Quinta-feira, 7 de Abril de 2011

Reflexões à volta da ideia de Munchau: a Europa em 2013 será igual à de 2011- parte 2

Enviado por Júlio marques Mota (continuação de ontem às 20 horas)

 

Veja-se nesta linha a análise que faz o FMI no seu relatório sobre a Irlanda:

“Os riscos de transmissão específicos para cada país a partir da Irlanda são significativos. A Irlanda tem fortes ligações financeiras com o resto do mundo e a ameaça de contágio da Irlanda pode ser assim importante. Dadas as percepções havidas pelos mercados, os efeitos colaterais para as outras economias periféricas da zona euro podem ser grandes. A Grécia, Portugal e Espanha são os mais vulneráveis à volatilidade da transmissão de um acontecimento na Irlanda. A probabilidade estimada condicional quanto ao perigo sobre pelo menos um outro banco europeu, dado a situação de perigo nos bancos irlandeses, é superior a mais de dois terços. Isto seria em particular o caso dos bancos gregos e portugueses.

 

 

 

 Os investimentos em carteira são outro canal potencial de contágio financeiro. Os países com maiores investimentos em carteira em Portugal são o Reino Unido (134 mil milhões), a Alemanha (112 mil milhões), a França (95 mil milhões), e os EUA (83 mil milhões). Em relação ao PIB do país de origem, os países mais expostos são Portugal (18,8 por cento), Reino Unido (8,9 por cento), Bélgica (8,1 por cento), Holanda (6,2 por cento), Suíça (5,9 por cento), França (5,2 por cento) e Alemanha (4,8 por cento). A maior parte dos títulos em carteira de estrangeiros na Irlanda é geralmente sob a forma de títulos de dívida de longo prazo, com excepção dos Estados Unidos, Suíça e Suécia, onde é maior o peso dos investimentos em capital.”

Mas neste terrível jogo, o que alguém perde provavelmente pode não traduzir-se em ganho para ninguém. Esta hipótese é a triste e real ironia de tudo isto. Os políticos franceses e alemães terão tão poucas possibilidades de permitir uma qualquer situação de incumprimento a partir de 2013 como agora, exactamente assim, não a têm. Depois da queda do banco Lehman Brothers os governos recusaram, e bem, correr qualquer risco de natureza sistémica de que poderiam e deveriam depois ser responsabilizados. Entenda-se aqui que por risco de sistema se considera a probabilidade de que uma economia passe de um estado de equilíbrio “normal” a um estado “anormal” caracterizado por prejuízos socialmente elevados. No que diz respeito ao sistema financeiro, este risco exprime a ideia que perturbações normais, tais como as que se encontram num ciclo económico, podem dar origem a efeitos nefastos completamente desproporcionados se se produzem em sistemas fragilizados. É pois esta a situação de que estamos a falar.

 

Mas se entram em pânico com a ideia de uma situação de incumprimento agora, e basta ver a perturbação de que a queda do governo português provocou, tê-la-ão na mesma, ou maior ainda, em 2013. Nesta matéria, os políticos europeus podem pensar alto e podem dizer: fazemos o que consideramos melhor e, de novo, ficam envolvidos num mar de confusão, de desorientação, como agora. Farão um outro empréstimo com taxas de juro excessivamente elevadas e exigem às populações mais sacrifícios decorrentes de mais planos de austeridade, que é só o que têm sabido fazer — e será assim porque como tudo aponta, dos planos actuais não resultará nenhuma melhoria da situação.

 

 

Este jogo continuará assim até que a economia do país devedor considerado, qualquer que ele seja, acrescente-se, se afunde sob o peso da dívida, até ao ponto em que a situação de caos económico e social seja tal que o país entre necessariamente em incumprimento. Com alguma sorte, os políticos de agora não estarão no poder então e poderão acusar os que aí estarão da situação entretanto criada. Os que chegarem ao poder tentarão fazer o inverso, acusar os que antes deles estiveram como os principais responsáveis da situação existente. Como em Portugal, agora, se recorrermos ao FEEF veremos os defensores do governo caído acusar disso os que chegarão ao poder, se não forem os mesmos!

 

 

Mas a ser assim, os nossos políticos de hoje e os que nessa data estarão no poder, saídos da mesma fornada e com o mesmo quadro mental, esquecem a lógica da História, ou melhor a sua força: ninguém acredita que a situação não deixe de se degradar até 2013 e ninguém poderá acreditar que em 2013 querer continuar o mesmo programa de austeridade não será objectivamente estar a quererem-se politicamente suicidar. Com efeito, a ser assim ninguém acredita que o poder neoliberal de todos os Sócrates da Europa de hoje mantenham o mesmo poder de mistificação que hoje têm, mas mesmo que o mantenham serão uns a seguir aos outros que começaram a cair. Desta maneira, criam-se condições para uma renovação política imposta, desta vez, por baixo, e serão então as instituições que terão de mudar, será a arquitectura da União que terá de se modificar para responder às linhas de tensão que se terão entretanto estendido a toda a Europa. Veja-se já a Inglaterra, veja-se já a decisão de Zapatero de não se recandidatar. Outros se seguirão[2] por toda essa Europa. Porém,  dada a “classe” da nossa classe  política actualmente no poder ou que daquela que o espera dominar brevemente e que não é melhor que a anterior, seremos aí talvez dos últimos a  mudar, a menos que a força das circunstâncias que se estão a desencadear  leve a pressões populares para a mudança que sejam elas mais fortes que o medo que a classe política de matriz neoliberal (socialista chamada, inclusive) tem estado a instalar na sociedade portuguesa nos últimos anos, mesmo antes da crise financeira ter estalado - a modernidade da sociedade, como nos querem convencer.  O oposto desta previsão seriam múltiplas repúblicas de Weimar que por essa Europa seriam instaladas e, para o efeito, os nossos neoliberais pensarão contar com a lumpen-burguesia, e lumpen em todos os sentidos que se possam imaginar, que via as múltiplas Bolonhas se estão já objectivamente a formar. E aí, nessa altura, serão todos os nossos fantasmas que não nos deixarão nisso cair. Disso, estamos certos, mas certos estamos igualmente que será preciso muita força.

 

Assim o que é que se deve fazer? Uma das vias seria aceitar a lógica do incumprimento, decidi-lo, organizar um grande programa de ajuda ao país, assegurando uma recapitalização pelo Banco Central Europeu e um necessário apoio de crédito para o país em incumprimento. Uma outra via, seria aceitar o princípio de um bail-out, não com transferências entre países como agora mas com a emissão de um título europeu, assumido pela União Europeia, que substituísse a dívida nacional. Uma emissão colectiva de títulos de dívida soberana, garantidas estas pelas Instituições Europeias. De entre as várias estudadas e no Estrolábio já publicadas, esta ou similar a esta é a via que merece a nossa atenção. Um mecanismo forte e altamente flexível de resgate financeiro em que todos os títulos soberanos de garantia da União fossem tomados como equivalentes, com a capacidade de subscrição de dívida por parte do Banco Central Europeu, com a possibilidade da sua aquisição seja no mercado primário seja no mercado secundário, será necessariamente um passo nessa direcção e desta forma se reduziria ambém o torniquete dos mercados financeiros que em vez da situação actual em que tudo lhes é pwermitido ficariam  sujeitos a forte regulação. Aqui reencontramos os recentes textos dos Economistas Aterrados recentemente publicados no Estrolábio, também[3]. Assim se estancaria a hemorragia, o roubo dizem os irlandeses, a que cada país da periferia europeia está a ser sujeito, roubado pois ao património adquirido no passado, a hemorragia de fundos no presente e no futuro de cada um de nós.

Para uma ideia do roubo a que se referem os irlandeses, e palavra utilizada foi exactamente essa, vejamos a tabela dos CDS soberanos aplicados a 15 de Março de 2011:

 

 


 

 

[2]  Talvez muito lentamente, Veja-se a posição de hoje, 5 de Abril,  do Partido Socialista Francês: “O Partido socialista adoptou oficialmente o seu projecto para 2012, nesta  terça-feira 5 de Abril. Nesta ocasião , deu algumas precisões sobre o quadro orçamental e financeiro no qual este se irá inscrever.  Michel Sapin , o secretário nacional para a  economia, indicou que com o enquadramento estabelecido levar-se-á  o défice público para “cerca de 1,5%” do produto interno bruto (PIB) em 2017.

Precisou que o objectivo  dos 3%  para o défice será “ mais provavelmente  atingido em 2014 ″ do que em 2013, como a França  já se tinha comprometido  junto da Comissão Europeia. “Será a partir daí que se inverterá a curva da dívida ,  que é a questão mais  importante”, sublinhou. O actual executivo de Sarkozy  comprometeu-se a levar o défice ao valor de  3% em 2013 e a 2%  em 2014. Martine Aubry , afirmou que o PS se “bateria” para obter um adiamento do prazo de 2013. “Mais dos dois terços dos países europeus pedem que esta etapa ser mudada para  2015 ″. Mais do mesmo, mas mais devagar! A mudança tem que vir pois da base, das bases, em Portugal, em Madrid, em Paris, na Europa, em suma.

 

[2] Já com este texto escrito e dado por terminado, lemos no Jornal  Le Monde (5.04.11) a posição do investigador  Gael Giraud, que julgamos situar-se no mesmo comprimento de onda em várias das proposições aqui defendidas: “gravar o rigor orçamental na pedra mármore leva a um impasse na medida em que , como é manifesto na Grécia, na Irlanda, na Grâ-Bretanha, a austeridade orçamental aumenta o défice público em vez de o diminuir. E esta austeridade não impedirá a reestruturação da dívida soberana de um país da zona euro daqui até  2014. (…) Para lá dos países periféricos é o conjunto da zona euro que está situado numa trajectória de crescimento das despesas públicas que é a prazo insuportável, insustentável.(…) Não há outra saída que não seja a de autorizar os Estados Europeus a refinanciarem-se, pelo menos em parte, directamente junto do Banco Central Europeu, o que imporia a revisão do Tratado de Lisboa. Mais vale prevenirmo-nos rapidamente desta hipótese do que sermos encostados à parede por um incumprimento  de um país fragilizado que poderia provocar um novo crash   financeiro análogo ao que provocou a falência de Lehman Brothers  em 2008. Se Portugal, Irlanda, Grécia, ou a Espanha ficam em incumprimento  não dou nada pela zona Euro. Negociado  à  escala europeia , um financiamento  pelo Banco central , como o fazem os Estados Unidos permitia preservar as despesas sociais e investir nas indústrias verdes”.  Faça-se rapidamente a mudança diz-nos Giraud, o que aqui sublinhamos

 

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Olhe-se para os prémios de risco, a títulos a 5 anos,  que se exige a Portugal em 2009 e agora, faça-se o mesmo exercíco para a Grécia e outros. O prémio de risco, apenas esse, é um múltiplo da taxa de crescimento. Se estes valores de CDS não representam   um roubo, então  que representam eles? Mas se são um roubo, punidos devem ser aqueles que o realizam e sobretudo aqueles que o consentem, e os que  o consentem são, primeiro que tudo, as Instituições Europeias e o FMI. O quadro dispensa mais comentários. A ilustração gráfica deste sistema, em que no topo temos os grandes bancos americanos e as agências de rating:

 

 

 

Com esta máquina, com este sistema, assim a hemorragia continua e continuará até que o permitirmos[4]Impedir estes mecanismos de extorsão aos países mais frágeis é uma necessidade urgente, mas esta é a via para uma outra Europa, a que a Comissão Europeia, as suas instituições regionais e asInstituições Internacionais como o FMI não querem, esta é a via para uma Europa de um outro modelo que não é o de estarem os países uns contra os outros, até mesmo no financiamento da dívida soberana, é a via para a Europa dos cidadãos e não para Europa dos mercados. A opção de uns, a dos nossos políticos, essa está feita, os seus resultados estão bem à vista. Cabe-nos agora a nós, cidadãos fazer a nossa, a de uma outra arquitectura para a União Europeia face aos resultados que desta Europa queremos verdadeiramente esperar e para a qual todos nós, com o que pudermos fazer, teremos muito que contribuir. E o tempo, esse urge.



[4] Nesse sentido, sugiro que se leiam os recentes artigos de  Paul Farrel,  Tax the Super Rich now or face a revolution  Super-Rich  Super-Rich CEOs are killing your retirement.

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continua....

 

publicado por Luis Moreira às 20:00

editado por João Machado em 01/05/2011 às 14:17
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