Quinta-feira, 13 de Janeiro de 2011

Coordenação de Augusta Clara de Matos

 

 

 

 

Entre o Eden e o Inferno (I)

Carlos Loures

 

 

 

 

Como num bizarro parque temático, entre o Paraíso e o Inferno, fica o Jardim das Delícias Terrenas. No entanto, o título do famoso tríptico de Hieronymus Bosch, que podemos apreciar no Museu do Prado, em Madrid, não foi por ele atribuído à obra. Ter-lhe-á talvez chamado “Uma pintura sobre a variedade do mundo". A seguir, foi designado pelo monge José de Sigüenza como o "Cuadro de las fresas" – Quadro dos morangos -  alusão aos frutos que enxameiam a tábua central – mais do que agora, os frutos sugeriam imagens libidinosas. «Comer fruta» na linguagem medieval, além da acepção mais imediata e inocente, tinha um sentido de comércio carnal. Só em 1912 um catalogador lhe dá um nome próximo do actual – tríptico dos “Deleites Carnais”. Daí sai a sua denominação actual de "Jardim das delícias" ou "Das delícias terrenas".

Durante a Guerra Civil foi transferido para o Museu do Prado em 1936, ficando depois da vitória franquista integrado no espólio do museu sob a actual designação - Jardim das Delícias Terrenas. É uma obra maravilhosa e fascinante. Quando vou ao Prado, fico em frente deste prodígio da arte e descubro sempre pormenores novos.

 

Diga-se que  o termo “delícias” ou “deleites” deve aqui ser assumido num registo irónico, condenatório talvez – por “delícias” o religioso e o funcionário do museu que crismaram a obra deviam entender os pecados e as tentações que permitem viajar do paraíso, representado no postigo da esquerda, onde reina a inocência, para um inferno que, no postigo da direita, Bosch pintou com imagens que parecem ter sido arrancadas a horríveis pesadelos, mas que nas caves do Santo Ofício em breve se tornariam realidade. Antes de vos falar no quadro, gostava de vos alertar para uma constante da condição humana – a de que a ignorância é quase sempre arrogante.

Quando nos rimos dos trajes arrebicados da aristocracia europeia do século XVIII ou dos saltinhos que as personagens dos filmes de há cem anos pareciam dar (porque só em 1929 se passou dos 16 fotogramas por segundo para os 24 que permitem reproduzir com mais rigor os movimentos), estamos a dar largas a essa arrogante ignorância. Não nos ocorre que daqui por umas décadas tudo o que fazemos e usamos provocará gargalhadas aos vindouros – telemóveis, computadores, DVDs, as roupas, os comportamentos, tudo isso fará rir os arrogantes estúpidos, bisnetos ou trinetos, dos actuais pobres de espírito. Na verdade, a natureza humana é imutável e a «evolução das mentalidades» é uma falácia introduzida por sociólogos respeitáveis (mas que nem por isso não deixa de ser uma falácia).  As mentalidades não evoluem, adaptam-se. Evolução significaria pessoas mais inteligentes de geração para geração. «Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades» - Neste simples verso, Camões descreveu melhor essa mudança comportamental do que os sábios sociólogos.

publicado por Carlos Loures às 14:00

editado por Luis Moreira em 12/01/2011 às 22:56
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