Domingo, 3 de Abril de 2011

Dedicatórias – Livros dedicados por poetas brasileiros / 2. por Sílvio Castro

 

 

 

 

 



 

                     Na coleção de livros a mim oferecidos e dedicados diretamente pelos autores, ocupa a primeira posição aqueles de poetas brasileiros contemporâneos. Como um elemento de particular alegria para mim, entre esses, além dos mais jovens, aqueles da minha mesma geração, encontram-se igualmente alguns dos grandes nomes históricos da Geração de 1922-30 que introduziu a modernidade na poesia e na literatura geral do Brasil, a partir do Movimento Modernista de 1922, bem como aqueles outros que estão por entrar igualmente na nossa historia, componentes da muito discutida e às mais das vezes não bem compreendida “Geração de45”.

 

                         Diante desta visão da poesia moderna do Brasil, dividirei a exposição dos nomes dos poetas que interessam à minha atual análise colocando-os nas posições históricas por mim propostas na minha História da Literatura Brasileira (3vv., Lisboa, 1999-2000), que é justamente a exposta acima, e mais a “Geração de56”, possivelmente aquela que conclui o ciclo histórico-literário. Tratarei delas e sempre sob a forma de gerações. Na minha atual seleção de dedicatórias, estão poetas da: 1. “Geração de 22-30”; 2. “Geração de 45;  3. “Geração de 56”.

 

 

                        1. “Geração de 22-30”


                        A presença dos poetas históricos da literatura brasileira que ilustram a minha análise do problema quanto a uma possível teoria retórica do tema “Dedicatórias” me permite equacionar uma importante verificação do comportamento dos escritores desta Geração, isto é, a máxima e natural disponibilidade para com os seus jovens confrades, literatos em muitos casos ainda em plena formação. Quando Manuel Bandeira, Cassiano Ricardo, Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes e Joaquim Cardozo me dedicam seus livros, a Geração fundadora se demonstra sempre aberta ao futuro. Mas, como veremos mais adiante, o mesmo acontecerá com os prosadores.

 

                        Do grupo que forma os doadores históricos, o mais antigo deles é sem dúvidas Manuel Bandeira, porém aquele que mais cedo me concede uma dedicatória é Joaquim Cardozo.

 

                        De Joaquim Cardozo recebo a revelação que estou em plena atividade literária já em agosto de 1954, quando eu ainda estava por completar 23 anos de idade e dava os primeiros passos na divulgação de minhas ambições literárias, a partir das tímidas publicações, não de poemas meus, mas de minhas primeiras resenhas críticas. Joaquim Cardozo, um dos “poetas bissestos”, segundo a famosa definição e análise do fenômento elaboradas por Manuel Bandeira, isto é, aqueles poetas, mesmos os capazes de uma poesia de grande nível criador, eram conhecidos pelos poucos poemas que vez por outra realizavam e publicavam. Em 1947, Joaquim Cardozo decide de sair desta categoria, publicando pela Editora Agir, do Rio de Janeiro, os seus Poemas, com poesias escritas desde1925 a 1947. O livro tem capa e gravura de Santa Rosa e ilustrações de Luís Jardins, dois grandes nomes das artes gráficas brasileiras dos nossos dias. A dedicatória que Joaquim Cardozo me faz na página de rosto de seu belo livro diz:

 

 “A Silvio de Castro

lembrança de

                 Joaquim Cardozo

3/8/954”.

 

                        Manuel Bandeira, eu o frequentava desde praticamente 1956 com boa frequência, mas quase à distância, não por imposição dele, sempre bonário e cordial, mas pela minha respeitosa timidez por um dos grandes monumentos da poesia brasileira. Eu o via particularmente em dois locais privilegiados, na Academia Brasileira de Letras, na tradicional reunião das quinta-feiras,  e na Livraria São José, do livreiro Carlos Ribeiro, catalizador dos escritores residentes no Rio ou de outros de passagem pela capital do país. Manuel Bandeira publicou em 1961 uma nova antologia de seus poemas, Antologia Poética, pela Editora do Autor, para a qual escreveu uma “Advertência“, onde, no primeiro parágrafo, se lê: “Esta é a sétima [antologia] que faço de meus poemas. `[....  ....]; nesta o critério adotado foi colher entre os meus poemas mais bem realizados os mais accessíveis ao leitor estrangeiro, pois eu desejava com ela retribuir a poetas de outras línguas a gentileza de me terem oferecido os seus livros.“ Eis aí mais um novo ponto da rica retórica da “dedicatória”. Aquela que o Poeta me faz é justamente de 1961, ainda que ele não tenha datado a mesma. Naquele 1961 que me via no auge de minhas atividades literárias na Cidade Maravilhosa, principalmente depois do lançamento,no ano anterior, do primeiro número de meu Anuário da Literatura Brasileira, feito com a parceria de Waldir Ribeiro do Val, Anuário que surpreendera todo o ambiente literário brasileiro e que teve o seu lançamento justamente na Livraria São José. Também Manuel Bandeira participou daquela tarde memorável. O segundo número do Anuário estava por sair quando Manuel Bandeira me dedica um exemplar da sua Antologia Poética. A dedicatória, colocada com ênfase na primeira página do volume, é simples e direta:

 

                                               “A Silvio de Castro

cordialmente

                                                               Manuel Bandeira”

 

                        Com uma outra figura histórica da poesia brasileira, Cassiano Ricardo, o ritmo de nossas relações é muito mais intenso. Isto pela natureza aberta do grande analista de O Homem Cordial (estudos brasileiros), de 1959, aquela mesma de que era feito o grande poeta Cassiano Ricardo, o mesmo que recobre magicamente e sempre novo todos os tempos das três Gerações da poesia contemporânea do Brasil. O meu relacionamento com o criador do Martim Cererê, já precedentemente existente pelos nossos encontros nas famosas reuniões das quintas-feiras da ABL, se intensifica a partir de 1959 e em particular depois da entrevista que fiz com o Poeta e publiquei, com o título de “Aqui fala Cassiano Ricardo”, nos Cadernos Brasileiros, n° 3, Rio de Janeiro, outubro-dezembro de 1959, pp. 54-63 (depois reproduzida como apêndice n° 3 no meu Modernização e Modernidade. Poetas Contemporâneos da Academia Brasileira de Letras, Edições Galo Branco, RJ, 2006). Certamente em correspondência com esta entrevista se coloca a expressiva dedicatória-abertura da parte mais significativamente experimental, “Babilônia“, da obra-prima de Cassiano, o volume de poemas Jeremias Sem-chorar, de 1964. quando eu já estava nas minhas atividades italianas desde 1962 e, somente por isso, não mais tinha oportunidade de um colóquio direto com o grande poeta paulista, como muitas vezes antes tínhamos, até mesmo por via telefônica. Cassiano Ricardo me dedicou pessoalmente dois de seu livros de poesia, ambos de 1960:  A Difícel Manhã e Montanha Russa.  No primeiro, ele escreve com a sua bela caligrafia:

 

 

                                               “A Sílvio Castro

                                               - afetuosamente,

                                               e com alto apreço –

                                                           Cassiano Ricardo          1961”

 

Com a mesma intensidade de comunicação ele me dedica o volume de seu genial Montanha Russa:

 

                                               “A Silvio Castro

com a admiração

e o afetuoso abraço

do

Cassiano Ricardo          1961“

 

                        Um pouco diversa, mas igualmente plena de cordialidades  e afeto, é a história de meus relacionamentos com Carlos Drummond de Andrade. A sua cordialidade não teve jamais a expressividade daquela muito mais genericamente brasileira de Cassiano Ricardo. Não era por nada que ele era inteiramente mineiro, de corpo e espírito. Por isso, como já o dissera num dos seus admiráveis poemas, muito do ferro da paisagem de Minas estava incrostrado no seu ser mais profundo. Porém, ainda que assim ferroso, Drummond era pleno de participação com o mundo e com os outros homens. Desta maneira o vi desde a primeira vez, aonde não sei mais, porém certamente num lugar público, possivelmente na generosa Livraria São José, aonde ele estava silencioso entre os livros, vez por outra se distraia com as perguntas muito cautas de Carlos Ribeiro, ou recebia com meio-sorriso os cumprimentos de um admirador. Depois, muitas vezes nos cruzamos quando de sua saída diária do trabalho no Ministério da Educação, debaixo dos pórticos sustentados pelos pilotis da invenção nascida de um modelo de Le Corbusier e realizada pela criatividade de jovens arquitetos brasileiros, como Oscar Niemeyer, em pleno crescimento na direção de muitas outras construções mágicas. Então nos saudávamos mais com a cabeça e leves gestos do que com as palavras. Pois estas, Drummond quase sempre as reservava para os seus poemas encantatórios. Porém, ele estava atento ao jovem que crescia lentamente no movimentado ambiente literário da Cidade Maravilhosa. Assim um dia, já aposentado, mas vivendo uma missão especial no Instituto Nacional do Livro, justamente aquela da programação de uma Enciclopédia Brasileira, ele lembrou-se do jovem prometente e o chamou para colaborar na empresa. Um pouco mais loquaz era possível encontrá-lo nas costumeiras reuniões no apartamento do Leblon, de Plínio Doyle, nas conversações dos muitos sábados sabadolianos, nos quais ainda que presente Drummond escutava mais do que falava. Sempre mineiro. De Carlos Drummond de Andrade, perdida a dedicatória das Obra Poética, tão sorrateiramene substraida-me na remessa do Correio carioca, tenho em mãos uma outra, aquela da 3ª. edição das poesias de Corpo, feita pela Record, Rj, em 1984:

 

                                                           “A Sylvio de Castro,

o abraço cordial de

Carlos Drummond de Andrade

Rio, 5. XII. 84“

 

                        Não o tendo jamais encontrado pessoalmente no Rio antes de sua partida para a Itália como um aparentemente simples leitor brasileiro em missão do Itamaraty, quando em verdade ele ia para a Universidade de Roma para alargar o espaço do ensino da língua portuguesa da capital italiana, bem como aquele das literaturas do Brasil e de Portugal, que Luciana Stegagno Picchio criara e projetara com verdadeiro espírito pioneiro, eu irei conhecer o Poeta quando também eu me desloco para a Itália. Murilo chegou na Universidade de Roma para, ao lado da literatura portuguesa ensinada por Luciana, colocar com ênfase a melhor visão possível da literatura brasileira. Ali vou encontrá-lo, quando em 16 de novembro de 1962 chego a Roma, com um vôo da Panair que bateu então o record de tempo para o percurso Rio-Roma. Chegado na capital italiana, invés de partir diretamente para Veneza, minha meta universitária, eu vindo como viera Murilo como leitor brasileiro, logo resolvi adiar a minha chegada às terras venezianas, ficando por 15 dias para melhor conhecer a Capital, hospedado na casa romana de meu caríssimo amigo Luiz Fernando Nazareth, o jovem 2° secretário que genialmente descobriu que o histórico palácio da Piazza Navona, sede da Embaixada brasileira, jamais fora tombado, depois do que convenceu o nosso embaixador  de então a contratar com os herdeiros Doria Pamphili a compra do belíssimo palácio. Luís Fernando logo criou uma reunião em sua casa no elegante bairro Parioli, na qual me apresentou Luciana Stegagno Picchio, bem como me fez rever o grande poeta, em companhia de sua mulher portuguesa, Maria da Saudade Cortesão. Depois, antes de partir para Veneza, tornei a encontrar Murilo, fato que iria repetir-se em várias ocasiões, em Roma ou em Veneza, antes que o poeta deixasse definitivamente a Itália e partisse para Portugal, onde viria a falecer. Naquele encontro de 1962 foi quando ele me presenteou a edição italiana de uma recolha de seus poemas. O volume encadernado é: Murilo Mendes, Poesie, organização de Ruggero Jacobbi, traduções de Anton Angelo Chiocchio, Ruggero Jacobbi, Luciana Stegagno Picchio e Giuseppe Ungaretti, Nuova Accademia Editrice, Milão,1961. A dedicatória do volume a mim destinado diz com grande visibilidade numa caligrafia em letras de imprensa:

 

                                                           “PARA SILVIO CASTRO,

                                                           COM OS MELHORES

                                                           AUGURI

                                               POR UMA FELIZ ESTADIA NA

                                                           ITÁLIA

                                                           E O ABRAÇO MUITO CORDIAL

                                                           DE

                                                                                  Murilo Mendes.

                                                           ROMA

                                                           21. NOVEMBRO1962.”

 

 

publicado por João Machado às 10:00
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