Soneto a um fidalgo morto por um touro (este vai repetido)
Dos golpes no confuso labirinto morre ao mais duro o touro mais atento, pois sendo igual em todos o instrumento em tudo o braço heróico o fez distinto.
Em cólera abrasado, em sangue tinto, conhece o bruto o alto régio alento, e ilustrando na morte o nascimento obrou como a razão o que era instinto.
Para acabar elege uma ferida, mas na eleição a rápida braveza passa de irracional, fica estendida.
E em régia adoração de tanta alteza, chega hoje a ser o estrago de uma vida mais que injúria, lisonja à natureza.
Soneto a um coronel, tido como cruel para os seus subordinados, e... zarolho! Este soneto ainda era considerado desrespeitoso em 1855.
Coronel satanás, Fernão zarolho, cruel hárpia das que o abismo encerra, na empresa de afligires esta terra de que serve o bastão, se tens esse olho?
Vai-te deitar na granja de remolho onde o vilão, porque o escorchas, berra; pois não é para o ilustre ardor da guerra Abóbora com feitio de repolho.
Se soubeste juntar com força rara, sendo em ti o prender genealogia, de galinha o louvor, de mono a cara,
anda, prende, e "ateima" na porfia, pois em Aldegavinha tens a vara e n´Ásia, em Cananor, a feitoria.
Soneto a um pregador, a um "cura", da Ordem dos Grilos, célebre pelo seu amor à bebida. Este soneto é o último que chegou até nós de Caetano José da Silva Souto-Maior:
Tal sermão, e tão grande, e sem parelha do nosso reverendo Frei Palrilha, será d´asnos oitava maravilha por somente constar de muita orelha.
Eu quando o vi com cara tão vermelha, dizendo as asnidades em quadrilha, sem reparar nos calos da servilha julguei tudo fumaças da botelha.
Se o sermão se pregasse na Pampulha, de toda a marotice a vil canalha, metera muito embora o frade a bulha.
Mas eu venho a inferir nesta baralha que ou o tal frade a todos nos empulha, ou ele certamente come palha.
OS 22 sonetos sobreviventes de Caetano José da Silva Souto-Maior foram "salvos" por José Maria da Costa e Siva, e publicados em 1855. Há outros poemas "sobreviventes".
Hoje desce ao Terreiro um poeta português - Luís Maria Leitão (Moimenta da Beira, 1912 — Niterói, 1987), conhecido sob o pseudónimo de Luís Veiga Leitão. Poeta e artista plástico, foi um dos fundadores do grupo literário Germinal. Activista político, antifascista, esteve preso em 1952. Dessa experiência resultou a colectânea poética Noite de Pedra, apreendida pela censura Com Egito Gonçalves, Daniel Filipe e outros, criou as Notícias do Bloqueio, uma série de fascículos publicada no Porto, entre 1957 e 1961, onde se reunia a criação poética de diversos autores. Foi colaborador das revistas Seara Nova, Vértice, entre outras. Poeta neo-realista, os seus poemas incorporam linguagens e técnicas subsidiárias de outras correntes, tais como o surrealismo. Em 1967 foi para o Brasil, onde viveu até 1977 e onde morreu.
Obras principais: Latitude (1950); Noite de Pedra (1955); Ciclo dePedras (1964); Longo Caminho Breve. Poesias Escolhidas (1943-1983); Biografia Pétrea, (1989); Rosto por Dentro (1992); Linhas doTrópico (1977); Livro de Andar e Ver (1976); Livro da Paixão (1986); Obra Completa, (1997). De Ciclo de Pedras seleccionámos este poema:
A uma bicicleta desenhada na cela
Nesta parede que me veste Da cabeça aos pés, inteira, Bem hajas, companheira, As viagens que me deste.
Aqui, Onde o dia é mal nascido, Jamais me cansou O rumo que deixou O lápis proibido… Bem-haja a mão que te criou! Olhos montados no selim Pedalei, atravessei E viajei Para além de mim.
Em 1856 o Governo manda instalar um salva-vidas na estação fluvial de Belém. Embarcação a remos, leve porém robusta, muito mais do que a tua canoa de pesca. Contudo, durante os naufrágios na barra, continuas a ser o primeiro a chegar! Compreende-se: estás melhor localizado...
Em Fevereiro de 1858 a escuna inglesa British Queen encalha junto ao Bugio. Dada a violência do mar, com a tua canoa de pesca mal consegues aproximar-te. Com muita dificuldade salvas apenas o Comandante e um cãozinho que por ali andava a nadar aflito por entre as vagas. A propósito, dizes para os teus marinheiros:
- Aquele ali também tem vida e é o melhor amigo do homem...
Recolhes o cão e regressas a terra juntamente com o Comandante da British Queen.
Apesar dos fracos resultados do salvamento, a Coroa inglesa agracia-te com a Medalha de Ouro de Mérito Humanitário. Toda a tua tripulação é também agraciada com a mesma medalha, mas de prata.
Finalmente, em 1859, o Governo transfere o salva-vidas de Belém para Paço de Arcos e coloca-o sob as tuas ordens. Resmungas: “mais vale tarde do que nunca”.
EL REI D. LUÍS
Salvamentos e mais salvamentos. Entre eles aponto:
Em 1859 salvas o Comandante e mais dois tripulantes do Stephanie, navio francês também encalhado no Bugio. És condecorado com a “Medalha de Dedicação e Mérito” e também com a “Medalha de Valor e Filantropia”, ambas francesas.
A 19 de Fevereiro de1864 salvas grande parte da tripulação do bergantim espanhol Achiles. A Espanha atribui-te a medalha de ouro “Distinção Humanitária”.
Três dias depois, a 22 de Fevereiro, salvas toda a tripulação do iate português Almirante. Mais uma vez o Governo português nem sequer pia. Mas a 24 de Fevereiro El-rei D. Luís bate à porta da tua casa humilde. Toda a tua família e toda a população de Paço de Arcos ficam em polvorosa.
O monarca pergunta e tu vais contando os teus feitos, rude linguagem de lobo do mar, porém sincera até mais não poder. El-rei convida-te a visitá-lo no paço de Caxias, povoação vizinha de Paço de Arcos, e onde pousava transitoriamente. Aceitas o convite e no dia seguinte estás do Paço de Caxias.
Entras, El-rei abraça-te e coloca-te ao pescoço o colar da Ordem da Torre e Espada, a mais alta condecoração portuguesa. E tu, rijo homem do mar, não tens vergonha de, comovido, soluçar contra o peito do teu monarca.
Mas uma coisa são as gloriosas condecorações, outra é a penúria em que tu vives. O Governo não se mexe, não quer saber do que está a acontecer em Paço de Arcos. Porém o Marquês Sá da Bandeira, deputado da Oposição, dispara o seu discurso como se fosse um arcabuz e o Governo, finalmente, abre os olhos: com a aprovação prévia do Parlamento, atribui-te uma pensão anual de 240 mil réis, transmissível à tua mulher e filhas, em caso de passamento teu. Se tu salvaste muitos da fúria das águas, Sá da Bandeira salvou-te da fúria da miséria...
As coisas começam a compor-se: em 1866 és nomeado mestre da Armada e graduado segundo-tenente, em diploma assinado por El-rei e pelo Visconde da Praia Grande.
BALANÇO
Em 1882, com 85 anos e já tolhido das pernas, mandas que te amarrem ao leme e ainda tentas socorrer o Lucy, lugre francês. Felizmente o teu filho Quirino António, que estava fora de Paço de Arcos, ouviu o disparo do Forte de S. Julião da Barra e acorre a tempo de te obrigar a passar para a falua e é ele quem, no salva-vidas, efectua o salvamento.
Tomás Ribeiro, o poeta, dedica-te uma quadra:
Quando o Patrão já velho, ao pé do mar assoma, só de o encarar, o oceano se atemoriza e doma.
Em 1885 o poeta e o Marquês da Fronteira, teus amigos, mandam inscrever esses versos numa lápide que é afixada no frontispício da tua casa.
Fazes o balanço da tua vida, dizes:
- Se não me falham as contas, nem a memória, socorri mais de 53 navios e salvei mais de 300 vidas.
ULTIMATUM
Em 1890, Ultimatum da Inglaterra a Portugal, por causa dos territórios africanos que as duas nações disputam. Tens 92 anos mas ainda a necessária lucidez e fibra para devolver ao governo inglês as condecorações com que ele te agraciou. E para convencer os teus filhos a seguirem o teu exemplo.
Morres a 21 de Dezembro do mesmo ano. Consternação e luto em Paço de Arcos, as lojas com as portas fechadas, as embarcações a rumarem para a praia com bandeiras a meia-haste. A Marinha organiza o teu funeral, barcos de guerra a escoltarem o teu corpo até ao Arsenal, junto ao Terreiro do Paço, em Lisboa. No cortejo, por decisão de El-rei D. Carlos, também se integra o iate Amélia, assim chamado em homenagem à rainha sua esposa. Finalmente és sepultado no cemitério de Oeiras.
Quando hoje atravesso Paço de Arcos e vejo o teu busto de bronze no parque fronteiro ao mar, e depois o Instituto de Socorros a Náufragos que tu inspiraste e a Rainha D. Amélia concretizou, tenho sempre a sensação, não sei porquê, que ando contigo a remar rumo ao Bugio.
Só Portugal é que não podia ter colónias? (Continuação)
Se Portugal, e muitíssimo bem, teve de deixar de ter colónias e, como assim, deu um contributo muito significativo para o desenvolvimento do pensamento e da acção em prol da Democracia, a justiça internacional que daí tem de decorrer – tal como Portugal tem de insistir em defendê-lo – não pode continuar a ignorar a circunstância, bem pelo inverso, tem de saber valorizá-la e apontá-la como uma atitude política eminentemente democrática que deve ser adoptada por quaisquer outros estados.
A manutenção das dominações exercidas sobre uma número considerável de Nacionalidades que, muitas delas, não desistem de querer afirmar-se, devem ter Portugal como um seu defensor estreme. Já não interessa procurar fazer vingar a injustiça um tanto belicista e despótica do Quinto Império antevisto pelo jesuíta António Vieira, nem, tão-pouco querer dar corpo à visão simpática, porque eminentemente cultural, mau grado reaccionária do outro Quinto Império que a intelectualidade de Fernando Pessoa adivinhava para o futuro de Portugal mas sim defender aquela visão que torna a Nação - Estado portuguesa como um farol activo das Libertações Nacionais e, como assim, do regresso a uma Europa das Nacionalidades, tudo feito sem ter de olhar, muito menos respeitar, supostos direitos históricos, fossem adquiridos ou colhidos mercê de actos de dominação política, conquista militar ou, sobretudo, pelas iniquidades dum suposto direito dinástico. Poder-se-á repor a esperança dum Quinto Império?
A Democracia – e a europeia com destaque – precisa de ser servida por um espírito e por uma acção de Libertação Nacional, uma tarefa cuja incumbência cabe ser dinamizada por Portugal, salvo querer-se que os cidadãos portugueses possam acusar as gerências nacionais de não verem – não quererem ver – o argueiro no olho alheio.
Só Portugal é que não podia ter colónias?
E os estados que as têm?
Quantos na Europa e na chamada União Europeia?
Para ser-se colonizado precisar-se-á de ter uma outra cor que não a branca?
Um basco, um andaluz, um galego, um sardo, um corso, um siciliano, um bávaro, um bretão, um alsaciano, um loreno, um galês, um irlandês, um escocês, um flamengo, um lapão, um tchetcheno etc., etc. não serão Homens e Mulheres colonizados? Que razão autêntica pode apresentar-se para impedi-los de possuírem a dignidade de eles próprios poderem estar representados, com autonomia completa, na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas?
Conseguir-se-á uma qualquer União Europeia na vigência dos seus actuais Estados?
A discriminação imposta pelos estados expansionistas que desde há muito exigem ter o direito de ocupação e dominação de várias Nacionalidades tem alguma legitimidade face aos valores supremos da Democracia?
Quem, em Portugal, não tem coragem para confrontar os estados europeus – esses, pelo menos – e colocar-se ao lado das suas inúmeras Nacionalidades que, com maior ou menor expressão, sabe-se, aspiram à sua Libertação?
Quem, em Portugal, é servil frente aos expansionismos europeus que dominam tantas Nacionalidades?
São os herdeiros dum pensamento estratégico timorato e acobardado, afinal, nada mais que uma inaceitável subserviência política das classes sociais dominantes deste Portugal e que prossegue, há séculos, desde que a governação nacional, depois de 1640, passou a viver, muito principalmente, à custa dos apoios externos.
Depois dos cinquenta anos da ditadura salazarista, o 25 de Abril devia e podia ter dado muito mais à população portuguesa. Teve que saber fazer-se uma descolonização que, sejam quais tenham sido as razões mais íntimas e as mais poderosas, com todo o acerto, não pecou – como todas as demais – por deixar restos de qualquer neocolonialismo porém, uma vez feita essa obra, face aos demais estados que continuam a colonizar – conhecem-se colonizações em todos os Continentes – não soube ter uma palavra no sentido de incentivá-los, senão mesmo de exigir-lhes, a terem de seguir o exemplo português.
Portugal, mercê da Descolonização – a consequência democrática internacional mais importante do 25 de Abril – passou a dispor dum capital de imensa legitimidade para apresentar-se ao mundo como defensor acérrimo de todos os povos oprimidos, a começar por quantos há no estado vizinho. Não será isso um vector importante da luta pela Democracia?
Se no plano da intervenção internacional, entre nós, ninguém soube – não pretendeu – tirar as consequências mais interessantes, mais lógicas, mais persuasivas e mais afirmativas para o Portugal posterior ao 25 de Abril, também, no plano interno os políticos que enxameiam a vida política nacional, na mira das vantagens estratégicas dos seus patrocinadores do exterior, só souberam – só pretenderam – arregimentar a população portuguesas ao sabor desses interesses alienígenas. Como é histórico – mais outra vez – todos esses interesses foram, tão-somente, aqueles exigidos pelos outros estados com hegemonia política.
Aos portugueses não compete ter contemplações, nem contemporizações para com as anexações territoriais operadas ao longo das suas histórias pela quase totalidade dos Estados europeus.
Só Portugal é que não podia ter colónias? É uma repetição obrigatória de continuar a fazer-se !
Que pena tenho de não poder exprimir tudo o que me vai na alma sobre algumas pessoas que durante este período do mundial falaram dos percursos anteriores da selecção nacional. Para mim a selecção nacional será sempre a minha equipa, ganhe, perca ou empate. Com este, como foi com os anteriores ou será com os próximos seleccionadores nacionais, enquanto por cá andar neste mundo. A Selecção Nacional será sempre a melhor equipa do mundo, a mais bela, aquela por que mais sofrerei. Em qualquer circunstância. A Selecção Nacional para mim são afectos, é "o nós" em oposição ao "eu", é a história de todos, não só de alguns, são as cores da bandeira, é o hino, e é esse conjunto de sentimentos que fazem dela a minha equipa. É equipa de Jorge Vieira, Azevedo, Matateu, de Travassos, de Hernãni, de Eusébio, de Futre, de Figo, Rui Costa, de Petit, de Deco, de Simão, de Ricardo, de Vitor Baía, de Fernando Couto, de Cristiano Ronaldo e hoje de Fábio Coentrão e de Eduardo, e de todos os outros que vestiram aquela camisola. É a equipa de Ribeiro dos Reis, de Otto Glória, de Juca, de António Oliveira, de Scolari e Queiroz. Não só de um, mas de todos. Com actos positivos e negativos, de vitórias e derrotas. Era este o espírito de muitos com quem aprendi, sobretudo lendo, porque infelizmente não os conheci. Cândido Oliveira, Vitor Santos, Carlos Pinhão, Aurélio Márcio e tantos, tantos outros. Infelizmente, alguns ilustrados comentadores(??) e analistas, mexendo nos números, nos resultados, sobretudo nos ódios, fizeram os impossíveis para demonstrar aos portugueses que a história foi fraca. Como se enganam. É o conjunto dos bons e dos maus momentos que faz desta selecção o que ela é hoje. E ela hoje é uma referência no mundo do futebol. Mesmo tendo perdido nois oitavos do mundial. E aí volto ao princípio desta entrada. Para que conste que nada mudou nos meus princípios e nas minhas ideias.
O comentário de Luís Moreira parece-me bem escrito e como deve ser. O que é como deve ser? Fugir dos ataques aos docentes que deviam entregar um relatório por dia, e reuniões que nunca mais acabavam. No seu minuto, e no Estrolabio, publiquei também uma crítica, que se o nosso gestor quiser, podia fornecer ao Luís Moreira. Não há arte mais difícil que a de ensinar e e Socióloga Engenheira andou por ruas que nem deviam ser pisadas. Um docente é para ensinar e não para dar conta do seu trabalho diariamente. Ensinar é pesado, o ministério também. Ninguém lê Paulo Freire para saber o duro do oficio e os contornos que tem. Reparem, é entrar numa mente aberta que ainda nada tem na cabeça e é ai onde o docente deve concentrar-se. A burocracia escolar não dá tempo aos docentes para aprender ciência nova e a transferir com palavras simples. No meu ver, a proposta é arrogante e para doutores e os pequenos não conhecem a o nem por redonda que ela é, menos ainda. As novas oportunidades nunca foram explicitadas, como iam os docentes usar? Introduzir profissões no segundo ciclo, é dividir a sociedade em amos e escravos. Parece-me bem que se faça, mas ao acabar o secundário completo, que, se não se aprende mais ciência, empurra ao estudante a ser operário, ficando o saber para os ricos. A minha critica é dura porque o programa é classista, o que o recenseador não refere. Parece-me mal não ir ao fundo da questão e reparar que se a sociedade já está dividida conforme as entradas económicas do lar, a torna ainda um sítio para entontecer ao aprendiz de feiticeiro. Na Inglaterra e nos EUA tem bom resultado, porque há dinheiro para pagar. Transferir do ensino privado para o público, é um risco destemido que não deve acontecer. Maria de Lurdes, comigo tornou a chumbar....
José Rodrigues Miguéis recorda a sua primeira infância num dos melhores romances portugueses. A cidade do princípio do século, os primeiros automóveis, a cidade iluminada a gás, dos teatros do Príncipe Real, do animatógrafo, a cidade que acabava na Rotunda, para lá os campos de corridas ao Campo Grande.
Os hábitos, a carbonária, a aristocracia decadente, o regicídio e a proclamação da I República. As profissões, os portugueses e galegos que chegavam à capital. Tudo contado magistralmente pelos olhos de um menino que cresceu a ver o brilho do sol das sacadas pombalinas viradas ao Tejo. Menino que reteve minuciosamente a memória das cores, dos cheiros, das gentes e de tudo quanto foi sendo, intensamente, o seu mundo.
Luís Moreira Quatro anos e sete meses, o mais extenso mandato nos últimos anos como ministra da Educação.Escolheu 24 medidas e o programa "Novas oportunidades" como as mais representativas. Destaca a introdução do Inglês no 1º ciclo; os cursos profissionais no ensino secundário para os alunos que abandonavam o ensino;e o programa "novas oportunidades" para os adultos com déficite de escolarização.
Reconhece que grande parte das medidas inovadoras foram lançadas na escola pública depois de terem sido implementadas na escola privada, como a escola a tempo inteiro no pré-escolar e no 1º ciclo e as aulas de substituição.
"A Escola Pública pode fazer a diferença " é um livro para o futuro, para mostrar que é possível fazer política obtendo resultados, não é um livro de memórias , mas de descrição de políticas".
Eu amo, Pavel, eu amo imensamente; eu não sei se posso ser amado como gostaria de sê-lo, mas não desespero; eu sei pelo menos que se tem muita simpatia por mim; eu devo e quero merecer o amor daquela que amo, amando-a religiosamente, quer dizer, activamente; - ela está submetida à mais terrível e à mais infame escravidão; - e devo libertá-la combatendo seus opressores e acendendo em seu coração o sentimento de sua própria dignidade, suscitando nela o amor e a necessidade da liberdade, os instintos da revolta e da independência, lembrando a ela o sentimento de sua força e de seus direitos. Amar é querer a liberdade, a completa independência do outro, o primeiro acto do verdadeiro amor, é a emancipação completa do objecto que se ama; não se pode verdadeiramente amar senão a um ser perfeitamente livre, independente não somente de todos os outros, mas mesmo e sobretudo daquele pelo qual é amado e que ele próprio ama. Eis minha profissão de fé política, social e religiosa, eis o sentido Intimo, não apenas de minhas acções e de minhas tendências políticas, mas também, quanto eu possa, o de minha existência particular e individual, pois o tempo em que estes dois tipos de acção podiam ser separados já está bem longe de nós; agora o homem quer a liberdade em todas as acepções e aplicações desta palavra, ou então ele não a quer absolutamente. Querer, amando, a dependência daquele a quem se ama, é amar uma coisa e não um ser humano, pois este só se distingue da coisa pela liberdade; e também se o amor implicasse a dependência, ele seria a coisa mais perigosa e a mais infame do mundo porque criaria uma fonte inesgotável de escravidão e de degradação para a humanidade. Tudo que emancipa os homens, tudo que, fazendo-os entrar neles mesmos, suscita o princípio de suas próprias vidas, de uma actividade original e realmente independente, tudo que lhes dá a força de serem eles próprios, – é verdadeiro; todo o resto é falso, libertário, absurdo. Emancipar o homem, eis a única influência legítima e benfeitora. Abaixo todos os dogmas religiosos e filosóficos, eles são mentiras; a verdade não é uma teoria, mas um facto; a vida é a comunidade de homens livres e independentes – é a santa unidade do amor brotando das profundezas misteriosas e infinitas da liberdade individual.
Por favor, não se esqueçam de mim e, se for possível, escrevam-me, mas sendo prudentes e evitando também vos comprometer pelo que quer que seja, escrevam-me pelo menos uma palavra a fim de que eu possa estar seguro de que estais ainda vivos. Meus pobres, vós não podeis saber quão frequente meu coração se aperta em relação a vós e por vós; nossos pais desperdiçaram toda vossa vida; eles vos mataram. O que é feito de meu pai? Eu lamento por ele: ele também era capaz de uma outra existência. Ele ainda está vivo? Eu lhe escreverei em breve uma última carta de adeus, sem o menor objetivo prático ou interessado, mas simplesmente para me despedir dele e lhe dizer algumas palavras de afeição e de adeus. Quanto à minha mãe, eu a amaldiçoo; para ela, em minha alma, não há lugar para outros sentimentos além do ódio e do mais profundo e radical desprezo, não por minha causa, mas pela vossa, a quem ela causou muitos males. Não me trateis por cruel; é tempo de que nós nos libertemos de um sentimentalismo impotente e irreal; é tempo de sermos homens, homens tão fortes e tão constantes no ódio quanto no amor. Sem perdão, mas guerra implacável a meus inimigos, pois esses são os inimigos de tudo o que há de humano em nós, os inimigos de nossa dignidade, de nossa liberdade. Nós por muito tempo amamos, Queremos finalmente odiar.
Sim, a capacidade de odiar é inseparável da capacidade de amar.
Paris, 29 de Março de 1845. A.A. Kornilov, Gody Stranstvij Michaila Bakunineea, Leningrado etc. 1925, pp. 284- 285.
Ilustrações - Na abertura do texto: primeira página manuscrita das Confissões de Bakunine ao Czar.
Do blogue "Café Portugal", com a devida vénia, transcrevemos na íntegra esta interessante e esclarecedora entrevista com Joaquín Fuentes Becerra, presidente da Associação Além Guadiana. A entrevista foi realizada por Ana Clara na passada terça-feira, dia 29 de Junho.
Para o presidente da associação Além Guadiana, cujo objectivo é dinamizar a cultura portuguesa em Olivença, com o passar do tempo as ancestrais ligações» com o nosso país «começaram a perder-se». Joaquín Fuentes Becerra refere que «a melhor maneira de recuperar os caminhos perdidos, entre eles o da língua, é através dos sentidos, das emoções, dos pequenos e grandes descobrimentos da nossa história desconhecida e dos novos laços com Portugal». «Não podemos ter duas culturas se uma delas não se pode expressar através das palavras, só das pedras mudas», lamenta Becerra, considerando que é fundamental apostar no ensino da Língua aos mais jovens.
Café Portugal - Em Junho último a associação que preside organizou um dia de homenagem à Lusofonia em Olivença. No fundo um dia de memória à língua portuguesa que contou com o apoio do Ayuntamiento de Olivença. Gostaríamos que pormenorizasse.
Joaquín Fuentes Becerra – A Além Guadiana tem tido sempre uma boa e aberta relação com a autarquia e os diferentes representantes políticos de Olivença. Após a criação da associação, em Março de 2008, apresentámo-nos a todas as instituições culturais e políticas locais com o objectivo de explicar o sentido da associação, os nossos fins e actividades a desenvolver. Apesar de ser uma entidade jovem, com pouco mais de dois anos, temos desenvolvido um grande número de actividades, como as primeiras Jornadas sobre o Português Oliventino, a criação de um website e um blogue para a difusão da Além Guadiana e a cultura lusófona, eventos musicais, etc. Tudo sempre em linha com a cultura portuguesa e com uma grande aceitação popular. Depois, chegaram outras iniciativas como a recuperação dos velhos nomes das ruas em português ou a realização de um espaço dedicado ao mundo lusófono, o «Lusofonias». Ambos os projectos foram apresentados à Câmara e às instituições políticas de Olivença e contaram com um apoio unânime.
Também temos desenvolvido actividades em colaboração com os professores de português da escola «Francisco Ortiz» para a divulgação do português que se fala em Olivença. Estas iniciativas não teriam sido desenvolvidas sem a participação directa das instituições oliventinas, sendo indicativas de uma grande receptividade. Para a nossa associação são muito importantes os canais de comunicação locais, bem como o envolvimento da população oliventina nos diferentes projectos. Não teria sentido promover actividades sem conexão com a povoação. E se o temos conseguido, até agora, é pela nossa maneira altruísta de contribuir para o desenvolvimento cultural, pela forma sempre construtiva de apoiar iniciativas, pela visão integradora das nossas propostas, pela desvinculação política da nossa actividade e pelo interesse colectivo dos próprios projectos. A iniciativa de recuperação dos nomes ancestrais das ruas em português, foi mais um exemplo, pois foi exposta com uma visão didáctica, cultural e turística com um elevado simbolismo.
C.P. - Olivença está há dois séculos sob administração espanhola. De que forma, hoje, os oliventinos se mantêm ligados a Portugal?
J.F.B. - Para além das fronteiras políticas estão os espaços culturais. Até meados do século XX, século e meio após a mudança de nacionalidade, Olivença tinha culturalmente maiores semelhanças a Portugal do que a Espanha, no âmbito linguístico, etnográfico, das tradições. Nessa altura nasceram os últimos luso falantes e desde então houve um processo mais rápido de debilidade das raízes culturais. A realidade da Olivença de hoje é diferente da realidade de há cinquenta ou cem anos. Porém, actualmente os oliventinos em termos gerais olham de maneira positiva para o seu passado e, embora os mais jovens não tenham vivido a cultura portuguesa da mesma forma que os pais, olham para Portugal com uma crescente curiosidade, com menos complexos e maior abertura. Este aspecto é novo, pois as gerações anteriores, por razões complexas, olhavam para Portugal com uma maior distância e alguns preconceitos. Pessoalmente, penso que a mudança identitária de Olivença foi um processo longo e complexo. Apesar das emigrações a maior parte da população oliventina ficou em Olivença depois de 1801, mantendo fortes laços pessoais, culturais e sentimentais com Portugal. Com o passar dos anos, as ancestrais ligações com Portugal começaram a perder-se e os oliventinos tiveram de iniciar a construção de novas ligações com Espanha e criar novas referências culturais. Ainda que os oliventinos tenham consciência do passado português, foi muito o que se perdeu no caminho.
C.P. - Como se pode recuperar esse muito que se perdeu?
J.F.B. - Na associação Além Guadiana, achamos que a melhor maneira de recuperar caminhos perdidos é através dos sentidos, das emoções, dos pequenos e grandes descobrimentos da nossa história desconhecida e dos novos laços com Portugal, degustando a sua gastronomia, conhecendo as suas paisagens e povos, fazendo novas amizades, conversando em português além e aquém Guadiana. Recentemente, no âmbito do primeiro certame das «Lusofonias», teve lugar uma Leitura Pública Contínua em Português, onde numerosos oliventinos de todas as idades, incluindo os representantes de todos os partidos políticos, leram textos de Camões, Pessoa, Saramago, Florbela Espanca e outros expoentes das letras portuguesas, incluindo quadras tradicionais de Olivença e autores oliventinos como Ventura Abrantes ou Caetano da Silva e Soutomaior, poeta oliventino do século XVIII conhecido como o Camões do Rossio. Foi um acto sem precedentes, popular e emotivo, que mostra grande abertura e novas maneiras de olhar a Portugal.
«Cidade das duas culturas»
C.P. - Olivença é comummente referida como «cidade de duas culturas». À luz do que acaba de referir os oliventinos vivem, de facto, hoje, essas duas formas de identidade?
J.F.B. - «Cidade de duas culturas» é um termo criado e alimentado pelos próprios oliventinos numa frase que procura expressar o carácter dual e a riqueza da nossa cultura. Mas, também, é uma declaração de intenções que não reflecte uma realidade completa. Temos um património monumental de herança portuguesa bem preservado mas uma grande parte da cultura imaterial, especialmente a língua, que é a cultura viva que conversa nas cozinhas e transita pelas ruas, está a desaparecer. Na verdade, há uma cultura vigorosa e dinâmica que se expressa em castelhano e outra cultura, a portuguesa, que está bem visível nas igrejas, nas muralhas, mas muito debilmente na língua. E a língua é tudo. Os oliventinos têm de conquistar verdadeiramente o qualificativo «duas culturas». Não podemos ter duas culturas se uma delas não se pode expressar através das palavras, só das pedras mudas. A Além Guadiana nasceu com o objectivo de promover a parte mais débil do património oliventino e para contribuir à projecção do enorme legado que nos deixou Portugal. A maior parte do que somos o devemos a Portugal.
C.P. – Na realidade poucos habitantes com menos de 65 anos falam o português…
J.F.B. - Em Olivença o português fala-se desde finais do século XIII até hoje. Em meados do século XX, a maioria dos oliventinos eram bilingues mas tinham na língua de Camões a sua língua materna. É nesta altura quando, por diversas razões, os pais deixam de falar aos filhos em português. Os últimos nascidos lusos falantes são os velhos de hoje. O português encontra-se hoje em camadas etárias de mais de 65 anos e é fácil adivinhar o seu futuro em 15 anos. Se não há uma aposta forte em relação à língua portuguesa em Olivença, nas suas aldeias vai desaparecer em poucos anos. Já desapareceu em Tálega, antiga aldeia de Olivença, num avanço do que significa uma enorme perda cultural.
C.P. – Referiu que a associação a que preside tem desenvolvido iniciativas com vista à promoção da língua portuguesa. Para além do «Lusofonias» pode-nos especificar?
J.F.B. - A petição à Junta da Extremadura para a declaração do Português em Olivença como Bem de Interesse Cultural, acções de divulgação, propostas para que os cartazes turísticos e a difusão cultural sejam bilingues. Achamos difícil, mas possível, a recuperação da língua de Camões em Olivença, fazendo uma aposta forte pelo ensino dos mais jovens. Existem experiências de outras línguas minoritárias em condições muito complicadas que conseguiram ser recuperadas. Mas este processo só pode ser iniciado com os próprios oliventinos, ganhando consciência sobre o valor do que temos e defendendo o que não desejamos perder. A sensibilização cultural é tão fundamental como o melhor conhecimento da nossa história portuguesa, da qual fizemos parte ao longo de meio milénio. Os nossos velhos acham que Olivença foi trocada por Campo Maior e poucos sabem que os Gamas descendem de Olivença. Temos uma extraordinária história e o papel de Olivença em Portugal foi verdadeiramente invulgar na construção da nação portuguesa, na aventura ultramarina, na Guerra de Restauração, na criação artística... Todo um passado à espera de ser melhor conhecido por nós e com uma grande projecção de futuro.
C.P. – De há um tempo a esta parte o português começou a ser associado em Olivença a uma língua estratégica, por exemplo para o turismo. Houve, com isso uma mudança institucional?
J.F.B. - Nos últimos dois séculos a língua portuguesa não contou com nenhum apoio institucional, salvo nos últimos tempos. Com a mudança de nacionalidade a língua de referência no âmbito educativo e administrativo passou a ser o castelhano. O português manteve-se exclusivamente ao longo de todo este tempo graças à vontade dos oliventinos, que se mantiveram ligados à sua língua materna, às raízes dos seus antepassados, num extraordinário exemplo de preservação cultural. Em meados do século XX era a língua popular, quase todos falavam o português mas não o escreviam pois foi unicamente a transmissão oral, e não o ensino nas escolas, o meio de aprendizagem.
Com a ditadura intensifica-se a associação conceptual das línguas espanholas e portuguesa, a primeira, ensinada na escola, ficava ligada à língua de promoção social, à da gente mais culta, ao futuro, e a segunda às classes mais populares, aos que tinham um menor aceso à educação, ao passado. Nas últimas décadas há uma certa mudança na maneira de olhar para o português e começam a existir algumas iniciativas interessantes, por exemplo cursos de português, mas com um baixo impacto real no sentido de inverter o processo de extinção da Língua. E, nos últimos anos, assistimos a uma mudança muito mais notável da mentalidade, não só em relação à língua mais também com tudo aquilo relacionado com a nossa herança portuguesa, especialmente em gerações mais jovens. A língua portuguesa começa a ser vista como um valor cultural muito importante para Olivença e, também, como uma língua estratégica para o turismo, relações comerciais e pessoais, etc. Paralelamente, há uma maior implicação das instituições na promoção do português, que é já língua de ensino obrigatório numa das escolas primárias de Olivença com a participação do Instituto Camões.
Tudo está a mudar, mas faz falta uma aposta mais forte pelo português, que não é uma língua estrangeira em Olivença. O português pertence ao mais profundo da nossa cultura e, na medida que os nossos velhos o falem, ainda pertencemos, também, ao âmbito da Lusofonia. E desejamos continuar a pertencer.
Património português
C.P. – Como sublinhou não é apenas a Língua que identifica o passado português em Olivença. Há a calçada, a arquitectura manuelina, a fisionomia das casas…
J.F.B. - O património monumental é quase todo português: conventos, casas notáveis, muralhas e obras de mestre como a manuelina igreja da Madalena. E, também, a base da gastronomia, das festividades, das tradições, da dança, da música...
Os portugueses que visitam os monumentos de Olivença sentem-se como em casa e identificam-se com os azulejos setecentistas da Misericórdia, com os retábulos joaninos e também percebem a influência espanhola em outros aspectos. E os espanhóis sentem esse ar diferente da cidade, esse sabor português tão particular. Mas, também há um super-estrato cultural de origem hispano, que é muito forte pois os oliventinos de hoje nascem e crescem num contexto onde todas as referências culturais foram espanholas. É neste aspecto quotidiano, visível na cultura popular, na língua, ambiente, nos gostos musicais, nos novas costumes, etc., onde a cultura espanhola é inegavelmente dominante. Não podemos esquecer a cultura portuguesa mas também não devemos renunciar à herança cultural espanhola. A letra «ç» de Olivença e a «z» de Olivenza foram sempre contempladas de uma maneira antagónica.
Nós achamos que utilizar ambas é contribuir para a riqueza cultural oliventina.
C.P. – Como olha para as posições do estado português em relação à questão de Olivença ao longo das últimas décadas?
J.F.B. - Sobre Olivença têm-se escrito muito, desde posições discrepantes sobre aspectos políticos e territoriais. Porém, a associação Além Guadiana não está interessada neste âmbito, nem está dentro dos fins e actividades estatutárias.
Reivindicamos o mais importante: a cultura. Achamos que na cultura podem e devem concordar todos. Não entendemos que a cultura oliventina tenha que pagar o preço de possíveis desencontros em outros âmbitos. Não conhecemos se há alguma posição do Estado Português ou se alguma vez se manifestou em relação à cultura portuguesa em Olivença. Mas, neste sentido, os oliventinos estão a fazer um esforço para valorizar as nossas raízes portuguesas. Nada seria mais belo e bem recebido que o compromisso das instituições portuguesas no apoio à valorização da nossa herança cultural que, também, é património de Portugal e do mundo lusófono.
Terminei a crónica anterior deixando em suspenso a questão das manipulações (políticas, económicas, culturais…) que a televisão veicula. Foi tema muito falado há pouco mais de um ano, em Maio de 2009, quando Manuela Moura Guedes entrevistou no “Jornal Nacional” da TVI o bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, No seu habitual estilo truculento, o bastonário disse à pivô verdades duras como punhos, daquelas que muito raramente se escutam em televisão. Vamos recordar esse momento.
De facto, a «informação» que naquela estação (e não só) se praticava, e pratica, deixa muito a desejar, misturando-se de maneira avulsa, opiniões com factos e não se fazendo a destrinça do que é uma e outra coisa. Isto, como muito bem disse Marinho Pinto não é jornalismo; são sim «julgamentos sumários disfarçados de jornalismo».
A televisão tem este poder de eliminar factos e de criar factos, de manipular a realidade e de a apresentar conforme melhor for servida a necrofagia e o sensacionalismo que parecem ter tomado conta do jornalismo em geral e os interesses, políticos, económicos, dos grupos a que o canal seja afecto.
Sobre o poder da televisão, dizia Karl Popper na sua obra já citada, que, nos nossos dias a, a televisão assumiu um poder colossal, potencialmente o maior de todos, «como se tivesse substituído a voz de Deus». Afirma ainda que em democracia não pode haver poderes incontrolados, pois a essência da democracia consiste precisamente em submeter o poder político a um controlo.
O poder da televisão constitui, pois, um grave perigo para a democracia e esse perigo agudizar-se-á se não conseguirmos pôr cobro aos abusos dos canais televisivos - «Nenhuma democracia pode sobreviver se não controlarmos esta omnipotência», dizendo ainda: «A democracia, como expliquei algures, não é mais do que um sistema de protecção contra a ditadura, e nada no seio da democracia proíbe as pessoas mais instruídas de comunicarem o seu saber às que o são menos. Pelo contrário, a democracia sempre procurou elevar o nível de educação; é essa a sua autêntica aspiração. As ideias deste director de uma cadeia televisiva não correspondem em nada ao espírito democrático, que sempre foi o de oferecer a todos as melhores oportunidades. Inversamente, os seus princípios conduzem a propor aos telespectadores emissões cada vez piores, que o público aceita desde que se lhes acrescente violência, sexo e sensacionalismo"."(Popper refere-se ao director de um canal de televisão que conheceu na Alemanha no decurso de uma conferência, que afirmava axiomaticamente que “Devemos oferecer às pessoas o que elas esperam”).
Não sei se Popper tem razão quando diz que a democracia «não é mais do que um sistema de protecção contra a ditadura». Esta definição parece-me redutora. Mas isso seria entrar numa outra discussão. Todavia, quanto a mim, Popper tem toda a razão quando nos alerta para os perigos de um meio que, tendo o poder de substituir a informação pela manipulação, pode destruir a democracia, instaurando em seu nome a ditadura dos media, por sua vez ao serviço de interesses políticos e económicos que nada têm de democrático.
Os governantes, os actuais e os anteriores, só se preocupam com as manipulações quando elas os atingem, como fez Sócrates na entrevista de 21 de Abril de 2009, na RTP, concedida a José Alberto Carvalho e Judite de Sousa, em que denunciou o mesmo Jornal Nacional da TVI e aquilo que naquele canal passa por ser um serviço informativo, dizendo que o que ali se faz não é jornalismo, mas sim «caça ao homem» e que se trata de um «telejornal travestido». Isto, porque foi atacado a propósito do caso Freeport. E quando, ali e noutros espaços «informativos», outras pessoas, a verdade e a Democracia são atacados? Acrescente-se que Moura Guedes contra-ataca e pôs agora uma acção ao primeiro-ministro devido aquelas declarações. Todos sabemos que nenhum governo da «democracia» que temos, exercerá uma acção pedagógica, profilática e terapêutica sobre os órgãos de informação. Não estou a falar de censura política, de repressão ou de limitações impostas à liberdade de imprensa (como em resposta a Sócrates o então director da TVI, vitimizando-se, se apressou a vir denunciar o que lhe parecia subjacente às palavras do primeiro-ministro). Estou a falar do inverso: impedir que a comunicação social se transforme ela mesma num odioso instrumento de repressão. O que começa a acontecer.
A liberdade de imprensa exige por parte dos profissionais um grande sentido de responsabilidade, o que raramente se verifica. Estou a falar de um cotejo sistemático e permanente entre o código deontológico que rege a profissão de jornalista e a prática exercida pelos respectivos profissionais. Aquilo de que falava Marinho Pinto.
Nunca esquecendo que, a maior parte das vezes, muito bons jornalistas, submetidos a direcções ligadas a grupos político-económicos e não só, são obrigados a escolher entre a honestidade e o emprego, entre o pão e a verdade. Para se extirpar este tumor que não cessa de aumentar, tem de se ir bem fundo na incisão e não ficar pela solução fácil de punir ou diabolizar jornalistas corruptos, por certo ao serviço de interesses obscuros, mas que apesar da sua desonestidade mais não são do que as pontas visíveis e emergentes de gigantescos icebergues submersos.
A UE já veio dizer que é ilegal a golden share que o estado tem na PT.75% dos accionistas já disseram que aceitam a proposta da Telefónica, incluindo as grandes empresas portuguesas que se gastaram a falar no interesse nacional mas que, face ao monte de dinheiro, já esqueceram tudo o que respeita ao interesse nacional.
Pateticamente, Sócrates anda a agitar a golden share que a partir do dia 16 não vale nada, a PT está nas mãos dos espanhóis e se não for a bem vai a mal, lança uma OPA sobre a própria PT e fica com a empresa e com a Vivo. O BES, que sempre esteve na frente do combate do interesse nacional, já está vendedora, isto tem a ver com as tremendas dificuldades que a banca tem tido para se financiar nos mercados internacionais, face à situação explosiva portuguesa.
Andamos vigiados atentamente, e o BCE vai financiando a tesouraria para podermos pagar o merceeiro e o padeiro, porque a questão agora já não são as obras públicas do patético Sócrates, agora são as coisas comezinhas que já não conseguimos pagar. O Presidente da Republica anda a falar em "insustentável", esquecendo que a situação que ele classifica como "insustentável" também é obra dele e da sua responsabilidade.Devia esquecer-se da reeleição e mover-se pelo interesse nacional.
A compra da PT é mais ou menos como o negócio de ocasião que fazemos comprando a "bomba" do vizinho por tuta e meia, o pobre perdeu o emprego e vende tudo ao desbarato, assim estão os accionistas portugueses da PT, precisam de "cash" para outros negócios de ocasião, há para aí muita coisa a metade do preço e a banca não tem dinheiro para emprestar.
Mas podíamos sair disto com dignidade, ver Sócrates sem perceber pêva do que se está a passar é muito doloroso, sempre é o primeiro ministro de Portugal, e vê-lo com a fronte enfeitada com a golden share, não é espectaculo bonito de se ver.
Mas muitos o avisaram, a determinação e a burrice são irmãs gémeas...
No dia 1 de Maio volto a Tomar. A viagem é mais demorada do que eu previa: por causa das obras na linha, há transbordo para autocarros. Chego a casa às onze da noite e só então começo a preparar as bagagens para o Caminho de Santiago…
Planeava partir com a mochila das primeiras etapas, logo uma observação rápida me obriga a desistir: uma das anilhas parece prestes a soltar-se. Mais uma… Impõe-se por isso levar a outra, mais pesada, mais desconfortável, mais malcheirosa, mesmo no primeiro dia, por absorver a transpiração – mas mais resistente. Desta vez quero ir tão longe quanto puder. Portanto, de preferência: até Santiago de Compostela.
Ainda hesito se posso incluir isto ou aquilo na bagagem. Opto, para além do que terei vestido, por três camisolas de algodão e uma de fibra especial para as caminhadas que, diz o fabricante, é leve, quente e deixa o corpo respirar, dois pares de calças, dois de peúgas, dois sutiãs e duas cuecas. Crocs para o duche. Uma toalha pequena. O saco-cama dos quinze graus (estamos em Maio). Um saco-lençol de linho, para não dormir em contacto com fibras artificiais; e, se o tempo estiver quente, dormirei com ele apenas. Protecção para a chuva: capa, blusão, polainas. O mínimo de medicamentos e produtos de higiene. O meu diário. Telemóvel, máquina fotográfica e seus respectivos carregadores de bateria. Um canivete. E um saco de produtos alimentares que não encontrarei nas mercearias. Ou seja, leitor trocista... Quase não me atrevo a escrevê-lo. Bem... Como diria o meu admirado A., verdade e mais verdade, não é? Pois, então: trinta e duas barras com proteínas, vitaminas e minerais. Duas para cada etapa; não contando a de hoje. Mais dez doses de (excelente) há. Mais três tabletes de chocolate preto – o meu declarado vício. (Não levo outras por saber que, com o calor, derreterá...) Mais uma sandes para a viagem, uma maçã, uma banana... E meio litro de água. Prefiro nem saber com exactidão o peso que levo: a mochila parece-me absurdamente pesada.
Medito onde convém arrumar as oito odoríferas rodelas de chouriço destinadas aos cães raivosos. Não pode ser na mochila pois, se for atacada por alguma fera, não terei tempo para a abrir antes de ser devorada, só pode por conseguinte ser na bolsa que trago à cintura com o roteiro, o protector solar, as bananas, a garrafa de água e o chocolate quotidiano. Pois... Vou atravessar Portugal perfumada com chouriço. A ideia não me encanta, prefiro o almíscar – mas faço do chouriço coração. Digamos... Eu cá me entendo! Divido as oito rodelas em duas doses de três (destinadas aos cães grandes) e uma de duas (suficiente para um cão pequeno), embalo-as em sacos de plástico finos para, em situação de perigo e urgência, os rasgar e lançar o pitéu ao monstro. Mesmo através da bolsa e do plástico sinto o cheiro do chouriço. Não correrei o risco de juntar todos os cães do distrito atrás de mim?...
Deito-me tarde. Passa das duas horas e levanto-me às seis. Não adormeço logo... Sinto-me pela primeira vez incerta quanto ao meu projecto – e quase inquieta. Não será melhor ficar em casa? Aproveitar estes quinze dias para ler e escrever? Atravessar Portugal a pé representará na realidade uma loucura?
Continuo a achar que não. Fui duas vezes atacada e roubada, a primeira a quinhentos metros de casa e a outra à porta da minha mãe. Não me parece que a clausura constitua solução para a violência urbana; aliás, pelo que oiço, até dentro de casa corremos o risco de ser agredidos. Por isso tomo as possíveis precauções para limitar os riscos – mas quero continuar a viver. E quero conhecer a minha terra para além dos jornais, museus, auto-estradas, aeroportos e supermercados. A caminhada dá-me um ponto de vista que enriquece e estrutura os outros: esta diferença vale os riscos e canseiras.
Por diferentes razões, alheias ao Caminho de Santiago, que me vão atrasando, só parto às 10 horas. Parece-me aberrante ir de comboio para Coimbra e, de lá, de camioneta para Condeixa, com o objectivo de em seguida fazer a pé o trajecto inverso, entre Condeixa e Coimbra. Por isso fico em Soure. Isto é: a 14 quilómetros de Condeixa. Catorze mais dezoito dá trinta e dois quilómetros: excessivo para um primeiro dia de caminhada.
Os meus pés não vêm preparados para tal jornada. Do mês de Novembro para cá, caminhei com frequência, porém em trajectos curtos. E não voltei a calçar as botas. Trouxe, mal por mal, estas, as antigas, as que já percorreram centenas de quilómetros – as que no entanto, em Novembro, me fizeram bolhas. Quantos quilómetros chegarei desta vez a caminhar?
Mudo para o comboio da linha do Norte na Lamarosa: uma estação no meio dos malmequeres. Saio para ver o que há para além deste delírio amarelo. Meia dúzia de casas, se tanto, uma fonte, dois tanques, um homem, um cão... Lembra-me o poema Aldeia de Manuel de Fonseca: Nove casas, / duas ruas, / ao meio das ruas / um largo, / ao meio do largo/ um poço de água fria. Imobilizo-me no silêncio do poema.
Uma turista russa, com uma mala rolante, reconduz-me à estação. Também se encontra ali pendurada durante uma hora: vai para Tomar, vem de Coimbra, não gostou da cidade, é tudo a subir, há a universidade, duas igrejas, muitos prédios, nada de especial. Como é Tomar? Explico que em Tomar tudo é especial. E os prédios situam-se do outro lado do Nabão: podemos ignorá-los. Se quisermos. Onde vou? A Soure, antes de Coimbra, de onde espero prosseguir o caminho para Santiago. A pé?! A senhora tem bigode, o que não me incomoda, mas sublinha o espanto. Fita-me entre incrédula – não percebeu? estarei a brincar? que humor lusitano é este? – e admirativa. Então a pé? Mesmo? Sempre a pé? Para ela já chegam os comboios e camionetas. Esperas, atrasos, confusões, mudanças. Cansaço. Desventuras. Só fala inglês. E russo. De facto o comboio dela tem dez minutos de atraso. Enquanto conversamos a senhora vai atacando primeira sanduíche, segunda sanduíche, uma maçã, uma laranja, um pacote de bolos... Avanço, para a consolar, que Tomar tem bons restaurantes, com boas doses e bons produtos, recomendo dois e até os marco no mapa que ela traz.
Há vento, sinto frio, acabo por vestir a tal camisola, que não me parece assim tão quente. No entanto, dali a pouco, o comboio indica uma temperatura de 20°. Bom tempo para caminhar.
As dúvidas e receios dissiparam-se. Trago, como é costume, curiosidade nos bolsos.
SALVAMENTO MARÍTIMO, APÓS UM NAUFRÁGIO DE UMA JOVEM INDIANA POR UM GRANDE GENERAL PORTUGUÊS (O POETA IMAGINA SER O GENERAL)
Não assustes. oh bárbaro elemento, a inocente, que tenho ao peito unida, que à glória desta acção compadecida respeita até das ondas o violento.
Tu logras o furor, eu logro o intento de ficarmos com sorte repartida: asilo nobre de uma tenra vida; sepulcro avaro de ouro macilento.
Se tenho a varonil integridade, que consegues no horror dessa inclemência, ou que importa a infeliz calamidade?
Quando fica no exemplo da violência desprezado o interesse da piedade, e vencida a desgraça da inocência.
Soneto ao Rei D. Pedro II, que, por ter morrido, não chegou a ver a sua própria estátua de pedra.
Senhor, a vossa efígie venerada é por vós com razão desconhecida; porque ficou na cópia pareceda de reverente a pedra desmaiada.
Que importa que do artífice lavrada pareça que o cinzel lhe infunde a vida, se a grandeza só pode esclarecida ser nas vossas vitórias retratada?
Estranhais esta imagem justamente, se a luz original está diante, o reflexo perdeu-se de repente.
´Inda sendo o retrato semelhante, porque em chegando o Sol a estar presente, mudam sempre as estrelas de semblante.
Soneto ao conquistador grego (Macedónio) Alexandre Magno, apertando com o seu diadema as feridas de Lisímaco.
Senhor, tenha o diadema lugar justo, que eu temo vê-lo menos respeitado, que importa a minha vida ao teu estado, se a reservas do estrago para o susto?
Não pode altivo, o meu valor robusto permitir, que o diadema venerado fique nestas feridas profanado se as recebi por conservar o augusto.
Se te fez vencedor esta façanha, será tanta piedade em tanta glória satisfação heróica, mas estranha.
Não percas no triunfo esta memória, que só crescem regados na campanha com sangue ilustre os louros da vitória.
Outro soneto a Alexandre em situação idêntica ao anterior.
Rompe o sacro diadema persuadido que fica certamente mais honrado nas ilustres feridas de um soldado que quando a régia fronte está cingido.
Felizmente em pedaços dividido, do teu sangue na púrpura banhado, se até aqui o lograva afortunado agora é que o mereço esclarecido.
Porque heróico às virtudes raras se una, com justiça exército esta piedade, que aceitar teu valor tanto repugna.
Remunero igualmente a heroicidade, que a vitória é acaso da fortuna, e o prémio distinção da majestade.
António Chainho (Santiago do Cacém, 1938) é aquilo que, usando um chavão, se pode considerar um nome incontornável da nossa música tradicional, quer como executante exímio de guitarra portuguesa, quer como compositor. Na passada segunda-feira, dia 28 de Junho, apresentou na FNAC de Almada uma nova etapa do seu projecto LisGoa. Este vídeo gravado durante esse espectáculo permite-nos ouvir a cantora luso - goesa Rubi Machado e a fadista portuguesa Isabel de Noronha.
Síntese da música goesa com o fado, este projecto do mestre António Chainho, com temas cantados em hindi, em concanim (dialecto de Goa) e em português é uma ponte entre o universo lusófono e as raízes culturais do povo goês, tão esquecido e abandonado à sua sorte. O Terreiro da Lusofonia põe passadeira vermelha para António Chainho, para os seus músicos, e para esta sua iniciativa cultural.