Sílvio Castro Um Novo Coração
Capítulo 41
Arco, 11ª jornada, 20/02/05
Não só de medicina conversamos, o dr. Citton e eu. Entre mil assuntos, falamos muito de futebol. O dr. Citton jogou professionalmente pela esquadra da sua cidade e me disse que essa atividade o ajudou muito a manter-se no período de estudos na Faculdade de Medicina de Pádua. Jogava com o número 9, centro-avante. Não quis jamais entrar em detalhes sobre a sua carreira, sobre os incidentes sofridos, sobre as vitórias conquistadas. Mas compreendi de seus silêncios que ele teve muitas satisfações nas muitas partidas jogadas pelos campos trentinos, vênetos, lombardos, emilianos. Muitas vezes contei-lhes das minhas práticas esportivas e ele sempre insistia em saber mais. Principalmente gostava de ver-me responder a suas curiosidades sobre a história do futebol internacional. Mais curioso ainda ficou quando lhe falei de um artigo escrito para uma revista de Milão, em novembro de 1983, pouco depois da vitória da Itália sobre o Brasill, em 1982, na Copa do Mundo da Espanha. Obrigou-me a prometer que lhe daria uma cópia do artigo. Então, numa das telefonemas diárias de Anna Rosa, pedi-lhe que fizesse uma cópia do artigo com o scanner no meu escritório e que me enviasse tudo para o meu email, coisa que ela logo fez. Agora, enquanto almoçamos, saboreando um perú assado com compota de maçã, o dr. Citton e eu lemos o artigo que me chegou e que leva o título - “Duas grandes escolas do futebol mundial”:
“A partida de Barcelona entre Brasil e Itália no Campeonato do mundo de futebol de 1982, além de ser história, já se fez lenda. Porém, não é o unico caso nesse sentido nos diversos encontros disputados entre as duas nações. Já no campeonato de 1938 na França, brasileiros e italianos se encontraram numa partida memorável, história para muitos, também lenda para alguns. Eram duas grandes seleções. A Itália, campeã do mundo, depois do triunfo romano de 1934; o Brasil, já famoso pela grande técnica de campeões como Leônidas, que muitos especialistas colocam ainda como o centro-avante ideal de uma formação internacional de todos os tempos; Domingos da Guia, que eu colocaria como “libero” ideal de qualquer formação que devesse encantar o espectador pela perfeição do estilo e pureza de meios agonísticos; Valdemar de Brito, Tim, Perácio, Patesco, Romeu Pelliciari.
Na semi-final jogada em Marselha, uma verdadeira final, como quase sempre acontece quando brasileiros e italianos se encontram antes de uma concreta final de campeonato, se defrontavam duas grandes escolas do futebol internacional. Como previsto, era uma partida disputada em todas as zonas do campo, com mudanças de ações que provocavam um constante “suspense” na torcida que enchia o estádio de Marselha. Uma luta concentrava a atenção de todos de modo particular, o duelo entre Meazza e Domingos. Este encantava o estádio pela elegância como defendia e pela perfeição dos lances de recomposição de ataque da seleção brasileira; Meazza era como sempre aquele gênio ofensivo, capaz de inventar e encontrar o gol de qualquer posição e a qualquer momento. Contra a prepotência de um, a serenidade olímpica do outro. Ao lado de Meazza trabalhava o apoio constante e racional de Silvio Piola. Domingos e companheiros se opunham com insuspeitada tranquilidade aos constantes assédios dos campeões do mundo e já muitos brasileiros sonhavam com a conquista do direito de disputar as finaisem Paris. Entretanto, Meazza lutava sempre com todos os recursos, obstinado contra a barreira que era Domingos da Guia. E usava todo o seu gênio futebolístico para superar a barreira. Muitos dos recursos de Meazza se dirigiam mais a demolir o espírito olímpico de Domingos que verdadeiramente tocar a bola. E assim foi por mais de uma hora. Até que em determinado momento, surpreso, o estádio assistia a um gesto quase impossível. Domingos da Guia que, em plena área brasileira, atingia com um ponta-pé sem bola o centro-avante italiano. Penalti, e a Itália bate o Brasil, 2 a1, conquistando o direito de ir até Paris para coroar-se bi-campeã do mundo.
Em 1950, no campeonato jogado no Maracanã, a crise da seleção italiana depois da tragédia de Superga com a morte dos campeões do Turim, não permitiu que a “Azzurra” pudesse encontrar a grande seleção brasileira de Bauer, Danilo, Zizinho, Ademir, Jair. Como acontecerá igualmente, por outras razões, na Suécia e no Chile, quando finalmente o futebol do Brasil – aquele de Pelé, Garrincha, Gilmar, Zagalo, Didi, Djalma e Nilton Santos – encontra o reconhecimento tristemente perdido naquele 1950, quando Guiggia marcou o segundo gol da vitória absurda do Uruguai diante de 200.000 brasileiros abismados. Porém, em 1970, no México, os encontros lendários entre Itália e Brasil assinalam um novo episódio. Então foi uma verdadeira final de campeonato mundial de futebol. A Itália de Facchetti, Mazzola, Rivera, De Sisti, Dominghini, Riva, vinha da épica vitória sobre a Alemanha Ocidental na semi-final do certame. Ainda que esgotados pelo esforço sobre-humano daquela que foi mais uma luta que uma simples partida de futebol, os “azzurri” se batem ao máximo contra a seleção de grande futebol – talvez a mais madura da história da seleção do Brasil – com um Carlos Alberto, Clodoaldo, Jairzinho, Gerson, Tostão, Rivelino, Pelé. Enquanto foi possível combater contra a fatiga acumulada, Boninsegna soube empatar o gol de Jairzinho. Porém, depois, com o passar dos minutos, o Brasil conquistou definitivamente a Copa Jules Rimet. Era definitivamente campeão mundial e era a definitiva consagração da escola brasileira de futebol, futebol que desde a vitória na Suécia via-se representado no campeonato italiano com campeões como Mazzola (Altafini para os italianos), Dino Sani, Dino da Costa, Vinicius. Sérgio Clerici, Jair da Costa, Sormani, Chinesinho, Amarildo. Hoje a partida de Paolo Rossi em Barcelona já se fez memória simbólica de duas grandes escolas de futebol. Duas escolas representativas – ao lado daquelas do Uruguai, da Inglaterra, da Alemanha Ocidental, da Hungria – de uma possível síntese estilística da história do futebol internacional. Todavia, o que é quase certo é que uma das tantas razões da derrota do escrete do Brasil na Espanha pode ser encontrada na falta de uma mentalidade histórica dos técnicos e dirigentes do futebol brasileiro que se esqueceram, então, que a Itália é sempre uma das grandes escolas do futebol mundial. Uma única ainda que bela compensação para aquela derrota se encontra na atual presença de dez jogadores brasileiros no campeonato italiano. Zico, Falcão, Toninho Cerezo, Edinho, Dirceu, Batista, Pedrinho, Luvanor, Juary e Elói – uns com maior intensidade, outros com menos rigor – representam dignamente a escola brasileira. Mas, também no Brasil se vive e se estima a força do futebol italiano, na simpatia esportiva por figuras de craques como Zoff, Cabrini,Tardelli, Paolo Rossi, Bruno Conti, Antognoni, Causio. Para demonstração de tal fato, basta que eu me recorde do espisódio que vivi um dia, logo depois do campeonato da Espanha, com meu sobrinho Rodrigo, jovem promessa de goleiro do time do jardim-de-infância do Colégio Santa Marcelina do Rio. Depois de um meu tiro muito fraco que lhe passou por debaixo da barriga: - Éee… Waldir Peres!… E ele, com cara de choro: - Eu não sou Waldir Peres… Eu sou Zoff.
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