Segunda-feira, 11 de Outubro de 2010

A Linguagem Codificada

Augusta Clara de Matos

Todas as áreas do saber têm a sua linguagem própria, facilmente entendida entre pares mas de difícil ou mesmo nula compreensão , nos casos de maior especialização, pelos leigos na matéria. É perfeitamente normal. Sempre assim foi e essa complexidade foi aumentando à medida que as disciplinas científicas se foram individualizando e os respectivos conhecimentos, bem como os de outras áreas, aprofundando.

Imaginemos que eu e a Andreia agora nos puséssemos para aqui a falar sobre uma estrutura orgânica constituída por bases que podem ser púricas ou pirimídicas, com os nomes X, Y, Z, por fósforo, açúcares e onde se falaria em ligações por pontes de hidrogénio, etc,etc. Alguém que não tivesse estudado biologia molecular descobriria que estávamos a falar de ácidos nucleicos, um dos quais se chama ácido desoxirribonucleico, o tão papagueado ADN de que toda a gente fala à boca cheia, a despropósito de tudo e de nada? Desconfio que não.

E o pior que não saber, ainda, é falar sem saber do que se está a falar. O ADN entrou na moda e, como tal, há ADN das empresas, ADN do país, ADN do diabo a quatro. No último programa “Prós e Contras” da RTP1 só o historiador Fernando Rosas teve o bom senso de se insurgir contra a atribuição, pela jornalista coordenadora do programa, do pobre ácido a Portugal. Bom, mas aí já íamos entrar na esfera da comunicação social.

Continuando: Se o Adão começasse a usar a linguagem codificada da cardiologia, ficaríamos a saber alguma coisa mais do que ficamos quando nos dizem que o nosso electrocardiograma está ou não normal ou que temos as carótidas desobstruídas? Claro que não.

Pois é, é que a ciência faz parte da cultura e, como tal, pertence a todos. E os cientistas, sejam eles das ciências exactas, das ciências naturais ou das ciências sociais e humanas, têm o dever e a obrigação de descodificar a linguagem própria das suas áreas para possibilitarem uma maior acessibilidade do conhecimento todos.

Esse comportamento faz parte da responsabilidade social dos cientistas. E, à medida que vamos avançando na vida e nas carreiras, se formos honestos e não nos tivermos preocupado apenas em obter um canudo, vamo-nos apercebendo quão pouco sabemos perante todo o conhecimento armazenado e tudo o que o cérebro humano está sempre apto a descobrir.

Perante isto, não é possível fugir a um sentimento de humildade relativo à nossa inescapável ignorância, bem como a interrogações de natureza ética não só sobre a aplicação do conhecimento existente, mas dos projectos de investigação em que será ou não legítimo investir.

Não se trata de inibir a progressão do raciocínio ou da inteligência, mas de estarmos bem conscientes de que cada descoberta, cada invenção é sempre susceptível de aplicação. Sejam essas aplicações benfazejas ou maléficas para a humanidade, sempre haverá um demiurgo pronto a utilizá-las.

E a nossa responsabilidade social é abrir o diálogo sobre o conhecimento que tivemos a felicidade de poder adquirir, num mundo onde a maioria não a conseguiu ter, partilhá-lo de forma a permitir que todos nos possamos pronunciar sobre ele, fazer as escolhas fundamentais a uma sociedade justa e humanizada.

Deixarmos de ser herméticos. De tudo se pode falar por forma entendível desde que se saiba bem do que se está a falar. Os papagaios é que falam por repetição, não por entendimento.
publicado por Carlos Loures às 23:55
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