Terça-feira, 1 de Junho de 2010

Saldanha Sanches - um homem de coragem!



Uma maravilhosa exaltação do homem corajoso e íntegro que foi José Luis Saldanha Santos.Prestamos a nossa homenagem a um homem que sempre admiramos, muitas vezes, embora, em barreiras diferentes, mas comuns no essecial. São palavras de Maria José Morgado, no elogio fúnebre a seu marido:

"Zé Luis: começámos esta tua última viagem (tu gostavas de viagens) na cama 56 dos serviços de cirurgia 1 do Hospital de Santa Maria. Lia-te poesia e um dia parámos neste poema da Sophia de Mello Breyner:

”Apesar das ruínas e da morte,

Onde sempre acabou cada ilusão,

A Força dos teus sonhos é tão forte,

Que tudo renasce a exaltação

E nunca as minhas mãos ficam vazias”.

Assim foi.

No teu visionário e intenso mundo, a voracidade de um cancro traiçoeiro não te consumiu a alegria, a coragem, a liberdade. Entraste pela morte dentro de olhos abertos. O mundo que habitavas era rico de ideias, de sonhos, de projectos, de honradez e carinho. Percebemos o que ia acontecer quando no fundo do teu olhar sorridente brilhava uma estrela de tristeza. Quando te deixava ao fim do dia na cama 56 e te trazia no coração enquanto descia a Alameda da Cidade Universitária a respirar o teu ar da Universidade, das aulas e dos alunos que adoravas, do futuro em que acreditavas sempre.

Foste intolerável com a corrupção, com os cobardes e oportunistas. Não suportavas facilidades. Resististe à sordidez, à subserviência, à canalhice disfarçada de respeitabilidade e morreste como sempre viveste - livre.

Uma palavra para aqueles que te acompanharam nesta última viagem: para os melhores médicos do mundo, para as melhores equipas de enfermagem e de apoio, num exemplo de inexcedível dedicação ao serviço médico público. Vivi com emoção diária o carinho com que te cuidaram.

Uma palavra de gratidão sentida para o Professor Luis Costa e para o Paulo Costa. E para um velho amigo de sempre o Miguel.

Também para Laura e para o Jorge e para a minha mãe e toda a família que nunca te deixou. Por fim uma palavra para aqueles amigos que inventaram uma barricada contra a morte no serviço de cirurgia 1, cama 56, e te ajudaram a escrever, a pensar, a continuar a trabalhar: o João Gama, o João Pereira e senhor Albuquerque, cada um à sua maneira.

Suspiraste nos meus braços pela última vez cerca da 1,15 da madrugada do dia 14 de Maio. Vai faltar-me a tua mão a agarrar na minha enquanto passeávamos e conversávamos.

Provavelmente uma saudade ridícula, perante a força do exemplo e da obra que nos deixaste e me foi trazido por todos aqueles que te homenagearam – a quem deixo a tua eterna gratidão.

Tenham a coragem de continuar.

16.05.2010 - Maria José Morgado
publicado por Luis Moreira às 20:00
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Recordações de antropólogo em trabalho de campo

Raúl Iturra
(Angelus, Jean-François Millet, em Barbizon, França, 1859,
conservado no Museu Orsay de Paris).

Em memória da minha Mamá Esperanza…


É-me impossível não recordar a família Medela Dobarro do Lugar de Lodeirón, Paroquia de Vilatuxe, Província de Pontevedra Alta, sem me lembrar da sua gentileza, da sua doçura, do seu acolhimento, do seu bom trato. O pai da casa é Hermínio Medela Taín, hoje com 82 anos, viúvo recentemente da sua querida mulher Esperanza Dobarro. Ele pertencia a uma família de ricos proprietários, do Lugar de Gondoriz Pequeno. Conheci-o em 1974, éramos novos. Tinha 47 anos certos, como digo num livro em que falo da sua vida, e eu, 33. Era o ano de 1974. Tinha sido enviado pelo meu director de estudos e trabalhos, Sir Jack Goody, Catedrático de Antropologia da Universidade de Cambridge, o meu sítio de trabalho, para entender o pensamento das crianças dessa parte do Estado Espanhol, denominado Galiza. Para meu espanto, havia duas Galizas: a da Polónia, da qual eu nada sabia, e a do Estado mencionado. Sem pensar mais, escolhi a Galiza Lusa, ao Noroeste da Península Ibérica. O problema era encontrar casa onde habitar em Vilatuxe. Com a colaboração do Pároco, Luís Vázquez Lamela, ofereceu-me uma casa fria, cozinha de lenha, imensos quartos, no Lugar da Carreteira que unia Vilatuxe com Compostela, cidade, e Lalín, Concelho. Assunto arrumado. A seguir, seduzir aos vizinhos para saber deles e escrever um livro. Em menos de uma semana do ano e meio que lá vivemos, era amigo de todos e trabalhava com eles desde as 7 da manhã até  noite adiantada. As raparigas, essas nossas filhas ou cativas como se diz em galego, uma gatinhava, a outra, começou a ir a escola. Teve que se traduzir do inglês ao luso galego, a língua do país, que era muito semelhante ao Castelhano. Passada uma semana, estava com as cativas na loja e uma amável senhora diz-me: Don Raul – nem sei como sabia o meu nome nem perguntei, e porquê eu era Don, o outro era o Pároco, os outros, Senhores - sabemos que quer conhecer os nossos costumes; convido-o para próxima terça-fFeira da segunda semana de Janeiro e vai poder apreciar como se trabalha em Galiza.

Deus me livre! Sabe-se bem que não sou homem de fé, é apenas uma exclamação, mas todos eles eram e muito. Foi preciso dissimular.Lá estava eu às 7 da manhã, ainda noite: tínhamos de limpar o sítio onde as vacas são guardadas, tirar o estrume, carrega-lo até um tractor, o do filho da Senhora, para mim D. Marcelina Medela de Montoto, e, com todo ímpeto, as minhas mãos agarraram uma pá e comecei a tirar o estrume fora da quadra, chamadas Cortes, para um monte que era carregado no tractor do filho da Senhora, o meu primeiro amigo, António de Taboada ou O Ferreirinho. Nem queriam que eu trabalhasse, mas orgulho-me em dizer que semeava batatas, cortava a espigas do milho, regava com todos os parentes e amigos do António. Havia um Senhor que disse para eu parar: era o irmão de, após largo tempo, Marcelina, o Senhora caiu, como o Don e passei a ser O Chileno de Vilatuxe. Esse Senhor, de forma gentil, tirou-me do sítio, começou a falar e fumar comigo, era a sua casa paterna, irmão da Marcelina, tio do António Montoto, como eu chamava ao Ferreirinho para não esquecer os nomes e não ser mal criado. Almocei…tanto, que fiquei doente e foi preciso regressar a casa, todo partido. A minha mulher Gloria teve que tomar conta de mim e melhorei em meio-dia. Juntei-me a esse grupo de pessoas, trabalhava sempre com eles enquanto preenchia os meus diários de campo, esse mais de 500 que guardo comigo. O Senhor amável era Hermínio e o sítio do trabalho, a dez minutos do nosso lugar, era Gondoriz Pequeno, palavra celta que significa aldeia. Apenas que havia a casa em que trabalhávamos, um Paço de mais de 300 anos, dividido e subdividido entre parentes por causa de heranças. Por ser a irmã mais velha, Marcelina ficou com a parte elegante do Paço e Hermínio, teve que construir uma casa para si e família na terra comum ou baldios ou terra de monte. Aí tomava conta das suas ovelhas, das suas cabras, viviam do produto delas, leite e queijo.

Ora bem, ou estávamos todos juntos a trabalhar os campos, ou Hermínio e eu a tomar conta dos bichinhos, como chamava ao rebanho. O frio era intenso e o calor no Verão era para nos cozinhar vivos. À hora do Angelus, que Hermínio e eu no rezávamos, continuava a conversa, aparecia a, para mim nesse tempo. A sua mulher D. Esperanza com comida para os dois. Pedi a Gloria preparar comida também para nós, que eu levava e comíamos que nem jibóias e adormecíamos por causa da comida e do calor.

Foi assim que conheci Hermínio Medela Taín, de família, descobri 25 anos depois, aristocrata, mas empobrecida pela Guerra Civil de derrubou a Isabel II de Bourbon, pela guerra começada pelos trabalhadores das terras dos condes e duques, os enfiteutas, que trabalhavam a terra como se fora deles, mas deviam entregar o que o proprietário da raíz do direito de propriedade, o que ele mandar. A revolta, ironicamente, começou em 1870 em Vilatuxe encabeçada por José Ferradas e os Dobarro, tios tetravós de Esperanza, que tinham de pagar aos Condes de Lemos, os Medela, o solicitado como enfiteutas. A revolta acabou com uma Rainha a correr para o exílio em Itália com toda a corte, entre eles a minha tetravó Maria Grajera Molano, filha de uma Dama da corte real, Dama quando a monarquia tornou a Espanha. Os Ferradas e Dobarro pagavam aos Medela em Gondoriz Pequeno, lugar situado perto do Paço dos Condes de Lemos, como são denominados na Galiza, os duques de Alba.

No podia deixar de contar estas ironias da vida. A família de Esperanza pagava aos de Hermínio e a minha família desfrutava com os impostos que a aristocracia pagava à Coroa. Hermínio e Esperanza não sabiam, eu sim, mas calava-me. Apenas 24 anos mais tarde, de regresso para um reestudo de Vilatuxe e acolhido pelos Medela e investigando outra vez a Paróquia, por não me quererem cobrar nem meia perra – forma de referir a meia peseta - pelos gastos que eu causava, escrevi o meu quarto livro sobre Vilatuxe, investigando, com Pilar, a quarta filha do casal Medela, e com licença do seu marido, Alfonso Batán, percorrendo os arquivos em procura das suas genealogias, todas elas apresentadas no livro que escrevi sobre eles: Como era quando não era como sou. O Crescimento das crianças, Profedições, Porto, datado em 1998, comentada em todas as moradas net de:
 http://www.google.pt/#hl=pt-PT&ei=iEgBTK3qCJ-O4gartPjLDg&sa=X&oi=spell&resnum=0&ct=result&cd=1&ved=0CBQQBSgA&q=Ra%C3%BAl+Iturra,+Como+era+quando+n%C3%A3o+era+como+sou.O+crescimento+das+crian%C3%A7as&spell=1&fp=940f438e07dbab8e
especialmente nos jornais, o mais notável, Terras da Beira, em:
http://www.freipedro.pt/tb/290600/soc9.htm
e outros sítios.

Os anos passaram. Voltei de Lodeirón, o Lugar dos Medela de Vilatuxe, em 1999, não sem antes descobrir com Pilar Medela Dobarro, esse apelido da mãe, que na Galiza é Nai ou Mamá, que eram parentes dos Condes de Lemos e dos Duques de Alba. Os levara ao Paço dos Lemos e Alba, que por direito lhes pertence, mas no usam o direito: trabalham. Fui capaz, com Pilar de historiografiar a sua vida desde o Século XVII em frente, com imensa teoria, o livro foi apresentado na Universidade de Compostela, está esgotado e parece-me que o devo dedicar a quem, anos volvidos e na sua casa, passara a denominar Mamá Esperanza…que já não está connosco, mas toma conta de nós onde quer que seja que se encontre... e eu a choro.
publicado por Carlos Loures às 19:30
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A República nos livros de ontem nos livros de hoje - 1 (José Brandão)

A Acalmação e Dom Manuel II


Augusto Ferreira do Amaral

Empresa Nacional de Publicidade, 1966

De há já a tempo que se contava entre as minhas ocupações a de aproveitar o facto de haver na posse da minha família cartas régias para realizar um estudo histórico sobre um período que para mim tinha triplo interesse – o período durante o qual meu bisavó paterno, o almirante Ferreira do Amaral, presidiu ao ministério que foi o primeiro do reinado de D. Manuel II.

Triplo interesse porque três são os especiais motivos de atracção que me fizeram embrenhar nesse labor. Por um lado, o facto de estar na fruição de elementos inéditos de evidente valor histórico; por outro, o de se tratar de uma época de relevância acentuada no destino da Monarquia, instituição que já contou com as minhas simpatias; e, finalmente, por ser figura principal desse período um membro da minha família, para mais caluniado pelos que posteriormente analisaram o papel que desempenhou.
publicado por Carlos Loures às 18:00
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Dia Mundial da Criança - O real dos pais: Caim e Abel

Raúl Iturra
excertos do meu livro A Ilusão de sermos pais, Capítulo 5, publicado em Março de 2008; Monografias.com, Rio de Janeiro, no dia Internacional da criança…

Não é que todo o dito até este parágrafo não pertença à nossa cultura e ao nosso modo de ser, pensar, sentir. Fala-se imenso do mundo globalizado, pelo que não é possível abandonar a ideia da influência em nós, dos grupos sintetizados por mim até esta página e desenvolvidos de forma prudente e sintética, nas seguintes. O mundo é apenas um e a dita globalização não é apenas de economias, mas também de emoções deveres e pensamentos. Pelo menos, Tony Giddens fala assim no seu texto sobre essa Terceira via : como ultrapassar as desigualdades económicas dos diversos países do mundo, por meio de estratégias de organização estatal, política e económica e organizar o mundo em apenas uma forma de comportamento quanto à manipulação de recursos, como comento no meu livro sobre reciprocidade e mais-valia, no prelo. É parte do real dos pais preparar suas crianças na ideia de interagir com grupos além fronteiras, classe social e género, para poder ensinar a essa criançada as formas de interacção entre grupos sociais tão diferentes. Talvez os Muçulmanos Árabes, Chitas e Sunitas do Paquistão, os Palestinianos e Israelitas da Faixa de Gaza, não tenham a paciência para se juntarem, pelo menos os seus maiores. É dever dos membros destes diferentes grupos da maior religião do mundo, ensinar a diferença teórica e teológica, os planos políticos que fazem dos Sunitas grupos Talismã para a guerra, políticas de investimento que cada grupo tem, o que os obriga a manter uma distância entre si, incluindo disputas de território sobre bases históricas, lei e hierarquia estatal. Tal e qual como acontece entre Cristãos Romanos, Cristãos Ortodoxos Russos, Cristãos Arménios, Cristãos Curdos do Líbano, Ortodoxos Gregos, Luteranos, Calvinistas, Anglicanos e outros grupos da mesma religião, que mal se entendem ou conhecem uns aos outros. É histórica a ideia de dividir o mundo do Século XV em dois grupos, conforme quem seja, assim fala: os Romanos englobavam tudo o que não estava com eles, no conceito Protestante, enquanto os outros denominavam os Romanos de Imperialistas. Nem falo da diferença entre Benfica e Sporting e os debates que causam. Muito mais relevante que esse é o caso Casa Pia, e a pedofilia que tem acontecido, dizem, desde há vinte anos. Mas o que o senso comum nos leva a pensar e a saber é que os mais velhos procuram crianças para prazer físico dentro da linha definida por Charcot, Freud, Klein, Miller, Winnicott e outros que, tal como eu nos meus textos, representamos uma análise e um grito de protesto, um levantamento do protesto queria dizer, dando voz aos mais novos, que não têm epistemologia adequada para se defenderem dos abusos dos adultos. Levantamento de protesto perante as autoridades e os pais que não tiveram atenção com o que acontecia com as suas crianças

Quais destas ideias são as que os pais, na vida real, devem ensinar ao seu rebento? Será pensar antes de julgar, procurar antecedentes e factos, como na pesquisa que tem sido feita e que me tem levado a mim e a um grupo a entender os comportamentos eróticos e dar a voz aos pequenos para os pais entenderem que sentem desejo desde a nascença? Será que os pais, na vida real, debatem com os seus filhos o que acontece no mundo, com a dúvida natural que exprimem de não estarem certos sobre se deve ganhar o defensor da criança denominada abusada, ou se na circulação da criança há uma vantagem para a sua família, quanto ao dinheiro que ganham ao prostituir os mais novos? Freud, como Malinowski, ao falarem de Aberração Sexual, definem o conceito e não adjectivam os factos. Há a ética emotiva que pode fazer pensar que as fellatios referidas por mim são abusos de poder sobre as crianças. O pensamento contrário nunca tem sido ouvido por mim: se a criança gosta ou não da relação erótica com um adulto. No amamentar, por exemplo, estabelece-se, sabemos hoje, uma luta entre um embrião e um adulto que, sem saber, lhe está a tirar o seu alimento ao penetrar o pai dentro da mãe grávida de um ser humano de três meses. Até onde a rapariga deve ouvir dos seus pais esta realidade e qual a cronologia adequada para saber que amar é também fornicar? Ou, como entender que o conceito adultério não é apenas um facto criminoso, bem como uma rebelião maior do bebé dentro da mulher por ter entrado no liquido amniótico, mica desconhecida para quem não tem capacidade de entendimento, mas sim sempre muita fome e come pela passagem passiva de líquido da mãe ao bebé, por meio do cordão umbilical? Porque, como diz Malinowski nos Argonautas, ou Godelier para os Baruya, ou Iturra ao analisar aos Picunche, não há relação carnal entre progenitores enquanto dura a gravidez? O motivo de tanta mulher a viver com ou o marido, se é Maori, ou o homem da mãe se são da Melanésia ou de Samoa, Silva Pereira nos Mapuche Rauco, não tem relação, como relatam pessoalmente os Hugh-Jones, meus colegas e amigos de Cambridge, para os Barasana da Amazónia Colombiana, se não é para evitar termos adultos de mau humor no crescimento, a seguir a luta com o mundo desde o ventre materno? Qual a opinião sobre incesto, a seguir à morte em Março de Keith Hopkins, ou o silêncio da televisão portuguesa sobre a minha defesa da sua existência em sítios de Portugal? O comportamento humano, a sua relação com a sexualidade, é apresentado como um romance dentro do lar e a intimidade, a libido dos pais, um segredo de portas fechadas ou incontinência enquanto se pensa que a criança dorme. Como mais uma narrativa desse outro meu amigo Christopher Hann, quem devia dormir na única cama dos camponeses polacos, por ordem de hierarquia: os pais numa ponta, a carreira de filhos a seguir e, no fim, o meu amigo, hoje catedrático de Antropologia na Universidade de Bonn na Alemanha.

Um número inacreditável de questões brota na minha mente, ao pensar apenas na temática. A análise de Etnopsicologia da Infância, como diz Leopold Szondi na sua obra, trata de entender os elementos da cultura por meio dos quais a realidade é impulsionada – fala de pulsões . Mais um Húngaro a contribuir para o entendimento do comportamento das crianças por parte dos adultos e, especialmente dos eruditos, para desenvolver um comportamento que não retire esse novo ser da proximidade dos seus progenitores. Uma modalidade de entendimento usada por Émile Durkheim, na base de testes, organizados pelo mal conhecido autor , salvo de um campo de concentração e que até aos 90 anos trabalhou com crianças. Este teste criado por ele foi usado e impulsionado por Émile Durkheim para o seu texto sobre O Suicídio. Trata o autor de explicar, a seguir aos seus testes em crianças, que o introspectivo das pulsões nessa idade, não é apenas a transferência de factos do exterior para o interior mas, sim, uma interpretação do real que a criança é capaz de desenvolver. Tal como Durkheim prova no seu estudo do suicídio, denominado por ele anômico, causado pelo sentimento do delírio de perseguição que o baixo salário provoca no adulto e na sua família. “Le grand mérite du test de Szondi, c'est à nos yeux qu'il soulève des questions pertinentes davantage qu'il n'apporte de réponses malheureuses - "La réponse est le malheur de la question", comme l'a écrit Maurice BLANCHOT dans "L'Entretien infini" - dans le sens où elles ferment les possibilités de dialogue.

La structure du moi "primitif" peut trouver un éclairage utile à la lumière de la théorie kleinienne du fonctionnement psychique.

On sait que Mélanie KLEIN confère un poids particulier au second dualisme pulsionnel de FREUD (Eros-Thanatos) et au mécanisme de clivage en tant qu'il aboutit à distinguer radicalement le bon (objet) des mauvais, premiers représentants représentations des pulsions érotiques et thanatiques comprises dans le sens strict de l'acception freudienne: est érotique ce qui lie, unit et rassemble, est thanatique ce qui sépare, détruit et morcelle.

Mélanie Klein prolonge et enrichit les développements de la pensée freudienne inaugurés avec l'introduction de la pulsion de mort dans "Au-delà du principe de plaisir".

Em conjunto com os outros autores apresentados, Szondi é capaz de entrar pela capacidade de pensamento das crianças e as suas reacções perante o mundo que faz parte delas. O contexto da criança é salientado pelo autor, contexto que na realidade não é considerado pelos pais, o que permite, como diz em parte da sua obra, a existência de adultos narcísicos, psicóticos, ou, mais delicado ainda, omnipotentes como ele e Klein primeiro e Bion a seguir tinham estudado. Ser divindade passou a ser um dos problemas das crianças – já nem falo dos adolescentes que Daniel Sampaio analisa – que, nas minhas próprias palavras, criam aos pais um problema de não saber como agir. As crianças têm a pulsão da morte junto à da felicidade, mas a realidade, como relatava na sua análise o pequeno Richard com Mélanie Klein e Hans com Freud, eram e são capazes de não ouvir os seus pais, os seus progenitores ou adultos que, para eles, devem desaparecer das suas vidas, como refiro no capítulo 4 deste livro, A Ilusão de sermos pais, editado e publicado por Monografias.com, 2008, Rio de Janeiro. Também nas minhas palavras, a partir da minha observação de campo, desejam ver desaparecer os seus adultos. Longe da ideia de Édipo, pelo problema de globalização que nasce em 1775, Adam Smith ao lançar essa ideia da divisão do trabalho e que toda a população deve participar de forma autónoma e individual na riqueza da nação. Sabemos, e tenho explicado em outros textos, que Durkheim rebate a ideia em 1893, porque a divisão do trabalho é social, não apenas porque um faz o que o outro não sabe, bem como porque depende das capacidades, habilitações, formas da economia dentro da vida política e social, que permite às crianças, ultrapassar os ciúmes Edipianos, entrar nos ciúmes da concorrência, do consumo, das formas de vestir, do gasto para além das possibilidades e recursos. Situação que Szas tinha previsto com os seus estudos de teste e que Durkheim desenvolve para adultos e eruditos, em toda a sua obra, incluindo a que ajuda Lenine a derrubar o Império do Czar. Esta análise passa pela de Piaget, que experimenta apenas saber o conhecimento dos pequenos, porque entronca com a política contextual do objectivo de vida e de auto-estima. Se o leitor passar os olhos outra vez pelo texto que acabo de citar, será capaz de entender que a criançada coloca os adultos contra a parede: tenho estes meios, tenho este desejo, o meu grupo gasta em corridas, há quem passe droga e dinheiro, a minha inteligência e o meu corpo vão com eles. As pulsões tanáticas estão presentes dentro de um mundo que está sempre em guerra ou em debate entre classes sociais, pelo que procuram refúgio dentro das pulsões eróticas, organizadas dentro do comércio globalizado, facilitado pela queda do simbolismo que ajuda a entender hierarquias e formas de pensamentos que alimentam o saber erudito. A criança, desde a idade denominada do fim de Édipo, acaba por entrar numa corrida que pára na falta de simpatia solidária entre seres humanos.

Bem entendido, não tenho percentagens para basear a minha hipótese, mas tenho essa percentagem do método qualitativo do trabalho de campo, da observação participante retirada da vida com gente miúda faz já mais de 25 anos. Eis porque as análises de Durkheim e de Zsas despertam em mim um grande entusiasmo. É impossível não juntar a estes autores as ideias de Bion sobre aceitar a dor para desenvolver o entendimento. Quase como uma ideia religiosa de mim para com os outros, dentro da qual o símbolo exógamo acaba por ter uma valor que me leva a afirmar, sem hesitação, que o objectivo da interacção social e da acção do inconsciente é não ferir bebés com adultérios, nem aceitar dois factos que acontecem facilmente nos lares: a pedofilia e o incesto. As etnias que tenho analisado têm resolvido o caso com rituais clãnicos e mitologia que apura a forma de agir.

Não é outra, para nós próprios, que o mito da Génese, Capitulo 4, sobre Caim e Abel . É apenas um exemplo de várias actividades: para começar, da existência de uma divindade que sabe punir conforme entende, essa que Feuerbach tinha analisado em 1841 e da qual quer Marx, quer Freud, retiram a teoria da alienação, como analiso mais à frente e noutros textos. E, em segundo lugar, estamos a falar duma actividade denominada sacrifício, oferenda, que significa derramar sangue, esse sangue derramado que faz parte do acreditar nas normas culturais dos cristãos, a maior parte da população que nos interessa para este texto, ideia de sangue que retira a ideia de pecado e de crime e facilita a corrida actual entre Eros e Thanatos, num processo religioso civil, sem importar se vive ou morre, se mata, rouba ou engana, como fez Caim na sua oferenda: retira bens não adequados para tamanha magnificência, como uma divindade sem nome, que tinha punido os seus pais. Não há o problema de Édipo no caso do mito, mas sim de falta de cumprimento da lei de respeito à consanguinidade e ao parentesco. Caim é um Thanatos que Freud não usou, muito embora tenha usado o Tora em grande parte da sua teoria, como Klein e Bion os Evangelhos. No mito referido, Abel aparece apenas num verso, pelo facto de a sua conduta ser normal, a que corresponde: entregar o melhor do seu gado e sacrificá-lo, como acontece em todas as Bíblias, num prenúncio da morte de um outro mito ainda, Jesus, que é morto como cordeiro e é usado no caso pelos terapeutas franceses, como analiso mais à frente: um ante – Édipo que ama o pai que o mata, mito acreditado por milhares de pessoas e comemorado, especialmente entre nós, todos os dias. Vivemos, como se depreende da Génese, dentro da sociedade do sangue, do sacrifício, da entrega, não para entender, mas para atingir à Massim, uma outra vida e fugir do conhecido Thanatos. Caim é o melhor exemplo do caso. O contexto cultural é a forma de entender o pensamento, desde que se leiam os textos, se comemore o ritual como tantos antropólogos fazem, se entendam os símbolos e os mitos sejam respeitados dentro da verdade que levam em si, como esta do pecado e do bem e do mal de Caim e Abel, útil para analisar o saber das crianças e o seu imaginário sem os pais terem que entrar pelas raivas e pelas formas de punição que Evangelhos e Bíblia definem com detalhe. É suficiente observar Fátima em Portugal e a Faixa de Gaza no Oriente, para sabermos que é muito diferente dos Baruya da Nova Guiné, analisados por Maurice Godelier. A nossa relação de resiliência, definida por Boris Cyrulnik – como analiso no Capítulo 2-, para desenvolver o amor às crianças que são pequenos patos canalhas, e também para os pais entenderem o seu dever de amar com respeito esse bebé chorão que quase o não lhe permite trabalhar no dia seguinte. Há uma excelente contradição entre o dever de amar e o de ser agasalho da descendência: na nossa sociedade, como no Jardim do Éden fora do mesmo ainda mais, não é permitida essa definida capacidade de entender, que é denominada inaudita capacidade de amar apesar do peso da criança e da sua educação como filho e ser humano

É o mito que faz lembrar essa descendência de Bion, incrustada em Cyrulnik, analisada no Capítulo 2, de forma sintética: a resiliência precisa de muita análise e trabalho de campo com bebés e com os seus progenitores. E, da parte dos pais na realidade, de uma grande paciência para entender o produto da sua paixão e saber que um dia cresce e acaba por não ser a filiação à qual nos tínhamos habituado, como comento no Capítulo 3. Os filhos largam os pais e estes, devem ver, ouvir e calar e permitir que a geração seguinte, seja capaz de melhorar essa relação tão complexa, essa de sermos pais, sem entrarmos pelas ilusões, mas dando força ao real.

Normalmente, pensa-se que o que interessa para a Etnopsicologia é entender porque os pequenos não devem chorar. Uma minha orientada de tese de doutoramento colocou-me no Seminário quatro questões que me fizeram pensar: a primeira, uma frase já consagrada: os meninos não choram, primeira ideia da repressão das emoções que sofre parte de humanidade que nos acompanha na vida. O pranto é o resultado dos sentimentos feridos ou frustrados e cura toda e qualquer pessoa que faz luto por uma actividade mal construída, ou, pior ainda, pela perca de um ser humano que ama. A seguir, a repressão dos pais na realidade, está consagrada ainda numa outra frase: se te portas mal, apanhas. Por outras palavras, há uma vara de medida do que se deve e não deve fazer que, na sua sabedoria infinita, omnipotente, os progenitores conhecem: é o facto de se ser bem visto porque a nossa descendência é amável, gentil, atenciosa...conceitos distantes de uma Epistemologia a crescer. Mas, para os pais, adultos que optam – e nem sempre bem – os seus mais novos devem fazer como eles e assim ganham a resiliência, moeda grátis, e não trinta denários de prata, sempre ao pé do pequeno que já sofre imensa raiva e a exprime à sua maneira. Um adulto tem uma ironia simpática suficiente para aceitar pulsões que podem ferir o ego e os outros. Esse outro tão importante de analisar na Antropologia, que converte a Etnopsicologia numa ciência de direito próprio, sem um método previsto para classificar o comportamento, como faz a psiquiatria. Daí que tenha escolhido Etnopsicologia: não tem clínica, observa e aprende e abstrai para propor mais compreensão na relação adulto criança. Como essa outra frase dita, a terceira, que pretende regulamentar a conduta rebaixando os pequenos: meninos que não lavam as mãos, são porcos, é dizer, uma metáfora dura, suja, que dita com zanga, acaba por deixar cair o pequeno dentro de uma grande melancolia a ser paga nas depressões do adulto. E digo assim tão forte, porque estas frases, com punições e gritos, são parte do quotidiano da criança que apenas deseja fugir dos pais: um Édipo social, com libido emotiva ferida, a ser guardada para a vida adulta, queira ou não o indivíduo. Como a outra fatalidade que indica o desapreço de quem apenas sabe procurar carinho: já viste esse menino tão sossegado e tu tão irrequieto, que mete nojo? Não sabes fazer como ele?

Grande dor que nos acompanha desde a concepção até à morte e que tento analisar nas poucas páginas que hoje em dia uma editora permite.

Quais as crianças? Estão definidas assim e também mais em frente: essas que são pensadas, a mãe engravida e até os 4 anos, não sabem muito bem por onde andam, excepto que têm um conjunto de inimigos em casa, e talvez fora dela, se o seu alimento e carinho primário lhes forem retirados.

http://br.monografias.com/trabalhos913/licoes-etnopsicologia-infancia/licoes-etnopsicologia-infancia2.shtml#xoreal
publicado por Carlos Loures às 15:00
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Opinião: - Eu é que sou o “berdadeiro” candidato independente!

Carlos Mesquita


Fernando Nobre não perdeu a oportunidade de reaparecer após o anúncio do apoio formal do Partido Socialista a Manuel Alegre. Descobriu mais uma vantagem para a sua candidatura, há mais um partido que o não apoia.

Extracto de um artigo, de há três meses atrás, sobre a candidatura de Fernando Nobre.

…Algumas ocorrências mereciam reflexão, como a intenção de Fernando Nobre ser presidente da Republica, embora as luzes após o anúncio da candidatura, tenham iniciado uma queda de tensão tal, que desapareceu na penumbra. Fernando Nobre é uma das poucas individualidades portuguesas que pode ser apresentada aos nossos filhos como um exemplo de altruísmo, de entrega heróica a causas difíceis e solidárias, de obra feita que perdurará para além da sua vida. Mas isso fará dele um bom presidente? Madre Teresa de Calcutá seria uma boa Secretária-geral da ONU? A política, mesmo exercida de forma nobre, não é uma coisa menor comparada com a sua actividade? O propósito de Fernando Nobre suscita muitas perguntas, mas todas desaguam numa resposta singela, Fernando Nobre quer fazer política. E quando “faz” politica é simplesmente um politico; nessa actuação vai ser avaliado pela maneira como exerce esse novo ofício e não pelo passado, como para Manuel Alegre é secundária a sua arte poética ou em Cavaco Silva o jeito que tinha para saltar barreiras e subir aos coqueiros. O que se conhece das posições politicas do médico é de ter oferecido apoio a candidatos partidários desde Durão Barroso e António Capucho a Mário Soares e ao Bloco de Esquerda, atitudes que terão leituras politicas para todos os gostos. E que é monárquico. Fernando Nobre não tem que explicar donde vem, todos sabemos, mas ao que vem, pois dos três (até agora candidatos) é aquele, cuja prática num hipotético cargo de Chefe do Estado traz maior incógnita. Terá muitas ocasiões para esclarecer os portugueses, se conseguir deixar o discurso do pilar da cidadania, da supremacia moral dos que nunca tiveram partido, e outros populismos semelhantes com que se apresentou. Tivemos o PRD de Eanes o MIC de Alegre e já todos sabemos que quando se junta a “pureza” de vários apartidários, resulta numa organização política; e depois os militantes partidários não têm bicho, são tão cidadãos como os outros, e a maioria exerce a cidadania de forma exemplar, digo eu que não tenho partido. Há um discurso pelo primado do apartidarismo que mais parece um coro de igreja de ateus. Por outro lado tem de contar que a afirmação de que não é de esquerda centro ou direita, avaria a bússola de muita gente que não gosta de dar cartas em branco e que tem de afirmar a diferença para as outras candidaturas. Depois temos as contas, a utilidade dos votos para além dos proveitos das campanhas eleitorais; não vai ser indiferente ter (em crise profunda) um presidente de esquerda de direita ou a pairar acima das opções e realidades do país.

(in Semanário Transmontano de 26/02/2010)
publicado por Carlos Loures às 13:30
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O livro na era digital

Carlos Loures


É com uma sensação de volúpia que pessoas pertencentes às gerações mais antigas, como a minha, folheiam o livro, aspiram o seu odor, apreciam a textura e a gramagem do papel. Mas, esta relação afectiva, é uma questão geracional. Daqui por uns anos estes dinossáurios terão desaparecido. E com eles morrerá também a nostalgia do livro impresso. As novas gerações estarão preparadas para acolher novos suportes de leitura. Só é preciso que eles existam. E nada do que existe substitui satisfatoriamente o livro impresso.

Neste conjunto de notas soltas, continuo a reflectir sobre as múltiplas questões que configuram a crise do livro. A ameaça do livro electrónico substituir o livro impresso é apenas uma dessas questões e, por certo, nem será a mais importante. Mas é dela que me estou a ocupar por estes dias.

Muitos anunciam a morte do livro como hoje o conhecemos e a inevitabilidade do triunfo do livro digital. Pudemos ler a opinião de Umberto Eco, segundo a qual o livro é uma daquelas invenções que, como a roda, como a colher, como o machado, nunca serão substituídas – são invenções consolidadas. Acho que tem razão. Em 1489, portanto há quase 521 anos, foi impresso em Chaves o Tratado de Confissom, o primeiro, ou um dos primeiros, incunábulos em português. Trata-se de um manual destinado aos membros do clero, aconselhando-os na missão de ministrar aos fiéis o sacramento da confissão e da penitência. Aborda questões ainda hoje, mais de cinco séculos decorridos, delicadas e polémicas – o adultério, a violação ou estupro, a pedofilia, o incesto, o aborto, a homossexualidade. Descoberto em 1965 pelo Professor José Vitorino de Pina Martins (1920), foi publicado em 1973 em edição diplomática, com um estudo introdutório do investigador.


Se quisermos ler o Tratado de Confissom, isso depende do nosso saber paleográfico e não de qualquer sistema externo ao. Mas se quisermos ler um livro gravado em disquete de há dez anos atrás, teremos problemas. Para que o livro electrónico substitua o livro impresso é indispensável que se produza um sistema standard estabilizado, que não seja destronado quase todos os anos por modelos «mais recentes». Parece-me que essa etapa ainda está distante.

Já por diversas vezes referi, em textos publicados noutros sítios, o receio que por aquela época de transição entre a «Idade Velha» e a «Idade Nova», entre a Idade Média e o Renascimento, de que o livro impresso viesse usurpar o papel até então desempenhado por outros suportes na difusão da palavra divina – a arquitectura e sobretudo a escultura. Temia-se também que a importância dos sacerdotes fosse afectada, as homilias dominicais substituídas pela leitura directa dos textos sagrados. A Igreja de Roma nunca acarinhou a difusão da Bíblia – as escrituras deviam chegar aos fiéis filtradas pela interpretação dos padres. A aposta da Reforma foi outra e o reformismo espalhou-se como fogo em seara seca – cada bíblia impressa e distribuída era como um sacerdote, um missionário – a palavra de Deus levada directamente do produtor ao consumidor. Um avanço tão grande, ou maior, do que aquele que a Internet veio trazer relativamente a anteriores sistemas de informação. Porém, os «papistas», como vemos pelo Tratado de Confisson , temendo o invento de Gutenberg, não desdenharam de o usar na formação dos seus quadros.

Autores americanos, como Dan Brown, começaram a lançar as suas obras simultaneamente em versão impressa e em versão electrónica, no formato e-book. A empresa Netronix, de Taiwan, promete já para o fim deste ano modelos com telas sensíveis a toques. A holandesa Polymer vision projecta um leitor electrónico portátil, com tela que pode ser enrolada. O Kindle, da Amazon, anuncia nova versão ainda mais portátil e com uma capacidade muito superior, podendo ser consultado em qualquer sítio. Não nos podemos deslumbrar com estes novos instrumentos de leitura e de difusão de ideias.

Não se devem deslumbrar os adeptos das novas tecnologias, nem atemorizar os que amam os livros, receando a sua morte. O próprio nome – livro - derivado do latim «liber» contém uma lição a reter, pois significa o entrecasco da árvore. Não remete para a funcionalidade de um instrumento, mas para um material. Em diversas civilizações (entre os maias, por exemplo) o entrecasco da árvore foi utilizado como suporte de escrita, embora não existam dados que permitam assegurar que na Grécia ou em Roma essa utilização tenha existido.

Mais que o liber, foi o «codex», o lenho da árvore, que forneceu material para registos escritos. As tabuinhas de madeira, enceradas ou não, foram utilizadas por um período que vai da Antiguidade até finais da Idade Média. O papiro, um novo suporte, entrou no mundo grego por volta do século VII a.C. O pergaminho, técnica de tratamento dado à pele curtida de animais atribuída à cidade de Pérgamo, terá surgido no século III a.C. e foi utilizado durante bastante mais de um milénio, até que se generalizou o uso do papel.

Contudo, o aparecimento de um suporte não significa o desaparecimento imediato do outro. Tradição e inovação coexistem até que a inovação se transforma, por seu turno, em tradição. Como vemos, os suportes vão sendo alterados por razões pragmáticas - porque um novo suporte supera as limitações do anterior. E alteram-se em função das exigências que a sociedade vai colocando. A tabuinha correspondia a uma cultura de oralidade, era um simples auxiliar da memória, pois era na memória dos rapsodos que se arquivava o conhecimento.

A Internet está-nos a transformar-nos em ciborgues – muito do nosso saber não precisa de ser memorizado, pois em segundos podemos recuperar informação sobre qualquer tema. O computador está a converter-se numa indispensável prótese do cérebro. Não me admiraria que, no futuro, o ensino deixasse de obrigar a acumular conhecimento, passando a habilitar à gestão e utilização do conhecimento armazenado e disponível.

O livro impresso tem a morte anunciada. Nada é eterno, como sabemos. Parece-me, no entanto, ainda não ter nascido um suporte de escrita que o possa substituir integralmente. Em todo o caso, podemos reflectir. Penso, lá mais para diante, organizar uma série de debates aqui no Estrolabio sobre a problemática do livro. Um deles terá este tema central: o livro impresso perante a ameaça das novas tecnologias.
publicado por Carlos Loures às 12:00
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Tourada em Salzburgo


Luís Couto

Eu e o Luis Rocha tínhamos chegado à cidade bastante tarde, numa noite de neve que caía aos farrapos, silenciosa e fria com as luzes a tremilicarem por entre o nevoeiro .Chegados ao hotel nada quente para beber ou enganar a fome tudo fechado salvo, diz-nos o recepcionista, uma taberna no fundo da rua, talvez aí.

Lá fomos encolhidos rua abaixo sem alma de gente a travessar-se no caminho, uma ténue luz a sair de uma porta no rés-do-chão, grossa, batente de ferro que deixava escapar um vozeirão contido. Que sim, havia que comer e beber, mas a casa era de bancos e mesas corridas, tratassemos nós de arranjar lugar e companhia.

À minha frente Franceses, ao lado esquerdo Suiços, mais uns quantos austríacos e à minha direita um casal americano, ele alto e grosso, ela naquela meia idade como o Outono, coberta de cores, a beleza evidente de uma delicadeza que condizia com a pela bem tratada, uns olhos avelã e um cabelo louro/castanho. Portugueses? ela olhava-nos com curiosidade, conhecem o cavalo de raça “Lusitano”? pergunta com os olhos a rirem de curiosidade, lá nos esforçamos a falar da Coudelaria de Alter, como tem vindo a ser mantida uma pureza de raça, catalogada, de que se conhece a genealogia há mais de dois séculos.

Ela tinha um Lusitano na sua quinta em Utha, adorava o cavalo, que caracteristicas tinha desenvolvido? onde e em que era utilizado? tudo queria saber com uma graciosidade que em tudo se opunha à rudeza do marido, que não se conteve quando ouviu falar de tourada, pegas do touro à mão, que era mentira, ninguem se colocava à frente de um touro de 600 kgs, eles lá nos USA tambem o apanhavam mas era saltando para cima do cachaço , e às tantas a minha gritaria cruzada com a dele, movida a copos, ouvia-se por cima das mil conversas .

Que sim, diziam os franceses que já tinham visto uma vez no sul de França e os suiços nunca tinham visto mas sabiam que era verdade e os austríacos, como era isso expliquem lá. Eu e o Rocha no meio da algazarra, com interlucotores a falarem diversas línguas não nos entendíamos, eh, pá, o melhor é fazer uma demonstração, o francês que já viu é o touro, eu sou o cabeça dos forcados, o Rocha explicava e orientava as posições, mais dois austríacos atrás de mim a fazerem de forcados do grupo, e o francês não vai de modas atira os forcados para cima do público já em pé a cantar e a rir, espaço, é preciso espaço e o pessoal em cima das mesas e o francês a levar o seu papel de touro demasiado a preceito e o cabeça do grupo já metido em orgulhos com os espalhanços, uma e outra vez…

O americano bêbado que nem um cacho ainda o vi a descer a rua ás curvas e fixei bem o porte altivo e gracioso da mulher. Por momentos as nódoas negras não me doeram nada!
publicado por Luis Moreira às 11:00
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A República nos livros de ontem nos livros de hoje

A partir de hoje, e até 5 Outubro, iremos publicar diariamente fichas de leitura das obras que fazem a história da República, da conspiração, da implantação, da sua conturbada existência…

José Brandão o nosso colaborador que já nos tinha apresentado uma valiosa série sobre suicídios famosos em Portugal oferece-nos agora esta

                      A República
               nos livros de ontem
                 nos livros de hoje
Uma das mais completas, senão a mais completa, das bibliografias sobre este importanta tema.
 
                                   (Apresentação às 18 horas de hoje)
publicado por Carlos Loures às 11:00
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Novas Viagens na Minha Terra

Manuela Degerine

Capítulo VI

Etapa 3, da Azambuja a Vila Franca

Primeira parte

O pinhal da Azambuja mudou-se.


Almeida Garrett, Viagens na Minha Terra


Saio dos bombeiros às seis e meia da manhã. Prevejo um dia de caminhada através do campo – se não me perder. A aventura de ontem impõe-me esta regra que, daqui em diante, respeitarei com rigor: logo que me sentir perdida, retrocedo até ao ponto em encontrei a última indicação certa e segura.

A etapa de hoje é de trinta e dois quilómetros. Para já: são dez até Reguengo. Atravesso para o outro lado da estação, avanço à beira de uma estrada sossegada, passo numa ponte, encontro o caminho arenoso com a ajuda de setas amarelas que mãos caridosas, diria quase carinhosas, sem vandalismo, pintaram nos postes de electricidade. Este caminho não pareceria desagradável, não fora o rio malcheiroso que o acompanha... Aliás rio malcheiroso tornou-se nesta região um pleonasmo. Se há água, na melhor das hipóteses, tem que ser mal-cheirosa e, em muitos lugares, como ontem, na estrada para Castanheira do Ribatejo, nem se pode já chamar água àquilo: no espaço onde devia correr água grudou-se uma pasta negra como o petróleo. O caminho alarga-se, piso um pavimento com grandes lajes de pedra, entre canviais. Avisto uma quinta. Surgem os primeiros campos de tomate mais ou menos apanhado. Poder-se-iam encher camiões com o tomate e os marmelos que, ao longo do dia, vejo abandonados pelos campos ou à beira do caminho. O resto são canaviais. O pinhal?... É evidente que também não se mudou para aqui.

A temperatura é fresca, o entusiasmo grande, o bem-estar intenso, sinto a mochila leve, tudo corre pelo melhor até ao momento em que, após hora e meia de caminhada, começo a sentir sede. Poiso a mochila, bebo água, como as primeiras bolachas vitaminadas, mais um pedaço de chocolate preto. Volto a pôr às costas a mochila, porém escorrega-me uma alça, fica todo o peso suspenso na outra – que se parte. Não a alça propriamente, que aguenta muito mais peso, mas o parafuso que a unia ao saco. Fito a mochila com a maior perplexidade. Não é possível... Outro defeito do equipamento? Outra traição das técnicas experimentadas em laboratórios? Peço a esta mochila duas únicas qualidades, ser leve e resistente, avaliei todos os pormenores excepto este, não desconfiei da qualidade dos metais. E agora? Se com as duas alças e o cinto, o peso bem distribuído e assente nas ancas, eu tenho dificuldade em transportar o meu fardo – como é que posso continuar? Abandono as bagagens? E o que visto nos próximos dias, onde durmo, o que bebo?...

Angústia crescente. Que fazer?
publicado por Carlos Loures às 10:00
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Vigilante

Luis Rocha

O meu amigo Luís Moreira tem insistido comigo para publicar telas da autoria da minha irmã (Maria de Lourdes Fernandes Rocha) falecida em 16 de Novembro de 2009 com 60 anos que, apesar do seu espírito e força de luta, não resistiu ao terceiro cancro.

Tal como eu nasceu em Castelo Branco. Formou-se em Medicina na Faculdade de Lisboa. Depois de casada e ter passado por alguns hospitais, emigrou para Torre de Moncorvo (onde o marido, licenciado em Direito, tinha nascido e para onde decidiu ir exercer a profissão). Assim foi para o Hospital de Torre de Moncorvo onde chegou a ser Directora. Para Novembro deste ano a Câmara de Torre de Moncorvo, anunciou homenageá-la com a colocação de um “busto” no Hospital.

A morte do nosso pai em 1981 foi uma das primeiras nuvens escuras da sua vida. Mais tarde surgiu o primeiro cancro numa mama e, no ano seguinte na outra. Fez os tratamentos de Rádio e Quimioterapia. Como médica, mas principalmente com a força de lutadora que sempre a caracterizou, enfrentou o “animal”.

Reformou-se, passando a exercer medicina privada e, se até aí já era uma pessoa dedicada ao serviço da saúde, passou também a dedicar-se a acções sociais de que são testemunho, entre outros, a sua participação como voluntária no Corpo de Bombeiros e a criação de uma Associação “ O LEME” de apoio aos doentes do cancro.

Como forma de luta elegeu a escrita (publicou dois livros) e principalmente um dom que não sabia que tinha – o da pintura.

Nas noites em que as dores não a deixavam dormir, pintava até de madrugada o que lhe ia na alma. Pintou dezenas de telas e fez várias exposições.

A pedido do meu amigo, apresento acima uma pintura que reflecte a sua maneira de estar e lutar.

Quando vi este quadro pela primeira vez escrevi sobre ele o que a seguir transcrevo:

“Algumas nuvens de poeira esmoreceram, durante algum tempo, aquele brilho de força e esperança.

Por ser incontrolável a poeira que já começava a desanuviar, adensou-se e o brilho ficou de novo ofuscado.

Mas aí veio ao de cima a força interior daquela mulher que com um forte sopro de esperança, começou a esbater a nebulosidade provocada por aquela nova poeira.

Renasceu uma nova mulher com um brilho ainda mais intenso de ESPERANÇA E AMOR.

Sempre Vigilante seguia o seu caminho.”
publicado por Carlos Loures às 09:00
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A montanha escondida pela neve

Ethel Feldman



A montanha escondida pela neve

desnuda pela chuva,

e de novo coberta, e novamente nua.

Umas vezes em gelo onde mal piso escorrego,

noutras tão fofa que me enterro e gelo.



Encosto-me a árvore.

Quanto mais velha - mais bonita.

E há aquelas que duram quase uma eternidade.

É nela que me abraço e esqueço.



Tiro o casaco,

jogo fora o lenço

faça neve, faça sol

já não me importo.



Uma cereja suculenta salvou

um homem de se matar

Com a cereja escorrendo pela boca,

viu o sol,

abanou a árvore,

deu de comer às crianças na rua.
publicado por Carlos Loures às 08:00
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