do Estrolabio para fazer uma breve resenha de algo que nos honra a todos, nesta grande casa da Lusofonia. Trata-se da atualização do reconhecido programa FLiP, da empresa Priberam Informática, permitindo programas OpenOffice.

Para nós, galegos, é importantíssima esta oitava atualização, pois entre as variedades nacionais da língua que tradicionalmente lá figuravam: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Timor, hoje por primeira vez aparece a Galiza, até com a sua bandeira. Este é um facto (um feito, como dizemos acima da Raia) que nos orgulha a todos, e pelo que parabenizamos a Priberam Informática.

Talvez para alguns leitores seja isto novidoso, mas a consideração da língua galega como “variedade do português” (também “norma galega do português”), sempre afirmada pela filologia clássica e independente de nacionalismos, recebeu um revigorado impulso nos dous derradeiros anos, que são os que tem de vida a jovem Academia Galega da Língua Portuguesa: ela foi recebida de braços abertos pelas irmãs Academia de Ciências de Lisboa e Academia Brasileira de Letras. A sua Comissão de Lexicografia e Lexicologia forneceu um Léxico não exaustivo (1200 entradas aprox.) de palavras “tipicamente” galegas, de uso corrente, para se integrar no Vocabulário Ortográfico que pedia o Acordo Ortográfico, como também nos demais dicionários da Lusofonia.

E isso já está a acontecer: um exemplo é este FLiP8; também o dicionário Priberam online já começou a incorporar esse Léxico. Os leitores podem ali consultar duas típicas palavras galegas: “lôstrego” e “brêtema” (http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=lôstrego e http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=brêtema). Elas já figuravam, como exemplos de proparoxítonas com vogal tónica fechada, na Base XI, 2º a) do Acordo Ortográfico de 1990, de Lisboa, no que a Galiza participou, com uma delegação de observadores, nas sessões de trabalho (como antes no de 1986 no Rio).

A inclusão de léxico da Galiza no FLiP 8 é fruto, pois, do trabalho da CLL da AGLP, e do Protocolo de Cooperação assinado com a Priberam. Mas também do chamado reintegracionismo linguístico galego, ao longo de muitos anos e com os esforços de muitos “bons e generosos” (as palavras do nosso Hino) de ontem e de hoje, entre os que só mencionarei os saudosos Ernesto Guerra da Cal e Manuel Rodrigues Lapa. Bem hajam!

Está a amadurecer na Galiza a consciência de pertença ao tronco linguístico comum, da que procuram afastá-la obscuros poderes ao serviço do centralismo estatal espanhol. Para estes “o galego” está bem em estado de hibernação e como engraçado adorno folclórico; e para eles é intolerável que a Galiza assuma a sua língua como nacional e internacional, com todas as consequências: pois isso é o que está a acontecer hoje nas suas camadas mais novas. Já era hora!

(Carlos Durão, Londres, 27 agosto 2010)

(Algumas ligacões: http://aglp.net/index.php?option=com_content&task=view&id=117&Itemid=31

http://aglp.net/index.php?option=com_content&task=view&id=114 (Léx) e

http://aglp.net/images/stories/Documentos/lexico_aglp.pdf)


publicado por Carlos Loures às 09:00
link | favorito
Quinta-feira, 26 de Agosto de 2010

Canta Galiza!

Hoje apresentamos três lindíssimas canções galegas. Começamos com Cristina Fernandez, uma uruguaia de origem galega, cantando "O galego na escola", uma canção de crítica bem-humorada, mas certeira, à repressão feita à língua e à cultura galegas.

Segue-se "Galiza - uma terra, um povo, uma fala", pelo grupo Perdizadm:



Finalmente, apresentamos uma parte do Concerto de Uxia Senlhe na Sala Zitarrosa de Montevideu, Uruguai. Como convidada especial a cantora uruguaia, de origem galega, Crsitina Fernandez ~



Em breve, prosseguiremos com "Canta Galiza!".
publicado por Carlos Loures às 09:00
link | favorito
Quinta-feira, 12 de Agosto de 2010

María Xosé Queizán fala sobre Ricardo Carvalho Calero

Continua Estrolabio a dedicar a sua particular atenção às questões relacionadas com a língua e a literatura galegas, particularmente à figura de Ricardo Carvalho Calero -  cujo centenário se comemora este ano e ao qual consagraremos por inteiro a nossa edição de 30 de Outubro.

Dentro desse espírito, transcrevemos hoje do Portal Galego da Língua,com a devida vénia, uma crónica da escritora María Xosé Queizán, na qual a autora de Despertar das amantes, destaca a importância de Carvalho Calero para a cultura galega, lamentando e denunciando o ostracismo a que foi condenado. 

Esta crónica foi colhida no semanário "A Nosa Terra", ao qual endereçamos também os nossos agradecimentos.
 
Começa Queizám a falar da casa natal de Carvalho, na parte velha de Ferrol. O prédio, em estado ruinoso, "pode servir como representaçom do desleixo das autoridades políticas e culturais galegas por esta figura exemplar do nosso pensamento e cultura", denuncia.  A seguir lembra as suas vivências pessoais e familiares com ele, narrando que, sendo ela criança, o vira em fotografia passeando com seu pai por Santiago de Compostela. Ambos, nascidos em 1910, eram "companheiros na faculdade de Direito, correligionários na FUE e colaboradores da revista RESOL".  Nom seria até 1962 que o conheceu pessoalmente. Foi em Lugo, e Carvalho "aledou-se ao abraçar a filha do seu perdido amigo". O relacionamento pessoal continuou ao se converter o ferrolano no primeiro crítico literário de Queizán, pois realizou a recensom do primeiro romance da escritora, A Orella no Buraco, em 1965. Mais tarde converteu-se "no meu querido professor" na matéria de Lingüística e Literatura Galega, cátedra que ganhou em 1972.  Nesta altura do artigo, Queizán só tem boas palavras para Carvalho Calero. "Pertenço à primeira promoçom da licenciatura de Galego-Português, grupo que mantemos o nosso agradecimento a tam insigne professor e somos conscientes, nom só do que significou o seu magistério, mas do imprescindível que foi a sua obra". Aliás, afirma que sem o trabalho investigador do professor, como a monumental História da Literatura Galega Contemporánea (1963), "nom seria possível instaurar tal licenciatura".  María Xosé Queizán finaliza o artigo para A Nosa Terra salientando que Carvalho Calero foi umha "pessoa séria, responsável, fiel aos seus princípios políticos, participa na criaçom do Partido Galeguista e na redaçom do Estatuto. Nom se concibe a cultura galega dos últimos 75 anos sem ele. Tampouco se entende a incúria em que o mantenhem".

(Na foto, casa onde Carvalho Calero nasceu, no Ferrol-Velho).
publicado por Carlos Loures às 11:00
link | favorito
Sexta-feira, 6 de Agosto de 2010

O porvir do galego - Professor Ricardo Carvalho Calero fala sobre o galego-português

Dando continuidade à série de textos que temos vindo a dedicar às comemorações do centenário do Professor Ricardo Carvalho Calero (1910-1990), iniciamos hoje a divulgação de um conjunto de vídeos sob o título genérico "O porvir do galego", titulo e tema de um entrevista emitida em 27 de Abril de  1987 pela TV Galiza. Esta entrevista foi conduzida por Constantino García González (Uvieu 1927 - Compostela 2008), Catedrático de Filologia Românica da Universidade de Santiago de Compostela. É um depoimento essencial para a compreensão da posição de Carvalho Calero na luta pela língua e pela cultura galegas. Sabendo que os galegos, de uma maneira geral, conhecem sobejamente esta posição, fazemos a sua divulgação mais em intenção de muitos portugueses, brasileiros e outros falantes  do idioma, que não têm dado a este magno problema a atenção devida.

 Neste segmento que hoje inserimos, o Professor Carvalho Calero explica as razões históricas que conduziram à secundarização do galego relativamente ao castelhano, situadas sobretudo no século XIV, quando no século XIV, a aristocracia galega apoiante de Henrique de Trastâmara, se viu obrigada a exilar-se. sendo substituída pela nobreza castelhana e durante a Revolução Industrial, com a chegada de técnicos estrangeiros. Explica como na Catalunha as coisas se passaram de modo diferente, pelo que foi possível aos catalães manter a língua e a literatura mais protegidas da aculturação.

Até 30 de Outubro próximo, não deixaremos de ir publicando textos, fotografias e vídeos sobre o Professor Carvalho Calero, figura cimeira da intelectualidade galega . O Estrolabio de 30 de Outubro será inteiramente dedicado à sua vida e à sua obra.

Iremos,até lá, publicando textos sobre Carvalho Calero e sobre outros paladinos da unidade do galego-português, como já fizemos com Manuel Rodrigues Lapa, por exemplo, um grande intelectual português que disse referindo-se a Otero Pedrayo: Se eu tenho orgulho em ser galego desta Galiza de aquém-Minho, e não é a primeira vez que o manifesto (sou de Anadia, nos limites da Galiza lanterga [sic]), por que razões ele, homem de Lugo, que pertencia à metrópole de Braga, não há-de ter orgulho em ser português? Dizendo melhor: por que não havemos todos de ter muita honra em ser galego-portugueses?”( in Otero Pedrayo e o problema da língua”, Grial, no 55, 1977, p. 44; depois em Estudos galego-portugueses, op. Cit.

. 


publicado por Carlos Loures às 09:00
link | favorito
Quarta-feira, 30 de Junho de 2010

Manuel Rodrigues Lapa e a Galiza (2)

Carlos Loures

Nos anos que se seguiram, prosseguiu infatigavelmente a sua tarefa de pedagogo, saindo textos seus na Seara Nova, na Revista Portuguesa de Filologia, de Coimbra, na revista Anhembi, de São Paulo, no Diário Carioca, do Rio de Janeiro, nos Cuadernos de Estudios Gallegos, de Santiago de Compostela, na revista Romania, de Paris. Em 8 de Agosto de 1954, foi a São Paulo onde participou no Congresso Internacional de Escritores, na companhia de Adolfo Casais Monteiro e de Miguel Torga. Deu lições na Universidade e conferências na Faculdade de Filosofia da Universidade de Minas Gerais. Regressou a Lisboa e prosseguiu a sua batalha, publicando a comunicação ao congresso de São Paulo – Das origens da poesia lírica medieval portuguesa. Na Anhembi publicou Galiza e Portugal; aspectos da cultura galega.


O ar de Portugal tornava-se irrespirável. A ditadura não lhe dava tréguas (e ele também ia dando bastante trabalho a censores e polícias…). Chegara o momento de partir. Em Maio de 1957 fixou residência no Brasil, em Belo Horizonte. Leccionou Literatura Portuguesa na Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais e intensificou a colaboração em jornais e revistas do Brasil, sem deixar de colaborar na «sua» Seara. Em Portugal, Salazar decidiu afastar Craveiro Lopes e as suas veleidades «de esquerda» e promover Américo Tomás. Mas não contou com o furacão Delgado. Nas eleições presidenciais de Junho, Humberto Delgado ganhou nas urnas, mas Tomás foi eleito. O Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, escreveu uma carta aberta ao ditador, defendendo a abertura do regime. Salazar «abriu-lhe» a porta de saída, retirando-lhe a diocese e obrigando-o a exilar-se. Manuel continuou no Brasil, ensinando, publicando, lutando. Em 1960, na revista Grial, de Vigo, saiu uma recensão sua ao livro de Luciana Stegagno Picchio In margine all’edizione di antichi testi portoghesi.

Em Dezembro de 1962 resolveu vir a Lisboa. Preso pela PIDE à chegada, foi solto no mesmo dia. Decidiu ficar em Portugal, apesar de tudo. Em 1964 leccionou um curso na Universidade de Santiago de Compostela e a revista Grial, de Vigo, dedicou-lhe um dos seus números. Entre outras publicações deste destaca-se, no Jornal de Letras e Artes, de Lisboa, o artigo Castelão: um grande artista galego. Em 1965, ano em que voltará ao Brasil, publicou Cantigas d’escarnho e de mal dizer dos Cancioneiros medievais galego-portugueses. (Editorial Galáxia, Vigo). Com uma emocionada dedicatória: «À Galiza de sempre, raiz anterga da nosa cultura, adico afervoadamente iste libro». Em edição do Instituto Nacional do Livro, do Rio de Janeiro, saiu a sua primeira Miscelânea de língua e literatura portuguesa medieval. Em 1967 publicou na Seara um artigo de homenagem a Raul Brandão, no centenário do seu nascimento – O «Balanço à Vida» na obra de Raul Brandão.

Em 1968, a Seara Nova, nos seus números de Maio, Junho, Julho, Agosto e Setembro, homenageou Rodrigues Lapa, que completou 70 anos em Abril, com textos e depoimentos de, entre outros, Orlando Ribeiro, Vitorino Magalhães Godinho, Lindley Cintra, Sophia de Mello Breyner, Ruy Luís Gomes, Mário Sacramento… Em Agosto, Salazar caiu da cadeira sendo substituído por Marcello Caetano. A «primavera marcelista», a promessa de uma liberalização do regime, revelou-se uma falsa esperança – continuou a Guerra Colonial e a repressão política.. Em 1969, Manuel, a convite de Mário Sacramento (entretanto falecido em Março), participou no II Congresso Republicano de Aveiro, presidindo a algumas sessões de trabalho.

Em 1971 participou na organização de uma Semana Cultural Galego-Portuguesa, em Coimbra, proferindo a palestra A Galiza, o Galego e Portugal. Em Fevereiro de 1973, substituiu Augusto Abelaira na direcção da Seara Nova. Ainda em 73, publica A recuperação literária do galego, única colaboração que teria na revista Colóquio-Letras, com uma resposta-comentário do escritor catalão, e seu amigo, Fèlix Cucurull (1919-1996).
 


Em 18 de Abril de 1974 foi ao Brasil, pois ia ser condecorado pelo Governo de Brasília. Foi, pois, no Brasil que soube que no dia 25 o odioso regime, que tanto o perseguiu a ele e a todos os democratas, caíra finalmente. No dia 29, regressou a Portugal. Prosseguiu a sua actividade, publicando textos na Seara Nova e na Vértice, principalmente. Em 1976, no dia 5 de Outubro, foi condecorado pelo Governo português com a comenda de Grande Oficial da Ordem da Liberdade.

Em 22 de Abril de 1977 completou 80 anos. No mês seguinte, a classe de Letras da Academia das Ciências de Lisboa, sob a presidência do professor Jacinto do Prado Coelho, aprovou um voto de saudação pela passagem do seu octogésimo aniversário. O académico Norberto Lopes recordou a obra «de um dos mais fecundos e brilhantes escritores e investigadores linguísticos, figura cimeira do ensino universitário e combatente valoroso da luta pela liberdade que se travou neste País». Em 1979, publicou Estudos Galego Portugueses: por uma Galiza renovada. Quando a Associação Galega da Língua (AGAL) se constituiu, em 1981, Manuel Rodrigues Lapa foi membro de honra, e figura, com Ricardo Carvalho Calero, Jenaro Marinhas e Ernesto Guerra da Cal, como uma das suas mais ilustres figuras.



Em Junho de 1981, como já disse, foi a Santiago participar no lançamento de um livro de Carvalho Calero. No n.º1 da Revista da Biblioteca Nacional, saiu um texto autobiográfico – Um rapaz curioso na velha Biblioteca Nacional, no qual após tecer diversas considerações sobre as opções que fez na vida, concluiiu em jeito de balanço final: «escolhi sempre a via libertária. Apesar de alguns contratempos e desilusões, posso afirmar que ainda me não arrependi».

Em Julho de 1982, na Universidade de Aveiro, proferiu uma conferência – O problema linguístico da Galiza; sobre cultura e idioma na Galiza. Em 1983, mais homenagens – destacamos a que, realizada na Biblioteca Nacional, foi presidida por Tito de Morais, presidente da Assembleia da República, em nome do chefe de Estado, Ramalho Eanes. De realçar um impressivo discurso da professora Maria de Lurdes Belchior. Numa homenagem do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, sairam dois volumes do Boletim de Filologia, com uma nota introdutória dos professores Lindley Cintra e Maria Elisa Macedo de Oliveira. O volume é composto por 55 textos de 58 autores de diversas nacionalidades. Nos anos seguintes, não pararam nem as homenagens nem a publicação de textos e a reedição de obras de Rodrigues Lapa. Em 27 de Março de 1989, a menos de um mês de completar 92 anos, o nosso Manuel morreu, às onze da noite, no Hospital José Luciano de Castro. Um acidente vascular cerebral foi a causa do óbito.

Termino com palavras do professor Vitorino Magalhães Godinho: «Portugal não quis, ou não soube aproveitar a pleno Rodrigues Lapa. A amargura oprime-nos, ao pensar nos irreparáveis desperdícios de valores autênticos, daqueles que, mais do que quaisquer outros, estavam preparados para trabalhar pela pátria, enriquecendo o seu património pela criação com categoria internacional».
_______
Nota: para realização deste texto, utilizei várias fontes. A principal foi o trabalho de José Ferraz Diogo Manuel Rodrigues Lapa Fotobiografia (1997)
publicado por Carlos Loures às 12:00
link | favorito
Terça-feira, 29 de Junho de 2010

Manuel Rodrigues Lapa e a Galiza (1)

Carlos Loures

Nas comemorações do centenário do nascimento de Ricardo Carvalho Calero, não podia deixar de recordar um dos seus amigos portugueses – Manuel Rodrigues Lapa, um dos homens que, do lado de cá da fronteira mais se empenhou na reabilitação do galego e na sua reintegração no tronco comum do galego-português. Em Agosto de 1932 fez a sua primeira viagem à Galiza para participar numa homenagem a Castelão. Foi um marco importante da vida de Rodrigues Lapa, pois o seu amor por aquela nação irmã, acompanhá-lo-ia para sempre. Em Junho de 1981, fez uma última viagem à «sua» Galiza. Foi a Santiago de Compostela para participar no lançamento de um livro de Carvalho Calero - Problemas da Língua Galega. A ligação ao berço do idioma, foi uma constante na sua vida: «Nunca deixei de me ocupar da Galiza, que é para mim um vício e uma necessidade»., disse. A Galiza foi uma das maiores paixões da sua vida. Façamos, pois, uma síntese da sua biografia e dessas relações com os irmãos do Norte.

Manuel Rodrigues Lapa, nasceu em 22 de Abril de 1897 na Anadia, no extremo Sul do antigo reino da Galiza. Em 1919 licenciou-se em Filologia Românica e em 1929 entrou no corpo docente da Faculdade de Letras de Lisboa como assistente, indicado por José Leite de Vasconcelos. Bolseiro em Paris (1929-1930), doutorou-se com a dissertação Das origens da poesia lírica em Portugal na Idade Média. Em 15 de Fevereiro de 1933, proferiu no Salão da Ilustração Portuguesa, uma conferência que daria brado e iria marcar para sempre a sua vida – A política do idioma e as Universidades. O texto da palestra foi publicado na Seara Nova. Para entender a celeuma provocada, é preciso que nos situemos historicamente.


Como uma cobra que despisse a pele, a Ditadura Nacional ia dando lugar ao Estado Novo. Em Março, conciliando as diversas correntes de opinião coexistentes no seio da Ditadura, realizou-se um plebiscito para aprovar a Constituição da República. Com «vitória» neste plebiscito, onde a liberdade de expressão e de voto estiveram ausentes, ficou consolidado o edifício jurídico-institucional que, com uma ou outra mudança de pormenor, iria vigorar por mais de quatro décadas. Por isso, as críticas de Manuel não passaram em claro – foi afastado da docência universitária e – vitória da sabujice – o Conselho Escolar aprovou por unanimidade uma censura às suas palavras. Porém, nem tudo era cinzento – a juventude reagiu: 74 alunos prestaram-lhe homenagem junto de sua casa. No Ministério da Instrução Pública, os jovens entregaram um protesto pelo afastamento «do insigne medievalista que é o Prof. Rodrigues Lapa». Nove alunos foram suspensos.

Salazar continuava a montar o seu sistema. Em Agosto foi criada a Polícia de Vigilância do Estado, PVDE,  antecessora directa da PIDE. No mês seguinte, surgiu outro importante instrumento do regime – o Secretariado de Propaganda Nacional, dirigido por António Ferro. Porém, apesar de o clima repressivo se ir adensando, Manuel não desarmou e repetiu a sua polémica conferência na Associação dos Artistas, em Coimbra. Em Outubro, voltou a dar aulas num liceu, desta vez no de Viseu. No mês seguinte, prestou provas para professor auxiliar (com o Livro de Falcoaria de Pero Menino), sendo aprovado por unanimidade. Em Dezembro, saiu no Diário do Governo, o decreto da sua nomeação. No dia 30 recomeçou a leccionar na Faculdade de Letras de Lisboa, de onde fora irradiado meses antes.

Em 1934 foi editada uma das suas mais emblemáticas obras – Lições de Literatura Portuguesa: época medieval – com dez edições até 1981.. A sua actividade como publicista prosseguiu – recensões, ensaios, iam sendo publicados em jornais e revistas de Portugal e do estrangeiro. As coisas pareciam tomar um ritmo normal. Porém, Salazar estava atento e desencadeou uma das primeiras grandes purgas – Em Maio de 1935, demitiu compulsivamente Rodrigues Lapa, impedindo-o (por decreto-lei) de aceder a qualquer cargo público. Na mesma altura outros 32 funcionários civis e militares foram demitidos, entre eles, Norton de Matos, Abel Salazar, Carvalhão Duarte. A carreira universitária de Manuel em Portugal chegara ao fim.

Na Universidade, Hernâni Cidade defendeu Rodrigues Lapa, lamentando a «perda de uma colaboração utilíssima». Em Outubro, voltou ao ensino, leccionando agora no Colégio Ulissiponense, em Lisboa. No mês seguinte começou a dirigir o semanário cultural O Diabo, substituindo Ferreira de Castro. Em Julho de 1936, eclodia a Guerra Civil de Espanha, facto a que Rodrigues Lapa não poderia ser alheio. Vejamos este vídeo:



Em Fevereiro de 1937 iniciou a publicação da colecção Clássicos Sá da Costa. Dirigiu também a colecção de Textos Literários da Seara Nova. Em Julho, Salazar escapou de um atentado à bomba, levado a cabo por anarquistas. Em consequência desse atentado e também devido à Guerra Civil espanhola, a repressão acentuou-se. Porém, Manuel prosseguiu a sua tarefa de ensaísta, em prol da língua portuguesa e dos direitos de cidadania. Em 1939, traduziu e apresentou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Em 1941, Manuel continuou dirigindo as colecções da Sá da Costa e da Seara Nova. Em Janeiro, morreu o seu mestre José Leite de Vasconcelos e, em Abril, Salazar proferiu o famoso discurso Todos não somos demais para continuar Portugal. Em Maio, foi a vez de falecer Raul Proença. Em 1945 publicou na Seara Nova a sua obra de maior êxito editorial – Estilística da Língua Portuguesa (até 1984 foram publicadas oito edições em Portugal e três no Brasil). Em 1949: o general Norton de Matos candidatou-se pela Oposição democrática às eleições para a presidência da República. Manuel, numa entrevista ao Diário de Lisboa, não teve papas na língua - «É chegada a oportunidade de acabar, sem sobressalto, com este estado de coisas, que nos envergonha como europeus»: referindo-se, obviamente, à ditadura salazarista. No dia seguinte foi preso em sua casa. Esteve sete dias detido no Aljube «ouvindo bimbalhar os sinos da Sé de Lisboa e vendo as pombas revoar livremente no céu azul.» Passados dias foi solto, mediante caução – a ficha da PIDE diz que foi preso «por atentar contra o brio e decoro nacionais e injúrias ao Governo da Nação» - Manuel não se atemorizou – em O Estado de São Paulo publicou uma série de seis artigos sob o título genérico de Em prol da democracia.

(Continua)
publicado por Carlos Loures às 12:00
link | favorito
Segunda-feira, 17 de Maio de 2010

A poesia galego-portuguesa

Carlos Loures

Podemos ouvir no vídeo abaixo Ondas do mar de Vigo, do jogral galego Martim Codax. Julga-se que terá nascido em Vigo, pois fez numerosas referências à cidade. Viveu entre meados do século XIII e princípios do XIV. Esta composição situa-se ainda dentro dos cânones da poesia galego-portuguesa. Contudo, há um período que estabelece uma fronteira entre um idioma único, falado e escrito em Portugal e na Galiza, e o início de uma deriva em que a Galiza começava a sentir os efeitos da aculturação castelhana e em Portugal, dois séculos após a criação do País, se começava a fixar uma língua autónoma. Essa fronteira situa-se algures entre o século XIII e finais do século XIV, inícios do XV, segundo Giuseppe Tavani (1924), professor catedrático da Universidade de Roma «La Sapienza», grande especialista em filologia românica nas áreas linguísticas do provençal, do catalão e do galego-português. Numa Galiza que não obteve a independência, ficando ligada à coroa de Leão e Castela, a lírica galego-portuguesa começou a dar lugar a uma poesia galego-castelhana.



Na Galiza, ainda de acordo com Tavani, a linha de demarcação entre a poesia galego-portuguesa e a posterior traça-se habitualmente em fins do século XIV, inícios do XV, com um cancioneiro específico compilado por Juan Alfonso de Baena, que passou a constituir o corpus da poesia galego-castelhana. O conteúdo do códice do século XIII do cancioneiro da Biblioteca da Ajuda e dos dois apógrafos italianos (cancioneiros da Vaticana e Colocci-Brancuti) é atribuído à poesia galego-portuguesa. Estes monumentos históricos e literários são os marcos que estabelecem a tal raia entre duas maneiras de falar e de escrever o mesmo idioma. E, como sempre acontece nas regiões fronteiriças, há zonas de imprecisão em que as duas tradições dialectais se confundem.


Em Portugal, o rei D. Dinis (1261-1325), ainda que seguindo a matriz provençal, censurara o excessivo convencionalismo de trovadores que privilegiavam o lugar-comum em detrimento de sentimentos genuínos como a amizade e o amor. Com a demarcação da poesia trovadoresca, com a fixação a Sul do rio Minho de um idioma que ia encontrando escritores que dele se serviam e o ajudavam a ganhar raízes e forma autónoma – D. Dinis, Fernão Lopes, Gil Vicente, Sá de Miranda, Camões, enquanto que a Norte o idioma de partida se ia eivando de castelhanismos, com a fonética a ganhar sonoridades distintas. A separação acentuava-se e, no século XIX, deparamos com um galego onde os neologismos são empréstimos do castelhano. A tese, segundo a qual o galego é um dialecto do castelhano, partindo de uma ficção centralista, mercê de uma aculturação intensiva, ia tornando-se realidade.

No entanto, sobretudo nos meios rurais, persistia um galego-português muito semelhante ao português usado no Norte. O Rexurdimento lançado por Rosalía de Castro, Manuel Murguía, Eduardo Pondal, Manuel Curros Enríquez e outros, reatou o movimento de reaproximação e permitiu começar a expurgar o galego dos castelhanismos mais gritantes. Apesar dos muitos escritores galegos que optaram pelo castelhano (por ser língua mais universal) – penso que, hoje em dia, é perfeitamente legítimo falarmos de novo em idioma comum, o galego-português, designação de Carolina Michaëlis que encerra o conceito prevalecente – o galego não é um dialecto do português, como se disse, nem o português é um dialecto do galego, como alguns radicais galeguistas afirmam.

O galego-português é um idioma que, devido a circunstâncias históricas, se cindiu em duas formas dialectais. A partir do século XIX, com o Rexurdimento, o idioma começou a recuperar na Galiza o seu estatuto de língua literária.

É essa recuperação que o dia de hoje comemora.
publicado por Carlos Loures às 21:35
link | favorito

.Páginas

Página inicial
Editorial

.Carta aberta de Júlio Marques Mota aos líderes parlamentares

Carta aberta

.Dia de Lisboa - 24 horas inteiramente dedicadas à cidade de Lisboa

Dia de Lisboa

.Contacte-nos

estrolabio(at)gmail.com

.últ. comentários

Transcrevi este artigo n'A Viagem dos Argonautas, ...
Sou natural duma aldeia muito perto de sta Maria d...
tudo treta...nem cristovao,nem europeu nenhum desc...
Boa tarde Marcos CruzQuantos números foram editado...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Eles são um conjunto sofisticado e irrestrito de h...
Esse grupo de gurus cibernéticos ajudou minha famí...

.Livros


sugestão: revista arqa #84/85

.arquivos

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

.links