Quarta-feira, 4 de Maio de 2011

França Telecom: um suicídio reconhecido como acidente do trabalho parte II por Júlio Marques Mota

continuação daqui

 

1.c França Telecom: um suicídio reconhecido como acidente do trabalho

 

Le Monde com AFP , 13.07.10

 

Este inquérito, no qual participaram inspectores da polícia judiciária, durou dezoito horas. Reuters/Eric Gaillard

 

O Director Geral da França Telecom, Stéphane Richard, decidiu reconhecer o suicídio de um assalariado como sendo acidente do trabalho apesar dos pareceres desfavoráveis da Inspection générale des affaires sociales (IGAS) e de uma comissão interna, indicou na terça-feira  a direcção.

 

“Além do parecer comunicado pela comissão de reforma [instância interna] sobre a ligação do drama que nos tocou com a empresa, Stéphane Richard decidiu que enquanto líder deste grupo, devia assumir um dever de assistência e de memória no que diz respeito aos desaparecidos, dos seus ambientes familiares e profissionais ", declarou um porta-voz da França Telecom.

 

O Director Geral “deseja igualmente tudo fazer para que todos juntos possamos superar este momento particularmente doloroso ". “Neste espírito, decidiu considerar este suicídio como um acidente de trabalho ", acrescentou o porta-voz.

 

O assalariado em causa que não tem descendentes e assim  esta classificação em acidente de serviço não dá lugar ao pagamento de uma renda pelo Estado, como os seus eventuais descendentes teriam podido dela pretender.

 

Dezassete suicídios desde o início de 2010

 

Há um ano exactamente, na noite de 13 para 14 de Julho de 2009, Michel D., quadro arquitecto de redes em Marselha de 51 anos, suicidava-se no seu domicílio, pondo em causa numa carta sua a “sobrecarga de trabalho” e um “gestão de terror”.

 

O gesto deste funcionário não era o primeiro, mas tinha posto em evidência no quadro do mal-estar em que se estava a viver na France Télécom por uma parte dos assalariados perante os métodos de gestão e das numerosas reorganizações, obrigando o governo a reagir e a direcção a tomar uma série de medidas das quais a substituição do Presidente, Didier Lombard, pe3lo presidente actual  Stéphane Richard

 

A Direcção e os sindicatos recensearam 35 suicídios de assalariados, alguns dos quais no local de trabalho, em 2008 e 2009, e os sindicatos referem ainda que houve ainda 17 suicídios desde o início 2010.

 

O gesto de Stéphane Richard é “extremamente simbólico " de acordo com o sindicato SUD, “muito político " segundo a CFDT, para quem “isto credibiliza a sua intenção de colocar o humano no centro " da empresa, como o proclamou no dia 5 de Julho.

 

“É uma medida de apaziguamento e de reconstrução ", considera o sindicato CFE-CGC/UNSA, que se interroga contudo “como é que se vai reanalisar os suicídios da era Lombard " (2005-2010). Os sindicatos sublinham “a ambiguidade” do procedimento de reconhecimento dos acidentes de serviço para os funcionários da France Télécom (65% de alguns 100.000 assalariados), sobre os quais a empresa decide. Para os assalariados de direito privado, ter direito à Segurança Social é o elemento decisivo e de toda a independência..

 1.d Um texto a ler com muita atenção

 

Suicídio: a armadilha das explicações simplistas

 

LEMONDE, 10.11.10

 

Nestes últimos tempos, numerosos meios de comunicação social atribuíram um lugar importante aos suicídios de assalariados de empresas ou de instituições como a França Télécom, Correios, Renault, a Guarda Nacional ou o Serviço Nacional das Florestas (ONF). Nessas ocasiões, simplificações puderam ser feitas mas merecem que se volte a esta questão .

 

O enigma e a violência que representa o gesto suicida de um ser humano agridem muito fortemente e muito naturalmente o seu ambiente familiar, profissional e social. Como sempre face à dimensão do incompreensível, a necessidade de explicar impõe-se com força. A fascinação ou a angústia que suscita tal acto não permitem, aos familiares - a família, o ambiente escolar, profissional ou social - diferir a resolução, para tentar reencontrar um equilíbrio posto em perigo.

 

Se é fácil compreender e aceitar, para melhor os acompanhar, tais reacções emanando do ambiente familiar e profissional próximo, é lamentável ver os meios de comunicação social, que estão mais à distância e que têm um dever de esclarecimento objectivo à comunidade, precipitarem-se pela mesma via. A época evidentemente privilegia as simplificações abusivas, pronta a adoptar uma representação caricatural da realidade. Ela testemunha regularmente a sua incapacidade em apreender a complexidade humana.

 

Perante cada grande problema que se nos é colocado - quer se trate de desregulação climática, da ameaça de uma nova forma de gripe ou do suicídio de assalariados - tudo se passa como se o que importa é, sobretudo, identificar uma causa, simples e única, a fim de obter ,o mais depressa possível, um suposto remédio para tudo resolver. Infelizmente, como assim efectivamente o deu a perceber René Girard, a sociedade prefere sacrificar um bode expiatório para canalizar, através dele, a violência social.

 

Para além do facto de esta abordagem traduzir  a pretensão rara de pensar que seríamos os primeiros na história humana a ser confrontados com questões deste tipo o que é típico do funcionamento adolescente que caracteriza em parte a nossa época - esta forma de abordagem afasta o enriquecimento que permite , cada vez que acontece, a investigação dos factores contributivos do que pode conduzir à passagem para o acto suicida: da psicologia individual à história do pessoa, da sua família e do seu ambiente; da antropologia e da Sociologia à filosofia; da economia à psicologia do trabalho; dos factores mais íntimos aos factores ambientais mais diversos. Sem esta abordagem plural, e em cada vez também, única, o risco é grande de conduzir a simplificações que certamente tranquilizam a curto prazo, mas erradas e conduzindo a soluções também elas, truncadas e erradas ou mesmo  impróprias.

 

A simplificação pode igualmente provocar uma indução, até mesmo um “contágio” o que a todos deve francamente preocupar. Este fenómeno é conhecido nos adolescentes, em especial nos mais vulneráveis, para os quais o que interessa aos adultos - e os inquieta muito - é que se abra a esperança de que se tenha mais atenção ao seu mal-estar : assim, o interesse da nossa época traduzido pelos meios de comunicação social sobre o alcoolismo, sobre as tentativas de suicídio ou sobre o absentismo escolar, etc. pode ter, para os mais frágeis,  um valor paradoxal de indução do que é temido. Daí o risco real de uma mediatização excessiva destes fenómenos, como a OMS e a Associação Internacional para a Prevenção do

 

Suicídio já o sublinharam, aquando do dia mundial de prevenção do suicídio a 10 de Setembro de 2010.

 

Daí a importância da boa utilização dos dados estatísticos disponíveis, a fim de os utilizar para o que estes nos podem trazer, mas não para além disso. Daí, igualmente, a necessidade para as instituições ou para as empresas confrontadas com suicídios de não naufragarem na culpabilidade activa e na adopção demasiada de normas, de protocolos e de cuidados que, antes que de se proteger a comunidade contra a tentação suicida, confortaria sobretudo aqueles que a esta tentação sucumbiriam mais facilmente quanto à oportunidade psíquica de ultrapassar a linha.

 

Perante os dramas humanos do suicídio, é imperativo abrir a reflexão efectivamente muito para além do que a que esta tem sido,  frequente e infelizmente bastante reduzida. Os meios de comunicação social, têm a este respeito uma responsabilidade que é da sua obrigação saber enfrentar, sem nunca se esquecer que, muito longe de serem simples relatores da realidade, a sua presença e os seus discursos também influenciam esta mesma realidade.

 

Doutor Patrice Huerre, psiquiatra dos Hospitais, psicanalista, chefe de serviço de psiquiatria da criança e adolescência, EPS Erasme, Antony, França.

 

O Doutor Patrice Huerre é também Vice-Presidente de La Maison des Adolescents des Hauts de Seine e perito junto do Tribunal de Recurso, em Versalhes.

 

Patrice Huerre, Suicide : le piège des explications simplistes, Le Monde, 10 de Noveembro de 2010.

publicado por Luis Moreira às 20:00
link | favorito

.Páginas

Página inicial
Editorial

.Carta aberta de Júlio Marques Mota aos líderes parlamentares

Carta aberta

.Dia de Lisboa - 24 horas inteiramente dedicadas à cidade de Lisboa

Dia de Lisboa

.Contacte-nos

estrolabio(at)gmail.com

.últ. comentários

Transcrevi este artigo n'A Viagem dos Argonautas, ...
Sou natural duma aldeia muito perto de sta Maria d...
tudo treta...nem cristovao,nem europeu nenhum desc...
Boa tarde Marcos CruzQuantos números foram editado...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Conheci hackers profissionais além da imaginação h...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Esses grupos de CYBER GURUS ajudaram minha família...
Eles são um conjunto sofisticado e irrestrito de h...
Esse grupo de gurus cibernéticos ajudou minha famí...

.Livros


sugestão: revista arqa #84/85

.arquivos

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

.links