Quinta-feira, 14 de Julho de 2011

14 - Terreiro da Lusofonia - por Carlos Loures

Orlando da Costa (1929-2006) foi um poeta verdadeiramente  lusófono. Nascido em Moçambique numa família goesa e, como tal, criado em Margão, veio para Lisboa para a Universidade e, com três nacionalidades possíveis, optou pela portuguesa. E em boa hora, pois foi um português de eleição, um homem que lutou contra a ditadura e sempre se mostrou consequente com os seus princípios. Um grande português e um grande escritor. E poderia acrescentar - e um grande e saudoso amigo.

 

Orlando da Costa, nasceu em Lourenço Marques, actual Maputo, em 1929, numa família goesa. Foi criado em Margão, vindo para Lisboa, com apenas 18 anos, em cuja Faculdade de Letras se licenciou em Ciências Histórico-Filosóficas. Ficcionista, dramaturgo e poeta, publicou uma dezena de livros, dos quais se destacam os romances «O Signo da Ira» (1961), «Podem Chamar-me Eurídice» (1964), «Os Netos de Norton» (1994) e «O Último Olhar de Manú Miranda» (2000). O poema escolhido foi publicado na antologia «Poemabril» (1984) e foi musicado pelo maestro Fernando Lopes-Graça:

 

Canto Civil – 1
            Este é o meu canto civil
            canto cívico graduado
            desde um tempo antigo que vivi
            entre poemas de aço camuflados e algemas de silêncio
            Esse era o tempo do assalto às casernas
            mas já então eu escrevia o que devia:
            a cartilha da guerrilha do amor e da paz
            para ser ensinada à luz das lanternas
            nas escolas nas igrejas na parada dos quartéis
            Este é o meu canto civil
            canto cívico desfardado
            escrito a vinte e oito de Abril
            do ano passado à noite
            de punho cerrado com alegria e sem espanto
            canto para ser cantado de dia
            por todos por muitos por mim ou por ninguém:
      
            Soldado raso
            ao cimo da calçada
            em guarda
            de flor e farda
            a flor que te damos
            é pão da madrugada
            É pão amassado
            sem liberdade
            é gesto de guerra
            em nome da paz.
            É flor de canção
            em terra mar e ar
            rubra flor popular
            num só cano de espingarda
            Soldado raso
            em sentido na memória
            lembra-te de novo e sempre
            a flor que te damos
            é da terra é do povo
            é pão da madrugada.

 

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 10/07/2011 às 01:57
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Quarta-feira, 13 de Julho de 2011

13 - Terreiro da Lusofonia - por Carlos Loures

 

António Campos (Leiria, 29 de Maio de 1922 — Figueira da Foz, 8 de Março de 1999) foi um dos primeiros cineastas em Portugal a dedicar-se à prática do filme documentário, dentro do conceito de antropologia visual. Explorou o filme etnográfico, recorrendo às técnicas do cinema directo. Foi um dos elementos fundadores do movimento do Novo Cinema em Portugal. Foi um caso invulgar no nosso cinema, pela persistência com que, indiferente a êxitos e a inêxitos, prosseguiu na senda que para si mesmo traçou. Começando como Manoel de Oliveira, pelo cinema documental, raramente, ao longo do seu percurso, se afastou dessa via. Nos anos 50, em Leiria, realizava pequenos documentários, por si custeados.

 

Era praticamente desconhecido. Foi-me apresentado pelo Camilo Mourão, um amigo, professor da escola de Leiria, onde Campos trabalhava como funcionário administrativo. Escrevi crónicas sobre ele (publicadas quase todas no Jornal de Notícias) e dei pequenas ajudas, por exemplo, colaborando na elaboração do guião de “A Invenção do Amor” e integrando a equipa que foi a Vilarinho das Furnas fazer um primeiro levantamento, antes de a povoação ficar submergida pelas águas da barragem, Quando pensou realizar «A Invenção do Amor», baseado no poema de Daniel Filipe, pediu-me e ao Guilherme Valente que lhe escrevêssemos um guião.

 

Influenciados pelo clima distópico do «1984» , de Orwell, escrevemos um «roteiro» que Campos não seguiu integralmente; umas vezes porque as nossas sugestões implicavam meios de que não dispunha, outras vezes porque não estava habituado a seguir ideias que não fossem as suas. O resultado, tendo em conta as condições em que o trabalho foi feito, não foi mau. O realizador Fernando Lopes descreve como mostrou "A Invenção do Amor” a François Truffaut. "Ele veio a Portugal preparar o 'Peau Douce' e organizei uma sessão com o António Campos. E o Truffaut ficou maravilhado. Mostrei-lhe o primeiro filme do António de Macedo, o meu filme 'As Pedras e o Tempo' e o Truffaut disse: 'Pá, o que eu gosto é do António Campos." Embora em patamares de realização diferentes, usando meios, actores, cenários, de qualidades completamente diferentes, existem similitudes entre a «Invenção» e «Fahrenheit 451» ou «Grau de Destruição», o filme realizado por François Truffaut em 1966, a partir do romance homónimo de Ray Bradbury. Quanto a Vilarinho, fez-me o mesmo pedido. Escrevi um primeiro rascunho desse guião, mas não fiquei com cópia. Ter-se-á perdido entre os papéis de Campos (e não se perdeu grande coisa). Lembro-me que a história da aldeia era narrada através dos olhos de um emigrante que voltava depois de Vilarinho desaparecer, recordando em flashbacks a aldeia como ela era. Mas o realizador optou depois por um documentário puro e simples. Era aquilo que gostava de fazer.

 

A ficção não lhe estava no sangue, embora tivesse capacidade para enveredar por essa via, como provou com «A Invenção». A partir dos anos 70, o escritório da editora onde eu trabalhava ficava num edifício da António Augusto de Aguiar, que deitava também para a Gulbenkian., o belo jardim da Fundação, era a vista das janelas do meu gabinete. Atravessando uma estreita rua estava no Centro de Arte Moderna onde havia um restaurante self-service. Muitas vezes almocei com Campos nesse restaurante. Falávamos de projectos que nunca chegámos a concretizar, porque ele nos deixou em 1999, mas também porque não gostava de trabalhar em equipa. Era um solitário, um bom selvagem, como o classificou Paulo Rocha. Por seu turno, Fernando Lopes disse a seu respeito. "Ele viveu numa época particular em que o neo-realismo tinha muita importância - o Alves Redol, o Soeiro Pereira Gomes... São leituras que ele fez. Fizemos todos. Depois, cada um saiu para o seu lado." António Campos saiu para um lado muito seu, criando um nicho especial dentro do documentário etnográfico, recorrendo à ficção, não como fim, mas como meio de explicar melhor o que pretendia. Não sei se a Cinemateca Nacional tem todos os seus filmes. Perder a obra de António Campos seria perder um elo na cadeia evolucionária do cinema português. Um bom selvagem, de facto. Não fez concessões.

 

 

 Fez filmes.

 

 

 

 

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 08/07/2011 às 23:40
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Terça-feira, 12 de Julho de 2011

12 - Terreiro da lusofonia - por Carlos Loures

Malangatana Valente Ngwenya,

 

um dos maiores pintores do espaço Lusófono, nasceu em Matalana,

Marracuene, província de Maputo, Moçambique, em 6 de Junho de 1936 e faleceu no dia 5 de Janeiro de 2011 numa clínica de Matosinhos, Portugal. 

 

 

Exerceu profissões humildes, de pastor de gado a apanhador de bolas num clube de Lourenço Marques. Foi perseguido pela polícia políitica portuguesa e preso sob a acusação de pertencer à FRELIMO. A partir de 1960, dedicou-se em exclusivo à pintura. Tem quadros nas colecções dos principais museus do mundo. As suas cores fortes e belas enchem hoje o Terreiro da Lusofonia.

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 08/07/2011 às 23:36
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Segunda-feira, 11 de Julho de 2011

11 - Terreiro da Lusofonia - por Carlos Loures

 

Apresentámos no nosso Terreiro «É doce morrer no mar», interpretado por duas grandes cantoras - a cabo-verdiana Cesária Évora e a brasileira Marisa Monte. Podemos ler toda a letra: É doce morrer no mar, Nas ondas verdes do mar A noite que ele não veio foi, Foi de tristeza pra mim Saveiro voltou sozinho Triste noite foi pra mim É doce... Saveiro partiu de noite, foi Madrugada não voltou O marinheiro bonito Sereia do mar levou. É doce... Nas ondas verdes do mar, meu bem Ele se foi afogar Fez sua cama de noivo No colo de Iemanjá 

 

 

Dorival Caymmi contou que esta maravilhosa canção foi criada, numa reunião de amigos, em casa do coronel João Amado de Faria, pai de Jorge Amado. Num ambiente descontraído, Dorival criou a canção partindo de um tema de "Mar Morto", romance de Jorge sobre os mestres de saveiros: "É doce morrer no mar / nas ondas verdes do mar". Jorge compôs mais alguns versos, completando a canção. Ainda se fez um pequeno concurso entre os amigos presentes (Érico Veríssimo, Clóvis Amorim e outros), mas foram os versos do Jorge que venceram.

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 08/07/2011 às 23:34
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Domingo, 10 de Julho de 2011

10 - Terreiro da Lusofonia - por Sílvio Castro

Numa significativa realidade literária nacional, como é aquela brasileira contemporânea, os nomes dignos de um grande Prêmio pela obra completa são muitos. Se esse Prêmio possui as dimensões internacionais, como acontece com o “Prêmio Camões”, destinado a um escritor de uma das nações componentes da grande Comunidade dos Países Lusófonos, o premiado vem reconhecido como um representante altamente representativo da criatividade artística contemporânea de seu país. Ferreira Gullar possui todas as dimensões que o “Prêmio Camões-2010” lhe reconhece e proclama. Poeta dedicado igualmente à crítica e ao ensaio, bem como autor de obras teatrais, ele demarca com clareza algumas características da modernidade brasileira. Autor que sabe criar a própria expressão a partir do valor essencial da linguagem, ainda que capaz de profunda participação com o mito poético, não o limita aos valores da pura subjetividade lírica. Nele se apresenta igualmente acentuada e assumida participação com a realidade, mais em particular com a realidade civil. Esta, nascida de uma forte integração com os problemas sociais e políticos de seu país, faz derivar naturalmente no poeta uma integração com os problemas próprios de outras realidades nacionais. Ferreira Gullar é naturalmente um poeta empenhado, um poeta político. Assim sendo, ele corresponde a uma já consagrada norma derivada da ação e teoria da história da Modernidade brasileira referente ao conceito de “poeta maior”, conceito nascido de um esclarecimento de um outro grande poeta brasileiro moderno, Manuel Bandeira, que se definia um “poeta menor”, pois, sempre segundo ele próprio, a sua poesia se confinava na dimensão lírica, nunca ousando atingir aquela do empenho social. Para esta, e portanto para a melhor definição do “poeta maior”, Bandeira os encontrava em criadores como Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto.

 

Certamente, foi a partir da magnífica conceituação de Manuel Bandeira que Sérgio Buarque de Hollanda, na sua Introdução ao volume de Gullar, Toda Poesia (1980), escrevia sobre o autor: “(… ….) Parece-me a mim, além disso, que, exceção feita de algumas peças de Mário de Andrade e também de Carlos Drummond de Andrade (mormente em Rosa do Povo) é o nosso único poeta maior dos tempos de hoje.“ Ferreira Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís do Maranhão aos 10 de setembro de 1930. Portanto, o Prêmio que agora lhe vem concedido pode ser integrado nas muitas comemorações e homenagens que o poeta brasileiro já recebe e receberá pelo seu próximo oitantésimo aniversário. Gullar publicou sua primeira coletânea de poemas, Um pouco acima do chão, em 1949, transferindo logo após para o Rio de Janeiro. De 1954 é A luta corporal, livro de poemas que desperta imediatamente grande interesse na crítica literária brasileira e que será um dos pontos de referências para a teoria do Movimento da poesia concreta, de 1956, principalmente derivada da ação de Haroldo de Campos, Augusto de Campos e Décio Pignatari. Depois de um período de participação com o movimento concretista, a poesia de Gullar assume novos rumos, indo na direção de um maior empenhol social. Este período, começado em 1962, se acentua a partir de 1964, em oposição ativa contra o regime militar então instaurado no Brasil. Integrado no CPC da União Nacional dos Estudantes, de que era presidente quando do golpe militar, o poeta se integra na divulgação de uma poesia de contestação civil, em especial a partir dos Cadernos do Povo Brasileiro que acolhe os volumes do movimento dos Poemas para a liberdade, da série Violão de Rua. Perseguido político, se exília inicialmente no Chile de Allende e posteriormente na Argentina. No exílio argentino escreve, em 1975, o seu livro de maior repercussão, Poema sujo, publicado em 1976. Ferrera Gullar faz parte da “Geração de ‘56”, segundo os critérios que adoto para a história da literatura brasileira moderna e contemporãnea (em particular nas páginas da minha História da Literatura Brasileira, 3 vv., Lisboa, 1999-2000). A “Geração de -56”, dentro do quadro da moderna poesia brasileira, sucede àquela fundadora do Movimento modernista brasileiro, a de 1922 e à sua complementar, aquela dos poetas de 1930, bem como ao possível movimento revisionista da “Geração de -45“. Desta maneira, a Geração de ‘56 absorve os ideais de liberdade criadora própria dos movimento modernistas fundadores, assim como endossa muitas das revisões formais quanto à linguagem poética, propostas pelos poetas de 1945. Os poetas de ’56 procuram aliar os processos formais mais condizentes ao novo poema da liricidade moderna a uma mais forte politização da poesia. Gullar, nos seus poemas, interpreta bem todo esse complexo percurso. Nele existe uma natural e profunda preocupação para com a liguagem poética. O seu poema se realiza a partir naturalmente de um forte ânimo lírico, sempre porém em consonância com o espaço do real, como convincentemente vem traduzido no poema “Arte poética”: Não quero morrer não quero apodrecer no poema que o cadáver de minhas tardes não venha feder em tua manhã feliz e o lume que tua boca acenda acaso das palavras - ainda que nascido da morte – some-se aos outros fogos do dia aos barulhos da casa e da avenida no presente veloz Nada que se pareça a pássaro empalhado múmia de flor dentro do livro e o que da noite volte volte em chamas ou em chaga vertiginosamente como o jasmim que num lampejo só ilumina a cidade inteira Será justamente de uma tal posição de precisa consciência lírico-formal que Ferreira Gullar saberá dar voz a poemas de acentuado empenho sócio-político, como acontece em “Meu povo, meu poema”:

 

 

 

Meu povo e meu poema crescem juntos
como cresce no fruto
a árvore nova

No povo meu poema vai nascendo
como no canavial
nasce verde o açúcar

No povo meu poema está  maduro
como o sol
na garganta do futuro

Meu povo em meu poema
se reflete
como a espiga se funde em terra fértil

Ao povo seu poema aqui devolvo
menos como quem canta
do que planta

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 08/07/2011 às 23:31
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Quinta-feira, 7 de Julho de 2011

7 - Terreiro da Lusofonia - por Carlos Loures

 

 

Começámos com palavras de Caetano Veloso num concerto em Santiago de Compostela, em 21 de Julho de 2008 na Praça Quintana dos Mortos. Confirmando a afirmação do grande cantautor brasileiro, Elias Torres, Professor Titular da Universidade de Santiago de Compostela e presidente da Associação Internacional de Lusitanistas, numa entrevista ao Portal Galego da Língua – http://www.pglingua.org/ – usava como metáfora uma situação de um conto de Álvaro Cunqueiro: «a Galiza está sentada sobre um tesouro e nom o sabe».

 

Esse tesouro a que o Professor se refere é, obviamente. a língua galego-portuguesa, um idioma falado por cerca de 240 milhões de pessoas, ultrapassando línguas de grande prestígio, como o francês, o alemão e o italiano. A nossa língua comum é a terceira mais falada nos continentes africano e europeu e, segundo projecções baseadas na evolução demográfica dos oito Estados e nove nações (com a Galiza) que têm o idioma como língua oficial, deverão totalizar 350 milhões de habitantes em 2050. Como Elias Torres salienta e podereis escutar no vídeo abaixo, a Galiza, não tendo contenciosos históricos nem com Portugal nem com nenhum dos outros países integrantes do espaço lusófono, poderá constituir um «magnífico ponto de encontro». Ademais, acrescentamos nós, a Galiza é o berço do idioma, embora tenha sido no Sul, em Portugal, que ele se tornou autónomo da matriz neolatina e, furtando-se à aculturação castelhana, se transformou na língua universal que hoje é - com Fernão Lopes, com Gil Vicente, Camões, António Vieira...

 

 

 

publicado por Carlos Loures às 11:00
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Quarta-feira, 6 de Julho de 2011

6 - Terreiro da Lusofonia - por Carlos Loures

Temos neste blogue dedicado atenção quer a Cabo Verde, quer à Galiza, dois países irmãos, duas culturas intimamente ligadas a Portugal – a galega a montante, nos alvores da nossa identidade, a cabo-verdiana a jusante, consequência das nossas navegações e do povoamento que fizemos das terras que achámos. Ligações entre essas duas culturas? Existem e não são poucas. Há uma colónia de cabo-verdianos na Galiza, maioritariamente constituída por homens do mar. Um grupo de doze cabo-verdianas, residentes em Burela (Lugo), ensaia desde há cerca de uma dezena de anos, recuperando ritmos ancestrais como a «Batuka».

 

Vamos falar destas corajosas mulheres que não querem que a memória e a voz da sua cultura se percam. O grupo nasceu durante um jantar em Burela. Uma das actuais componentes do grupo, perguntou: por que não batucamos como as velhas da nossa terra? E a pergunta, floresceu, resultando no «Batuko Tabanka». Diz Antonina de Cangas, a solista do grupo: «As mulheres não podiam falar e, comunicavam, batendo no peito como manifestação de protesto. Depois utilizaram um trapo molhado» e depois, acrescentou, um saco de couro colocado entre as pernas. A «batuka» é uma música de trabalho, como a da «pandereteira» galega ou a das adufeiras portuguesas; está à margem das dolentes mornas que Cesária Évora internacionalizou.

 

Vamos então ouvi-las:

 

 

 

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 05/07/2011 às 18:33
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Domingo, 3 de Julho de 2011

3- Terreiro da Lusofonia - por Manuel Simões

Hoje temos um poeta de São Tomé no nosso Terreiro. É um convidado de Manuel Simões, nosso colaborador que vos apresenta  Frederico Gustavo dos Anjos:

 

Poeta e ensaísta, nasceu em S. Tomé em 1954. Fez os estudos primários e liceais em S. Tomé e superiores na ex-RDA, em Leipzig, onde se licenciou em Estudos Alemães. Regressou a S. Tomé e Príncipe em 1984, trabalhou na então Direcção de Cultura até exercer o cargo de Coordenador Nacional da Comunicação Social e, depois, o de Secretário de Estado da Comunicação Social e Cultura, estes já na 2ª. República. Publicou alguns poemas e artigos no jornal Revolução (S. Tomé, 1975-1991) e, em 1984, publicou a novela Bandeira para um cadáver, tendo como sujeito a louca Perí, inspirada numa figura real, e em que a loucura funciona como veículo de contestação. E em 1985 editou um estudo sobre a literatura são-tomense, As descobertas da descoberta ou a dimensão de uma mensagem poética. Para além de poemas dispersos em colectâneas (destacam-se A voz do medo e Vem e vamos), publicou o volume Solilóquio (S. Tomé, 1986, ed. do autor), mais precisamente um longo poema de sessenta estrofes, poema em que a ilha é assumida como lugar centralizador da consciência sócio-histórica e como espaço privilegiado de conhecimento. Na sua globalidade, o poema recorre a símbolos que apontam para o tema da liberdade (vejam-se os lexemas “ave”, “voo”, “asas”, “rota”, “vento”, por exemplo), sem transcurar a sua procura, empreendida pelo sujeito poético. (Manuel Simões)

 

 

De Solilóquio:

Sou ave
livre
voo
do
bando
com quanto gosto
vou e venho
pode ser
como se diz
tomo rota
falsa
rumo ao céu

Tenho asas
não mais que duas
pode ser
como
se diz
não tenho jeito
vou só com o vento
quem alto voa
se
cai
ADEUS.

Trago ensanguentado
o meu bico
comprido
quem
perde?
o quê?
que mal fiz?
a quem?
se me quebram o
bico?

(estr. 1,2,3).

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 01/07/2011 às 23:59
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Sábado, 2 de Julho de 2011

2 - Terreiro da Lusofonia - por Carlos Loures

 

 

 

São as palavras, os sons e as cores do nosso universo lusófono. Hoje é Caetano Veloso que desce (ou sobe?) ao Terreiro para defender a Língua Portuguesa.

 

 

Caetano Veloso nasceu em 7 de Agosto de 1942 em Santo Amaro da Purificação,

município do estado da Baía. É um dos mais

apreciados músicos e cantores brasileiros. Na sequência do subgénero musical  que, surgindo no final da década de 50 do século XX,  ficaria conhecido como bossa nova e que teve repercussão mundial, movimento marcado por nomes como os de Vinicius de Moraes, António Carlos Jobim, João Gilberto, eclodiu uma nova geração de cantores, onde avultam nomes como os de Gilberto Gil, Chico Buarque, Maria Bethânia, Gal Costa e, naturalmente, Caetano Veloso.

 

A ditadura militar que se instalou no Brasil reprimiu tanto quanto podia esta

vaga de cantores que hostilizava o poder, mas que tinha um grande apoio

do povo brasileiro, que os adorava, e começava a ganhar prestígio internacional.

Em 1969 Caetano Veloso foi preso e, quando o libertaram partiu para o exílio,

em Londres. Voltou em 1972.

 

Uma discografia com dezenas de álbuns, fruto de mais de quatro décadas de

trabalho, constituem um testemunho da capacidade criativa de um músico

que é, indiscutivelmente, um dos maiores cantautores do mundo lusófono.

 

 

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publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado em 01/07/2011 às 16:59
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Sexta-feira, 1 de Julho de 2011

Terreiro da Lusofonia - 1 - por Carlos Loures

Um dos maiores pintores do mundo lusófono - Roberto Chichorro

 

É com o pintor moçambicano Roberto Chichorro que verdadeiramente inauguramos este Terreiro da Lusofonia, espaço dedicado particularmente à cultura de todo o universo lusófono.

 

Tratando-se de artistas consagrados evitaremos tecer considerações de carácter crítico sobre as suas obras. Pequenas notas biográficas e às vezes nem isso.


Mais ou menos assim:

Roberto Chichorro nasceu em 1941, no Maputo. Fez a sua

primeira exposição em 1967, mas só em 1980 se dedicou inteiramente

à arte. Em 1982 recebeu uma bolsa do governo espanhol,

tendo trabalhado em cerâmica no Taller Azul e em zincogravura

com Óscar Manezzi, em Madrid. Obras suas fazem parte de

colecções como a do Museu do Chiado em Lisboa e a do Museu de Arte Contemporânea de Luanda. Chichorro ilustrou vários livros, por exemplo, os do grande poeta José Craveirinha. Este é um quadro da série "Karingana-estórias de era uma vez”.

 


 

publicado por Carlos Loures às 11:00

editado por João Machado às 01:42
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Quinta-feira, 30 de Junho de 2011

Terreiro da Lusofonia - Apresentação - por Carlos Loures

Vamos voltar a apresentar no nosso blogue o Terreiro da Lusofonia. Começaremos amanhã, 1 de Julho, às 11 horas. A seguir incluímos uma introdução que explica os objectivos que pretendemos alcançar. Pedimos aos nossos colaboradores e leitores a melhor atenção e que pensem como podem colaborar com este objectivo de difusão da cultura portuguesa, nos países lusófonos e não só.

  

 

Camões, Zeca e Uxia - um tandem alucinante

 

Como sabemos, a língua portuguesa é falada em nove países, oito independentes e um não - precisamente aquele que foi o berço do idioma – a Galiza, integrada no estado espanhol. Nestes nove territórios, fala-se o português ou, se quisermos ser rigorosos, o galego-português. Há entre os que defendem que se ponha cobro à aculturação castelhana na Galiza, quem afirme mesmo que o idioma se devia chamar galego e não português. Haveria razões históricas para adoptar essa designação, mas não seria, a meu ver, justo.

 

Foi em Portugal que o idioma se preservou, porque preservada a independência política. Sem as lutas que os portugueses travaram pela sua independência, não haveria galego, nem português, nem galego-português – falaríamos castelhano e, na melhor das hipóteses, haveria investigadores que registariam a remota existência de um idioma na faixa Oeste da Península… Esta posição que alguns galegos assumem é extremista e peca por ingratidão – sim, a Galiza é o berço da língua comum – a mãe, a nai, do galego-português, mas foi em Portugal que ele cresceu, e devido à existência de Portugal e à forma como sempre recusámos ser assimilados, que o idioma se firmou e se espalhou pelo mundo. Hoje somos mais de 200 milhões de falantes. De galego-português, digo eu.

 

Porém, como conclui um estudo encomendado pelo Governo português. a influência da língua portuguesa no mundo não corresponde ao seu número de falantes. Encomendado pelo Ministério da Educação e pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros ao reitor da Universidade Aberta, Professor Carlos Reis, o estudo constatou também a dispersão da política da língua e o fraco empenho dos sucessivos executivos portugueses na sua promoção -"Existe uma grande disparidade entre o universo falante de português e a efectiva influência internacional da língua portuguesa", afirmou o professor.

 

Vamos, a partir de Julho reeditar esta série, com música, poemas, pintura, cinema, teatro… em suma, as artes e as letras do universo lusófono. E, com esta informação, um «tandem alucinante», como o classifica Uxía Senlle – Verdes São os Campos, a composição de Zeca Afonso para um poema de Luís de Camões, na voz de Uxía, a grande cantora galega. Galiza e Portugal foi onde começou e se desenvolveu esta língua, a nossa língua, que será a grande protagonista desde terreiro onde traremos artistas de todo este vasto universo da lusofonia.

 

 

 

 

 

 

publicado por Carlos Loures às 11:00
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Sexta-feira, 27 de Maio de 2011

Além Guadiana - Lusofonías

publicado por Carlos Loures às 09:00

editado por João Machado em 23/05/2011 às 22:33
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Segunda-feira, 16 de Maio de 2011

Convite para participar no Encontro de Escritores Lusófonos_ 20,21 e 22 Maio

 

 

 

 

 

______________________________________________________

4 Site | www.apescritores.pt | * info@apescritores.pt    

( Tel | (+ 351) 21 39718 99

6  Fax | (+ 351) 21 397 23 41

+ Morada | Rua de S. Domingos à Lapa, 17

                   1200-832 Lisboa, Portugal

 

 

 

 

DIVULGAÇÃO

CULTURAL

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Programa:

 

20 de Maio de 2011                                                                                                        

Local: Centro Cultural da Malaposta                                                                                 

 

09.30/10.00  - Registo/documentação

 

10.15/10.30 - Abertura oficial                                                                       

 

Dra. Susana Amador -  Presidente da CMO

Eng. Domingos Simões Pereira – Secretário Executivo da CPLP

Eng. Miguel Anacoreta Correia - Secretário Geral da UCCLA

 

 

10h30 – 11h30 - A Edição de Autores Lusófonos: A Produção Literária e o Mercado, Oportunidades e Constrangimentos

                       

Assírio Bacelar (Nova Vega)

Larissa Rodrigues (Artiletras)

Maria do Rosário Pedreira (Leya)

Ozías Filho (Editora Vozes)

Paula Amaro (Dinalivro)

Miguel Freitas da Costa (APEL)

 

Moderador: José Carlos Vasconcelos (Director Jornal de Letras, a confirmar)

 

Declamação por Paula Nunes

 

11h30 - 11h45 - Pausa                                                                                                           

 

 

11h45 – 13h00 - A Literatura Lusófona na Diáspora da Europa Ocidental

 

Ana Paula Tavares (Angola)

Luís Carlos Patraquim (Moçambique)

Luiz-Manuel dos Santos (Suíça)

Maria João Lehning (Portugal)

Paula de Lemos (Alemanha)

Ricardo Adolfo (Holanda)

Waldir Araújo (Guiné)

                                              

Moderador: Paulo Pisco (Deputado pelo Círculo da Europa)

 

13h30 – 15h00 - Almoço                                                                                                       

 

15h00 - 16h30 - Da Literatura às Artes Performativas

 

Armindo Tavares (Cabo Verde)

Domingos Lobo (Portugal)

Francisco Fragoso (Cabo Verde)

Hélder Costa (Portugal)

José Eduardo Agualusa (Angola)

Ondjaki (Angola)

 

Moderador: Manuel Coelho (Director Artístico do Centro Cultural da Malaposta)

 

 

16h30 – 16h45 - Pausa                                                                                                          

 

Momento cultural: Quarteto de cordas do Conservatório de Música D. Dinis

 

 

16h45 - 18h00 - Processos Criativos na Produção Literária

 

Augusto Carlos (Moçambique)

Flaviano Mindela (Guiné)

Francisco Soares (Angola)

José Hopffer Almada (Cabo Verde)

Lívio de Morais (Moçambique)

Odete Semedo (Guiné)

Teolinda Gersão (Portugal)

 

Moderador: Ana Jordão (Jornalista RDP África)

 

 

15h00 - 17h30 - Encontro c/ comunicação social                                           

Local: Sala de cinema

 

 

21 de Maio de 2011                                                                                                           

Local: Centro de Exposições de Odivelas (manhã)

 

10h00 – 11h15 - Protecção aos Escritores: Actualidade e expectativas futuras; missão e impacto do prémio literário

 

Annabela Rita (Associação Portuguesa de Tradutores)

António Carlos Cortez (Crítico, Poeta, Prémio SPA/RTP)

José Jorge Letria (Sociedade Portuguesa de Autores)

Manuel Rui Monteiro (Angola)

Maria Elsa Rodrigues dos Santos (Sociedade de Língua Portuguesa)

Miguel Real (Critico Literário)

                       

Moderador: João Rosário (Jornalista RDP África)    

 

                                                                                                                                            

11h15 - 11h45 - Pausa                                                                                                           

 

Momento cultural: Coro de Câmara do Conservatório de Música D. Dinis

 

 

11h45 - 13h00 - A Literatura Portuguesa em Expansão

 

Ângela Carrascalão (Timor)

Germano de Almeida (Cabo Verde)

João Maimona (Angola)

Lucílio Manjate (Moçambique)

Luís Costa (Timor)

Olinda Beja (São Tomé)

Ondjaki (Angola)

Tony Tcheka (Guiné)

           

Moderador: Mário Máximo (Vereador da Câmara Municipal de Odivelas)

 

 

13h30 - 15h00 - Almoço                                                                                                        

 

 

21 de Maio de 2011                                                                                                           

Local: Biblioteca Municipal D. Dinis (tarde)

 

 

15h00 – 17h30 - Lançamento de Livros                                                           

 

Sala de Adultos (início 15.00)

 

Carlota de Barros (Cabo Verde)

Gabriel Baguet Jr. (Angola)

José Hopffer Almada (Cabo Verde)

Margarida Fonseca Santos (Portugal)

Teobaldo Virgínio (Cabo Verde)

Olinda Beja (S. Tomé)

 

Moderador: Ana Jordão (Jornalista, RDP África, a confirmar)

 

 

Sala Multimédia (início 15.30)

 

Arménio Vieira (Cabo Verde)

Luís Peixeira (Portugal)

Ozías Filho (Brasil)

Teolinda Gersão (Portugal)

Vadinho Rodrigues (Cabo Verde)

 

Moderador: Artur Lucena (Poeta, Jornalista Loures Magazine Odivelas)

 

 

15h00 - 18h30 - Encontro c/ comunicação social                                           

Entrevistas com jornalistas para promoção de autores e obras

Local: Serviço de Leitura Especial

 

 

18h00 – 18h30 - 20º Aniversário Artiletras                                                                  

 

 

22 de Maio de 2011

Local: Centro de Exposições de Odivelas

 

 

11h00 - 12h00 - A Influência dos Factores Socioculturais na Escrita

 

Adriano Botelho (Angola)

Ângela Carrascalão (Timor)

António Francisco Neto (Angola)

Fátima Marinho (Portugal)                                                                                 

Germano de Almeida (Cabo verde)

Joaquim Arena (Cabo Verde)

Virgílio Coelho (Angola)

 

Moderador: João Costa Dias (Jornalista RDP África, a confirmar)      

 

Leitura de Contos Tradicionais por M. Margarida Pereira-Müller       

 

 

12h00 - 13h00 - Poesia Lusófona na Primeira Pessoa

 

António José Borges (Timor)

Artur Lucena (Portugal)

Emílio Lima (Guiné)

José Luís Tavares (Cabo Verde)

Jorge Viegas (Moçambique)

Maria Teresa Horta (Portugal)

Mário Máximo (Portugal)

 

Moderador: Tony Tcheka (Jornalista)

 

 

13h00 - Encerramento                                                                                                          

 

 

 

ficha de Inscrição:

 

 

     III Bienal de Culturas Lusófonas

                                                                      

 

                                                                                                               Câmara Municipal de Odivelas

 

 

 


 

 

Encontro com Escritores Lusófonos

20, 21 e 22 de Maio de 2011

Malaposta _Centro de Exposições de Odivelas_ Biblioteca Municipal D.Dinis

 

Ficha de Inscrição

 

Nome:

 

 

Profissão:

                                                                                 

Entidade:

 

 

Telefone:

 

Telemóvel:

 

E-mail:

 

 

Habilitações:

 

 

Morada:

 

 

Código Postal: _______ - _____

Localidade:

 

 

 

Notas:

O prazo das inscrições decorre até ao dia 18 de Maio de 2011.

As inscrições para assistir Encontro de Escritores Lusófonos são gratuitas, e permitem a obtenção de um Certificado.

 

A inscrição deverá ser enviada para o e-mail: Aldina.ribeiro@cm-odivelas.pt ou para o fax. 219 328 004

 

Para mais informações contactar:

Biblioteca Municipal D.Dinis: Tel. 219 320 770 | E-mail. bmdd@cm-odivelas.pt

 

 

 

publicado por João Machado às 09:00
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Quarta-feira, 1 de Dezembro de 2010

Carta aberta ao Professor Sílvio Castro

Carlos Loures


Sílvio Castro, meu prezadíssimo amigo, retribuo com os devidos juros os elogios que me fazes e que antecedem a tua patriótica indignação – considero-te um grande escritor, um probo intelectual e sei que és um excelso professor. Nada do que digo a seguir deve ser interpretado de outra forma que não seja a de prosseguir um diálogo entre amigos que divergem num pormenor, mas que sabem que estão de acordo em muitas coisas importantes. Conhecemo-nos há muitos anos e as nossas relações, as profissionais e as de amizade, sempre se pautaram por uma grande frontalidade. Não vamos abrir excepções.

Devias saber que nada me incomoda usar lugares-comuns sempre que acho que podem substituir formas mais elaboradas, mas menos claras. O lugar-comum é como a praça pública – aberto a todos. Tampouco me assustam adjectivos tais como «aberrante», «anacronístico» , como aqui dizemos, para mim vêm de carrinho. Usar anacronismos é precisamente um dos meus hábitos, num tempo em que a ditadura do “politicamente correcto” vai transformando em anacronismos valores, que constituíam suportes da vida em sociedade. Guio-me pelos juízos que das coisas faço. Como se costuma dizer, não sou de modas. Do que está na moda escolho o que me interessa e deito fora o que não me agrada. É pecha antiga que com a idade se vai agravando.

A moderna historiografia literária, tal como a antiga, como melhor do que eu sabes, não é uma ciência exacta, e o que agora é fixado como correcto está sujeito a no futuro ser considerado anacronismo, lugar-comum, quando não mesmo dislate. As Letras, as Humanidades são disciplinas que abordam o íntimo do ser humano e, se forem autênticas, não registam evoluções – Homero é tão pertinente quanto Saramago. A literatura ensina-nos que a natureza humana é igual á de há milhares de anos. Mudam as mentalidades? Mudam. Chamar-lhe evolução já não concordo, pois dá ideia de que seguem um padrão científico e que se vão aperfeiçoando. A natureza humana é imutável, pelo menos até que a engenharia genética a manipule e modifique. Correntes literárias, história da literatura, tudo o que a relaciona o homem como ser social – está sujeito à mudança e às tais modas a que sou indiferente. Estar ou não estar up-to-date seja no que for não me preocupa.

Entrando na questão que estamos a debater, não estou a depreciar os valores do patriotismo brasileiro, tão respeitáveis quanto os de qualquer outra nação. Não há nesta apreciação eurocentrismos ou europeísmos culturais. Aliás, com sete séculos de diferença, a independência de Portugal e a do Brasil têm similitudes – Afonso Henriques pertencia à nobreza leonesa e quis criar um reino independente. Pedro I, era o indigitado rei de Portugal, mas sonhou um Império vasto como um planeta. Patriotas, Afonso e Pedro? Acho que não – ambiciosos, diria antes. Eles e os que os acompanharam. E não considero a ambição um crime.. As épocas são diferentes e a ambição manifestou-se de forma diferente. A brutalidade dos barões medievais foi substituída pelo empolamento que o Romantismo induziu em toda a sociedade. E aí, meu caro Sílvio, és tu quem está a ser anacrónico e a deixar que o patriotismo interfira no raciocínio – os nobres que romperam com o reino de Leão ou Pedro, rompendo com Portugal, foram patriotas? Quanto a mim, não. Foram oportunistas. Ou, mitigando, podemos dizer que tiveram o sentido da oportunidade.

Os leoneses que criaram Portugal e os portugueses que criaram o Brasil não podiam ser patriotas de pátrias inexistentes. Nem eram oprimidos – queria bem saber Afonso dos que no seu condado viviam como animais ou estava preocupado Pedro com índios a ser exterminados ou com os negros que eram como mercadoria importados de África? Nem Afonso mudou a estrutura feudal do seu condado, nem Pedro deu liberdade aos escravos. Curioso que país «libertado do jugo colonial» quis manter os territórios que herdara do colonizador – deveria ter dado a liberdade ao Uruguai. Mas não. Prosseguiu a luta que os «portugueses opressores» tinham iniciado. Onde fica a coerência?

Quando digo que antes de haver estado brasileiro não existe literatura brasileira, quero dizer que antes da independência não existe Brasil. E aplico o mesmo critério a Portugal – não naturalizo as “Cantigas de Santa Maria”, embora faça parte da proto-história da nossa literatura (tal como da vossa). A língua portuguesa foi saindo do seu berço novilatino e iniciou uma deriva que passando por Fernão Lopes, Gil Vicente, Camões, António Vieira, chegaria ao belo idioma que hoje temos em nove nações (contando com a Galiza, a nação sem estado, a irmã com que há um milénio começámos a viagem). E tudo isto, de Afonso X a Rubem Fonseca, é nosso, é comum. Essa é a realidade.

Os patriotismos exacerbados são anacrónicos, são lugares-comuns e cheios de poeira que nos chegam, não da Idade Média ou da época dos Descobrimentos, mas sim desse mal - cheiroso século XIX, em que se forjaram impérios, romantismos anti-higiénicos que vieram a desembocar, já no desgraçado século XX em fascismos, nazismos, em estados - novos podres de velhos, em holocaustos… Deu-nos óperas bonitas, grandes romances, filósofos e poetas; o marxismo inventou-se e o capitalismo forjou-se ao ritmo do resfolegar da máquina a vapor. A ambição imperial tomou conta das cabeças. Napoleão não acabou em Waterloo, prolongou-se na sofreguidão de prussianos, russos, sérvios, austríacos, castelhanos que, sem espaço para criar o «seu» império, subjugaram vizinhos. O europeísmo cultural dominou as cabeças dos próceres da “libertações” americanas. A Europa de que diziam querer libertar-se, dominou-os, esteve em todos os seus actos. Na sua maioria, os «libertadores» eram europeus ou crioulos europeizados.
Queres anacronismos, meu caro Sílvio Castro? Tenta ler com olhos estrangeiros estes versos:

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas/ De um povo heróico o brado retumbante,/E o sol da Liberdade, em raios fúlgidos,/Brilhou no céu da Pátria nesse instante.

Se o penhor dessa igualdade/Conseguimos conquistar com braço forte,/Em teu seio, ó Liberdade,/Desafia o nosso peito a própria morte

É bonito, acredito que os corações brasileiros bombeiem lágrimas para os olhos patrióticos ao evocar o “Eu fico!”, tal como nós aqui lacrimejamos quando gritamos “Contra os canhões, marchar, marchar!” – mas é tudo romantismo e literatice novecentista – Nem no Brasil com a independência raiou o sol da liberdade, nem os portugueses marcharam contra os canhões britânicos que dos navios da sua armada se preparavam para bombardear Lisboa e Porto, se o seu humilhante ultimato não fosse aceite. No Brasil a escravatura continuou até à lei Áurea de 1888; aqui fizemos uma subscrição que deu para comprar uma pequena canhoneira e lá aceitámos o ultimato. Cada um foi à sua vida. As coisas são como são.

Segundo se diz nesse dia do “Eu fico”, o imperador estava com uma diarreia dos demónios, pouco adequada aos cânones românticos. Mas tal pormenor não ficaria bem nos versos empolados do Joaquim Osório Duque Estrada. Do nosso Afonso I não há notícia de distúrbios intestinais. Mas outros haveria.
A independência portuguesa foi uma questão familiar. Não existia por parte dos súbditos um impulso patriótico. Duvido que depois da independência alguma coisa de importante para eles tenha mudado. No Brasil, sete séculos após, as coisas não foram muito diferentes – escravos e índios terão visto as suas condições de vida melhorar?

Em Angola, em Moçambique, foi diferente. As independências foram conquistadas através de guerras contra a potência colonizadora, prolongando-se depois em terríveis guerras civis – antes das independências havia já uma literatura, escritores que, fazendo parte do património comum da lusofonia, não se inserem na literatura portuguesa. Em Cabo Verde, com circunstâncias históricas diferentes, há uma literatura que antecede a independência, sem que seja necessário anexar escritores portugueses que ali escreveram – Manuel Ferreira, com Hora di Bai e Morabeza, romances sobre Cabo Verde, foi um escritor português. Cabo Verde tem uma excelente literatura feita por cabo-verdianos – não necessita de empréstimos.

O que a historiografia literária afirma, interessa-me como informação, mas não como dogma. Guio-me pelos meus anacronismos e lugares-comuns e para mim Tomás António Gonzaga é um português, um portuense, subversivo na opinião do Santo Ofício, mas português – tão português como Bocage, seu companheiro árcade. Quanto ao Frei Caneca. está bem, meu caro Sílvio, fica lá com o Joaquim da Silva Rabelo, depois Frei Joaquim do Amor Divino. Acho que o Joaquim da Silva Rabelo era brasileiro, um dos primeiros. Esteve implicado na Revolução Pernambucana (1817) e na Confederação do Equador (1824) de cariz republicano contra o imperador. Aqui está um bom brasileiro, não um dos parasitas que acompanhavam Pedro I, sonhando o Brasil como um local de libertação e não como um pesadelo para escravos e indígenas.

A Carta de Pero Vaz de Caminha primeiro documento literário do Brasil? Seguindo esse critério, poderíamos dizer que a “Geografia” de Estrabão, um grego contemporâneo de Cristo ao serviço de Roma, ao descrever a Lusitânia e os lusitanos criou o primeiro monumento da literatura portuguesa .- pela sua dimensão geográfica e em particular pela antropológica pode ser considerada, pelo menos na versão latina, como um primeiro evento da nossa literatura, mais de um milénio antes de a Nação existir.

E ainda não foi desta vez que posso publicar o texto jubilatório sobre a magnífica literatura brasileira.
publicado por Carlos Loures às 12:00
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Quarta-feira, 29 de Setembro de 2010

Terreiro da Lusofonia - João Cabral de Melo Neto e Chico Buarque


João Cabral de Melo Neto, foi um dos maiores poetas brasileiros do século XX. Nasceu no Recife em 1920 e morreu no Rio de Janeiro em1999. Diplomata de profissão, a sua poesia caracterizou-se por um grande rigor formal, pela utilização de vocábulos que sugeriam secura, parcimónia e austeridade . Membro da Academia Brasileira de Letras, recebeu com vários prémios literários. Foi apontado como candidato ao Prémio Nobel.

As suas principais obras foram:
Pedra do Sono (1942); Os Três Mal-Amados (1943);O Engenheiro (1945); Psicologia da Composição com a Fábula de Anfion e Antiode (1947); O Cão sem Plumas (1950);O Rio ou Relação da Viagem que Faz o Capibaribe de Sua Nascente à Cidade do Recife (1954);Dois Parlamentos (1960);Quaderna (1960);A Educação pela Pedra (1966);Morte e Vida Severina (1966);Museu de Tudo (1975);A Escola das Facas (1980);Auto do Frade (1984);Agrestes (1985);Crime na Calle Relator (1987);Primeiros Poemas (1990);Sevilha Andando (1990).

Morte e Vida Severina é uma das suas obras mais conhecidas. Chico Buarque de Holanda, musicou-a. No vídeo, podemos ouvir um excerto desse trabalho do então jovem músico em torno do poema de João Cabral de Melo Neto.

publicado por Carlos Loures às 01:30
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