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O que é aprender?
Aprender é:
— recolher activamente e tratar as informações.
— organizar as informações.
— ligar as informações.
É construir conhecimentos estruturados.
É integrar e não justapor novos conhecimentos àquilo que já se sabe.
Aprender é como construir uma casa com tijolos (um monte de tijolos, mesmo que bem empilhados, não são uma casa) ou fazer um quebra‑cabeças (cada peça só tem significado quando está ligada a todas as outras). É, sobretudo, necessário evitar o simplesmente "arrumar" os conhecimentos em gavetas ou "ficheiros" separados do espírito.
Tem-se frequentemente a preocupação de saber "tudo" quando o importante é saber, mas saber bem.
O ensino não visa transmitir "conhecimentos" completamente construídos, acabados, realizando um simples decalque dos conhecimentos do professor. A sua função é dupla:
— fornecer informações que os estudantes devem apreender e utilizar como elementos para construírem os seus próprios conhecimentos.
— colocar os estudantes nas melhores condições possíveis para o poderem fazer.
Saiba-se que não existe "o pronto a aprender" válido para todos os estudantes. O saber de cada um é pessoal, e se o não é no seu conteúdo, é-o pelo menos na sua estrutura e organização.
Como aprender?
Os conselhos aqui propostos visam colocar cada estudante nas condições mais favoráveis para que o trabalho pessoal que cada um faça, indispensável e insubstituível, seja o mais produtivo e gratificante possível.
1 - Estar motivado
É fundamental ter-se ou adquirir-se a vontade de aprender, o projecto de aprender, assente em motivações que podem ser as mais diversas:
— o sentimento de trabalhar para o seu próprio desenvolvimento pessoal, para o seu futuro (por exemplo, profissional). Isto pressupõe confiança em si mesmo, confiança nas suas possibilidades e nas suas capacidades.
— o interesse pela matéria em estudo. É natural não se ter o mesmo interesse por todas as matérias que se têm de estudar sobretudo nos ciclos pluridisciplinares, como por exemplo nos primeiros anos , mas o interesse de uma dada matéria é largamente função dos esforços que se fazem para nos interessarmos por ela. Não existe nenhuma matéria completamente destituída de interesse.
O essencial é não viver por viver ou estar na vida passivamente. Deve adquirir-se e manter-se uma motivação pessoal; fixar objectivos precisos e realistas, nem que seja o de se passar no exame que se está a preparar, conseguindo‑se assim a prova de que se é capaz de o fazer.
2 - Utilizar bem os meios de que se dispõe
As aulas e os apontamentos
As aulas teóricas são um meio entre outros de transmitir informações; é necessário tirar apontamentos, o que é uma actividade difícil, visto que simultaneamente é necessário ouvir, compreender, analisar e traduzir por escrito, continuando-se atento à exposição. Mas é — deve sê-lo — uma actividade inteligente e formadora (e não uma obrigação uma praxe vexatória) mais cansativa mais para a cabeça do que para a mão, constituindo a primeira fase do processo de aprendizagem e de preparação da memória.
Para que as notas tiradas se tornem um instrumento de trabalho personalizado, insubstituível, é necessário que estejam bem feitas, evitando‑se os dois extremos, de fazer apontamentos a mais ou a menos, de modo a serem fundamentalmente o registo do essencial (mas de todo o essencial). Os apontamentos nunca devem ser um simples registo das aulas; a mensagem deve ser descodificada e reformulada por cada um e com as suas próprias palavras.
Um truque: os estudantes podem treinar‑se sozinhos, primeiro, a partir de um texto escrito que devem procurar analisar pausadamente e cujo conteúdo devem resumir e depois, com o auxílio da rádio ou da televisão, procurar fazê-lo mais rapidamente, a um ritmo imposto e sem qualquer possibilidade de se poder voltar atrás.
Os apontamentos são o produto de uma audição activa: o raciocínio e a atenção devem estar sintonizados com a actividade mental do professor, interiorizar a mensagem oral, analisá-la, confrontá-la imediatamente com o que já se sabe e reconhecer o essencial. Deve estar-se particularmente atento à organização do discurso, aos movimentos do pensamento, marcados por palavras de ligação que são essenciais ("como", "de facto", "pois", "porque", "consequentemente", “por exemplo”, "pelo contrário",) e que é absolutamente necessário referir.
Os apontamentos, mesmo quando bem feitos, devem ser trabalhados o mais depressa possível depois das aulas: o mais tardar na própria noite, completem-se as passagens em branco, sublinhe-se, enquadre-se, utilizem-se marcadores de cor, acrescentem subtítulos, numerem-se as partes e subpartes, acrescentem-se nas margens de uma ou outra página notas pessoais (relação com outra parte da matéria, questão a rever ou a aprofundar, tema que lhe veio à ideia). Mas é a partir da tomada de notas que é necessário deixar um registo (sob forma pessoal codificada para não demorar muito tempo) das próprias impressões, para se utilizar quando se voltar atrás: questão sentida como importante, não compreendida, associação de ideias
O que dá valor aos apontamentos de cada um é que são pessoais, são os seus apontamentos. Salvo caso de força maior, copiar os de um colega não tem qualquer interesse. Mas, ao contrário, uma comparação com os dos colegas pode ser útil.
Se existem textos de apoio, isto não é razão para que não se tirem apontamentos. Mas, em termos ideais, as aulas teóricas preparam‑se antes de se assistir às mesmas: devem ler‑se os textos de referência antes de ir às aulas, deixá‑los em casa e tomar normalmente apontamentos, para depois os confrontar com os textos de apoio. Reler os apontamentos da aula teórica anterior antes de ir à seguinte é também uma excelente prática.
Em resumo, uma aula trabalha‑se exactamente antes (leitura do texto/leitura de apontamentos da aula anterior), durante (tomar apontamentos) e imediatamente a seguir (releitura e enriquecimento dos próprios apontamentos feitos) e não somente nas vésperas dos exames.
As aulas práticas
As aulas práticas devem ser uma ocasião para aprofundar as aulas teóricas, de colocar questões e de responder, de se treinar a aplicar os conhecimentos adquiridos à resolução de problemas. Devem resultar, cada vez mais, do trabalho pessoal de cada um e não o substituem. Deve-se prepará-las, revendo a matéria sobre a qual devem incidir, e se se dispõe antecipadamente do texto prático, deve começar‑se a pensar nele, principalmente para identificar as próprias dificuldades e as questões a colocar. Deve ter-se uma atitude activa: não se deve esperar que a resposta seja dada pelo colega ou pelo professor.
O livro
Um livro é um instrumento de trabalho que apresenta características sem equivalente e que pode ser utilizado:
— quando se quer (ou seja, quando se sente necessidade).
— onde se quer.
— e como se quer, sem nenhum intermediário.
Molda-se sem qualquer limite às preferências ou dificuldades de cada um. Pode ler‑se depressa ou lentamente, pode parar-se para reflectir ou para descansar um pouco, reler, voltar atrás, saltar passagens Com ele explora‑se a memória visual, tanto a das ilustrações como a do próprio texto. Permite que se estabeleça entre o leitor e o livro um contacto físico, uma intimidade, uma relação pessoal, muito favoráveis à aprendizagem.
Quando se tem um livro na mão pela primeira vez, despenda-se o tempo necessário para que ele se torne familiar: olhe‑se para o índice, repare‑se nas partes em que se divide, na sucessão dos capítulos. Devem ler-se algumas páginas, "e visitá-lo", folheando‑o, um pouco como se visita um lugar pela primeira vez. Deve fazer-se o mesmo, mas de forma mais cuidada, por cada capítulo que se aborde.
O livro, se é utilizado como instrumento para aprender, exige uma atitude tão activa como as aulas e um verdadeiro trabalho de acompanhamento. Uma leitura activa assemelha‑se muito a uma audição activa, mesmo (e isto muda tudo) se se pode trabalhar quando se quer e à medida do ritmo de cada um. Deve ir‑se ao fundo do que se lê, confrontá‑lo com o que se sabe, estabelecer um vaivém entre o livro e o próprio leitor e procurar o essencial, isto é, as relações entre as informações ou os elementos de raciocínio.
Tal como a "audição activa", a "leitura activa" implica uma escrita simultânea:
— tirar apontamentos.
— fazer resumos em termos pessoais, como se se tivesse de fazer um resumo para alguém.
— elaborar fichas (sobretudo se se utilizam diferentes fontes: "sebentas", livro ou diferentes livros).
Nunca se deve abandonar matérias que não se tenham compreendido: releia‑se tendo em atenção todas as expressões, leiam-se mais um ou dois parágrafos, que talvez eles contenham a explicação que faltava ou então procure‑se algures Se a dificuldade se mantém, assinale-se a matéria para mais tarde se voltar a ela.
Não hesite em fazer marcas pessoais nos livros (sublinhados, “caixas”, anotações à margem, chamadas de atenção para outras partes da matéria)
Se se utiliza um livro para obter uma informação sobre um ponto bem determinado, talvez o índice não seja suficientemente detalhado para o encontrar facilmente, mas a maior parte dos livros comportam um índice alfabético que é muito útil. Mesmo neste caso, não deixe de ler "um pouco mais" antes e depois do ponto que se procura.
3 - Memorizar
Não se trata de aprender decorando, mas não existe aprendizagem sem memorização, no sentido de se conservarem as marcas do que se aprendeu, tendo em vista a sua "restituição" ou a sua posterior utilização. Ora, muitos estudantes queixam‑se da sua dificuldade em memorizar. Os conselhos seguintes podem dar alguma ajuda:
— Reconhecer no que se quer aprender interesse, utilidade e querer apreendê-lo. Ninguém memoriza sem o seu próprio "acordo" ter sido dado conscientemente, e ainda menos contra a sua vontade. Cada um deve esforçar‑se por se projectar no futuro: qual a razão porque se aprende? Por quanto tempo? Quais os objectivos?
— Escolher momentos favoráveis para trabalhar (à tarde, de manhã ou à noite) e encontrar boas condições materiais (alimentação, luz, conforto, silêncio); criar um ambiente estimulante segundo os próprios gostos: diante de uma janela, diante de uma fotografia ou objectos que nos agradem, com música
— Esforçar‑se na concentração (evitar os devaneios ou pensamentos parasitas) e ignorar a porta e o telefone.
— Saber bem o que se quer memorizar, principalmente em função do tipo de dificuldade a enfrentar (os factos, os resultados, esquemas ou gráficos, fórmulas, raciocínios, demonstrações). Cada um deve procurar economizar a sua própria memória: é inútil, por exemplo, memorizar com o mesmo cuidado duas fórmulas equivalentes, que se deduzem uma da outra.
Para os "auditivos": ler em voz alta, "discutir" alto consigo mesmo, descrever com palavras os esquemas ou figuras, eventualmente gravar e ouvir em seguida. Para os "visuais": desenhar, fazer figuras, esquemas, setas, fichas ou resumos (utilizando diferentes tipos de letras ou diferentes cores)
— Agrupar, organizar, estruturar, dar sentido, a fim de diminuir o número de informações independentes. Quando se recebe uma informação, esta fica situada na memória de curto prazo (memória de trabalho) que tem uma capacidade limitada de guardar informações; só será conservada de forma durável se, a seguir, a guardar na memória de longo prazo, o que só acontece se a informação tiver adquirido sentido. É bem conhecido o facto de uma sequência de oito algarismos de um número de telefone se memorizar melhor se se agruparem estes números por grupos de dois, e melhor ainda se se associar a cada um dos grupos de dois algarismos algo que nos interessa. Não se devem desprezar os meios mnemónicos (palavras chave formadas por iniciais, frases fáceis de memorizar, ).
— Imaginar, por antecipação, a situação em que se deverá mostrar o que se aprendeu. Para uma prova escrita: a folha em branco, a secretária, a sala, os outros candidatos; para uma oral: o professor, o quadro, imaginar‑se a si próprio a responder.
— Fazer "reactivações" da matéria (revisões, releituras) regulares, cada vez mais espaçadas no tempo, sem esperar a revisão de última hora antes do exame: para cada disciplina uma primeira releitura deverá ser feita imperativamente no próprio dia, em seguida alguns dias mais tarde, depois ainda um mês ou dois meses mais tarde (segundo a facilidade de cada um de memorizar).
Sobretudo: evitar a revisão intensiva de última hora Utilizar um método "calmo" O cérebro também pode ter indigestões
4 - Auto‑avaliação frequente
Para bem gerir a sua aprendizagem é indispensável fazer frequentemente o ponto dos resultados obtidos; isto permite fazer a triagem entre o que está adquirido e o que necessita ainda de ser trabalhado.
Ora, na Universidade, os controles de aprendizagem são muito menos frequentes que no ensino secundário; corre‑se o risco de ausência de referências durante longos períodos, de não se saber realmente "como é que se está ", e de só se dar conta e demasiado tarde das eventuais lacunas, na ocasião de um "controle" que conta para um exame.
Cabe a cada um dos estudantes ligar e em tempo útil, ele próprio, aos sinais de alarme correspondentes:
— Façam-se perguntas a um colega e vice-versa.
— Utilizem-se as colecções de pontos de exame de anos anteriores, colocando‑se na posição de quem está a ser examinado, não recorrendo a nenhuma ajuda para além daquela que em exame seria permitida e com o tempo limitado de um exame.
— Utilizem-se os cadernos de exercícios não somente como treino, mas também para controlar as capacidades de resolução dos problemas propostos.
5 - Gerir bem o tempo; organizar‑se
A gestão do tempo é um problema essencial na vida activa. Tem‑se facilmente a impressão de que falta o tempo, quando de facto ele é mal utilizado. Comprovemo‑lo:
Uma semana tem 7 x 24h = 168h e se se dormir 8 horas por noite, restam 168h - 56h = 112 h, em que trinta são gastas em refeições e deslocações. A carga lectiva semanal, aulas teóricas e práticas, não excede em geral 30 horas e se contarmos 20 para os tempos livres, desporto, relaxe, sobram 32 horas (o equivalente a 4 dias de trabalho de 8 horas) para o trabalho pessoal de cada um. Isto deverá ser suficiente, se se faz a caça impiedosa ao desperdício do tempo.
O segredo desta boa utilização é não improvisar, fazendo em cada momento o que tem necessidade de se fazer nesse mesmo momento. É necessário organizar um plano de trabalho, e mesmo dois: um para a organização da sua semana, e um outro para a organização do ano em função das datas dos exames (e das férias!).
O plano semanal deve associar de maneira equilibrada actividades variadas sobre as diferentes matérias que têm de se estudar. Deve ter‑se em conta as preferências pessoais em termos de ritmo de trabalho: duração das "sessões" consagradas à mesma actividade, utilização óptima das horas do dia Não se deve somente mencionar "física" ou "matemática", "psicologia clínica" ou "literatura medieval", mas deve também indicar-se o tipo de tarefas: releitura de apontamentos, resolução de exercícios, documentação, preparação de trabalhos para as aulas práticas
Se se quer respeitar o plano, faça‑se de modo a que seja possível respeitá-lo: prevejam-se intervalos de tempo para fazer face ao imprevisto (a chegado de um amigo, o aparecimento de uma gripe) e não se seja demasiado "impiedoso" consigo próprio. Caso contrário, por se querer fazer demasiado bem pode acabar por se cair no desinteresse e o muito bom plano acabará numa gaveta: é claro e legítimo modificar o próprio plano, se aparecem acontecimentos importantes como alterações no mapa de exames...
6 - Gerir bem a actividade mental; conhecer-se enquanto se está a aprender
Cada um de nós tem a sua forma pessoal de utilizar o cérebro para aprender e é por esta razão que não existe um único método de trabalho que possa ser considerado o melhor para todos. É muito importante que cada um consiga chegar a conhecer bem as suas próprias características "enquanto pessoa que está a aprender", a forma como cada um funciona relativamente ao trabalho intelectual, o próprio estilo de aprendizagem.
Se é certo que não se deve estar ao sabor dos humores não é menos verdade que também não se deve violentar a própria maneira de ser.
Cada estudante deve aprender a olhar para si mesmo e aprender a conhecer-se, para poder fazer o melhor uso possível das suas capacidades, do seu potencial intelectual. É nisto que consiste a gestão mental.
Vejamos algumas pistas:
— Madrugador ou noctívago? É um dado a ter em conta, para escolher o melhor horário para dormir.
— Qual a duração óptima das sequências de trabalho? (depois da qual já não dá nenhum rendimento)? O plano de trabalho deve prever tempos de descontracção em intervalos de tempo adequados.
— Trabalha melhor só ou acompanhado? No segundo caso, deve procurar-se trabalhar com colegas com quem se dê bem.
— Qual é a maior dificuldade? Tomar notas, concentração, memorização, aplicação dos conhecimentos à resolução de problemas? Identificar os pontos fracos é já atenuar o problema, privilegiando o treino sobre estes pontos.
NB: Os dois hemisférios cerebrais não têm as mesmas funções: a parte esquerda é lógica, analítica, racional, sequencial, temporal e gere a linguagem e a actividade auditiva. O hemisfério direito é sintético, analógico, global, espacial e gere o visual. Todos nós temos uma pré-disposição para a utilização maior de um do que do outro hemisfério e é bom ter consciência deste facto não só para melhor utilizar este "canal" de recepção e de tratamento da informação, mas também para ter a preocupação de desenvolver o outro hemisfério.
— O estudante é mais "auditivo" (retém bem o que ouve) ou, pelo contrário, é mais "visual" (retém melhor o que viu)?
No primeiro caso, para aprender o que de importante tem um texto, deve ter interesse em lê-lo em voz alta, e para memorizar uma figura ou um esquema deve descrevê-lo.
No segundo caso, para reter o conteúdo de um texto deve-se estruturá-lo visualmente (sublinhar, enquadrar) e fazer um plano o mais "visual" possível.
Em resumo: é necessário conseguir aprender a gerir a aprendizagem, a manter o domínio das operações, e não se deixar dominar ou deixar levar pela corrente (a do tempo, em particular). É necessário investir-se realmente, com tenacidade, impor-se regras de trabalho e de vida rigorosas mas todavia flexíveis, evolutivas, adaptáveis às situações. |
Fonte: Apprendre ... mais comment, os conselhos do Professor Paul Arnaud, professor honorário de Química na Universidade Joseph Fourier de Grenoble 1, publicados por Edições Dunod (Paris) no Guide Dunod de l'etudiant, Paris (1996).
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