Uma pequena nota de Júlio Marques Mota
Dois pequenos textos de antologia, onde de antologia é também a simples referência ao golf. Estarão Portugal e a Irlanda, no fundo da crise, a serem concorrentes uns contra os outros, a serem competitivos, a favor afinal daqueles que colocaram ambos os países na miséria: os senhores e as familías de quem se passeia pelo mundo para jogar gofe e praticamente sem pagar impostos. Estes não são aqueles que trabalham seguramente. E é tudo
Coimbra, 2 de Abril de 2011-04-02
Júlio Marques Mota
Os banqueiros responsáveis da crise estão de regresso aos comandos
Marc Roche, Le Monde
Há nomes praticamente desconhecidos do grande público que recentemente têm ocupado em evidência na esfera financeira. Três nomes que, para muitos, não dizem nada, mas que simbolizam a filosofia de uma profissão que não nada aprendido e todavia tudo compreendido : banqueiro por um dia, banqueiro para todos os dias, para sempre. Para a vida, para a morte! Que seja dito!
Comecemos pelo francês do lote referido. Jean-Pierre Mustier deve assumir a 21 de Março as suas novas funções de director das actividades de finança e investimento do estabelecimento italiano UniCredit, “para poder levar e desenvolver certas convicções ". Este personagem enigmático era o chefe na Société Generale , do trader louco Jérôme Kerviel. Tinha-se demitido em 2009.
O segundo protagonista é o americano Bill Winters, membro da comissão oficial britânica responsável pela reforma bancária. Este antigo banqueiro de negócios acaba de associar-se a dois peso bem pesados da vida dos negócios, o raider Lorde Rothschild e o industrial do luxo Johann Rupert, para criarem um fundo de investimento. Winters tinha sido um dos animadores da equipa de JP Morgan, que em 1994-1997 tivesse inventado os CDS crédito default swaps, estes produtos financeiros altamente tóxicos que contribuíram para a explosão do planeta financeiro .
Por último, há o caso de Alan Schwartz, o último patrão de Bear Stearns, o banco de negócios falido com os créditos imobiliários tóxicos, cuja queda em 2007 tinha sido o sinal premonitório da tormenta que veio a seguir. Depois da sua saída ignominiosa , o banqueiro de Nova Iorque tinha assumido a direcção de um hedge fund, Guggenheim Partners. Este fundo anunciou na semana passada a criação de um departamento de trading que utiliza os seus capitais próprios , uma actividade muito arriscada e altamente especulativa doravante proibida aos bancos.
Os banqueiros arrastados pela crise de 2008-2009 estão pois volta, como se nada se tivesse passado, e entram pela porta da frente. E a lista é longa, muito longa, ao ler diariamente as páginas da imprensa financeira. O caso mais escandaloso continua ainda a ser o de Antigone Loudiadis, a banqueira de Goldman Sachs que ajudou a Grécia a maquilhar as suas contas para lhe permitir entrar no euro. Este serviço valeu-lhe ser promovida à cabeça da companhia de seguros da casa Goldman Sachs!
Convenhamos, para qualquer lado que se olhe, ficamos com a cabeça à roda. Agora com um ar de quem está arrependido , Jean-Pierre Mustier terá estudado afincadamente durante o seu interlúdio londrino de ano e meio as biografias de Alan Greenspan, antigo director do FED, a Reserva Federal Americana, e de Henry Paulson, o secretário do Tesouro entre 2006 e 2008.
Na esfera dos flagelos, faz-se melhor. Greenspan passa para um dos grandes responsáveis da derrota pela sua política de dinheiro barato e pela sua recusa de uma regulação sobre os produtos derivados. Quanto a Paulson, que foi presidente de Goldman Sachs entre 1999 e 2006, não parou de estar sempre a defender os interesses do seu antigo empregador, Goldman Sachs.
O descalabro financeiro viu milhões de famílias perderem as suas casas , empregos, pensões de reforma. Com algumas excepções apenas , reencontra-se hoje os mesmos chefes à frente das grandes instituições financeiras. Nenhum dirigente da banca foi punido , mesmo nos casos de fraude provada sobre os créditos hipotecários. Neste tipo de negócios complexos, as provas são difíceis de reunir, e a incompetência não é um crime: este é o discurso oficial para justificar este laxismo judicial.
Enquanto que o contribuinte que salvou o sistema bancário deve apertar-se e bem o seu cinto, a hora é de novo para a concessão em toda a impunidade de bónus mirabolantes, à Wall Street como na City de Londres. Em Bruxelas e em Washington, os lobby bancários castraram os projectos de regulação, levando mesmo a gritos de meter medo só pela ideia de um reforço das normas prudenciais de capital. Com o desprezo mais descarado pelo civismo mais elementar, as zonas off-shore ajudam as multinacionais como as grandes fortunas a dedicarem-se à evasão fiscal legal. Para escapar ao imposto assim como ao regulador britânicos, os hedges funds londrinos terão encontrado a sua nova terra prometido, Malta, para especular em toda a calma do mundo.
A profissão bancária não vê sequer em que é que terá falhado em termos de honra ou de moral, explica-nos o consultor londrino Amin Rajan, especialista em liderança na condução de empresas. “Os meios financeiros tiveram êxito em fazer passar a mensagem que a crise é da responsabilidade do sistema, dos reguladores, dos bancos centrais, dos accionistas, ou mesmo das famílias, resumidamente, das vigarices dos outros. “ Na leitura bem particular que têm os banqueiros da deontologia, reconhecer as suas faltas seria uma confissão de fraqueza ou de culpabilidade.
No entanto, é necessário convir, os bancos, de que ninguém pode passar sem eles, não se deevem colocar todos no mesmo saco, e alguns preenchem mesmo as funções normais de financiamento da economia.
O cardeal o arcebispo Westminster, Vincent Nichols, não disse outra coisa ao falar para os banqueiros : “A vossa missão consiste antes de mais nada em servir o interesse do público. “ Esta exortação não deveria ser gravada no frontispício à entrada do Hotel Guildhall, o hotel dos homens da City?
Marc Roche, Les banquiers responsables de la crise de retour aux manettes, Le Monde, 9.03.11
2.Da Irlanda com carinho, uma carta
Um pequeno conselho amigável a Portugal
Domingo, 27 de Março de 2011
Caro Portugal:
Daqui lhe escrevo, da Irlanda. Eu sei que não nos conhecemos muito bem, embora eu tenha ouvido que alguns dos nossos promotores estão muito tristes com o facto de vocês estarem a ultrapassar a recessão.
Eles poderão ficar assim por uns tempos. Em todo o caso, não pretendo intrometer-me na sua vida mas tenho lido os jornais e causa-me impressão pensar que tenho de lhe escrever para lhe dar um pequeno conselho quanto à situação em que se encontra e quanto ao que ainda está para vir.
Porque, e com alguma ironia amarga, qual é a diferença entre Portugal e a Irlanda na presente situação? Cinco letras e seis meses.
Em todo o caso, reparo agora que Portugal está sob pressão para aceitar um resgate financeiro de urgência mas os vossos políticos estão a insistir que estão fortemente determinados a não o quererem. Para o fazerem, só por cima dos seus cadáveres. Diz-me a experiência que isto significa que
Portugal estará brevemente a querer um resgate financeiro, provavelmente a um domingo. Deixe-me primeiramente dar-lhe uma pista quanto às nuances da língua inglesa.
Dado que o inglês é a sua segunda língua, Portugal pode estar a pensar que as palavras bailout (resgate) e aid (ajuda) implicam que Portugal irá ter a ajuda dos nossos irmãos europeus para começar a sair das suas dificuldades actuais. Mas o inglês é a nossa primeira língua e foi isso que nós pensámos ser o significado de bailout e o de aid. Mas permita-me que o avise: não só este “resgate” – quando ele vos for inevitavelmente imposto – não livrará Portugal dos problemas actuais como também, na prática, os irá prolongar durante as futuras gerações.
Por tudo isto, o que esperam de si, Portugal, é que se mostre grato. Se quiser saber qual é o termo português adequado para traduzir o termo inglês bailout, sugiro-lhe que pegue no seu dicionário de Inglês-Português e procure palavras como: moneylending (empréstimos em dinheiro), usury (usura), subprime mortgage (hipotecas subprime), rip-off (roubo). Isto dar-lhe-á uma tradução mais exacta daquilo que lhe vai acontecer.
Fico, também, a saber que você, Portugal, vai mudar de governo dentro de dois meses. Vai desculpar-me pelo facto de eu-me permitir esboçar um certo sorriso quanto à mudança em questão. Não deixe de aplicar uma boa camada de tinta por cima das fendas da sua economia. E não deixe, também, de apreciar o cheiro dessa tinta fresca por algum tempo.
Nós, aqui, também arranjámos um novo governo – o que foi uma agradável manobra de diversão durante algumas semanas. O que você vai verificar é que o novo governo irá surgir no meio de uma certa euforia popular. O novo governo, entretanto, terá já feito todo o género de promessas durante a campanha eleitoral quanto a dar cabo dos detentores de títulos e por aí fora, e a União Europeia irá sorrir condescendentemente perante toda essa conversa fiada.
Então, quando o seu governo tomar posse, ele irá mostrar-se à Europa e dará algumas indicações. Você até poderá vencer alguns jogos de futebol com os vossos principais adversários, quaisquer que eles sejam, e pode até conseguir ser visitado por dignatários estrangeiros, como o Papa ou outros. Sentir-se-á uma atmosfera positiva, por algum tempo, enquanto todos se refugiam numa certa ilusão.
E usufrua de tudo isso, Portugal, enquanto puder. Porque a realidade estará de novo à espreita, para se intrometer outra vez na sua vida, quando a diversão se desvanecer. O contraponto de tudo isto é que o preço de um jogo de golfe se tornou aqui mutio competitivo. Oxalá o mesmo aconteça aí. Esperamos vê-lo, Portugal, então.
Com a amizade da
Irlanda
The Independent on Sunday
. Ligações
. A Mesa pola Normalización Lingüística
. Biblioteca do IES Xoán Montes
. encyclo
. cnrtl dictionnaires modernes
. Le Monde
. sullarte
. Jornal de Letras, Artes e Ideias
. Ricardo Carvalho Calero - Página web comemorações do centenário
. Portal de cultura contemporânea africana
. rae
. treccani
. unesco
. Resistir
. BLOGUES
. Aventar
. DÁ FALA
. hoje há conquilhas, amanhã não sabemos
. ProfBlog
. Sararau