Terça-feira, 1 de Fevereiro de 2011

Artexto - texto de Adão Cruz, quadro de Adão Cruz

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

 

A descodificação, ainda que parcial, de uma obra de arte, se é que se pode chamar a esta pintura, um tanto grotesca, uma obra de arte, pode ser um fenómeno redutor que empobrece a obra, podendo mesmo anular a sua própria hermenêutica. Neste caso não será tanto assim, dado que se trata de um figurativismo bastante objectivo.

 

Não me lembro de qual o meu estado de espírito aquando da criação deste quadro, já antigo. Ao contemplá-lo hoje, perante o meu estado de espírito actual que não é nada famoso, eu entendê-lo-ia como uma espécie de tragédia espiritual mahleriana, eclodindo neste abraço militarista, entre a possessiva paixão de Mahler e a frustração, desespero e desânimo de Alma Schindler. Sem qualquer pretensiosismo, parece-me que ele contém alguns laivos de uma atmosfera emocional com perfeito cabimento nas interpretações mais dramáticas e pessimistas da sexta sinfonia.

 

publicado por João Machado às 08:00
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6 comentários:
De ethel feldman a 1 de Fevereiro de 2011
Adão,
Explicar a obra de arte sempre me causou calafrios na espinha. Invariavelmente a explicação é longa e redutora. Uma obra de arte, a meu ver, é a síntese do olhar do artista. A contemplação da realidade, o expressar conciso desse olhar e de todas as emoções que dele são origem. Está para além do artista. É por fim um encontro tão mágico que devia ser proibida qualquer explicação. Quem olha, quem lê, quem assiste, quem ouve e até quem manuseia a obra - reage. É mais um encontro. Entre gostar e não gostar, é divino notar a qualidade do sentir nesse encontro. Não vou explicar por onde me levam os teus quadros. Cada um, leva-me ao mais profundo de mim. A tua escrita, também. Se viajo com ambos, se nesse encontro me encontro, só te posso agrader pela oportunidade que me dás de eu continuar aberta a mais um encontro.
'Esse abraço que contorna as minhas ancas, faz com que eu abandone meu corpo no teu.'
Beijo
Ethel
De Carlos Loures a 1 de Fevereiro de 2011
Como logo te disse, gosto do quadro e não gosto do teu comentário, embora quando o li a primeira vez me tenha desagradado mais, sobretudo o primeiro parágrafo que, como te disse, teria suprimido não fora a tua insistência em o manter. Agora, não isolando o parágrafo inicial, o conjunto não me desagrada.

Aproveito para te agradecer a disponibilidade de colocares os teus quadros à mercê de imprevistas prosas. O resultado não me parece mau. Digo-te mais uma vez quanto aprecio a tua pintura. Tens quadros de uma grande beleza. Urge organizar uma mostra dessa pintura em Lisboa. Um grande abraço e parabéns Adão.
De adão cruz a 1 de Fevereiro de 2011
À Ethel e ao Carlos o meu orgulho e a minha gratidão pelas vossas palavras
De cclara castilho a 1 de Fevereiro de 2011
Isto é muito engraçado! Se me tivesse saído em sorte em quadro para eu comentar, teria ido para aspectos completamente diferentes... Que agora já não consigo porque já li o que o Adão escreveu. Resta que estas "parcerias" têm sido muito interessantes e desafiadoras! E com resultados óptimos. Obrigada ao Adão pelos belos quadros, obrigada a quem teve a ideia.
De augusta clara a 1 de Fevereiro de 2011
Um autor chamar grotesca à sua obra é um contra-senso. Não consigo entender como pode ser grotesco o que sai espontâneo da mão do artista como expressão da sua subjectividade, do seu mundo interior. Por mim, esse seria um adjectivo a abolir na esfera das emoções. Mahler e Alma representaram um drama ou uma tragédia sem coro que produziu as maravilhosas sinfonias que conhecemos. Nada de grotesco houve nisso. Meu querido Adão, a tua pintura reflecte tão bem a vida e a alma humanas nos seus tumultos, nos seus desassossegos, nas suas alegrias, numa palavra, nas suas contradições da mesma forma sublime que a reflectem os três últimos versos de um poema da Maria Teresa Horta.

“minha raiva de ternura
meu ódio de conhecer-te
minha alegria profunda”
De augusta clara a 1 de Fevereiro de 2011
Ah, e, claro, queremos uma exposição em Lisboa.

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