A Revolução de 25 de Abril veio provar que tinham razão aqueles que defendiam que a ditadura só cairia pela força das armas. Porém, derrubada a ditadura pelo MFA, durante alguns meses, sobretudo até ao 11 de Março de 1975, o espectro de um contragolpe de direita foi uma permanente ameaça e uma preocupação constante para os antifascistas.
Quando em 28 de Setembro de 1974, sob a inspiração do marechal Spínola, um dos membros da Junta de Salvação Nacional, o general Galvão de Melo, apelou a uma manifestação da «maioria silenciosa» - referindo-se a uma suposta maioria dos cidadãos portugueses silenciada pelo terror imposto pelas esquerdas – temeu-se que as direitas, quer as estruturas civis quer as militares, tentassem a via golpista para restaurar a ditadura.
Fizeram-se barricadas, o povo veio para as ruas armado com podia – e a montanha pariu um rato - afinal a direita não se atreveu a deitar a cabeça de fora. Só no ano seguinte, em 11 de Março, fez uma tentativa canhestra, rápida e consistentemente controlada pelo MFA, logo apoiado por manifestações populares que não deixaram dúvidas quanto ao que a maioria do povo português sentia. Aliás, como sempre acontece nestas coisas, a ameaça golpista de Spínola, deu lugar a um forte avanço das forças populares.
A direita, durante alguns tempos, manteve activas as suas estruturas armadas clandestinas, nomeadamente o MDLP e o ELP (o assassínio do padre Max e da estudante Maria de Lurdes, em 2 de Abril de 1976) terá sido uma das suas últimas acções violentas. Começava a aprender uma coisa – pela força não regressaria ao poder. Tinha de dançar a nova dança, aprender as regras do novo jogo, isto é, entrar nos partidos do poder e tomar o sistema democrático por dentro. O que, diga-se, fez com todo o êxito. Hoje, a Democracia é o habitat preferido pelas forças conservadoras.
E a esquerda revolucionária? Aqueles que tinham lutado de armas na mão contra o regime de Salazar e Caetano? Será que, em regime democrático, se justificava manter estes dispositivos armados em situação de prontidão? A ARA foi extinta logo em 1974. A LUAR, a primeira das organizações que levaram a cabo acções armadas foi extinta em 1978. Implantado o regime democrático, já não fazia sentido um movimento como o de Palma Inácio. E as Brigadas Revolucionárias? No final deste artigo, insere-se um vídeo com declarações de Isabel do Carmo e de Carlos Antunes sobre a formação das BR.
Numa sessão realizada em Constância em 5 de Março deste ano, Carlos Antunes, o principal operacional das Brigadas Revolucionárias e um dos fundadores do Partido Revolucionário do Proletariado, contou como teve, após o 25 de Abril, dificuldade em desactivar aquela estrutura. Numa reunião em Riachos, Torres Novas, contou como, sabendo da intenção de a maioria dos elementos das Brigadas de continuarem a luta armada, numa jogada de antecipação, deu uma longa entrevista ao Expresso, que foi publicada em 11 de Maio, no dia em que se efectuava a reunião.
Nessa entrevista ao semanário, Carlos Antunes anunciava o fim das operações de sabotagem, pois em democracia não fazia sentido utilizar o mesmo tipo de acções violentas que se justificavam durante a ditadura. Apanhados de surpresa, os operacionais acabaram, após renhida discussão, por aceitar a decisão do seu comandante e acataram a ordem para entregar as armas e se integrarem na estrutura partidária legal. Como tributo à história das Brigadas, durante algum tempo o partido usou a sigla de PRP-BR.
Revelou também como uma acção prevista para o Santuário de Fátima (antes de 25 de Abril) acabou por ser posta de parte, pois era impossível levá-la a cabo sem que houvesse mortes – e um dos princípios das BR era não provocar vítimas: todos os actos de sabotagem que empreenderam, causaram elevados prejuízos mas não provocaram mortes (a não ser as de dois militantes das brigadas que ao colocarem um engenho explosivo em instalações militares em Lisboa, o fizeram inadvertidamente rebentar).
As Brigadas eram compostas sobretudo por marxistas e por católicos progressistas, incluindo sacerdotes e freiras. Carlos Antunes revela que se chegou a pensar em constituir uma Brigada totalmente feminina, integrando freiras dos conventos onde os brigadistas encontravam muitas vezes refúgio. Diz o dirigente do PRP: »Algumas concordavam com o que fazíamos e como éramos contra matar pessoas…»
Esta preocupação de não causar vítimas entre a população foi comum às três organizações. Note-se que o assalto ao Banco de Portugal, levado a cabo por Palma Inácio, foi feito com réplicas de armas (havia, salvo erro, apenas uma pistola autêntica). A ARA manifestou sempre o mesmo cuidado, embora em 1970 se tenha verificado, quando do ataque à escola técnica da PIDE, em Lisboa, a morte acidental de um transeunte. Na história das Brigadas há também a lamentar duas mortes. Dois militantes que ao colocarem um engenho explosivo em instalações militares em Lisboa, este foi accionado por erro ou por acidente. Preocupação que as organizações armadas de direita nunca tiveram.
Passados todos estes anos, é altura de fazer um balanço ao que foi e ao que representou a resistência armada contra a ditadura. Num debate que vamos iniciar com elementos operacionais das três organizações que, nos últimos anos do regime ditatorial, desencadearam esse tipo de luta – a LUAR, a ARA e as BR – vamos tentar, no seguimento desta simples sumarização das tentativas de golpe militar e dos actos violentos praticados ao longo dos 48 anos de ditadura, clarificar um pouco mais esse aspecto menos estudado da nossa história recente.
(Continua)
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