A mim, o que me espanta é tanta preocupação com este "direito fundamental das famílias" (vem na Constituição?) , com o respectivo subsídiozinho a actividades privadas, num momento em que se está a retirar a centenas de milhares de cidadãos o direito, fundamentalíssimo - e base de todos os outros - a viver com dignidade, a comer, a comprar remédios; ou, mais cruamente: o direito à vida.
É natural que, perante esta realidade, a jornalista - e muito mais gente - se espante com a simples hipótese de um Estado economicamente tão debilitado, tão trémulo perante os "mercados" (que devem ser uma emanação divina), se propor gastar dinheiro com tal "direito"...
Ainda há pouco, num noticiário televisivo, se narrava o aumento constante do número de pessoas que se vêem obrigadas a recorrer à assistência de diversas entidades, para terem acesso... a comer! Ao que parece, deveriam era estar a pensar em que escola (privada) colocariam os filhos esfomeados... Uma das entrevistadas confessou o que sabemos - já sem espanto, mas sempre com indignação - estar a acontecer a tanta gente, sendo os idosos os mais atingidos: assistida num Hospital, ali estava à espera de comida, sem dinheiro para comprar os remédios que lhe haviam receitado! É claro que também devia mas era estar a pensar nas escolas privadas para os filhos ou netos... Ou talvez em emigrar para a Suécia, o que, aliás, seria recomendável às Donas Alexandras deste mundo, a quem estas minudências de fome, doença e morte, não devem preocupar: o que lhes perturba as meninges é a impossibilidade de acesso dos "mais pobres" (eu não consigo deixar de ler - "menos ricos") ao glorioso ensino privado, à custa do bolso de todos nós. E não é que chego mesmo a ler "dos mais ricos", já que por alguma razão, onde a esperteza mais ou menos saloia não deve faltar, chegaram a esse estatuto ou lá se mantiveram, se lhes adveio por herança familiar?...
O que me espanta, mesmo, é que o Governo e os seus amigos do PSD não contabilizem, no OE, as verbas que vão poupar, só em pensões, com a morte dos muitos milhares de pessoas que, sem alimentação adequada (e, portanto, mais vulneráveis em termos de saúde), sem medicamentos que não podem adquirir, sem outros apoios de saúde que não podem obter, vão tornar-se nas vítimas escondidas, varridas para debaixo do tapete das "fatalidades" e "pressões externas", deste plano de assassínio em massa, friamente premeditado pelos que alegam a "imperiosa" necessidade de sacrifícios... dos outros.
O que me espanta é que me venham ainda falar num "direito", que poderá ser mui fundamental por outros lados, mas, aqui e agora, não passa da última fileira das prioridades, perante este acumular de desgraças, fabricadas por especuladores, deslocalizadores de empregos e outros sacripantas, envernizadas pela cambada de governantes sem espinhaço que infestam a União Europeia - única entidade que poderia e deveria assumir o combate a tais sanguessugas, com medidas claras e duras, de defesa dos mais elementares (e fundamentais) direitos dos seus povos - e com o último polimento dado, em Portugal e não só, pelas transviadas alegações de "prioridades" que permitiriam violar a Constituição e quantos direitos fundamentais fosse preciso, quando o objectivo seja a redução de salários dos mais pobres, por causa da "crise".
Dona Alexandra, aproveite um cházinho das cinco para debater esse momentoso problema, na aveludada intimidade das suas electivas afinidades, onde os graves acenos de assentimento por certo a consolarão do "desconhecimento" da jornalista, eu diria mesmo: da sua insensibilidade. Mas olhe que ela não há-de ser de boas famílias. Valha-nos isso!
Paulo Rato
Paulo, pois se cada aluno privado custa ao Estado menos 1 000 euros que no Estatal e apresenta melhores resultados, porque carga de água é que temos que pagar mais?
A Alexandra Pinheiro, à qual aproveito para saudar e dar as boas-vindas ao nosso Estrolabio, defende uma posição que me parece correcta. O facto, indesmentível, de haver pessoas com problemas económicos mais agudos não nos deve impedir de com lucidez, sem lentes ideológicas e, muito menos, com preconceitos, analisarmos a questão do Ensino e da Educação. A este tema dedicaremos a semana que começa no dia 5 de Dezembro.
Seja bem-vinda Alexandra Pinheiro.
Os "melhores resultados" são tretas, como as cintilantes teorias de que certas empresas poupam com subempreiteiros, a quem pagam menos pelas mesmas tarefas dos trabalhadores que alijaram: só pode ser milagre!
Despejar números, como os dos "rankings" escolares, sem adequada análise do que lhes subjaz, numa área das ciências humanas (é disso que se trata, não de ideias esvoaçantes de amadores convencidos), é uma das espécies de vigarices de consumo mais difundido: até se tiram as conclusões que se quer, basta manipular os parâmetros do "estudo", eliminar uns, deitar mão a outros! São uns criativos, estes rankingueiros: verdadeiros génios da alarvidade.
Não mudei de opinião sobre os espantos alexandrinos acima despejados: considero indecorosa a invocação de "direitos fundamentais" inventados por quem é privadísssimo, ai o Estado credo! mete-se em tudo qu'órror!... mas anda à mama do mesmíssimo Estado, que somos nós, que pagamos as fraudes bancárias e o mais que for preciso (pois sim, sôtor, sôp'essor, atentos a vocências, veneradores... obrigados), e não um qualquer Governo, mero e, em geral, péssimo gerente do que é nosso.
Prioritário é que os governos, a nível europeu, tomem medidas que resolvam efectivamente os problemas, o que implica chatear a sério aqueles que os causaram e ainda se aproveitam disso p'ra caçar mais uns dinheiritos. Os estudos estão feitos, por universitários e economistas bem preparados e sem traumas. Não é preciso nenhuma revolução, basta perceber o que ainda funciona no "sistema" e o que já se provou ter avariado definitivamente.
Quando mandarem à fava as agências de "rating", neutralizarem as pressões dos mercados, chamarem a si a resolução de "crises", défices e dívidas públicas, com o Banco Central Europeu a fazer o que deve (bastava só ameaçarem, para eu ter o prazer de assistir aos temíveis "mercados" a miarem baixinho), taxarem pesadamente as (re)importações de quem deslocaliza fábricas para países onde os trabalhadores são ainda mais explorados, acabarem com "offshores" e outros coios de ladroagem, quando me convencer de que os "gandas ecunomistas" que empestam os média com imbecilidades putrefactas deixaram de ser meros vassalos dos maravedis, estarei, talvez, disponível, para debater privatices alexandrinas com criaturas espantadiças, que tão facilmente esquecem os tais direitos básicos, sem os quais todos os outros não passam de grosseiros simulacros.
Ainda hoje brotou a informação de que, aprovado o OE assassino (e não me digam que os seus perpetradores não sabem que a mortandade de que falei vai fatalmente acontecer, em consequência das suas medidas pseudo-salvadoras), "por pressão dos mercados", o governo já fala em rever outra vez o Código do Trabalho, para flexibilizar ainda mais as facilidades já oferecidas aos patrões dele.
O melhor será aplicarem já a "solução final" nazi aos desempregados, aos pensionistas, a toda essa gentalha que só incomoda as pessoas de bem e, se calhar, até 'tá a prejudicar as crianças de boas famílias! é uma seca! e depois aquela coisa de quererem comer e ter saúde cumás pessoas e fazerem manifestações que nem se pode passar co' carro! e greves e essas coisas todas de gente pobre! Só deviam d'haver alguns p'ra dar esmolinha e ir pó céu! Peccato, amici.
Paulo Rato
De carla romualdo a 28 de Novembro de 2010
Seja bem-vinda, Alexandra. Estou certa de que dará um contributo importante às futuras discussões sobre os temas educativos aqui no Estrolabio.
Creio que o seu texto nos permite reflectir, ainda que esse possa não ser o alvo, sobre a escola pública e o seu progressivo abandono por parte do Estado, e os custos que esse abandono terá para o país. Creio que mais do que alargar a possibilidade de escolha - financiando a inscrição numa escola privada a quem não tens meios económicos para tal - cabe ao Estado investir numa escola pública de altíssima qualidade, a melhor que seja capaz de oferecer às suas crianças e jovens. Se o Estado abdica disto e compensa esse fracasso financiando o acesso aos privados, fracassa duplamente e condena, a curto prazo, todos os que não têm meios económicos (cuja fileira aumenta a cada dia) a uma formação medíocre e que penalizará pessoalmente esses jovens e a todos nós enquanto país.
É um tema pertinente, actualíssimo, e ainda bem que a Alexandra o trouxe aqui.
Este post levou-me ao que escreveu Fernanda Câncio (está no DN online).
Concordo com o Carlos Loures em passar este debate para a altura marcada, mas aconselho o Carlos e os outros interessados a lerem o que escreveu a jornalista.
Vou adiantando que assino por baixo o que diz Fernanda Câncio, também eu não sabia o que
"o contribuinte" anda a pagar.
O ensino privado é de mais que um tipo, mas oportunisticamente são misturados. Bem... fica para depois.
Para já junto-me ao Paulo na oposição ao que tem vindo a ser defendido neste blogue, e ao qual tenho encolhido (erradamente) os ombros.
Eu não compreendo ,se há escolas que apresentam menlhores resultados e com custos mais baixos...
A fernanda Câncio escreveu o que escreveu porque o corte foi feito nos apoios à escola privada contratualizada, baixando de 4 200 euros /aluno para 3 300/aluno, enquanto na escola estatal mantentem-se os 5 200euros/aluno/ano.Há um texto em rascunho em que um dirigente das escolas públicas contratualizadas explica isso muito bem. Estou completamente de acordo com a Alexandra.As pessoas têm direito à escolha e muito mais quando isso representa melhores resultados e é mais barato para todos nós.
Estamos a antecipar o debate que só devia começar de hoje a uma semana. Não tem mal, a não ser que estejamos a gastar munições e depois elas nos faltem na altura devida. Bela entrada, Alexandra - provocou uma «zaragata» das antigas.
Força Alexandra, o que está em equação é o direio de escolha, os resultados e o custo.Ser estatal ou não ,não me diz nada.
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