Maurice Allais e a Financeirização da Economia
A leitura de Pierre Noel Giraud
Se há efectivamente uma coisa que se pode reter da conferência de Maurice Allais é a de que se trata de um autor nada fácil de compreender, ele que é o único economista francês que teve o Prémio Nobel em Economia, e, sobretudo, não é nada fácil para os economistas amadores. É por conseguinte um grande serviço que nos presta Pierre-Noel Giraud propondo-nos no seu livro “Le commerce des promesses : Petit traité sur la finance moderne “, “uma tradução” em linguagem acessível a todos, das propostas de Allais que, aliás, encontram uma escaldante actualidade no contexto da crise que atravessamos.
No final dos 90, constatando a viragem que tinha assumido a liberalização financeira, Allais escandalizava-se com o facto de se permitir aos bancos “jogar na Bolsa com os seus fundos próprios e, ainda pior, com a moeda que para o efeito criavam”. Preconizava uma separação absoluta entre a esfera da moeda e crédito relativamente à esfera da finança de mercado, bem como uma criação monetária estritamente reservada ao banco central. Formuladas em pleno período de euforia, até porque o sistema acabava de ultrapassar com brio a falência de LTCM, estas propostas naturalmente não foram nem entendidas ou nem ouvidas sequer. Foram afastadas dos nossos ouvidos e dos nossos olhos considerando-se que tais medidas bloqueariam totalmente todo e qualquer sistema financeiro e torná-lo-iam gravemente ineficaz. Analisemos contudo com mais pormenor as propostas de Maurice Allais, porque estas têm o mérito efectivamente de levantar as grandes questões de fundo .
Para Allais, no sistema actual, as crises financeiras cada vez mais violentas são inevitáveis. Uma especulação desenfreada nos mercados financeiros, à qual os bancos eles próprios participam maciçamente, é com efeito, do seu ponto de vista, inseparável das modalidades actuais de criação monetária. São estas modalidades que ele sugere que se reformem e de forma radical. Maurice Allais propõe separar os actuais bancos “universais” que, ao mesmo tempo, criam moeda e directa e indirectamente intervêm nos mercados financeiros, em três tipos de instituições diferentes com funções bem determinados e controlos bem precisos.
A primeira categoria , são simples bancos de depósitos, que gerem as contas - correntes dos seus clientes. É-lhes proibido fazer crédito: nenhum crédito a descoberto sobre os depósitos é pois autorizado. A sua função é unicamente a de pagamentos, função que facturam aos depositantes: a emissão de cheques, as transferências, os pagamentos por cartão bancário, que são conseguinte operações facturadas ao seu preço de custo
A segunda categoria , são bancos de empréstimos. Nesta categoria os bancos de créditos. Estes só podem conceder empréstimos nos valores que eles próprios tenham antecipadamente levantado eles mesmos como empréstimos junto do Banco central, como se vai ver. Além disso, estes bancos estão sujeito à exigência de emprestarem sobre períodos mais “curtos” do que aqueles de que usufruem junto do banco Central, para assim se evitar o perigo do risco de liquidez.
Os bancos de créditos não têm por conseguinte nenhum poder de criação monetário. A terceira categoria de bancos , são os bancos de negócios, que contraem empréstimos junto do público e dos bancos de créditos para comprarem títulos. Estes últimos são por conseguinte o equivalente dos actuais investidores institucionais.
No esquema de Allais , a criação monetária é reservada exclusivamente ao banco central que cria moeda emprestando aos bancos de créditos . É do Banco central e só deste que a criação monetária depende exclusivamente, de que depende o ritmo de expansão dos créditos aos actores económicos, por conseguinte da massa monetária em circulação. Este ritmo é decidido pelo governo.
O governo fixa por conseguinte ao banco central objectivos quantitativos de expansão da massa monetária. Calcula estes objectivos de modo a que a massa monetária aumente a um ritmo ligeiramente superior (de 2%) ao crescimento esperado da ' actividade económica, o que faz com que a inflação tolerada seja de 2%.
De acordo com Maurice Allais este sistema resolveria os problemas seguintes. O sistema de regulação não é mais afectado pelas crises financeiras, dado que os bancos de depósitos, que asseguram os pagamentos não fazem crédito e não investem nos mercados financeiros. Nem os bancos de depósitos nem os bancos de créditos poderiam conhecer crises de liquidez, dado que o seu activo é pelo menos tão líquido quanto o seu passivo.
Os bancos de créditos, se forem mal geridos e avaliarem mal os seus riscos de crédito, podem evidentemente declarar-se ou acharem-se em situação de falência. Mas serão retomados por bancos sãos, e estes factos traduzir-se-ão apenas em transferências entre accionistas e credores dos bancos, sem estar a afectar a moeda gerida pelos bancos de depósitos. Certamente, nada neste esquema impede um actor que contraia um emprestar junto de um banco de crédito para especular sobre os mercados financeiros.
Mas Allais sublinha em primeiro lugar que os bancos eles mesmos deverão ter que contrair empréstimos para especular, em vez de o poderem fazer como agora, com a moeda que criam ex nihilo e sem qualquer custo no sistema actual. Seguidamente, se, com tudo o resto igual, os actores (bancos inclusive) querem contrair empréstimos para especular, isso fará aumentar a taxas de juro e quanto mais a especulação se desenvolver , mais os recursos para especular custarão caro.
Maurice Allais vê aqui um potente mecanismo de regulação da especulação, enquanto que, no sistema actual, o crédito bancário pode alimentá-la sem qualquer travão . No seu sistema, poder-se-ia assumir riscos nos mercados financeiros apenas com uma poupança de antemão constituída, quer a sua própria quer a poupança levantada, por empréstimo, de outros.
Para Allais isto constitui a garantia de um bem maior estabilidade destes mercados e por conseguinte da economia como um todo. Este esquema tornaria cada vez mais impossível os enriquecimentos colossais e rápidos (de indivíduos ou instituições) graças a especulações felizes realizadas com dinheiro criado expressamente para isso, o que Allais considera moralmente condenável.
Tal é a base das reformas propostas por Allais. Prevêem outras medidas, mas o essencial é a separação e a compartimentação das actividades bancárias bem como o facto de se reservar ao Estado a criação monetária. O interesse destas propostas é que apontam muito claramente para a raiz da instabilidade do sistema monetário e financeiro contemporâneo: a possibilidade para a finança de criar direitos em excesso graças a uma criação monetária pelo crédito bancário que escapa largamente ao contrô1e do Estado.
. Ligações
. A Mesa pola Normalización Lingüística
. Biblioteca do IES Xoán Montes
. encyclo
. cnrtl dictionnaires modernes
. Le Monde
. sullarte
. Jornal de Letras, Artes e Ideias
. Ricardo Carvalho Calero - Página web comemorações do centenário
. Portal de cultura contemporânea africana
. rae
. treccani
. unesco
. Resistir
. BLOGUES
. Aventar
. DÁ FALA
. hoje há conquilhas, amanhã não sabemos
. ProfBlog
. Sararau