enviado por Júlio Marques Mota
Crise dos subprimes, um negócio criminoso?
O banco Goldman Sachs recebeu recentemente uma citação para comparecer perante o procurador de Nova Iorque devido ao papel ambíguo durante a crise dos subprimes. Será que se perfila, enfim, um inquérito penal ?
Desde o início desta crise, a finança americana assemelha-se com efeito a uma gigantesca “ cena de crimes ". Contudo, as fraudes maciças que deram origem ao desencadear da maior crise financeira desde há um século aguardam ainda os seus seus procuradores, os seus polícias e os seus juizes. A explicação de um fenómeno macroeconómico pelo crime pode parecer irrisória, anedótica ou até mesmo ingénua.
A opinião publicada - a das elites que têm acesso aos meios de comunicação social - apressa-se como sempre a diabolizar uma perspectiva tão incómoda, agitando cómodos espantalhos : teoria a conspiração, a teroia de bodes expiatórios, efeito de diversão, populismo.
Todos querem impôr uma amável visão das causas da crise através de explicações fatalistas (a teoria dos ciclos), mágicas (uma catástrofe) ou estimulantes (disfuncionamentos dos mercados). No entanto, poucas crises financeiras na história comportaram uma dimensão criminosa tão evidente, uma tal massa crítica de fraudes.
Estes especialistas da negação são frequentemente aqueles que, durante as décadas de euforia (1980-2000), estavam cegos pela anomia crescente dos mercados financeiros. Ontem foram incapazes de antecipar a crise, hoje apressam-se a dissimular os seus aspectos mais chocantes , o que siginifica dos dois lados do Atlântico a falência quase generalizada dos peritos universitários e mediáticos.
Ora esta cegueira só pode preocupar aqueles que ainda são dotados de memória histórica, mesmo por muito pouco que esta seja. Com efeito, nos anos 1980, a América já tinha sofrido uma primeira grande crise financeira de forte “odor criminoso” com a falência das caixas de poupança. Por falta de ter sabido tirar as verdadeiras lições desta primeira tragédia da desregulação dogmática dos bancos, a América condenava-se a uma recaída dolorosa.
A cegueira generalizada e a desregulação depredadora encontra a sua origem na ideia que os mercados são omniscientes e auto-reguladores. Por outras palavras, que a sua “mão invisível” é quase infalível. Inchada e arrogante com este pressuposto , o lobby financeiro de Wall Street pode-se ligar - se comprar ? - aos eleitos sempre disponíveis se não estiverem mesmo convencidos, a míopes professores e às vezes ávidos de avaliações remuneradas, a analistas simpatizantes, friendly , e a jornalistas enredados na complexidade da matéria e pela pertença da maior parte dos meios de comunicação social aos grandes grupos de capitalistas.
Nos factos, esta crise foi o teatro de fraudes ao mesmo tempo maciças (sistemáticas) e integradas nos mecanismos financeiros (sistémicos).
Fraudes que puderam eclodir apenas pela graça de uma desregulação dogmática dos mercados financeiros, pensada e depois realizada desde os anos 1980, tanto pelos republicanos como pelos democratas. Sendo portadora de incitações e de oportunidades criminosas inéditas, a desregulação teve de facto este efeito criminoso; o que explica porque é que estes comportamenos ilícitos têm podido espontanea e mecanicamente eclodir ao longo da complexa e opaca cadeia financeira americana, à maneira dos enxames de abelhas e das matilhas.
Estas fraudes foram determinantes em três níveis: a montante com os empréstimos ditos “depredadores” ou “mentirosos”, difundidos no interior da franja mais vulnerável da sociedade americana (pobres, minorias étnicas, pessoas idosas e deficientes). Estes empréstimos serão mesmo qualificados pelos profissionais da indústria financeira como sendo “ empréstimos de neutrões”, subentendendo-se: estes empréstimos são armas que irão destruir as famílias e deixar as casas intactas. Tanto cinismo linguístico reduz a nada as tentativas de defesa a posteriori sobre o tema da ignorância ou da incompetência.
A jusante, as fraudes têm a ver com os produtos titularizados que foram vendidos pelos grandes bancos de investimento de Wall Street. Aí, estes bancos entregam-se a múltiplos comportamentos engaanosos: engano sobre o nível de risco, trucagem dos balanços, manipulação dos cotaações em baixa, etc.
No meio do processo, as três grandes agências de notação - das quais uma francesa - agem em reguladores de facto, num pântano “de conflitos de interesses”, um eufemismo que hoje já não engana ninguém . Estas agências são juizes e partes interessadas dado que notam produtos financeiros que elas mesmas contribuíram para estruturar.
Ora esta crise vem “de cima”, os defraudadores pertencem geralmente às elites da sociedade americana. Estamos pois longe de uma criminalidade organizada clássica, estamos aqui perante uma criminalidade de “ colarinhos brancos ", integrados ao sistema e dispondo de todos os instrumentos para podererm fazer desaparecer até a ideia mesmo dos seus crimes. Esta crise financeira largamente criminosa coloca de novo à luz do dia o novo equilíbrio dos poderes nos Estados Unidos entre o poder político (Washington) e o poder financeiro (Wall Street): depois do “ complexo militaro-industrial” denunciado pelo presidente Eisenhower (1961), “um complexo politico-financeiro” ter-se-á ele imposto nos Estados Unidos?
Porque é que até agora, nenhum banqueiro foi condenado por crime , as únicas sanções têm-se resolvido com em compensações negociadas ao nível do direito civil. Além disso, o plano de salvamento federal realizou-se únicamente para a benefício de Wall Street. O que pensar, afinal, de um sistema que recompensa tão abertamente a predação? Porque a impunidade continua aser um potente estímulo para a recidiva, quer se seja seja ladrão de bancos ou banqueiro ladrão (“bankster”).
Exageros, dir-se-á ? Os sépticos deveriam ler os dois relatórios do Congresso dos Estados Unidos que foram publicados desde o início d eJaneiro de 2011 : FCIC (fcic.law.stanford.edu/report) ; Carl Levin (hsgac.senate.gov/public/_files/Financial _Crisis/FinancialCrisisReport.pdf). As quase 1 300 páginas não deixam nenhuma dúvida : a fraude aí está de maneira indiscutívela ser o fio conductor desta crise.
Jean-François Gayraud, chargé de mission au Conseil supérieur de la formation et de la recherche stratégiques, commissaire divisionnaire, La crise des subprimes, une affaire criminelle ? , Le Monde, 13.06.11,
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