A autonomia dos jovens ao serviço da igualdade: síntese de um relatório
A juventude é, em França, pouco autónoma. Depende mais que noutros países das solidariedades familiares, o que os poderes públicos incentivam, não somente quanto à vida de estudante mas igualmente para os primeiros anos de vida activa, anormalmente marcados pelo desemprego, pela precariedade, pelos rendimentos modestos. Ora o apoio familiar é um factor importante de desigualdades e não pode garantir uma real emancipação em direcção à juventude. O relatório que publica Terra Nova, coordenado por Guilhaume Allègre , Alain Marceau (1) e Maud Arnov (1), propõe uma inversão de perspectiva em proveito de uma política de autonomia dos jovens. Contém nomeadamente duas grandes medidas, duas grandes propostas : “um capital formação” que garante um rendimento universal de apoio à vida estudante e um subsídio de inserção para os jovens que andem à procura do primeiro emprego, hoje sem recursos.
O aumento do tempo de vida traduziu-se pela criação de uma terceira e depois de uma quarta idade da vida e pelo aumento do tempo de formação inicial e, por conseguinte, pelo aumento também do tempo de juventude, que se pode definir como o período de tempo que separa o fim da escolaridade obrigatória do acesso à independência financeira e residencial. Estas duas idades, o período de formação obrigatória e o outro, o que se segue até se chegar à independência financeira, são caracterizadas pela dependência financeira devida ao afastamento do mercado de trabalho. Mas enquanto que a terceira idade é assumida pela via de segurança e solidariedade social, a dependência financeira ligada à formação inicial e às dificuldades de integração no mercado de trabalho, são em muito grande parte, assumidas pelas respectivas famílias.
O aumento da duração do tempo de estudos era portador de uma dupla promessa: a da emancipação, pelo acesso de uma parte crescente de cada geração a um nível de saber anteriormente reservado a uma elite; a da modernização de uma economia que passa a dispor de uma mãodeobra cada vez mais qualificada. E permitiu o aparecimento de uma nova idade da vida, a juventude, idade das escolhas, das etapas decisivas da vida e da construção de si-mesmo.
A promessa de ontem parece hoje bem estragada. Desde há quinze anos que a taxa de acesso de uma classe de idade ao fim do secundário e aos estudos superiores estagna, relegando a França para bem longe da frente do pelotáo das nações mais avançadas. O objectivo de alongamento dos estudos é ele mesmo reposto em causa: este objectivo geraria uma baixa das exigências escolares, a desqualificação dos jovens diplomados e não conduziria a nenhuma democratização real. A autonomia dos jovens não está ainda para breve. A obsessão do desemprego pesa ao longo de todo o percurso sobre a sua própria construção . Pais, angariadorers de mão-de-obra, instâncias de decisão políticas e os próprios jovens partilham o modelo do percurso rectilíneo em que em cada ano se marca um progresso num itinerário perfeitamente coerente, coroado por uma inserção profissional bem sucedida.
O funcionamento meritocrático do sistema escolar francês funciona contra a autonomia. As comparações internacionais mostram até que ponto a nossa escola está voltada para a selecção de uma elite restrita. A nossa escola não sabe conduzir a maioria dos nossos alunos ao controlo dos conhecimentos fundamentais: à saída do primário, 25% dos alunos têm bases frágeis e 15% têm dificuldades severas ou muito severas. A França é, entre os países desenvolvidos, um dos que reproduz mais as desigualdades sociais existeentes entre os pais. Os alunos franceses são os mais obcecados com o receio do malogro e menos confiantes, o que os prejudica nos exercícios que recorrem à expressão e à criatividade.
O funcionamento do mercado de trabalho funciona contra a autonomia. Os jovens fazem quase todos eles a sua entrada no mundo do trabalho através de um contrato temporário (cdd, os contratos a duração de tempo determinada, ou de trabalho temporário) e, para cerca de um terço deles, esta fase de precariedade dura pelo menos três anos. Cerca de um milhão de jovens é empregado no âmbito do sub-estatuto do estágio, enquanto que eles ocupam frequentemente verdadeiros postos de trabalho.
A protecção social funciona contra a autonomia. Os franceses gostam de pensar que o seu sistema de protecção social é um dos mais generosos do mundo mas, tratando-se dos jovens, não há nada que seja mais falso. Um jovem com menos de 25 anos que procura primeira vez um emprego não tem acesso nem a um subsídio de desemprego, nem ao rendimento de solidariedade activa, o RSA. Se não pode contar com o apoio da sua família, estará então em situação de pobreza, como já estão mais de um jovem em cada cinco , na faixa dos 18 aos 24 anos ; nenhuma outra faixa etária é tão atingida pela situação de pobreza.. Enquanto que a maior parte dos países da Europa ocidental alarga os seus mínimos sociais a partir da idade de 16 ou 18 anos, a França fez a escolha de tratar os seus jovens adultos como menores sociais, que não têm direito quase a nenhuma ajuda por eles mesmos mas abrindo o direito a ajudas de que beneficiam os seus pais: manutenção do quociente familial et dos subsídios familiares, dedutibilidade das pensões pagas aos filhos maiores.
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Há duas razões para promover a autonomia dos jovens. É uma condição de instauração de um novo modelo de desenvolvimento, assentando sobre o investimento em capital humano. Longe de tomar o caminho de realizar o objectivo de 50% de uma classe de idade diplomada do ensino superior fixado pela União Europeia , a França, se não rectifica o caminho, verá o seu número de estudantes diminuir de 200.000 daqui a 2017. A autonomia dos jovens deveria também estar no centro de uma concepção moderna da igualdade, que não tende a uniformizar os indivíduos mas a permitir que cada um construia as suas próprias escolhas.
As dificuldades de financiamento, se estas não são as únicas em causa, pesam fortemente sobre a continuação de estudos superiores: autocensura dos filhos de famílias modestas, a obrigação de trabalhar em proporções nefastas ao sucesso universitário, sobre-representação das formações superiores curtas (STS, IUT) em relação aos nossos parceiros europeus. A França distingue-se também pelo muito fraco acesso dos adultos às formações contínuas que qualificam, permitindo realmente aprender o ofício. É por isso que propomos atribuir a todo e qualquer indivíduo com mais de 18 anos “um capital formação ”, financiado pelos poderes públicos, que lhes permite prover às suas necessidades durante três anos de estudos superiores ou de formação contínua. Qualquer indivíduo terá assim o direito de atingir um nível igual à licenciatura e a ser remunerado.
O capital formação permitirá fornecer a qualquer estudante ou adulto em formação contínua um rendimento de 460 euros por mês durante 3 anos. Cada indivíduo poderá escolher completá-lo por um empréstimo protegido, garantido; as mensalidades de reembolso serão calculadas em função dos rendimentos recebidos na sequência dos estudos ou da formação adquirida. O direito ao capital formação será atribuído independentemente do rendimento dos pais. Substituir-se-á ao sistema actual das bolsas e todas as ajudas atribuídas às famílias nos termos de serem filhos maiores (quociente familiar, subsídios familiares, dedutibilidade das pensões).
A proposta de capital de formação aproxima-se , em certos pontos de vista, da proposta de subsídio de autonomia, defendida desde há muito tempo pela União Nacional dos Estudantes de França (UNEF). Distingue-se, contudo, sobre certos pontos: numa óptica de formação ao longo de toda a vida, não é reservada aos estudantes mas referida também aos adultos em formação contínua; cada indivíduo dispõe de um capital mobilizável ao longo de toda a sua vida; o sistema é completado por um empréstimo protegido, garantido.
Outros países instauraram certas formas de remuneração da vida estudantil. A Suécia e a Dinamarca oferecem a qualquer estudante uma combinação de subsídio e de empréstimo protegido, garantido; o Reino Unido financia bolsas para os dois terços dos seus estudantes (contra 20% em França) e com empréstimos protegidos para todos. A ordem de grandeza do custo líquido do capital formação, após dedução das economias realizadas graças à supressão das ajudas às famílias, pode ser avaliada em cerca de 4 mil milhões de euros. É uma despesa da mesma ordem que os dispositivos bastante inoportunos como o IVA a taxa reduzida para a restauração ou a não tributação das horas suplementares.
A criação do capital formação não deve ser decidida separadamente. Deve inscrever-se num conjunto de reformas destinadas a promover a autonomia dos jovens, atingindo tanto o sistema educativo como a orientação e o mercado de trabalho
A reforma do sistema educativo deve quebrar a norma dos percursos rectilíneos que são uma especificidade francesa, e questionar a lógica meritocrática . O número de repetições deve ser limitado de maneira drástica. A fim de revalorizar as vias tecnológicas e profissionais do ensino secundário, é necessário garantir o acesso dos seus titulares ao ensino técnico superior (Institutos Universitários Tecnológicos, IUT e Brevet de Técnico Superior, BTS).
Os primeiros ciclos universitários devem ser inteiramente reformulados, integrando o que faz a força das classes preparatórias: pluridisciplinaridade, reforço do enquadramento. Todos os cursos universitários deveriam ter um semestre obrigatório “de mobilidade”; uma larga escolha seria proposta aos estudantes sobre o teor desta mobilidade (ano no estrangeiro, experiência profissional, formação complementar da formação principal).
A preparação para a entrada na vida activa deve ser da competência da responsabilidade de um serviço público da orientação concebido como a rede dos que a não têm . Os progressos na lei sobre a responsabilidade das universidades de 2007 são insuficientes. O serviço público da orientação terá por missão o ajudar na construção de um projecto pessoal, na constituição de uma rede e na colocação dos estudantes em ligação com os empregadores, pela organização de encontros com os empregadores ao longo do percurso escolar. Poderá ser levado a efeito no âmbito de parcerias entre as universidades e associações, na gestão das quais os próprios estudantes têm um papel activo a desempenhar.
A precariedade não deve nunca mais ser a norma da entrada na vida activa. Como os parceiros sociais se tinham empenhado no acordo interprofissional sobre a modernização do mercado de trabalho em 2008, um subsídio fixo à entrada de 460 euros por mês deveria ser garantido a qualquer jovem à procura de emprego com menos de 25 anos e que não tenha adquirido ainda suficientemente direitos para entrar no sistema de segurança social. Trata-se, para os jovens entrados no mercado de trabalho, do correspondente ao capital formação atribuído aos estudantes. A fim de lutar contra o recurso excessivo aos contratos temporários (CDD, trabalho temporário), as contribuições para o seguro de desemprego deveriam ser mais elevadas sobre este tipo de contratos.
(1) Alain Marceau e Maud Arnov são pseudónimos de altos funcionários especialistas das políticas sociais
Groupe de travail Terra Nova, coordenado por Guillaume Allègre, Alain Marceau e Maud Arnov, L’autonomie des jeunes au service de l’égalité, Novembro de 2010.
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