É por mim claramente assumida a cleptomania de que padeço relativamente aos títulos de
obras famosas. Só aos títulos, sublinhe-se. Pensei em dar a este texto o título de “Elogio da Loucura” – não que tenha, de algum modo, sido influenciado pela obra de Erasmo de Roterdão ou alguma coisa tenha este texto a ver com Stultitiae Laus. Apenas gosto do título. Aproveito para lembrar que este ano passam cinco séculos sobre a publicação em 1511 desta obra que terá sido um dos primeiros sinais de que as coisas não corriam bem pela Igreja de Roma.
De forma satírica, Erasmo, denunciou a superstição que alastrava pela liturgia inquinando a doutrina, pela corrupção que trepava pela hierarquia – O Elogio da Loucura, abriu as portas ao terramoto da Reforma.
Mas o meu elogio da loucura não se iria ocupar desse tema. Nem seria um elogio, porque não faz sentido elogiar uma doença tão dolorosa. Por isso, porque de facto, não quero elogiar a loucura, resolvi mudar para “pequena dissertação sobre loucos (e malucos). Esta pequena dissertação sobre loucos e malucos pretende apenas chamar a atenção para a forte componente que neuroses, psicoses, esquizofrenias e outras formas de demência instilam no tecido mental colectivo.
Numa pequena cidade onde vivi, havia um número relativamente grande de malucos. E digo malucos porque loucos são pessoas diferentes daquelas de que estou a falar. De uma perspectiva clínica não haverá diferenças entre uns e outros. Porém, no plano social, há. Um operário da construção civil que fale sozinho em público é maluco; um estadista que manda incendiar uma cidade e assiste ao incêndio tocando harpa ou um caudilho que determina o extermínio de seis milhões de seres humanos, são loucos. Se uma mulher mata o marido bêbedo que a maltrata dando-lhe com um pedregulho na cabeça, é maluca, mas se um senhor importante asfixia a esposa com uma almofada é louco. O crime no bairro degradado é notícia para o “24 Horas” ou para a TVI; o crime da almofada é descrito por Shakespeare e tem direito a programas eruditos no canal História. Estão a ver a diferença? – em todo o caso, o bêbedo da Cova da Moura e Desdémona, é que não se devem ter apercebido desta subtileza.
Na tal pequena cidade havia um número elevado de gente que não jogava com o baralho completo, como soi dizer-se. Desses pormenores falarei noutro dia, porque nesse burgo com menos de vinte mil habitantes apercebi-me melhor do peso que a loucura tem nas sociedades. Diz-se que dez por cento das pessoas sofrem de qualquer distúrbio mental. A ser assim, já viram quantos loucos há no Parlamento? Mais de vinte. Já viram quantos loucos e malucos há em Portugal – mais de um milhão! Como pode o País funcionar? (e no nosso blogue? – somos cerca de quarenta. Dá quatro. - Vá lá! Sempre pensei que fossem mais).
Nos tempos de Erasmo, como Hieronymus Bosch documenta no seu quadro “A extracção da pedra da loucura”, os físicos tentavam arrancar dos cérebros doentes uma pedra que, segundo se julgava, era a causa da demência. A pedra que anda ai pelas cabeças, a julgar pela maneira como os eleitores maioritariamente votaram nas presidenciais, dava para construir uma estrada até à Lua.
À face oculta, claro.
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