Sílvio Castro Um Novo Coração
Capítulo 37
Arco, 8ª jornada, 17/02/05
Hoje é o dia do meu primeiro exercício com o treadmill, a máquina da esteira rolante. Já às 8,15 eu estava sentado à minha mesa, a de número 58, e me preparava para o café da manhã. Depois de ter tomado a minha laranjada, comido várias frutas e bebido o café, saí do restaurante sem ter visto o dr. Citton que geralmente desce para o café-da-manhã um pouco mais tarde.
No grande salão do bar as pessoas conversavam, liam os jornais ou se preparavam para os diversos exames médicos marcados para aquele dia. Os pacientes com problemas motores em geral tomavam a direção da piscina numa dependência externa, outros se preparavam para os exercícios nos ambulatórios que estão aqui no 1º andar. O ambulatório nº 1 acolhe o setor de ortopedia, mais o dermatológico e o neurológico; o 2 hospeda a logopedia; o 3, o servício dietológico. Ao lado dos ambulatórios está o salão do ginásio B, destinada preferencialmente aos pacientes com problemas motores. Passeio indiferentemente diante deles, abro a porta principal do salão B, admiro por momentos os aparelhos expostos. Saio para começar a endereçar-me ao sub-solo, à procura de meus já costumeiros exercícios respiratórios. Pela primeira vez ali encontro o meu companheiro de quarto, Roberto, que logo se revela exímio no exercício das bolinhas.
Agora, passadas as primeiras horas da manhã, estou de novo no 3º andar, no ginásio A, para o meu primeiro exercício no treadmill. Depois de tirada a pressão, começo o meu exercício. Subo nos tapetes e começo a caminhar com passos acelerados, seguindo em harmonia o ritmo da máquina. Com essa não acontece como com a bicicleta, porque eu sempre fui um grande caminhador. Até mesmo o ritmo acelerado da máquina não me cria problema, pois tenho um passo seguro e constante na corrida virtual. Então, me rejubilo comigo mesmo pelo muito que pratiquei de esporte, em particular o futebol, com o qual criei pernas de boa consistência, fortes e resistentes, prontas a muitas reações credoras de um bom sistema de reflexos condicionados. Caminhando sobre o tapete que rola sem cessar, mudo os passos, alterno pernas e pés, movimento em sincronia os braços, e levanto com boa técnica o peito, juntamente com a cabeça. Meus olhos acompanham a marcha, mas não renunciam a admirar a paisagem que penetra no salão pelas janelas de vidros claros. Quanto mais passa o tempo, mais me entusiasmo com a minha marcha. Estou inteiramente nela, me sinto transportado nos movimentos e corro, corro, como se em disputa de uma maratona. São muitos os quilômetros que devo superar e logo reconheço que estou correndo por Veneza, numa maratona muito especial que me empenha ao máximo. Corro por Veneza, por calles campos pontes. Devo cobrir um grande itinerário que parte da entrada na Praça Roma e contorna a figura de peixe da cidade que conheço tanto, para retornar depois de muito tempo na mesma Praça Roma. Começo e corro. Corro. Deixo o ponto de partida e vou na direção do gótico da Basílica dei Frari, aonde logo chego passando pela Scuola di San Rocco, rica de quadros de Tintoretto. Viro à direita na direção do Campo Santa Margherita, onde estão a igreja e a “scuola” dos Carmini; sigo para a estrada que me leva à igreja de São Sebastião. Sei que ali se encontram alguns dos Veroneses entre os mais belos, principalmente na decoração do teto, mas não posso parar. Corro, corro sempre. Entro no Zattere, com o grande canal da Giudecca, pelo qual passam barcos e mais barcos que seguem a minha corrida pela grande extensão do Zattere até a Punta della Salute. Devo virá-la e tenho apenas segundos de contemplação para a ilha de San Giorgio em meio às águas da laguna e defronte à Praça San Marco. Virando em velocidade a Punta della Salute vejo de longe a fachada frontal do Palácio Ducal, mas logo a perco de vista, porque já estou passando pela igreja della Salute e me estou encaminhando para a ponte da Accademia. Por ruas interiores, chego diante da ponte; o museu da Accademia está à minha esquerda e sei que ali posso ver todos os grandes artistas venezianos, principalmente o meu predileto Giorgione e a maravilha da “Tempesta”. Voltarei depois da maratona para revê-los a todos: Giorgione, os Bellinis, Veronese, Tiziano, Tintoretto, Tiepolo (Gianbatista), Carpaccio. Subo pela ponte da Accademia, a sempre inacabada, e dela contemplo na corrida a beleza esguia do Canal Grande. Desço os muitos degraus e corro na direção do Campo Santo Stefano, nele entro pegando seu lado direito, aquele do Conservatório Benedetto Marcello, de onde parecem vir acordes do adagio de Albinoni. Percorro o Campo cincundado pelos grandes palácios
A luz rarefeita da tarde
transporta os palácios
góticos clássicos neo-clássicos
brancos / vermelhospálidos / rosas
/ rosados / rosas
/ brancos
além da luz.
O espaço ilimitado da luz
une os extremos
que vão de mim a mim mesmo.
Não, nem um momento para a contemplação gozosa; pego a calle que me conduzirá ao Campo San Maurizio que abre as estradas na direção da Praça São Marco. Vou pela rua XXII Marzo, enquanto a percorro recordo que essa, juntamente com a “via Garibaldi”, no bairro de Castelo, onde estou por chegar, somente elas levam a denominação de “via” em Veneza. Agora passo mais uma ponte que me mostra a igreja barroca de San Moisé. Dali me preparo para entrar na Praça São Marco. Nela entro, sem parar, mas indo da Ala Napoleônica sempre à frente, de encontro com a beleza bizantina da fachada da Basílica de San Marco. Quanto mais me aproximo dela, mais sei que devo desviar logo que toco a sua Torre externa, entrando na Piazzeta, com o Palácio Ducal, de um lado, e a Biblioteca Marciana, do outro. Vejo tudo, mas passo, passo o mais rápido que me é concedido pelo cansaço que começa a tomar as minhas pernas, porque estou correndo a minha maratona de Veneza. Já virei à esquerda do Palácio, encaminhando-me para a ponte que olha lá dentro no rio, entre o Palácio Ducal e as Prisões dei Piombi, as mesmas onde esteve também Casanova, para a direção da Ponte dei Sospiri, que une alada os dois edifícios. Mais que ver tudo isto e as outras coisas, rememoro. E penetro na meta que divide os dois tempos da minha corrida, a longa e magnífica Riva degli Schiavoni. Estou indo por ela, bela, longa, larga, sempre viva de gente e de luzes. Logo me aparece a igreja della Pietà, uma das três construídas por Palladio em Veneza, morada da música de Vivaldi e dele escuto os cálidos movimentos de seu “Inverno” enquanto corro por Veneza nessa fria tarde do fevereiro de 2005. Embalado pela música vivaldiana, continuo pela longa Riva, passo diante do palácio que hospedou Petrarca por quase um ano e, de relance, como que o vejo ao receber a surpreendente visita de Boccaccio, ao qual oferece um manuscrito do Canzoniere. Mais que ver, ainda que vendo, rememoro tudo, mas sinto que aqui na Riva degli Schiavoni, que estou por superar definitivamente para entrar na zona do Arsenale e assim penetrar nas calli estreitas de Castelo, diante da parte final da minha mágica corrida, a minha cabeça começa a divagar, como que desejosa de perder-se no cáos das coisas maravilhosas. Insisto, mas o faço mais com a força dos músculos que com meu entendimento. Estou por acabar a grande fatiga, e sou um maratonista que não sabe certamente da entidade de suas forças, mas que continua a correr, porque deve chegar à ponte de Rialto e ultrapassá-la e, depois dela, tomar a definitiva reta final. Corro corro e eis Rialto
Subo a escada nas águas
subo a escada no tempo
subo a escada nas águas
no tempo das águas e
desço a escada dos tempos
das águas que voltam no
tempo de escada e pé.
A maratona está chegando ao seu fim; posso conseguir chegar ao fim e ultrapassá-lo com minha força viva. Agora basta superar o Campo San Polo – já o fiz – passar pelo Palazzo Bernardo, seguir na direção do Campo San Giacomo dell’Orio, ultrapassar mais duas pontes, chegar pela retomada do Canal Grande até o prado do Jardim Papadopoli. Atrás dele está a meta final. Cheguei.
Cheguei; mas somente eu cheguei. Contra quem corri?
É a metodologia usada por Radcliffe-Brown para a recolha de dados para escrever os seus textos que passo a analisar. Metodologia que começou a utilizar na sua pesquisa entre os Ilhéus do arquipélago Andaman the Birmânia, entre 1906 e 1908, como estudante do fundo Anthony Wilkin em Etnologia da Universidade de Cambridge da Grã-bretanha O seu objectivo era ser membro do Trinity College da Universidade, para se graduar em Etnologia com a colaboração do então Doutor em Etnologia, Alfred Cort Haddon (1855-1940), leitor na Universidade de Cambridge, etnólogo, ates era biólogo, e membro da Faculdade Christ's College desde 1900, e a colaboração de William Halse Rivers Rivers, da Faculdade St John’s College, English anthropologist, neurologist, ethnologist e psychiatrist ajudaram ao antigo estudante de medicina Radcliffe-Brown a se converter em Etnólogo, com formação em psicanálise. Colaboração que foi de grande utilidade para Radclffe-Brown, que andava a analisar Ilhéus do Arquipélago Andaman do Golfo de Bengala que banha à Birmânia. O nosso autor estudou os Andaman na época em que Etnólogos e Arqueólogos analisavam as suas instituições e costumes. Não foi em vão que William Rivers organizara uma expedição ao Estreito de Torres para compilar dados de como éramos antes de ser o que hoje somos. O Estreito de Torres é uma larga savana da água, entre Australia e as Ilhas Melanésicas ou Melanesian island de New Guinea. Seu comprimento é de 150 km (quase 93 milhas marítimas).
Ao Sul, limita com a Cape York Peninsula, o extremo mais ao norte continental do Estado Australian de Queensland. Ao norte o seu limite é Western Province do Estado Independente de Papua New Guinea. Sítio do estudo de Radcliffe – Brown, por iniciativa de Haddon, para estudar as instituições e a sua gestão. Rivers era necessário por causa de ser psicanalista, Seligaman, patologista, um professor primário para entender como eram ensinadas as crianças, Sidney Ray e o jovem estudante de 1890, Anthony Wilkin, para fotografar espécies raras. Esta viagem ao Estreito de Torres marcou uma ponta de viragem na ciência antropológica. Era a primeira vez que académicos iam a terreno. O que pensavam encontrar, não existia. Era bem mais complicado: formas de matrimónio, significado de palavras, compromissos, organização social e outras funções de interacção bem mais complexas do que era esperado. Foi o motivo pelo que animaram a Radcliffe-Brown a estudar as funções sociais que eles não conseguiam entender com o seu saber ocidental. Com as pesquisas e descobertas de Radcliffe-Brown, todos os formados em patologia, zoologia, ciências da educação, passaram a ser antropólogos, após as explicações do nosso autor. A primeira ideia de Radcliffe-Brown foi distinguir entre significado e função. Significado era o conteúdo de uma Função social. Os académicos antigos, estudavam a narrativas do mito, sem entrar pelo seu significado. Significado que Sir Archibald soube explicar no seu texto a função do mito, por exemplo. O significado é o conteúdo do facto. Há palavras que falam por elas próprias, como essa explicada por ele: a da Polinésia Tapu, traduzida ao inglês como Taboo encontrada por ele nas suas pesquisa na ilha Manus e que explica na sua lição Frazer de 1939, impressa pela Cambridge University Press esse mesmo ano, diz que em toda sociedade há comportamentos permitidos e outro proibidos e punidos. A punição não é apenas como no ocidente, onde está estabelecido que tabus são proibições para relações sexuais entre parentes consanguíneos, mas não apenas. Palavra introduzida da polinésia, que significa, principalmente, o quebre de regras sociais, a desobediência a um chefe, punição de crianças para não se intrometer em ideias e matérias definidas como o saber dos adultos.
enviado e introdução por Julio Marques Mota
Uma cavalgada “Wagneriana” para o abismo
Introdução
É a primeira vez que apresentamos um texto de Satyajit Das no Estrolabio. Grande especialista em produtos derivados, autor de diversas obras no campo dos mercados financeiros, apresenta-nos aqui o que nos parece ser uma extraordinária desmontagem do que foi o neoliberalismo na Europa ao longo das últimas décadas: uma Europa que não só perdeu muitas das suas indústrias, que exangue é incapaz de criar postos de trabalho para os seus cidadãos, uma Europa das civilizações que agora as ignora, uma Europa das culturas que deixa agora as Universidades em ruínas, uma Europa que a reboque do que aumenta foi vive agora obcecada pelas políticas de austeridade em tempo de crise, assente numa profunda crise política a gerar uma não menos profunda describilidade no sistema democrático quando governo a governo, todos eles, negam hoje o que afirmaram ontem, afirmam como programa de amanhã o contrário daquele com que se apresentam ao eleitorado ontem, uma Europa sem nenhum dirigente à altura da grave crise que se atravessa, uma Europa prisioneira dos mercados de capitais, uma Europa que incapaz de regular os CDS, mesmo depois da crise, vive agora assustada com o que eles podem financeiramente representar, uma Europa que da indústria fez um deserto em nome da concorrência com quem a não respeita, uma Europa cravada de dívidas onde se pode perguntar se desta forma é por incompetência ou por maldade dos nossos políticos a cavalgada para o abismo a que estamos a assistir.
E com isso ninguém está preso, ninguém irá preso. São os mercados, dir-se-á. Dessa cavalgada para o abismo, é dela que nos fala o presente texto.
Coimbra, 27 de Junho de 2011.
Júlio Marques Mota
CV de Satyajit Das
Satyajit Das é um especialista internacional na área de produtos derivados e na gestão de risco. Tem sido consultor de grandes empresas e instituições na Europa, América do Norte, Ásia e Austrália. Trabalhou com o Commonwealth Bank of Australia, Citicorp Investment Bank and Merrill
Lynch Capital Markets Australia. É autor, entre outras, das seguintes obras:
Traders, Guns & Money: Knowns and Unknowns in the Dazzling World of Derivatives (2006);
Extreme Money: The Masters of the Universe and the Cult of Risk (data prevista de edição, Agosto de 2011.)
Uma cavalgada "Wagneriana" para a situação de incumprimento na Europa
Satyajit Das
No livro A importância de se chamar Ernesto de Oscar Wilde, Lady Bracknell numa memorável observação diz que: "perder um dos pais... pode ser considerado como uma infelicidade, mas que perder os dois pode ser tomado como uma falta de cuidado". A zona euro tem necessidade de resgatar três dos seus membros (Grécia, Irlanda e Portugal) com outros três (Espanha, Bélgica e Itália) cada vez mais a serem vistos com diferentes possibilidades de serem atacados devido a uma incompetência institucionalizada.
Fernando Pessoa São Pedro
(ilustrações de Almada Negreiros)
Tu, que Diabo?, és velho.
És o único dos trez que traz velhice
Ás festas. Tuas barbas brancas
Têm contudo um ar terno
A que o teu duro olhar não dá razão.
Parece que com essas barbas brancas
Por um phenomeno de imitação
Pretendes ter um ar de Padre Eterno.
Carcereiro do céu, isso é o que és.
Basta ver o tamanho d'essas chaves —
As que Roma cruzou no seu brasão.
Segundo aquelle passo do Evangelho
Do "Tu és Pedro" etcetera (tu sabes),
Que é, afinal uma fraude
Meu velho, uma interpolação.
Carcereiro do céu, que chaves essas!
Nem dão vontade de ser bom na terra,
Se, segundo evangélicas promessas
Vamos parar, ao fim, a um céu claustral.
Isso — fecharem-me — não quero eu,
Nem com Deus e o que é seu
Que o estar fechado faz-me mal
Até na beatitude do teu céu,
Entre os santos do paraíso,
(A liberdade — Deus dá a Deus —
Um Deus que não sei se é o teu),
O estar fechado, aqui ou alli, dizia eu
Faz-me terríveis cócegas no juizo.
Enfim, que direi eu de ti, amigo,
Que não seja uma coisa morta,
Anti-popular, gongorica,
Por fruste deselegante,
Como de quem. sem saber nada. exhausto,
Começo por duvidar bastante,
Desculpa-me chaveiro antigo,
De que tivesses existência histórica.
Mas isso, é claro, não importa
Se nos trazes
A alegria da singeleza
Ou a bondade que não sabe ter tristeza.
O peor é que nada d'isso fazes.
O teu semblante é duro e cru
E as barbas que roubaste ao Deus que tens
Só arrancam aos dandies teus loquazes
Ditos de dandies cinicos desdens.
Que diabo, és uma série de ninguens.
O Santo são as chaves, e não tu.
Para uns és S. Pedro, o grão porteiro,
Para outros as barbas já citadas,
Para uns o tal fatidico chaveiro
Que fecha à chave as almas sublimadas.
Para uns tu fundaste a Roma do Papado
(Andavas bêbado ou enganado
Ou esqueceste
O teu posto quando o fizeste)
E para outros enfim, como é o povo
E segundo as ideas que elle faz,
És quem lhe não vem dar nada de novo —
Umas barbas com S. Pedro lá por traz.
É difficil tratar-te em verso ou prosa,
Tudo em ti, salvo as barbas, é incerto,
Tudo teu, salvo as chaves, não tem ser
E a alma mais humilde é clamorosa
De qualquer coisa que se possa ver,
Em sonho até, qual se estivesse perto.
Olha, eu confesso
Que nunca escreveria
Este vago poema, em que me apresso
Só para me ver livre do teu nada,
Se não fosse para dar um cunho
A este livro da triologia
(Santo António, S. João, S. Pedro —
De popular, que bem que soa!)
Mas porque diabo de intuição errada
E que vieste parar a Junho
E a Lisboa?
Isto aqui ainda tem
Um sorriso que lhe fica bem,
Que até, até
No teu dia,
(O estupor velho
Como um chavelho,)
Nas ruas
O povo anda com alegria,
É fé,
Não em ti nem nas barbas tuas
Mas no que a alegria é.
Olha, acabei.
Que mais dizer-te, não sei.
Espera lá, olha
Roma, fingindo que viceja,
Lentamente se desfolha.
Teu ultimo gesto seja
Um gesto volvente e mudo.
Se tens poder milagroso,
Se essas chaves abrem tudo,
Deixa esse céu lastimoso.
Deixa de vez esse céu,
Desce até à humanidade
E abre-lhe, enfim no mudo gesto teu,
As portas do Inferno, e da Verdade.
(in Fernando Pessoa, Os Santos Populares, Edições Salamandra e Casa Fernando Pessoa)
(tão desconcertante em relação a São Pedro, como o poema de Fernando Pessoa, é este fado cantado por Amália)
Inês Aguiar Para sempre mulher
(Adão Cruz)
teus seios entrevistados são o néctar dessa vida
que pulsa e explode, colinas que Eros sobe
noite de um dia vago, manhã de um sonho acordado
feminino desdobrado, cântico de Neptuno cristalizado
és varanda da tua vontade, veneno de felicidade
eterno feminino que sempre que se abandona
ao feitiço de um cheiro
é fêmea faminta duma boca que sinta
a aurora dos sentidos
e, se saltas a vedação da razão
arrastada pela vertigem da entrega
despertas o animal que és e no frémito do teu desejo
há como que um halo de fogo
que por entre névoas murmura o teu nome
para sempre mulher
O “28 de Maio”
I – Na Génese do Estado Novo
Arnaldo Madureira
Editorial Presença, 1978
Só as circunstâncias extremamente difíceis vividas em Portugal durante cinquenta anos podem justificar a carência de estudos dedicados a tão importante período da vida nacional, a reduzida discussão pública do tema necessária para refutar conceitos, eliminar equívocos, desfazer sofismas e mentiras e contribuir para conhecer com nitidez os intuitos, as sucessivos manobras verificadas antes e durante o desenrolar dos acontecimentos, e o desfecho que teve o movimento militar iniciado na madrugada de 28 de Maio de 1926.
Na realidade, a história, a análise e a exposição dos factos, dos pormenores das operações, das sucessivas tentativas para desviar o «movimento» num ou noutro sentido, dos constantes ziguezagues políticos e compromissos dos diferentes sectores populacionais, estão em grande parte por fazer.
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O “28 de Maio”
II – Na Hora do Corporativismo
Arnaldo Madureira
Editorial Presença, 1982
No primeiro volume da presente obra – Na Génese do Estado Novo – fez-se a análise dos factos históricos decorridos desde a preparação e início das operações do 28 de Maio até ao isolamento e subsequente queda de Mendes Cabeçadas. Neste segundo volume, não se trata já de analisar passo a passo o curso dos acontecimentos, mas antes de estudar e alinhar as opções que se apresentaram ao País, todas elas apostando num projecto nacional dos sectores conservadores, expresso económica e socialmente no corporativismo.
O autor propõe-se determinar: o significado do afastamento de Mendes Cabeçadas: os objectivos reais de cada uma das facções em que a direita se desdobrou após a queda daquele; (…) o papel desempenhado pelas organizações republicanas e pelos representantes da classe operária.
Saramago sobre Gonçalo M. Tavares - não tem o direito de escrever tão bem apenas com 35 anos: dá vontade de lhe bater!"
Os prémios são uma alegria e uma honra, mas para um escritor o mais importante é o seu percurso”, disse Gonçalo M. Tavares ao saber que tinha ganho o Grande Prémio de Romance e Novela daAssociação Portuguesa de Escritores (APE) / Ministério da Cultura 2010 com aobra ‘Uma Viagem à Índia’, editada pela Caminho.
“Trata-se de uma epopeia – ou anti-epopeia, como lhe chamou Eduardo Lourenço – em que um homem parte numa viagem física, mas também mental, à Índia, à procura de um mestre indiano, para descobrir que ele é, afinal, materialista”, Referindo-se ao valor monetário do prémio - 15 mil euros – destacou o autor: “Para alguém que escreve, os prémios representam também a possibilidade de defender melhor o seu tempo de trabalho”, conclui. Quando em 2005 Gonçalo M. Tavares publicou o seu romance Jerusalém, José Saramago comentou: "Um grande livro, que pertence à grande literatura ocidental. E concluiu - Gonçalo M. Tavares não tem o direito de escrever tão bem apenas com 35 anos: dá vontade de lhe bater!"
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Em primeiro lugar, e como introdução ao tema, gostaria, não propriamente de responder, mas de tecer algumas considerações sobre as reacções suscitadas pelo comentário que fiz no “Estrolabio” na noite eleitoral, tentando cumprir o horário que me foi pedido e, por isso, antes de haver números definitivos. Mas este último aspecto é irrelevante, pois, no essencial, mantenho o que escrevi.
Numa conjuntura como a actual, com o desgaste sofrido pelo Governo e pelo primeiro-ministro, que o PSD só tenha conseguido nos últimos dias de campanha descolar da situação de empate técnico existente durante semanas, ilustra o que atrás afirmo sobre a alternativa. E quanto aos resultados propriamente ditos, como diria La Palice, é evidente que o PS perdeu porque o PSD teve mais votos, mas contrariamente ao que li nalguma imprensa, e como aliás então referi, não foi a maior derrota depois da de 1985.
Mas deixando estas minudências de lado, o que de facto interessa retirar é que, utilizando a conceptualização do tal paradigma de Michigan, se assistiu a uma continuidade do sistema que se caracteriza pela alternância entre dois grandes partidos. Deste modo, quer se queira quer não, o PS continua a ser um deles, nenhum outro – contrariamente ao que se passou em 1985 com o PRD – lhe disputou tal lugar, donde ser importante o que no seu seio irá acontecer neste novo ciclo entretanto aberto. Sem ele não há alternativa institucional à coligação de direita que agora nos governa, não há perspectivas de travar o desmantelamento do que nos planos político, social e económico ainda resta das conquistas mais significativas do pós-25 de Abril. E em relação a isto, bem tento, como dizia Schopenhauer – e posteriormente Gramsci -, encarar os factos com o pessimismo da razão, e o optimismo da vontade.
Como quer que seja, abstraindo de quem vai ocupar o cargo de secretário-geral – e claro que não é indiferente ser Assis ou Seguro – o PS está comprometido com o programa imposto pelos controleiros europeus e mundiais da finança, e por muito que se queira redimir de ter ajudado a conduzir o país para este impasse, isso condiciona-o e limita-o. Por outro lado, tanto no plano global como europeu, os governos estão sujeitos à chantagem do banditismo financeiro, com os seus homens de mão chamados “agências de rating”. Consequentemente, as mudanças que é necessário ocorram dentro do PS, estão dependentes de dinâmicas mais gerais, a nível europeu e não só. Num sentido conducente ao reforço da ditadura dos mercados e da finança, ou num sentido contrário, através da mobilização dos povos – incluindo o nosso -, e da reorganização estratégica da esquerda e dos movimentos sociais, tradicionais ou de tipo novo. As democracias precisam não de um “choque liberal” – como dizia, falando de Portugal, aquela figura que a governação tornou pesada, circunspecta e direitista, do ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Amaro – mas de um “choque social”. Ou seja, se não surgirem novos actores sociais e políticos, ou se os que à esquerda ocupam a cena política não conseguirem repor no cerne da sua acção os valores da solidariedade, da liberdade, da igualdade, da democracia, dos Direitos do Homem, da ética republicana, da laicidade, etc., etc. – tudo aquilo por que se têm batido, no decurso de séculos, gerações e gerações de homens e mulheres -, o que nos aguarda são formas, mais ou menos tecnológicas e comunicacionais, de novos autoritarismos, materializados, de modo mais ou menos soft, em reais e concretos big brothers. Isto é, os verdadeiros detentores do poder que continuarão a dominar com cinismo, a incentivar a ganância, a destruir os elos comunitários, argumentando na “novlíngua” da inversão de valores que enaltece os chamados winners que vivem esmagando os losers, quer dizer, os mais pobres, os mais fracos, os mais desprotegidos.
Radical e exagerado o que digo? Como dizia o velho Marx, se ser radical é procurar ir à raiz das coisas, confesso que sou radical. E confesso também que se tivesse menos quarenta anos estaria a ocupar uma praça qualquer de Lisboa ou de outra capital europeia. Mas a indignação não constitui um programa político e é volátil se não se transformar em força organizada.
A natureza do projecto político do Governo, que ainda se está instalar, começa a precisar-se, se dúvidas houvesse: ser ainda mais “troikiano” do que o diktat da chamada “troika” e, como grande desígnio nacional no plano económico – como confessou aquele sorridente ministro da Economia acabado de aterrar do Canadá – transformar o país numa Florida europeia, um destino de sonho para estrangeiros reformados com poder de compra… Ora há que recusar este projecto que nos quer converter em prestadores de serviços aos europeus mais abonados, e que contrariar o actual primeiro-ministro, decerto bom rapaz, um pouco populista até – aquela de viajar em classe turística faz-me lembrar o Teófilo Braga a ir para Belém de eléctrico -, quando afirmou, algures, que deverão ser os bancos e os “mercados” a “alavancar” o crescimento. Os povos não se alimentam com a especulação que só aproveita aos especuladores, e é premente reconstruir o nosso tecido produtivo nos vários sectores, pois é com força de trabalho, vontade e inteligência que se faz “a riqueza das nações”. Por isso “alavanquemos” todos para recuperar a nossa dignidade de cidadãos. É disso que se trata.
(Continuação)
Este texto não precisa de comentários, excepto dizer que é retirado da realidade social, que segue as águas do moinho da procura da liberdade do homem. Mas, como já comentei, essa liberdade é a subordinação à lei que nos governa e define cada passo que damos na nossa vida e dá nomes às pessoas conforme o seu comportamento. A capacidade de raciocinar, de pensar e decidir, é o que traz a liberdade ao ser humano. O problema é que liberdade… O texto, como todos os outros denominados sagrados que referi, remete a actividade humana para uma metáfora que não vive entre nós, que radica na mente do ser humano e que dita leis por meio de pessoas como Moisés, Elias, Jesus, hierarquias pontifícias, formas de acreditar e que, no fim dos finais, é parte da cultura ou formas de comportamento adequadas às conveniências da nossa individualidade. O que é adequado à nossa pessoa, é viver sem pecado, quer dizer, sermos capazes de fixar um último bem, uma auto-estima que, em metáfora, está definida como a procura de Deus, muito embora a divindade não esteja definida em parte nenhuma. É aí que Freud e os seus seguidores foram capazes de ver as dificuldades da vida, para além da metáfora e entrar dentro de cronologias e contextos genealógicos, orientados por uma libido erótica que leva à reprodução. Ideia que o texto que comento não refere, antes pelo contrário, retira da materialidade da vida o que a ilusão de sermos pais tinha colocado: factos históricos, com provas complementares para demonstrar a sua verdade.
Na foto: MQ-9A «Reaper» (Predador-B) tipo de aeronave de ataque a operar sobre a Líbia.
Os Estados Unidos prevêem exportar 46 mil milhões de dólares em armamento durante o ano fiscal de 2011, informou ontem a Agência de Defesa, Segurança e Cooperação dos Estados Unidos (DSCA); um aumento de 50% em relação a 2010.
A France Press dá conta que as vendas de equipamentos militares americanos, que se limitavam a cerca de 10 mil milhões de dólares no início dos anos 2.000, alcançaram 30 mil milhões em 2005.
Segundo o vice-almirante William Landay, director da DSCA, informou na conferência de imprensa, “entre 2005 e 2010 mandámos via sistema FMS (Vendas Militares ao Estrangeiro) o equivalente a 96 mil milhões de dólares em equipamentos, materiais e serviços.” Disse ainda que “nos anos 2.000, os clientes buscavam principalmente reços baixos, mas com a guerra do Afeganistão eles passaram a querer equipamentos novos”, o que explicaria o aumento do valor das exportações americanas. “Nota-se uma procura crescente de aviões não tripulados norte-americanos”, acrescentou.
Em Agosto do ano passado, Barack Obama defendia novas regras na exportação de armamentos produzidos nos Estados Unidos, de forma a simplificar a venda de produtos pouco sensíveis, (incrementando as exportações e gerando empregos), enquanto por outro lado queria impor restrições sobre o armamento de tecnologia de ponta.
No fundo que não falte armamento para iniciar conflitos de baixa intensidade, essencial para a indústria, mas resguardando que os meios que definem a vitória no terreno, não vão parar a mãos indesejáveis.
O senão da estratégia tem sido o facto de em várias zonas do globo, os amigos de hoje dos americanos, virem a ser os inimigos de amanhã.
O horrível da estratégia, é que para ajudar a resolver o problema do insuficiente crescimento económico e do desemprego nos Estados Unidos, tenha de se promover a guerra.
Conflitos que não têm razão de existir, alguns que se transformam em guerras quando podiam ser resolvidos no campo diplomático por negociações, são semeados por todo o lado levando a morte e o sofrimento a gente pacífica.
Publicado por Carlos Mesquita em oclarinet.blogspot.com-.url
No dia 15 deste mês, em Barcelona, uma manifestação pacífica dos "Indignados" em frente do Parlamento vira à guerra campal com a polícia. Por ser difícil, para a polícia, controlar um grupo de manifestantes pacíficos sem passar por um instrumento de repressão totalitário, a polícia envia agentes seus disfarçados de manifestantes para semear a confusão e justificar assim a sua intervenção.Desencadeada a barafunda, a polícia tem então uma razão válida para intervir.Este método é bastante clássico em muitos cenários e como podemos ver neste vídeo, não é por ter um jean esburacado e uma mochila às costas que um polícia passa despercebido na multidão. A prova em imagens:
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«Foi o Mário Vieira de Carvalho que me fez chegar este texto, uma iniciativa de Mikis Theodorakis, texto este que não nos diz nada de novo em relação ao que, graças ao labor do Júlio Marques Mota, no «estrolabio» se tem dito há já muito tempo, nomeadamente dando a conhecer os textos dos «Economistas Aterrados». É por isso menos importante? Evidentemente que não, não só por ter sido um grande vulto da música contemporânea, M. Theodorakis, a ter tomado a iniciativa de se dirigir à consciência dos europeus, com muito maior audição do que um simples cidadão europeu, mas também por nunca serem demasiadas as chamadas de atenção para a verdadeira razão da crise com que os mercados financeiros e os políticos seus serventuários estão a destruir a democracia e a levar a Europa e o euro à ruína. Não são os trabalhadores os responsáveis, mas são os trabalhadores quem a crise vai pagar. Agora a Grécia, a Irlanda e Portugal, com as baterias já apontadas a Espanha; depois serão a Itália, a França, ..., por fim a Alemanha, talvez o país mais merecedor de vir a sofrer a crise pela cegueira com que está a conduzir-se.
Se a Europa no pós-guerra (e a América, claro) tivesse tido o comportamento que a Alemanha está agora a ter, como estaria hoje este país? Será que ainda existiria?
É evidente que sem os erros cometidos pelos políticos gregos (as duas famílias que a têm governado), pelos políticos irlandeses, pelos políticos portugueses desde Cavaco Silva 1.º Ministro, não teria sido tão fácil aos mercados financeiros, com a acção constante das agências de rating, e à banca levarem-nos a tal estado de penúria, o que nos leva a também ter de assumir a nossa quota de responsabilidade por não termos sido capazes de impedir a acção de tais políticos, pois fomos nós que os elegemos. Esquecemo-nos que a política é um exercício de cidadania que a todos responsabiliza.
E agora? Resta-nos tomar consciência de que o futuro de nós depende e partir para a acção, acção essa que tem de ser dos europeus, como no texto se defende, e não do povo trabalhador isolado, deste ou daquele país.»
(Adão Cruz)
Sobre os teus ombros nus
Cai um lindo xaile de fitas
Delicadas e sedosas
Discretas e silenciosas
Que nesse corpo ágil habita
Nesse teu corpo suave, esguio
Pendem longas e solenes fitas
E desses lábios, doce sorriso
Soltam-se palavras nunca ditas
E do cândido e sereno olhar
Se escapa o desejo de abraçar
Nunca um sorriso pintou melhor
Um rosto que o alimenta
Nunca um xaile tapou um corpo
Tão cheio de paixão sedenta
No xaile se escondem ternuras
Que só brilham nas noites escuras
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