continuação daqui
1.c França Telecom: um suicídio reconhecido como acidente do trabalho
Le Monde com AFP , 13.07.10
Este inquérito, no qual participaram inspectores da polícia judiciária, durou dezoito horas. Reuters/Eric Gaillard
O Director Geral da França Telecom, Stéphane Richard, decidiu reconhecer o suicídio de um assalariado como sendo acidente do trabalho apesar dos pareceres desfavoráveis da Inspection générale des affaires sociales (IGAS) e de uma comissão interna, indicou na terça-feira a direcção.
“Além do parecer comunicado pela comissão de reforma [instância interna] sobre a ligação do drama que nos tocou com a empresa, Stéphane Richard decidiu que enquanto líder deste grupo, devia assumir um dever de assistência e de memória no que diz respeito aos desaparecidos, dos seus ambientes familiares e profissionais ", declarou um porta-voz da França Telecom.
O Director Geral “deseja igualmente tudo fazer para que todos juntos possamos superar este momento particularmente doloroso ". “Neste espírito, decidiu considerar este suicídio como um acidente de trabalho ", acrescentou o porta-voz.
O assalariado em causa que não tem descendentes e assim esta classificação em acidente de serviço não dá lugar ao pagamento de uma renda pelo Estado, como os seus eventuais descendentes teriam podido dela pretender.
Dezassete suicídios desde o início de 2010
Há um ano exactamente, na noite de 13 para 14 de Julho de 2009, Michel D., quadro arquitecto de redes em Marselha de 51 anos, suicidava-se no seu domicílio, pondo em causa numa carta sua a “sobrecarga de trabalho” e um “gestão de terror”.
O gesto deste funcionário não era o primeiro, mas tinha posto em evidência no quadro do mal-estar em que se estava a viver na France Télécom por uma parte dos assalariados perante os métodos de gestão e das numerosas reorganizações, obrigando o governo a reagir e a direcção a tomar uma série de medidas das quais a substituição do Presidente, Didier Lombard, pe3lo presidente actual Stéphane Richard
A Direcção e os sindicatos recensearam 35 suicídios de assalariados, alguns dos quais no local de trabalho, em 2008 e 2009, e os sindicatos referem ainda que houve ainda 17 suicídios desde o início 2010.
O gesto de Stéphane Richard é “extremamente simbólico " de acordo com o sindicato SUD, “muito político " segundo a CFDT, para quem “isto credibiliza a sua intenção de colocar o humano no centro " da empresa, como o proclamou no dia 5 de Julho.
“É uma medida de apaziguamento e de reconstrução ", considera o sindicato CFE-CGC/UNSA, que se interroga contudo “como é que se vai reanalisar os suicídios da era Lombard " (2005-2010). Os sindicatos sublinham “a ambiguidade” do procedimento de reconhecimento dos acidentes de serviço para os funcionários da France Télécom (65% de alguns 100.000 assalariados), sobre os quais a empresa decide. Para os assalariados de direito privado, ter direito à Segurança Social é o elemento decisivo e de toda a independência..
1.d Um texto a ler com muita atenção
Suicídio: a armadilha das explicações simplistas
LEMONDE, 10.11.10
Nestes últimos tempos, numerosos meios de comunicação social atribuíram um lugar importante aos suicídios de assalariados de empresas ou de instituições como a França Télécom, Correios, Renault, a Guarda Nacional ou o Serviço Nacional das Florestas (ONF). Nessas ocasiões, simplificações puderam ser feitas mas merecem que se volte a esta questão .
O enigma e a violência que representa o gesto suicida de um ser humano agridem muito fortemente e muito naturalmente o seu ambiente familiar, profissional e social. Como sempre face à dimensão do incompreensível, a necessidade de explicar impõe-se com força. A fascinação ou a angústia que suscita tal acto não permitem, aos familiares - a família, o ambiente escolar, profissional ou social - diferir a resolução, para tentar reencontrar um equilíbrio posto em perigo.
Se é fácil compreender e aceitar, para melhor os acompanhar, tais reacções emanando do ambiente familiar e profissional próximo, é lamentável ver os meios de comunicação social, que estão mais à distância e que têm um dever de esclarecimento objectivo à comunidade, precipitarem-se pela mesma via. A época evidentemente privilegia as simplificações abusivas, pronta a adoptar uma representação caricatural da realidade. Ela testemunha regularmente a sua incapacidade em apreender a complexidade humana.
Perante cada grande problema que se nos é colocado - quer se trate de desregulação climática, da ameaça de uma nova forma de gripe ou do suicídio de assalariados - tudo se passa como se o que importa é, sobretudo, identificar uma causa, simples e única, a fim de obter ,o mais depressa possível, um suposto remédio para tudo resolver. Infelizmente, como assim efectivamente o deu a perceber René Girard, a sociedade prefere sacrificar um bode expiatório para canalizar, através dele, a violência social.
Para além do facto de esta abordagem traduzir a pretensão rara de pensar que seríamos os primeiros na história humana a ser confrontados com questões deste tipo o que é típico do funcionamento adolescente que caracteriza em parte a nossa época - esta forma de abordagem afasta o enriquecimento que permite , cada vez que acontece, a investigação dos factores contributivos do que pode conduzir à passagem para o acto suicida: da psicologia individual à história do pessoa, da sua família e do seu ambiente; da antropologia e da Sociologia à filosofia; da economia à psicologia do trabalho; dos factores mais íntimos aos factores ambientais mais diversos. Sem esta abordagem plural, e em cada vez também, única, o risco é grande de conduzir a simplificações que certamente tranquilizam a curto prazo, mas erradas e conduzindo a soluções também elas, truncadas e erradas ou mesmo impróprias.
A simplificação pode igualmente provocar uma indução, até mesmo um “contágio” o que a todos deve francamente preocupar. Este fenómeno é conhecido nos adolescentes, em especial nos mais vulneráveis, para os quais o que interessa aos adultos - e os inquieta muito - é que se abra a esperança de que se tenha mais atenção ao seu mal-estar : assim, o interesse da nossa época traduzido pelos meios de comunicação social sobre o alcoolismo, sobre as tentativas de suicídio ou sobre o absentismo escolar, etc. pode ter, para os mais frágeis, um valor paradoxal de indução do que é temido. Daí o risco real de uma mediatização excessiva destes fenómenos, como a OMS e a Associação Internacional para a Prevenção do
Suicídio já o sublinharam, aquando do dia mundial de prevenção do suicídio a 10 de Setembro de 2010.
Daí a importância da boa utilização dos dados estatísticos disponíveis, a fim de os utilizar para o que estes nos podem trazer, mas não para além disso. Daí, igualmente, a necessidade para as instituições ou para as empresas confrontadas com suicídios de não naufragarem na culpabilidade activa e na adopção demasiada de normas, de protocolos e de cuidados que, antes que de se proteger a comunidade contra a tentação suicida, confortaria sobretudo aqueles que a esta tentação sucumbiriam mais facilmente quanto à oportunidade psíquica de ultrapassar a linha.
Perante os dramas humanos do suicídio, é imperativo abrir a reflexão efectivamente muito para além do que a que esta tem sido, frequente e infelizmente bastante reduzida. Os meios de comunicação social, têm a este respeito uma responsabilidade que é da sua obrigação saber enfrentar, sem nunca se esquecer que, muito longe de serem simples relatores da realidade, a sua presença e os seus discursos também influenciam esta mesma realidade.
Doutor Patrice Huerre, psiquiatra dos Hospitais, psicanalista, chefe de serviço de psiquiatria da criança e adolescência, EPS Erasme, Antony, França.
O Doutor Patrice Huerre é também Vice-Presidente de La Maison des Adolescents des Hauts de Seine e perito junto do Tribunal de Recurso, em Versalhes.
Patrice Huerre, Suicide : le piège des explications simplistes, Le Monde, 10 de Noveembro de 2010.
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