Segunda-feira, 28 de Fevereiro de 2011

Uma adenda à Carta Aberta a Mariano Gago - por Júlio Marques Mota

No fascismo não era necessário pensar, pensavam por nós, por isso era proibido pensar.

 

Há um dia ou dois ao falar com um dos meus colegas de trabalho sobre a carta aberta ao Ministro Mariano Gago, lembrei-me de uma conversa, há muitos anos havida, com o meu antigo professor, José Baptista Martins, a quem publicamente presto homenagem. Disse-me ele que em tempos de rapaz novo fazia com outros jovens uma espécie de think thank, junto do Engenheiro Araújo Correia que foi durante muitos o Presidente da Caixa Geral dos Depósitos e homem de extrema confiança de Salazar. E a esse propósito conta-me uma história que vale esta adenda: os americanos queriam Portugal inserido no Plano Marshall. Quem terá iniciado as negociações foi exactamente o engenheiro Araújo Correia. E o que os americanos estariam dispostos a financiar não era nada mais nada menos que a barragem do Alqueva e a regularização do rio Tejo em que ainda hoje falta muito para a concluir e de que a propósito dela se fala na carta quando nos referimos às águas sujas em Vila Franca de Xira. Salazar “heroicamente” recusou a ajuda, pois não precisávamos, podíamos viver “orgulhosamente sós”!

 

 Ainda nesta linha, mais tarde estou com um dos herdeiros do Engenheiro Araújo Correia, meu amigo e colega de curso, João Augusto Domingos, e é-me dado a ver um documento fabuloso: o projecto de financiamento para o Bairro de Encarnação, creio, que foi apresentado ao primeiro ministro António Oliveira Salazar. Neste documento, duas coisas a ressaltar: a primeira, as contas do projecto eram verificados por Salazar, nas margens do documento, ao nível do tostão e a lápis. O nosso “homem de Estado” tinha do futuro a dimensão do centavo mesmo, uma dimensão curtíssima, reduzidíssima, portanto, e foi bem isso que se viu; e a segunda característica do documento, referia-se a uma nota digna de facto do fascismo. Dizia-se nesse texto mais ou menos isto, que me foi relatado nessa altura: as casas do bairro de Encarnação eram concebidas para que os locatários não tivessem sequer que se questionar, o locatário e o local não eram feitos para pensar, isso cabia a outros. Fiquei com a ideia que este texto escrito terá sido escrito pelo próprio Araújo Correia.

 

Desta nota ressalta a ideia que o espólio da biblioteca de Araújo Correia , hoje na mão da família Domingos, de Castelo Branco, família de raiz profundamente democrática, alberga muita informação que ao país conviria saber e que muitos jovens precisam mesmo de aprender para que assim aquela realidade nunca, mas nunca mesmo se permita esquecer. Fascismo, nunca mais. E, seria bom que homens apaixonados pela História e competentes na sua análise estivessem disponíveis para trazer à luz do dia muito desses factos ocorridos e que assim com a sua interpretação quebrassem a capa que a poeira do tempo lhes teceu. Estou-me a lembrar, por exemplo e só a título de exemplo, de João Ferreira do Amaral ou de uma equipa que ele pudesse dirigir e se a família proprietária assim o consentir. Mas disto, eu não duvido, é este o meu sentir.

 

Já depois do texto escrito contactei a família Domingos. Um dos herdeiros leu-me o texto acima referido pelo que me foi dito nos termos citados, nessa altura, e estamos a trinta anos de distância, onde se pode ler, o que passo a transcrever : “O novo plano de habitação tem que obedecer a condições de solidez, isolamento e distribuição de quartos que a tornem de fácil uso, higiénicas e de quase automática utilização. O novo habitante deve ser orientado pela casa, na disposição dos seus móveis, ser-lhe-á por assim dizer imposto o modo de ali viver, os lugares onde é colocada a cama, onde é lavada a roupa, a posição da mesa de comer, o espaço do quintal, onde crescerão as flores, o sítio mais propício para as crianças poderem brincar, e mesmo o lugar mais próprio para galinheiros, plantação de árvores ornamentais ou de fruto. Tudo se resume numa simples frase: ao novo habitante será poupado o esforço de pensar sobre o lugar ou lugares em que vai desenvolver a sua actividade doméstica.

 

A colaboração de boas donas de casa no arranjo do plano interno será provavelmente útil a todos os concorrentes” (arquitectos a concorrer com os seus projectos. Nessa sequência fui eu próprio informado de que a família com muito gosto porá a Biblioteca do Engenheiro Araújo Correia à disposição do Professor João Ferreira do Amaral.

 

Da minha parte, leitores no Estrolabio, é tudo.

 

Júlio Marques Mota

publicado por Carlos Loures às 22:00
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