Quarta-feira, 25 de Agosto de 2010

O crescimento das crianças

Raúl Iturra

 Capítulo 1.2º parte


A Saber.


Steven Stoer (1991 e 1998), Luiza Cortesão (1995 e 1988)), Luís Souta (1997), de entre os meus próximos na pesquisa, ficavam encantados com uma situação de objecto científico como esta. Encantados, porque é uma situação multicultural, á qual eu acrescentava, multitemporal. Porque a multicultura, não é apenas de uma etnia diferente. É também o tempo diferente, as gerações diferentes dentro do mesmo tempo, e, mais ainda, o saber diferente. Victoria, Pilar, Anabela, estão a retirar o seu saber para avaliar, das camadas de ideias que, um dia, ficaram todas coladas. Coladas pela sua sedimentação no tempo, pelo sincretismo que a população teve que organizar, para juntar normativas condutoras do comportamento, provenientes de outras épocas. Bem como, de outros Continentes. E de outras terras do mesmo Continente. E de outras experiências conjunturalmente mutáveis. E de outros costumes, credos e leis. Embora, sintetizadas de forma subsumida, á época actual. Subsumida á Historia, á sua interpretação, á cronologia que vou referir mais em frente, como tempo. Dentro de um conjunto heterogéneo de experiências comportamentais. Onde, como diriam Goody (1986) e Scribner & Cole(1981) e Gough(1981) e Locke (1690), a escrita abafou á oralidade. Uma oralidade que fez os mitos (Lévi-Strauss (1962b)), Maurice Godelier (1984), Sigmund Freud (1913)), lembrados apenas nos factos da troca reprodutiva, na orientação da afectividade, nos santos, e nas festas. De facto, para Victoria é normal que um homem tenha muitas mulheres. Um homem sem muitas mulheres, acaba por não ser do género masculino.

Monumento a Pedro de Valdívia em Santiago do Chile.               

O papel do homem é coordenar o trabalho reprodutivo, quer do conhecimento tecnológico, quer do trabalho das pessoas, quer ainda, do tempo. Os Picunche, mal se lembram de serem parte da etnia Mapuche. E ficam assim definidos. (José Bengoa, 1985; Sérgio Villalobos, 1974; Leonardo Castillo 1996) da terra denominada Chili pelos Quechua. Foram os Quechua, que disseram ao Conquistador Espanhol do Chile, Pedro de Valdivia (1542), de que ia á terra do frio, é dizer, do chili - embora muitas disputas existam sobre o facto (Francisco Frias Valenzuela, 1986; Jaime Eyzaguirre, 1963; José Bengoa 1985; Sérgio Villalobos 1974, Luís Silva Pereira 1998; Elias Lizana 1909, e o Historiador local oral de Pencahue, Luís Bravo). Os Picunche, abatidos pelos colonizadores a começos do Século XVI (Arquivos da Igreja de Pencahue), e reduzidos a sítios denominados Doutrinas: (Rauquen, Libun, Toconay, Tapihue, Carrizal), tiveram que se comportar como os seus invasores espanhóis e algum português prévio a Tordesilhas. Sitos na Cordilheira de Los Andes, a viverem em extensões entre o que hoje é o Chile e a Argentina, como vou analisar no capitulo 2 , viviam dos pastoreio das vicuñas, llamas e guanacos, e das lãs desses animais que os Inca ensinaram a cardar e tecer.

O trabalho de todos eles estava dividido entre animais, terra, confecção do carvão, e outras actividades relacionadas com o tear. Todo grupo precisava de muito trabalho em pessoas ( Raúl Iturra 1971; Karl Marx 1857; Jack Goody 1976, Kart Polanyi 1944; Brian O’Neill 1987), para dar conta do seu. Um homem é homem, se é capaz de guardar a reprodução de forma conveniente para todos. As Doutrinas, estavam encarregadas de ensinar a ideia da monogamia, que Tomás de Aquino, tinha já defendido em Paris (1267-73). No entanto, é sabido o facto da mistura de povos pela sua hierarquia. É surpreendente ver como aparecem escritas as categorias verbais e conceituais novas e antigas de Espanhol, Yndio ( não é gralha, é a forma antiga da escrita), Mestiço, Mulato, Escravo, e, finalmente, Chileno, entre os séculos 17 e hoje. Victoria sabia que ter mais irmãos de outras mulheres, era uma forma de ser normal. O não comum, era não ter esses irmãos. E ela, sabia e convivia com eles. O que Victoria não sabia, é que Tomás de Aquino tinha razão, quando dizia que a poliginia era injusta para as mulheres: algumas eram amadas, outras iam sentir de que não. Como a Yeyé. Quando, no mesmo ano do matrimónio, o seu pai Clodomiro tem um filho com Rebeca Troncoso. Victoria diz que a Yeyé sofria: o homem era dela, e dele estava também grávida! O que Victoria não diz, não entanto, é de que a sua mãe ilibou à Clodomiro para casarem, enquanto Rebeca estava grávida e oficialmente, noiva do seu pai. Victoria o não diz, porque tem uma outra ideia ao pé da ideia factual: todo matrimónio é por amor, monogâmico, heterossexual e eterno. Pelo menos pela lei Huinca. Bem como uma mãe, é uma pessoa para ser amada, respeitada e servida. Se houver outra mulher, esta é uma intrusa que deve ser eliminada, ignorada, temida e aborrecida. Este é o saber de Victoria distante das ideias Mapuche. Saber de ideias mitológicas e de factos entendidos conforme for. A sua mãe rouba o noivo da amiga e vizinha Rebeca Troncoso, alastra consigo ao homem a outras terras, tem vários filhos com ele. O roubou para fora de Pencahue. Rebeca ia casar grávida; Yeyé, grávida, rouba ao Clodomiro Pencahue fora. Ao qual voltam depois de vários meses a dar a luz o primeiro. Persistente na sua ideia de macho, o seu pai Clodomiro vai andando pelo meio de varias senhoras, até que a Yeyé o deita fora de casa e abre a dita pensão. Passava a ser a primeira mulher a fazer a denominada cruz ao marido. Mais tarde, a irmã mais velha de Victoria, Beatriz, faria o mesmo como o seu. E reclama, publicamente, ser ela a primeira mulher a faze-lo: o caso da sua mãe era calado, o homem habitava parte do lar, casa da sua propriedade. O marido da irmã Beatriz, tem que escolher e é publicamente afrontado na rua, e deve partir. Com filhos já crescidos. Diferente ao caso do vizinho Castillo, que Victoria conhece, mas não menciona. Castillo tem varias casas e transita entre uma e outra, e as mulheres convivem entre elas, bem como os irmãos, que organizam entre eles, a reciprocidade maussiana (Marcel Mauss 1924; Bronislaw Malinowski, 1922; Raúl Iturra 1971,1977 e 1988) a volta’e mau - é dizer, entreajuda ou devolver a mão (Milán Stuchlick, 1976; Luís Silva Pereira 1998). Facto que se comemora com os almoços dominicais nos túmulos dos defuntos, quer aos domingos, quer às festas. E é nessas actividades, que hoje é guardada a harmonia das pessoas entre elas todas. Victoria sabe que o cemitério, é um lugar de encontro, ao qual ela não vai, para não estar com o pai, caso ele aparecer. A vizinhança de Pencahue, vive a poliginia com calma, uma poliginia heterogénea sexual. É dizer, uma mistura amorosa - e português por Hermínio, ele diz ter tido a arrogância de namorar à loura e esguia vilatuxeana, que lhe ia dando filhos, enquanto ele passeava a cavalo e tinha o prazer de correr por entre as ruas do lugar de Vilatuxe, um dos catorze lugares da Paroquia, à qual dá nome. Pilar vive entre a doutrina e o facto. E talvez saiba também, porque na sua família todo é falado, de que a mãe do Hermínio, a sua avó paterna, tinha grandes períodos de ausência, ou nas suas terras de Carrefeito na vizinha Paroquia de Lebozán, ou nas termas, alhures. Bem como é conhecido que o mal de amores da irmã do seu pai proibida de casar com um vizinho de outro Lugar da Paroquia de Vilatuxe, é por ela curado intimamente com esse vizinho. Intimidade da qual nascem filhos que morrem. A experiência de Pilar, em matérias afectivas que tanto tenho salientado nos meus trabalhos com crianças, está trespassado de exemplos de divisão de seres humanos, pela afectividade reprodutiva. O próprio filho da irmã de Hermínio, é logo deserdado por causa do seu casamento com uma pessoa não aceite pela arrogância de proprietária enfiteuta da avó paterna. A hierarquia social joga, no caso galego, um papel forte dentro da interacção. Os proprietários de terras que eram dadas em enfiteuses (Raúl Iturra, 1988), não acolhiam aos indivíduos os seus servidores, dentro da família. Não havia conhecimento explícito do parentesco com a Casa de Lemos e de Alba, do qual se falasse na cozinha, ao pé do lume. Havia um mito que percorria à família e que acabava por ser engraçado: ser descendentes de um Padre, como eles pensavam, porque de facto o bisavô incógnito era Advogado de Direito Canónico pela Universidade de Compostela. Era a contravenção à regra estabelecida, especialmente entre católicos não praticantes, ainda que concorrentes a todo mito possível. Crentes relativizados, gostavam brincar com o facto. Mas, quer Pilar, quer a família, no dia de saberem serem parentes dos Lemos e dos Alba, ficaram em grande alvoroço, que eu presenciara. E brincara: Hermínio, disse, tem que trabalhar na mesma, pagar impostos e não imaginar que vai ser recebido pela família ducal. E Hermínio riu. O filho mais novo, gentil, senhor, genro de um galego emigrado em Venezuela e amigo do Embaixador desse País, empregado de uma funerária, um senhor de ver, é quem mantém relações eróticas com homens e mulheres. Victoria vai sinalizando as casas dos homens, onde reúnem a beberem e se amar entre eles. Eu próprio tive a experiência de ter o meu carro lavado e, em trocas, não foi o dinheiro o pedido, bem como a minha pessoa, o que eu agradeci e declinei. Facto que não fizera o Pároco anterior ao actual, que acabou por ir embora a uma cidade perto, com um primo de Victoria. Local onde trabalham e convivem, em paz e serenidade com a população; se não ficam em Pencahue, é para não terem rivais entre os outros homens e as famílias. Porque os homens Picunche, hoje inquilinos, vivem publicamente com as suas mulheres, e privadamente como os seus homens, como é sabido de outros grupo étnicos locais ( Milán Stuchlick 1976; Mireille Simoni-Abbat 1976; Maurice Godelier 1982; Gilbert Herdt1981; Michel Foucault, 1966; Anthony Giddens1991; Henry Junod, 1913). É o facto que divide a Victoria e a sua geração, europeizados à antiga, pelas doutrinas do passado Concílio de Trento (1521) que mandava todos serem católicos. Doutrinas pregadas na Doutrina pelos Padres Agostinianos e seculares da Cidade de Talca. E os seus filhos, feitos Padres depois, como vou argumentar no capítulo 2. O entender do saber de Victoria é cimentado pela emoção da morte repentina e a idade nova, da sua mãe Yeyé. Aos 64 anos, em uma terra na qual, normalmente, morre-se aos cem ou cento e vinte anos de idade.



O saber de Pilar é também heterogéneo. O próprio comportamento dos seus pais, é diferente do que ensinam na sua galega doutrina cristã, a catequeses, começada no dito Concilio de Trento. Hermínio e Esperanza, os seus pais, casam quando vai nascer outro rebento da paixão. Às cumpridas noites ao pé do fogão todos nos, e com uma Esperanza que só fala e entende o galego, mas contado entre galego, castelhano e português por Hermínio. Ele diz ter tido a arrogância de namorar à loura e esguia vilatuxeana, que lhe ia dando filhos, enquanto ele passeava a cavalo e tinha o prazer de correr por entre as ruas do lugar de Vilatuxe, um dos catorze lugares da Paróquia, à qual dá nome. Pilar viver entre a doutrina e o facto. E talvez saiba também, porque na sua família todo é falado, de que a mãe de Hermínio, a sua avó paterna, tinha grandes períodos de ausência, ou nas terras de Carrefeito da vizinha Paróquia de Lebozán, ou nas termas, alhures. Bem como é conhecido que o mal de amores da filha, irmã do seu pai e proibida de casar com um vizinho de outro Lugar da Paróquia. Amor que é curado por ela na intimidade com o proibido vizinho, intimidade da qual nascem filhos que morrem. A experiência de Pilar e matérias afectivas, que tanto tenho salientado nos meus trabalhos com crianças, está trespassado de exemplos de divisão de seres humanos, pela afectividade reprodutiva que une sempre a dois. O próprio filho da irmã de Hermínio, é logo deserdado a causa do deu casamento com uma pessoa não aceite pela arrogância ideal de proprietária enfiteuta da dita irmã. A hierarquia social joga, no caso galego, um papel forte dentro da interacção. Os proprietários de terras que eram dadas em enfiteuses, não acolhiam aos indivíduos seus servidores, dentro de família. Não havia conhecimento explícito do parentesco com a Casa de Lemos e de Alba, do qual se falasse na cozinha, ao pé do lume. Havia um mito que percorria a família e que acabava por ser engraçado: serem descendentes de um Cura. Era a contravenção as regras estabelecidas, especialmente entre católicos que gostavam dizer não serem praticantes. Ainda que fossem a todos os rituais da Paróquia. Crentes relativizados, gostavam brincar com o facto. Mas, quer Pilar, quer a família, no dia de saberem que eram parentes dos Lemos e dos Alba, ficaram no grande alvoroço que eu presenciara. E com o qual brincara: Hermínio, disse, tem que trabalhar na mesma, pagar impostos e não imaginar que vai ser recebido pela família ducal. E Hermínio ria. O filho mais novo, gentil senhor, um senhor de ver como o pai, é quem mais queria saber dos factos. A Historia aprendida por eles era complexa: o mundo estava, pelo menos, dividido em dois, os senhores e os trabalhadores que tinham que estrategizar o seu comportamento, manipular a realidade, para poder ser o que eram. Para viver e se reproduzir. Uma casa que tinha o grupo habitual para trabalhar em conjunto, com mais casas a participar, por se terem casado os filhos e formado um lar ao pé do lar paterno. Em terras cedidas pelo casal aos filhos: a Vila Medela, como costumo dizer a eles. O saber estava fechado na língua galega, agora livre e obrigatória para os estudos e habilitações. Esse engano de ter uma língua própria, que acaba por os afastar da língua do poder, o Castellano, ainda que os documentos oficiais estivesse oficialmente traduzido. Os conceitos, eram eruditos; e a lei, obrigatória. Como vamos ver no Capitulo 4. Como Assier-Andrieu (1987), Handman (1978), Goody (1971), Fortes (1987) e eu próprio (1991), temos estudado, entre outros. Giddens (1991) tem sido, como Bourdieu (1997), o mais claro no que diz respeito as identidades e solidariedade, da mesma forma que Gellner(1992) fala de nacionalidades, de essa identidade que o referido Tony Giddens diz ser a identidade de grupos pequenos dentro de um mesmo povo (1991). È ai que Pilar aprende, ensina ao filho, e não tem asso para transferir o que ela viu, ouviu e calou, e precisa continuar a calar. A infância de hoje, não entende o que os jovens pais, essas crianças que conheci ontem, dizem. Nem querem saber. A autonomia e a individualidade, são parte integral da defesa para a reprodução. As minhas crianças solidárias de ontem, são os adultos concorrentes de hoje, de carro e telemóvel, de perfume e fato, de habilitação universitária ou técnica, sem entender o trabalho do seu adulto. Facto que faz corte na comunicação. Mesmo entre irmãos de anos de diferença. Ou de amigos da mesma geração. Bem difícil é para o pequeno Carlos de ontem, esse grande amigo de Pilar, esse o meu filho emotivo na sua infância, visitar aos seus pais e falar com eles. Como difícil é para o filho mais velho do Hermínio, antigo pastor, hoje comerciante e camionista, falar com a sua irmã emigrante, a que mora em Castela. Pilar sabe que só o facto de os pais serem vivos, é o que junta aos irmãos, habituados como estão á cozinha da mamã Esperanza, que a todos sempre nos regalara deu o prazer de fazer o melhor comer. Eis o que fica do que Goody (1973) denomina Grupos Domésticos, a panela compartida. Porque o teto partilhado, já não o é, bem como o não é o trabalho da aldeia. O saber está dividido entre os jovens pela música, a pintura, a medicina, as leis, a arquitectura, as ciências do mar (ver anexo 1) Pilar vive a transição que Victoria começa a ter. Pencahue é o novo sítio a começar outra mudança, Vilatuxe já teve varias, Vilaruiva anda por essas vias desde meados do Séc.XIX.

Anabela o sabe. Como o diz no seu texto escrito como Historia de vida Ou estudava, ou ficava no café, a ser empregada do pai. Um pai que aceitou os seus estudos, desde que ficarem perto do sitio onde moram. E assim foi que o investimento foi feito. Investimento que o irmão Luís não teve, e foi preciso para ele trabalhar fora e estudar á noite, para ser Gestor. As crianças de ontem de Vilaruiva, andam todas pelos estudos mais adiantados do secundário, via estudos superiores. O saber de todos, como Anabela, a pioneira fez, é a de aceitar as regras económicas da União Europeia. O próprio pai assim entendeu, e organizou o clube ou centro de Vilaruiva, que concorre com a decadente Igreja local nas suas festas. Decadente na reunião, não nos ritos. Os ritos existem, estão aí, com um poder único para os gerir, o poder sacramental, respeitado por todos. Ainda pelos que organizam o centro e as festas locais. Não há circulação de pessoas, se não é feita ritualmente. Por todos. Ainda, pelos que reclamam a falta de Divindade. Como diz um vizinho, quer em Vilaruiva, quer em Pencahue, quer, também, em Vilatuxe: não há cinema aos domingos, e cá na Igreja que a gente se vê. È esse o saber de Anabela. O saber que traz a calma para atender as velhas avôs em casa, doentes e cansadas. O saber que traz a hierarquia não social, mas a familiar, por cima da social. Porque a social, sabe ela, é assunto individual, assunto próprio, não da família. Ideia não compartida pelas quatro gerações que esta família, como outras, tem já: a longevidade, a higiene, a mudança de trabalho, os hábitos alimentares, o divertimento feito com a mente e não com o corpo, têm definido um saber que cultiva a solidariedade no campo íntimo. Um saber que, aprendido da escola que teve que atender na aldeia (Iturra 1990a), Reis 1991 , Raposo 1991, Porto 1991), a fez mudar o seu relacionamento com os seus alunos, lá perto de Viseu. As crianças cresceram do humanismo cristão de Mounier (1939) e de Maritain (1942), para o neo-liberalismo português, importado de Chicago, do saber dos Friedman (1979). Neo-liberalismo do qual todos lucram, sem emigrar, mas a se contratarem em outros sítios ao saberem lidar com os Bancos, a lei, e terem habilitações.
publicado por Carlos Loures às 15:00
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Quinta-feira, 24 de Junho de 2010

A Selecção do Chile no Mundial de 2010 ! - 2

O Chile, como sabemos, está no fim do mundo, ao Sul, entre o Peru, a Bolívia ao Norte, a Argentina a Leste, e a Antárctica, no Sul do Sul.

Sabemos que foi habitado pelo povo Mapuche, ensinado a trabalhar (sobretudo ao nível da agricultura e dos sistemas de rega), a ler e a contar pelos Inca, até ao Século XV. Século em que os Espanhóis chegaram à hoje América Latina. Bem trataram os novos invasores de matar os poucos que apareceram, pois os Mapuche continuaram, no país, a ser milhares de pessoas, divididos em clãs. O primeiro europeu a conhecer o território chileno foi o português Fernão de Magalhães, na sua tentativa de circum-navegação do planeta sob as ordens de Carlos I, Rei de Espanha, sem, contudo, entrar em terra. O primeiro explorador de grande parte do território chileno foi Diego de Almagro, sócio de Francisco Pizarro na conquista do Peru.

As disputas que teve com Pizarro pela divisão das riquezas do destruído império Inca levaram-no a aventurar-se nas terras do sul. Almagro partiu de Cuzco em Julho de 1535. Muitos historiadores acreditam que uma das razões da viagem de Almagro está ligada a rumores da existência de um reino muito mais rico que o Inca, o qual poderia ter surgido de forma intencional como forma de debilitar as investidas conquistadoras e assim permitir uma rebelião nativa.

Depois de percorrer o caminho do Inca (cruzando territórios correspondentes às actuais Bolívia e norte da Argentina), Almagro realizou a travessia da cordilheira dos Andes com terríveis resultados: a maior parte da sua comitiva morreu durante o percurso devido à hipotermia. Ao fim de mais de nove meses, Almagro chegou ao vale de Copiapó, em 21 de Março de 1536.


Organizando o reconhecimento da sua governação sobre Nova Toledo (nome dado ao território cedido ao conquistador por parte do monarca espanhol), não encontrou as riquezas que tanto buscava. Um confronto ocorrido em Reinohuelén entre os indígenas e uma das patrulhas dos invasores é considerado a primeira batalha da Guerra de Arauco, que, até à actualidade, ainda não acabou…. Decepcionado e cansado da desastrosa viagem decide voltar ao Peru, em 1536, tomando a rota de Arequipa até Cuzco, onde se rebela contra Pizarro.

Em 1540, Pedro de Valdivia levou a cabo uma segunda expedição, com a qual se iniciou o período da conquista. Este, ao contrário de Diego de Almagro, tomou a rota do Deserto de Atacama.

Ao chegar ao vale de Copiapó, toma posse solenemente do território em nome do rei de Espanha e nomeia-o Nova Extremadura, em homenagem à sua terra natal. Renova a marcha até ao vale do Aconcagua, onde o cacique Michimalongo tentou detê-lo sem êxito. Em poucos meses Valdívia foi proclamado pelo cabildo Governador e Capitão Geral da Nova Extremadura. Inicialmente rejeitou a ideia, vindo, porém, a aceitar o cargo em 11 de Junho de 1541.




















Pedro de Valdivia

Nesta primeira etapa lutou contra os indígenas do norte do país, tentando consolidar a dominação espanhola naqueles territórios; quando dispôs de mais tropas iniciou a ocupação dos territórios situados mais a sul e iniciou a fundação das cidades: La Serena (1544), Concepción (1550), La Imperial (1552), Valdivia (1552), Villarrica e Los Confines (1553).

Em 1553, data em que o país parecia definitivamente pacificado, os Mapuche, dirigidos por Lautaro e Caupolicán, iniciaram uma insurreição, onde Valdívia, num dos combates, perderia a vida. O novo governador, García Hurtado de Mendoza y Manríquez (1557), posterior vice-rei do Peru (1589-1596), reconstruiu as cidades destruídas, mas não obteve sucesso sobre a resistência dos indígenas.

Acrescento unicamente, pois já aqui abordei esta temática, que o seu captor e juiz, foi Lautaro, seu antigo pajem que entrara ao seu serviço com 15 anos de idade, para descobrir os segredos destes estrangeiros ou Huincas, na língua Mapudungún (ou língua da terra). Lautaro, depois de mais de dez anos ao serviço dos invasores, organizou a sua Nação, milhares de clãs Mapuche juntaram-se para um assalto final com o objectivo de expulsarem os Huinca, mas, aconteceu uma tormenta, levando os Mapuche a pensar que se tratava de uma vontade do seu Deus Pillán, ou Rei do mato, para que os estrangeiros continuassem no Chili - país do frio em Quechua, país distante, em Aimara, esse antigo nome da hoje República do Chile.

República que, apesar de comemorar a sua independência como colónia da coroa de Espanha a 18 de Setembro de 1810, de facto ficou livre dos conquistadores bem mais tarde, com a chegada do Exército dos Andes, a cargo do general argentino José de San Martín, incorporado por Bernardo O'Higgins, líder das milícias chilenas. Este Exército Libertador, que inicialmente contava com 4.000 homens e 1.200 membros da tropa de auxílio para condução de mantimentos e munições, cruzou a Cordilheira dos Andes e em 12 de Fevereiro de 1817 derrotou as tropas reais na Batalha de Chacabuco, dando início à Pátria Nova.



Batalha de Maipú, por Rugendas

O'Higgins foi nomeado Director Supremo e, em 12 de Fevereiro de 1818, primeiro aniversário da Batalha de Chacabuco, declara formalmente a independência do Chile, que se confirmaria com a vitória do exército chileno na Batalha de Maipú, em 5 de Abril do mesmo ano.

O seu Governo, como Director Supremo, acabou em 1833, ao entregar o seu mando ao descontento Congresso de Senadores e Deputados. Exilou-se no Peru, onde faleceu, voltou ao Chile com honras militares quarenta anos depois.

O Chile não foi um país pacífico, enquanto se ia formando essa nova República, que acabou por ficar em paz em 1990. Dois Presidentes morreram no desempenho do seu cargo: José Manuel Balmaceda, asilado na legação Argentina até à data em que terminava o seu mandato, a 19 de Setembro de 1891. E Salvador Allende, assassinado pelo levantamento das Forças Armadas, a 11 de Setembro de 1973, crime organizado, como se sabe, por Nixon e Kissinger, a burguesia chilena e a CIA. Deposto o Ditador, a República voltou às suas festas, a lucrar de um alto PIB com as minas de cobre e carvão, a tomar onces em casas de amigos ou na própria, o alimento mais importante a seguir a um forte almoço. Continuou a ser um país confessional católico, a organizar uma vida em família estreita, carinhosa e amável. Como se nunca nada tivesse acontecido. Esse lanche de tomar onces, é quase um ritual sagrado e a família espera os seus membros para comerem todos juntos. À noite, apenas uma sopa, deitar cedo, porque todos os trabalhos se iniciam pelas 7 da manhã. Férias, poucas e curtas; dias de Santos, apenas em pequenas vilas, e lentamente vão acabando. Até a famosa Sexta-Feira Santa, é comemorada numa segunda-feira adequada.

É o que esta selecção representa: um país acomodado e trabalhador. País do meu berço, apesar de ser Huinca por todos os costados da família, que, por causa de uma viagem de prazer, ficaram no Chile ao falecer no transatlântico, a mãe de duas raparigas e dois rapazes. O luto era prolongado, as crianças cresciam e foram estudando, transferindo bens de Espanha para o Chile, até se esquecerem das suas origens, como muitos no Chile.

Lautaro e O´Higgins, foram os fundadores da Pátria, que deverá levar esta selecção a ganhar…

Fonte: a minha memória, os historiadores, uma imensidão deles no Chile, e as saudades de tomar onces sempre só e quando calhava. E rememoro esses dias alegres e saborosos que dois terramotos quiseram destroçar, sem conseguirem dobrá-lo: o da ditadura e o da natureza ocorrido a 27 de Fevereiro deste ano, que ainda não pára…
publicado por Carlos Loures às 15:00
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