Domingo, 18 de Julho de 2010

Bakunine por Bakunine (Raúl Iturra)

Carta ao Journal de Genève
Aos Senhores Redactores do Jornal de Genebra

Senhores,

Não faz parte dos meus hábitos responder às injúrias e às calúnias dos jornais. Eu teria tido muito trabalho, realmente, se tivesse querido apurar todas as besteiras que, desde 1869, sobretudo, se divertem a debitar em minha conta.

Entre os meus caluniadores mais furiosos, ao lado dos agentes do governo russo, eu situo naturalmente o Sr. Marx, o chefe dos comunistas alemães, que, sem dúvida, por causa do seu tríplice carácter de comunista, alemão e judeu, me odiou, e que, dizendo nutrir igualmente um grande ódio contra o governo russo, em relação a mim pelo menos, nunca deixou de agir em plena harmonia com ele.

Para me sujar aos olhos do público, o Sr. Marx não somente recorreu aos órgãos de uma imprensa muito complacente, serviu-se também dos correspondentes íntimos, dos comités, das conferências e dos próprios congressos da Internacional, não hesitando em fazer desta bela e grande Associação que ele tinha ajudado a fundar, um instrumento das suas vinganças pessoais.

Hoje mesmo anunciaram-me a publicação de uma brochura sob o título; “A Internacional e a Aliança”. É, segundo dizem, o relatório da comissão de inquérito nomeada pelo Congresso de Haia.

Quem não sabe que este Congresso não foi outra coisa senão uma falsificação marxista, e que esta comissão, na qual tinham sítio dois delatores (Dentraygues e Van Heddeghem), tomou decisões que ela própria declarou ser incapaz de justificar, ao pedir ao Congresso um voto de confiança; o único membro honesto da comissão protestou energicamente contra essas conclusões, ao mesmo tempo odiosas e ridículas, num relatório de minoria.

Pouco satisfeito com a inépcia dos seus agentes, o Sr. Marx teve o trabalho, ele próprio, de redigir um novo relatório que publica hoje com a sua assinatura e as de alguns dos seus cúmplices.

Esta nova brochura, disseram-me, é uma denúncia formal, uma denúncia de policial, contra uma sociedade conhecida sob o nome de Aliança. Arrastado pelo seu ódio furioso, o Sr. Marx não temeu aplicar nele próprio uma bofetada, ao assumir publicamente o papel de um agente de polícia delator e caluniador. É sua responsabilidade, e como esta profissão lhe convém, que ele a exerça. E não é para lhe responder que eu farei excepção à lei de silêncio que me impus.

Hoje, todavia, Senhores, creio dever fazer excepção para repelir mentiras, ou, para falar uma linguagem mais parlamentar, erros que deslizaram nas colunas de vosso jornal.

No vosso número de 14 de Setembro, que me foi impossível conseguir, vós havíeis reproduzido, disseram-me, a correspondência de um jornal de Paris, La Liberté ou o Journal des Débats, no qual um senhor anónimo afirma descaradamente ter-me escutado declarar, ou melhor, gabar-me de ter sido a causa de todas as convulsões revolucionárias que agitam a Espanha. É simplesmente estúpido! Seria o mesmo que dizer que eu causei todas essas tempestades que no decorrer deste ano assolaram o oceano e a terra.

De tanto caluniar, esses senhores acabarão por me deificar.

É preciso que eu vos assegure que jamais mantive tais propósitos? Estou certo de que jamais encontrei este senhor e desafio-o a dar o seu nome e a designar o dia e o local onde nos teríamos encontrado.


25 de Setembro de 1873. Journal de Genève.


Mas vós próprios, Senhores, no número de 19 de Setembro, de vosso jornal, vós me atribuístes escritos cuja publicação me é estranha.

Assim também, permitir-me-ei endereçar-vos um pedido que vossa justiça não poderá negar. Na próxima vez, quando quiserdes conceder-me a honra de vossos ataques, acusai-me apenas pelos escritos que são assinados por mim.

Confesso-vos que tudo isso me enojou profundamente da vida pública. Estou farto de tudo isso. Após ter passado toda minha a vida na luta, estou cansado. Já passei dos sessenta anos, e uma doença no coração, que piora com a idade, torna a minha existência cada vez mais difícil. Que outros mais jovens se ponham ao trabalho. Quanto a mim, não sinto mais a força, nem talvez a confiança necessária para empurrar por mais tempo a pedra de Sysipho contra a reacção triunfante em todos os lugares. Retiro-me, pois, da liça, e peço a meus caros contemporâneos apenas uma coisa: o esquecimento.

De agora em diante não atrapalharei o repouso de mais ninguém; que me deixem, por minha vez, tranquilo.

Acreditei muito em vossa justiça, Senhores, ao esperar que vós não recusaríeis a publicação desta carta?


Durante dois anos e meio suportamos em silêncio esta agressão imunda. Os nossos caluniadores haviam inicialmente começado por vagas acusações, misturadas com covardes reticências e insinuações venenosas, mas ao mesmo tempo tão estúpidas, que por falta de outras razões para me fazer calar, o desgosto somado ao desprezo que tinham provocado no meu coração teria sido suficiente para explicar e legitimar o meu silêncio. Posteriormente, encorajados por essa indulgência, da qual eles não souberam adivinhar as verdadeiras razões, levaram a sua suja maldade até a apresentar-me como um agente assalariado pan-eslavismo russo, napoleónico, bismarckiano, quem sabe até mesmo papal...


Era realmente muito estúpido responder a isso. Mas tive, para guardar silêncio, razões bem mais importantes do que o desgosto natural que sentimos em lutar contra a lama. Eu não quis fornecer um pretexto a esses dignos cidadãos, que evidentemente buscavam um, para poder reduzir ao seu nível um grande debate de princípios, transformando-o numa miserável questão pessoal. Eu não quis tomar nenhuma parte na terrível responsabilidade que deve recair sobre aqueles que não temeram introduzir nesta Associação Internacional dos Trabalhadores, da qual o proletariado de tantos países espera hoje a sua salvação, o escândalo das ambições pessoais, os germes da discórdia e da dissolução. Eu não quis absolutamente oferecer ao público burguês o espectáculo, tão triste para nós, tão reconfortante para ele, das nossas dissensões internas.

Enfim, pensei que devia abster-me de atacar, diante deste mesmo público, uma súcia na qual, gosto de reconhecer, há homens que prestaram incontestáveis serviços à Internacional.

Sem dúvida, esses homens desonram-se, hoje, e causam um grande dano à Internacional ao servirem-se da calúnia para combater adversários que eles desesperam provavelmente em aniquilar pela força dos seus argumentos. Sem dúvida, ao seu grande zelo pela causa do proletariado soma-se, de um modo bastante desagradável, uma considerável dose de pretensões vaidosas e opiniões ambiciosas, tanto pessoais quanto de raça... Mas não é menos verdade que esse zelo é sincero. Pelo menos, estou perfeitamente convencido disso, não em relação a todos, mas a um grande número de entre eles; e como eles são todos solidários, tive que me abster de atacar uns para poder poupar os outros.

Assim, sempre me resguardei de chamar todos os meus caluniadores diante de um júri de honra que o Próximo Congresso Geral, sem dúvida, não me recusará. E por pouco que este júri me ofereça todas as garantias de um julgamento imparcial e sério, poderei expor-lhe com detalhes necessários todos os factos, tanto políticos quanto pessoais, sem temor pelos inconvenientes e pelos perigos de uma divulgação indiscreta.

Mas há um outro facto, de carácter totalmente público, e que a calúnia marxista, referendada desta vez por todos os membros do Conselho Geral, desnaturou consciente e maldosamente.

Restabelecê-los em sua verdade, contribuindo, na medida das minhas forças, à demolição do sistema de mentiras edificado pelo Sr. Marx e seus acólitos, tal será o objecto de um texto que me proponho publicar antes da reunião do congresso.

Terminarei esta carta com uma última observação. Nada prova melhor a dominação desastrosa do Sr. Marx no Conselho Geral do que a referida circular. Percorrei os nomes dos quarenta e sete signatários e encontrareis somente sete ou oito que se puderam pronunciar neste caso com algum conhecimento de causa. Todos os outros, instrumentos complacentes e cegos da cólera e da política marxista, referendaram uma condenação infame contra nós, a quem jamais viram, nem ouviram falar, a quem julgaram e executaram sem se terem sequer dignado dirigir-nos uma pergunta!

É assim, pois, que no Conselho Geral de Londres se entende a justiça, a verdade, a moral que, segundo as considerações dos nossos estatutos gerais, devem servir de base a todas as relações, tanto colectivas quanto individuais na Associação Internacional dos Trabalhadores?

Ah! Senhor Karl Marx, é mais fácil colocá-las à frente de um programa do que exercê-las!

Dir-se-ia que neste momento em que a Federação belga questiona a existência ulterior do Conselho Geral, todos os membros deste Conselho se sentiram orgulhosos em provar, não somente que a sua instituição se tornou inútil, mas que ela nada mais é hoje do que uma instituição malfazeja.



Saudações e solidariedade.


Ilustração: desenho de Bakunin por Félix Valloton publicado em 1895.














Bakunine por Bakunine (14)



CARTA AOS REDACTORES DO BOLETIM DA FEDERAÇÃO DO JURA



Caros companheiros,

Eu não posso nem devo deixar a vida pública sem vos endereçar uma última palavra de reconhecimento e de simpatia.

Faz quatro anos e meio aproximadamente que nós nos conhecemos, e apesar de todos os artifícios de nossos inimigos comuns e das calúnias infames que lançaram contra mim, conservastes vossa estima, vossa amizade e vossa confiança em mim. Vós não vos deixastes intimidar por esta denominação de “Bakunineeianos” que eles lançaram em vossos rostos, preferindo guardar a aparência de serem homens dependentes, do que a certeza de terdes sido injustos.

Por sinal, sempre tivestes, e em alto grau, a consciência da independência e da perfeita espontaneidade das vossas opiniões, tendências, actos, e a pérfida intenção dos nossos adversários era tão transparente, por outro lado, que não pudestes tratar as suas insinuações caluniosas e ferinas de outra forma, se não com o mais profundo desprezo.

Vós o fizestes, e é precisamente porque tivestes a coragem e a constância de fazê-lo que acabastes de conquistar hoje, contra a intriga ambiciosa dos marxistas, e em proveito da liberdade do proletariado e de todo o futuro da Internacional, uma vitória tão completa.

Fortemente socorridos pelos vossos irmãos de Itália, de Espanha, de França, da Bélgica, da Holanda, da Inglaterra e da América, fizeram retomar a grande Associação Internacional dos Trabalhadores ao caminho, do qual as tentativas ditatoriais do Sr. Marx fracassaram em desviá-la.

Os dois Congressos que acabam de se realizar em Genebra foram uma demonstração triunfante, decisiva, da justiça e, ao mesmo tempo também, da potência da vossa causa.

O vosso Congresso, o da liberdade, reuniu no seu seio os delegados das principais federações da Europa, menos a Alemanha; proclamou em voz alta e estabeleceu amplamente, ou melhor, confirmou a autonomia e a solidariedade fraterna dos trabalhadores de todos os países. O Congresso autoritário ou marxista, composto unicamente de alemães e de operários suíços, que parecem ter aceitado a liberdade em desgosto, esforçou-se em vão para remendar a ditadura arrebentada, e de agora em diante ridicularizada, do Sr. Marx.

Após ter lançado muitas injúrias aqui e ali, para constatar a sua maioria genebrina e alemães, chegaram a um produto híbrido que não é mais a autoridade integral, sonhada pelo Sr. Marx, mas que é ainda menos a liberdade, e separaram-se profundamente desencorajados e descontentes com eles próprios e com os outros. Esse Congresso foi um enterro.

Assim, a vossa vitória, a vitória da liberdade e da Internacional contra a intriga autoritária, está completa. Ontem, quando podia parecer ainda incerta, – ainda que, no que me concerne, jamais duvidei disso, – ontem, digo, não era permitido a ninguém abandonar as suas fileiras. Mas, hoje, quando esta vitória se tornou um facto realizado, a liberdade de agir segundo as suas conveniências pessoais voltou a cada um.

12 De Outubro de 1873.



Tomo vantagem desta carta, caros companheiros, para vos pedir a gentileza de aceitar a minha demissão como membro da Federação Jurássica e membro da Internacional. Possuo muitas razões para assim agir. Não acrediteis que seja principalmente por causa dos desgostos pessoais dos quais eu estive saturado nesses últimos anos. Não digo que eu lhes seja absolutamente insensível; todavia, eu sentiria ainda bastante força para resistir, se pensasse que a minha participação posterior no vosso trabalho, nas vossas lutas pudesse ter alguma utilidade no triunfo da causa do proletariado. Mas não acredito nisso.

Por nascimento e pela minha posição pessoal, e não por minhas simpatias e tendências, nada mais sou do que um burguês e, como tal, não saberiam fazer outra coisa entre vós senão propaganda teórica. Bem, tenho esta convicção de que o tempo dos grandes discursos teóricos, impressos ou falados, passou. Nos últimos nove anos desenvolveram-se no seio da Internacional mais ideias do que era preciso para salvar o mundo, se apenas as ideias pudessem salvá-lo, e desafio quem quer que seja a inventar uma nova.

O tempo não está mais para ideias, e sim para factos e para actos. O que mais importa, hoje, é a organização das forças do proletariado. Mas esta organização deve ser obra do próprio proletariado. Se eu fosse jovem, transportar-me-ia para um meio operário, e, compartilhando a vida laboriosa dos meus irmãos, participaria igualmente com eles no grande trabalho dessa organização necessária.

Mas a minha idade e a minha saúde não me permitem fazê-lo. Elas pedem-me, ao contrário, a solidão e o repouso. Cada esforço, uma viagem a mais ou a menos, torna-se um caso muito sério para mim. Moralmente sinto-me ainda bastante forte, mas fisicamente canso-me rapidamente, não sinto mais as forças necessárias à luta. Eu não poderia ser, no campo do proletariado, mais do que um estorvo, não uma ajuda.

Como vedes, caros companheiros, tudo me obriga a pedir a demissão. Vivendo longe de vós e longe de todo o mundo, que utilidade eu poderia ter para a Internacional em geral e para a Federação do Jura em particular? Vossa grande e bela Associação, de agora em diante totalmente militante e prática, não deve sofrer com sinecuras nem posições honorárias no seu seio.

Retiro-me, então, caros companheiros, pleno de reconhecimento por vós e de simpatia pela vossa grande e santa causa, – a causa da humanidade. Acompanharei com uma ansiedade fraterna todos os vossos passos, e saudarei com alegria os vossos novos triunfos.

Estarei convosco até à morte.

Mas antes de nos separarmos, permiti que eu vos dê um último conselho fraterno. Meus amigos, a reacção internacional, cujo centro hoje não está nesta pobre França, burlescamente dedicada ao Sacré-Coeur, mas sim na Alemanha, em Berlim, e que é representada tanto pelo socialismo do Sr. Marx quanto pela diplomacia do Sr.Bismarck; esta reacção que propõe como objectivo final do pangermanismo da Europa, ameaça tudo engolir e tudo perverter neste momento. Declarou guerra mortal à Internacional, representada hoje unicamente pelas Federações autónomas e livres. Como os proletários de todos os outros países, mesmo que fazendo parte de uma república ainda livre, sois forçados a combatê-la, pois ela interpôs-se entre vós e o vosso objectivo final, a emancipação do proletariado do mundo inteiro.

As lutas que tereis que sustentar serão terríveis. Mas não vos deixais desencorajar, e sabei que, apesar da imensa força material dos vossos adversários, o triunfo final vos estará assegurado, se observardes fielmente estas duas condições:



1ª Mantende-vos firmes no vosso princípio da grande e ampla liberdade popular, sem a qual a igualdade e a solidariedade, elas próprias, nada mais seriam do que mentiras.



2ª Organizai cada vez mais a solidariedade internacional, prática, militante, dos trabalhadores de todas as profissões e de todos os países, e lembrai que, infinitamente fracos como indivíduos, como localidades ou como países isolados, encontrareis uma força imensa, irresistível, nesta universal colectividade.

Adeus. Vosso irmão,

Mikhail Bakuninee















Bakunine por Bakunine (15)

O REPOUSO DE UM GUERREIRO

CARTA A NIKOLAI OGAREV



Assim, caro e velho amigo, eis que partiste para bem longe. Tranquiliza-me escrever, porque distante deles, os Herzen não te esquecerão nem te deixarão sem ajuda financeira, na miséria e na dificuldade, insuportáveis a um homem da tua idade e, além do mais, doente. Este é o primeiro ponto. Eis o segundo; deves ter encontrado em Londres um meio russo, ou mesmo um único russo com o qual podes ter trocado algumas francas palavras sobre a situação da Rússia, a qual, como sempre, te interessa com certeza mais do que qualquer outra coisa no mundo. É certo, Lavrov vive em Londres com todo o seu clã. Mas quando o conheceres melhor, ele e todos os outros, duvido que te pareça oportuno estabelecer relações de boa fé. A propósito, leste a minha última brochura anónima: Anarquia e Estado? Se ainda não leste, escreve-me, eu a enviarei.

Mas, sobretudo, peço-te uma vez mais, escreve-me com quem e como vives, quais são as pessoas que vês e com quem passas os teus dias. Eu temo que as relações inglesas da tua esposa (sem o pope) – tua esposa, à qual peço-te que dês minhas lembranças – sejam para ti não muito interessantes e que te sintas, hoje, em Londres, mais só do que nunca e do que em qualquer outro lugar – e na nossa idade isto é um sentimento penoso. Um único consolo: a morte que se aproxima. O sino soou muito; agora abandona o campanário.

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Eu mesmo, meu velho amigo, coloquei-me à distância, e desta vez radical e irrevogavelmente, de toda a actividade real, de todo o contacto por empreendimentos de ordem prática. Primeiramente, porque a época actual não convém, decididamente, para acções deste género. O Bismarckismo, ou seja, o militarismo, a polícia e o monopólio das finanças confundidos num único e mesmo sistema que se chama Estado moderno, triunfam em todos os lugares. Talvez durante dez ou quinze anos, esta potente e científica negação de tudo o que é humano continue ainda o seu triunfo. Não digo que actualmente não se tenha nada a fazer, mas esta nova acção exige novos métodos e sobretudo forças novas e jovens, e sinto que não valho nada para esse combate. Foi por isso que apresentei minha demissão sem esperar que algum impertinente Gil Blas me venha dizer: “Monseigneur, plus d’homélies!”

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A minha saúde não cessa de piorar, de forma que me tomei completamente inapto para novas tentativas ou acções revolucionárias aleatórias.





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Esta frase está em francês no texto original.



Por este motivo, retirei-me ao seio de minha família, vinda da Sibéria, e moramos todos juntos em Lugano, e não Locarno.

Com certeza deves ter ouvido falar, várias vezes, no ano passado, que eu comprei uma grande propriedade perto de Locarno; e, sem dúvida, como muitos outros, deves ter perguntado onde consegui dinheiro para esta aquisição. Eis, para ti, a solução do enigma: eu nunca fui o proprietário, fui unicamente um prête-nom 9 para o meu rico amigo Cafiero. Ficou decidido que eu seria o proprietário de nome, a fim de que eu pudesse adquirir a cidadania; o que nos pareceu necessário, pois um cidadão não pode ser expulso do cantão de Tessin, e a minha estada neste cantão havia sido julgada indispensável. Assim, passei por proprietário, por burguês; não apenas não me aborreci por me terem considerado como tal, mas fazia mesmo tudo o que era possível para que esta nova reputação se espalhasse o máximo possível. Quanto mais burguês pudesse parecer, mais útil e mais segura seria a minha actividade anónima.

Mas hoje, tendo definitiva e irrevogavelmente renunciado a esta actividade, não preciso mais de máscara; devolvi as minhas plumas de pavão, quero dizer, a propriedade, ao seu verdadeiro proprietário, a meu amigo Cafiero; eu próprio me distanciei e resido agora, com a minha família, em Lugano. Compreendestes? Se, sim, guarda isto para ti e não repitas a ninguém o que acabo de te dizer.

Fora isso, não cruzo os braços, trabalho muito. Primeiramente, escrevo as minhas memórias; e, em segundo lugar, simultaneamente, proponho-me a escrever, se as minhas forças o permitirem, uma última palavra sobre as minhas convicções mais íntimas, e leio imenso. Tenho actualmente três livros à mão: Kolb’s Culturgeschichte der Menschheit, Autobiography de Stuart Mill e Schopenhauer.

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Leste a Autobiografia? Se ainda não o fizeste, não deixes absolutamente de fazê-lo. A obra é, ao mais elevado ponto, interessante e instrutiva. Do teu lado, escreve-me sobre o que lês; e, se valer a pena, recomenda-me. Chega de ensinar, nós iremos, amigo, dedicar-nos nos nossos velhos dias, a aprender. É mais divertido.

Escreve o mais rápido possível. Eis o meu endereço: Suíça Lugano, Caixa Postal.

Lugano, 1 1 de Novembro de 1874.



Senhor

M. Bakuninee.

Eu te abraço, velho amigo, e lembranças de minha parte a Miss Mary. Responde-me rapidamente.

Teu M. Bakuninee



























Bakunine por Bakunine (16)





CARTA A ELISÉE RECLUS



Meu caro amigo. Agradeço-te muito pelas tuas boas palavras. Jamais duvidei da tua amizade, este sentimento é sempre mútuo e eu julgo o teu em relação ao meu.

Sim, tens razão, a revolução no momento foi ao leito, recaímos no período das evoluções, quer dizer, naquele das revoluções subterrâneas, invisíveis e frequentemente mesmo insensíveis. A evolução de hoje é muito perigosa, se não para a humanidade, pelo menos para certas nações. É a última encarnação de uma classe esgotada, jogando seu último jogo, sob a protecção da ditadura militar macmahono – bonapartista na França, bismarckiana no resto da Europa.

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Em francês no texto original.

Lugano, 15 de Fevereiro de 1875. Archives Bakounine, Tomo V. op-pp. LXXXIII - LXXXIV.



Eu concordo contigo em dizer que a hora da revolução passou, não por causa dos horrorosos desastres dos quais fomos testemunhas e das terríveis derrotas das quais fomos vítimas culpadas, mas porque, para meu grande desespero, constatei e constato todos os dias que o pensamento, a esperança e a paixão revolucionários não se encontram absolutamente nas massas, e quando elas estão ausentes, de nada vale fazer esforços inúteis. Admiro a paciência e a perseverança heróicas dos prussianos e dos belgas – estes últimos moicanos da falecida Internacional - e que apesar de todas as dificuldades, adversidades, apesar de todos os obstáculos, no meio da indiferença geral, opõem sua fronte obstinada ao curso absolutamente contrário das coisas, continuando a fazer tranquilamente o que fizeram antes das catástrofes, quando o movimento geral era ascendente e o mínimo esforço criava uma força. Trabalho ainda mais meritório, visto que não colherão os frutos, mas eles podem estar certos de que o trabalho não será perdido nada se perde neste mundo – e as gotas de água, por serem invisíveis, nem por isso deixam de formar o oceano.

Quanto a mim, meu caro, tornara-me muito velho, muito doente, muito desencorajado, e, devo-te dizer, sob muitos pontos de vista muito desiludido, para sentir o desejo e a força de participar nesta obra.

Decididamente retirei-me da luta e passarei o resto dos meus dias numa contemplação não desocupada, bem ao contrário, intelectualmente bem activa, e que, espero, não deixará de produzir alguma coisa de útil.

Uma das paixões que me domina, neste momento, é uma imensa curiosidade. Uma vez que tive de reconhecer que o mal triunfou e que não pude impedi-lo, pus-me a estudar as suas evoluções e os seus desenvolvimentos com uma paixão quase científica, completamente objectiva.

Que actores e que cena. No fundo, e dominando toda a situação na Europa, estão o Imperador Guilherme e Bismarck, à frente de um grande povo lacaio. Contra eles, o papa, com seus jesuítas, com toda a Igreja católica e romana, ricos em biliões, dominam uma grande parte do mundo através das mulheres, pela ignorância das massas, e pela habilidade incomparável dos seus inúmeros filiados, tendo os seus olhos e as suas mãos em todos os lugares.

Terceiro actor – A civilização francesa, encarnada em Mac-Mahon, Dupanloup e Broglie, colocando as correntes num grande povo em declínio. E em torno de tudo isso, a Espanha, a Itália, a Áustria e a Rússia, fazendo cada uma sua careta de ocasião, e de longe a Inglaterra, não podendo decidir-se a voltar a ser alguma coisa, e ainda mais longe, a República modelo dos Estados Unidos da América, já se engraçando com a ditadura militar.

Pobre humanidade!

É evidente que ela só poderá sair desta cloaca por uma imensa revolução social. Mas como fará esta revolução? Nunca a reacção internacional da Europa esteve tão formidavelmente armada contra todo o movimento popular. Ela fez da repressão uma nova ciência que se ensina sistematicamente nas escolas militares aos tenentes de todos os países. Para atacar esta fortaleza inexpugnável o que temos? As massas desorganizadas. Mas como organiza-las, quando elas não são suficientemente apaixonadas pela sua própria salvação, quando elas não sabem o que devem querer e quando não querem a única coisa que pode salvá-las.

Resta a propaganda, tal como a fazem os jurassianos e os belgas. É alguma coisa sem dúvida, mas muito pouca coisa, algumas gotas de água no oceano; e se não houvesse outro meio de salvação, a humanidade teria tido tempo de apodrecer dez vezes antes de ser salva.

Resta uma outra esperança: a guerra universal. Estes imensos Estados militares devem-se entre destruir e se entre devorar, cedo ou tarde. Mas que perspectiva!

Fonte: http://www.sabotagem.cjb.net/
publicado por Carlos Loures às 15:00
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Quinta-feira, 15 de Julho de 2010

Bakunine por Bakunine (Raúl Iturra)

MARX E A INTERNACIONAL: CARTA AOS INTERNACIONAIS DE BOLONHA - 4 (Continuação)


Mas, desde o Outono de 1868, os chefes, os propagadores e os agitadores, em grande parte judeus, do Partido da democracia socialista, que tinha acabado de se formar, sempre sob a inspiração de Marx, no norte da Alemanha, começaram a conquistar para o seu lado os judeus da Áustria, e juntos puseram-se a magnetizar, a fazer sermão, a enganar os operários alemães da Áustria. Eles não trabalharam em vão. Há um ou dois meses, os mesmos operários alemães de Viena, reunidos novamente numa grande assembleia popular e já organizados segundo o programa e sob a direcção dos chefes do partido da democracia socialista, traduzindo dali por diante, sob inspiração exclusivamente tudesca, o cosmopolitismo no sentido do pangermanismo, declaram-se partidários da grande pátria alemã, quer dizer, do Estado pangermânico, que se diz popular, do qual eles esperam estupidamente a emancipação do proletariado, como se um grande Estado pudesse ter outra missão que não a de subjugar o proletariado.


Examinaremos esta questão numa próxima oportunidade, caros amigos. Enquanto se espera, vós compreendereis que esta nova resolução teve como consequência natural alijar do movimento do proletariado todos os operários não alemães da Áustria.

Na Suíça, vemos hoje, sempre sob a influência directa e em nome dos princípios deste mesmo programa da democracia socialista tudesca, todos os operários dos cantões alemães, em Zurique e na Basileia sobretudo, mas também em Argóvia e em Berna, a reivindicação de quê?


Da abolição do sistema federal e da transformação da Federação suíça, garantia da liberdade suíça, numa centralização única do Estado. Sabeis o que isso significa? É o começo da absorção, da conquista da Suíça, a alemã pelo menos, pela Alemanha; mas não somente da Suíça alemã, de toda a Suíça, pois as reformas que se preparam e que se discutem agora, se elas passarem, terão inicialmente por efeito inevitável subordinar absolutamente as Suíças italianas e romanches à direcção, ao governo, e à administração exclusiva dos Suíços alemães, e mais tarde, por estes últimos, subordinar os da Prússia - e tudo isso pelo maior triunfo de todos os judeus da Alemanha e da Suíça que engordarão nessas manipulações...

Tal é o espírito do programa que os delegados do Partido da democracia socialista da Alemanha, da Áustria e da Suíça alemã, desembarcados em grande número no Congresso de Basileia, em Setembro de 1869, tentaram fazer prevalecer neste Congresso, com o apoio unânime de todos os delegados do Conselho Geral de Londres, alemães e ingleses, escolhidos com cuidado pelo próprio Marx, e todos, naturalmente, seus partidários fanáticos.

Evidentemente que se tratava de um golpe montado. Todavia, fracassou diante da oposição unânime dos delegados franceses, belgas, suíços romanches, italianos e espanhóis.

Foi um completo fiasco. Todas as proposições, tendendo a colocar o movimento socialista e revolucionário do proletariado da Europa a reboque do radicalismo burguês e do comunismo judeu – pangermânico dos alemães, foram rejeitadas Inde irae.

Desde então os congressos gerais, essas verdadeiras tribunas do proletariado do mundo civilizado, foram condenados no espírito dos mentores quer dizer, dos alemães do Conselho Geral de Londres - no espírito de Marx e de seus discípulos.

Até 1869, o papel do Conselho Geral na Internacional, tal como foi determinado pelos nossos estatutos gerais e pelas sessões dos Congressos de Genebra, de Lausanne e de Bruxelas, foi muito restringido; ele tinha apenas a missão muito modesta de não ser nada mais do que um Bureau central de correspondência e de comunicações entre os grupos nacionais dos diferentes países – e sobretudo entre os três grupos regionais: anglo-americano, alemão e latino, que tinham naturalmente pouca comunicação entre eles. Por sinal, ele não possuía nenhuma missão legislativa, nem mesmo governamental, o que quer que diga Mazzini disso. O poder legislativo, se havia poder, residia unicamente nos congressos. E mesmo as resoluções dos congressos, ainda que respeitadas como sendo a expressão dos desejos da maioria, não eram consideradas como obrigatórias, com a base real da Associação Internacional, seu pensamento, sua vida, residindo inteiramente na autonomia, na acção espontânea e na livre federação, de baixo para cima, das secções.

Isso esteve e ainda está em uso constante em todas as secções da Internacional, excepto as da Alemanha, onde hoje parece prevalecer uma disciplina totalmente bismarckiana, de tal forma que, após cada congresso, os delegados, uma vez retornados às suas respectivas secções, devem prestar contas detalhadamente a estas últimas de todas as discussões que aconteceram no congresso, explicar as razões de seus próprios votos e submeter à aceitação ou à rejeição das secções as resoluções votadas pela maioria do congresso. Resulta daí que os próprios congressos – de grande valor sob este aspecto, pois apresentavam os desejos, as aspirações, as diversas tendências dos diferentes grupos, tendiam a harmonizá-los e a unificá-los não autoritariamente, mas pelo próprio efeito deste encontro, desta fricção fraternal, anualmente renovado, – não tinham, portanto, e não devem ter força soberana, pois o efeito desta força seria a de submeter uma minoria qualquer à lei da maioria, e, na maioria das vezes, mesmo a maioria das secções a uma maioria artificial produzida pela surpresa ou pela intriga de uma minoria no seio do congresso; seria, numa palavra, a de transformar a Internacional num Estado político com a liberdade fictícia e a escravidão real da massa do proletariado.

Nós desejamos a unidade, mas a unidade real, viva, resultante da livre união das necessidades, dos interesses, das aspirações, das ideias dos indivíduos tanto quanto das associações locais e que são, por consequência, a expressão e o resultado, sempre real e sincero, do maior desenvolvimento da sua liberdade, da sua existência e acção espontânea, mas não uma unidade imposta, seja pela violência, seja por artifícios parlamentares. Numa palavra, somos francamente comunalistas e federalistas, significa dizer que nós seguimos estritamente o espírito assim como a carta dos nossos estatutos gerais, a lei constitutiva da Internacional.

É a única lei obrigatória para todas as secções, e sobre a única base desta lei todas as secções são autónomas, soberanas, ao mesmo tempo que elas estão realmente ligadas por uma solidariedade internacional não dogmática, não governamental, mas prática.

Esta solidariedade internacional prática, lei suprema e absolutamente obrigatória da internacional, pode-se resumir nestes termos:

Cada membro da Internacional: indivíduos, secções de profissão ou quaisquer outras, grupos ou federações de secções, federações locais, regionais, nacionais, são igualmente obrigadas a apoiarem-se e a socorrerem-se mutuamente, até ao limite do possível, na luta de cada um e de todos contra a exploração económica e contra a opressão política do mundo burguês.

(Continua)

Ilustração: Magón, Proudhon e Bakunine no mural "Del porfirismo a la Revolución".
publicado por Carlos Loures às 15:00
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Segunda-feira, 12 de Julho de 2010

Bakunine por Bakunine (Raúl Iturra)

MARX E A INTERNACIONAL: CARTA AOS INTERNACIONAIS DE BOLONHA


Dezembro de 1871. Instituto Internacional de História Social de Amesterdão.

A guerra acaba de ser declarada ao Conselho Geral. Mas não vos assustais, caros amigos, a existência, a potência e a unidade real da Internacional não sofrerão, porque sua unidade não está em cima, não está num dogma teórico uniforme imposto à massa do proletariado, tampouco num governo mais ou menos ditador como aquele que o Congresso dos operários mazzinianos acaba de instituir em Roma; ela está em baixo: na identidade da situação material dos sofrimentos, das necessidades e das aspirações do proletariado de todos os países; a potência da Internacional não reside em Londres, ela está na livre federação das secções operárias autónomas de todos os países e na organização, de baixo para cima, da solidariedade prática entre elas. Eis os princípios que nós defendemos hoje contra as usurpações e contra as veleidades ditatoriais de Londres que, se elas pudessem triunfar, matariam a Internacional, com certeza.

Um Conselho Geral da Internacional, que esteja sedeado em Londres ou em outro lugar, só é suportável, possível, na medida em que é revestido de atributos modestos de um Bureau central de, apenas, correspondência. É também aproximadamente o único papel que lhe atribuem nossos estatutos gerais. Mas tão logo ele queira se tornar um governo real, ele se torna necessariamente uma monstruosidade, uma absoluta impossibilidade. Imaginem um tipo de monarca universal, colectivo, impondo sua lei, seu pensamento, seu movimento, sua vida aos proletários de todos os países, reduzidos ao estado de miséria! Mas seda, paródia ridícula do sonho ambicioso dos Césares, dos Carlos V, dos Napoleão, sob a forma de uma ditadura universal, socialista e republicana. Seria um golpe de misericórdia dado na vida espontânea de todas as outras secções, a morte da Internacional.

Estes doutrinários e estes autoritários, Mazzini tanto quanto Marx, confundem sempre a uniformidade com a unidade, a unidade formal dogmática e governamental com a unidade viva e real, que só pode resultar do mais livre desenvolvimento de todas as individualidades e de todas as colectividades e da aliança federativa e absolutamente livre, na base de seus próprios interesses e de suas próprias necessidades, das associações operárias nas comunas, e, para além das comunas, comunas nas regiões, regiões nas nações, e nações na grande e fraternal União internacional, humana, organizada federativamente somente pela liberdade com base no trabalho solidário de todos e da mais completa igualdade económica e social.

Eis o programa, o verdadeiro programa da Internacional, que nós opomos ao novo programa ditatorial de Londres. Nós, quer dizer, a Confederação das secções do Jura, à qual eu pertenço. Nós não somos os únicos: a imensa maioria, pode-se quase dizer todos os internacionais franceses, espanhóis, belgas, e italianos também, eu espero - já temos a adesão de várias secções italianas e, não duvidamos, da vossa secção - numa única palavra, todo o mundo latino está connosco. Os operários ingleses e americanos têm muito acentuado o sentimento de sua independência e o hábito da acção e da vida espontânea para se preocupar ou para levar em consideração as pretensões bismarckianas do Conselho Geral, que sequer ousa anunciá-las. Há somente o mundo propriamente tudesco que se submete a ele com esta paixão da disciplina ou da servidão voluntária que o distingue hoje. O pensamento que acaba de prevalecer, infelizmente, no seio do Conselho Geral, é um pensamento exclusivamente alemão.

Representado sobretudo por Marx um judeu alemão, um homem muito inteligente, muito culto, socialista convencido e que prestou grandes serviços à Internacional, mas ao mesmo tempo muito vaidoso, muito ambicioso, intrigante como um verdadeiro judeu que ele é – este pensamento, representado por Marx, o chefe dos comunistas autoritários da Alemanha, por seu amigo Engels, um homem muito inteligente também, o secretário do Conselho Geral para a Itália e para a Espanha, e por outros membros alemães do Conselho Geral, menos inteligentes, mas não menos intrigantes e não menos fanaticamente devotados a seu ditador – Messias, Marx, – este pensamento lhes é inspirado por um sentimento de raça. Como o pangermanismo que, aproveitando-se dos triunfos recentes do absolutismo militar da Prússia, é o pensamento

Omnidevorador e omniabsorvente de Bismarck, o pensamento do Estado pangermânico, submetendo mais ou menos toda a Europa à dominação da raça alemã, que eles acreditam ter sido chamada a regenerar o mundo. Estes pensamentos liberticidas, mortal para a raça latina e para a raça eslava, que se esforça hoje em se apoderar da direcção absoluta da Internacional. A esta pretensão monstruosa do pangermanismo, devemos opor a aliança da raça latina e da raça eslava, - não com este império monstruoso de todas as Rússias que nada mais é do que um tipo de império alemão que se impõe às populações eslavas pelo cnute (chicote usado na Rússia) tártaro, não com esta outra monstruosidade que se chama pan-eslavismo e não seria outra coisa senão o triunfo e a dominação deste cnute na Europa - não, a aliança da revolução económica e social dos latinos com a revolução económica e social dos eslavos, revolução que, fundada sobre a emancipação económica das massas populares e que, tomando por base de sua organização e autonomia das associações operárias, das comunas, das regiões e das nações livremente federadas, fundará um mundo internacional novo sobre as ruínas de todos os Estados - um mundo que, tendo por base material a igualdade, por alma a liberdade, por objecto de acção o trabalho, e por espírito unicamente a ciência, será o triunfo da humanidade.

Esta aliança latino-eslava não fará absolutamente a guerra ao proletariado da Alemanha, hoje infelizmente enganado por seus chefes. Regra geral: nunca são as massas populares que criam a vaidade e a ambição nacional, são sempre seus chefes que os exploram e que têm naturalmente um grande interesse em estender os limites do mundo submetido à sua exploração lucrativa. Assim, pois, longe de lhe fazer guerra, a aliança latino - eslava procurará ao contrário reforçar e multiplicar os elos da mais estreita solidariedade com o proletariado da Alemanha, cuidando de fazer penetrar em seu seio, por uma propaganda ardente e infatigável, este princípio, esta paixão da liberdade que, derrubando todo o aparato artificial do novo despotismo que seus chefes actuais gostariam de construir sobre seus ombros, de há muito habituados à servidão, somente poderá lhe dar e lhe assegurar o que ele procura e o que ele quer tão apaixonadamente quanto o proletariado de todos os outros países: uma existência humana.

Retorno ao Conselho Geral de Londres. Suas pretensões actuais são tanto mais ridículas e absurdas porque a sua composição e a sua constituição, completamente irregulares e provisórias, deveriam ter-lhe imposto sentimentos muito mais modestos. Compreender-se-ia ainda que ele se arrogasse o direito – sempre iníquo e liberticida segundo minha opinião, excepto em caso de guerra – o direito de impor as suas leis a todos os grupos nacionais da Internacional se ele realmente fosse o representante destes grupos. Mas para isso teria sido preciso que ele fosse composto de delegados nomeados e renovados pela eleição anual ou bi-anual destes grupos.

Seria necessário que cada país fosse nele representado por dois delegados, pelo menos, especialmente eleitos pelo Congresso Nacional de todas as suas secções. Teria sido preciso, então, que cada grupo nacional fizesse uma despesa anual de quatro a seis mil francos, pagando a cada um de seus delegados gastos de correspondência inclusive, de dois a três mil francos por ano, pois a vida em Londres é mais cara do que em qualquer outro lugar. Em parte por causa desta consideração, mas em grande parte também pela pouca importância que, desde o início, se deu à missão e ao papel tão modesto que lhe eram determinados pelos estatutos gerais, criaram este resultado que a partir do primeiro Congresso da Internacional em Genebra (1866), do Congresso de Lausanne (1867), do de Bruxelas (1868) e do último Congresso de Basileia (1869), enfim, acharam mais cómodo deixar continuar provisória a existência do mesmo Conselho Geral, dando-lhe o direito de acrescentar novos membros ao invés de renová-lo todos os anos. Assim, com poucas excepções, desde que a Internacional existe, é sempre o mesmo Conselho Geral, este mesmo que, antes do Congresso de Genebra, chamava-se Conselho Geral ou Comité Central provisório, e que só tomou o título definitivo de Conselho Geral após a votação deste Congresso. Ele é, em imensa maioria, composto de alemães e de ingleses. Todas as outras nações estão pobremente representadas nele, algumas vezes por seus delegados nacionais que, residindo em Londres, têm a felicidade de agradar Marx e CIA, algumas vezes, à sua revelia, por indivíduos de uma secção diferente e, na maioria das vezes, por alemães. É assim que hoje mesmo a Itália e a Espanha estão representadas no Conselho por Engels, um alemão; a América, por Eccarius, alemão; a Rússia, por Marx, judeu alemão, o que é simplesmente ridículo. Para representar a França, desdenhando um Berqeret por exemplo, que redige e que vive! em Londres, e tantos outros representantes enérgicos, devotados e inteligentes da Comuna, e antigos membros da Internacional francesa, eles escolheram Serraillier, uma nulidade que nem sequer tinha feito parte da Internacional até então; isto pela simples razão que todos os franceses sérios, orgulhosos da sua dignidade e da sua independência, não quiseram, não puderam submeter-se a Marx, enquanto Serraillier, desejoso de se tornar, ou melhor, de parecer alguma coisa, diante dos seus compatriotas mais sérios, subordinou-se voluntariamente à ditadura do judeu alemão.


Ilustração: retrato de Karl Marx.
(Continua)
publicado por Carlos Loures às 15:00
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